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O processo de alocação dos recursos federais pelo Congresso Nacional

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02/09/2004 às 00:00
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IV. A Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização - CMO

IV.1. Processo orçamentário bicameral institucionalmente concentrado

A atribuição da tarefa de apreciar as leis do sistema orçamentário a órgão colegiado técnico misto do Congresso Nacional foi incluída em nosso ordenamento constitucional pela Emenda Constitucional nº 1, de 1969, alterando a Constituição de 1967, cujo procedimento bicameral historicamente mostrou-se inadequado ao trato dos temas orçamentários. Orçamento significa pressuposto para a concretização do princípio da continuidade da administração, assim, exigências de prazo e oportunidade cobram processo deliberativo célere e adensado, de difícil atingimento pelo processo legislativo ordinário bicameral.

Em termos de direito comparado, exigência de um mundo globalizado, nosso processo orçamentário pouco deixa a desejar quando contrastado com sistemas alhures. Ainda que mantenha a bicameralidade nas votações, primeiro votam os deputados, se aprovação a proposição então é apreciada pelos senadores, tanto no plenário da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização - CMO como do Congresso Nacional, mostra-se este bicameralismo mitigado por uma comissão mista com poderes e atribuição provenientes diretamente de sede constitucional.

Propugna-se na PEC nº 22/2000-Senado, voltada à implantação do orçamento impositivo, a extinção da CMO e a tramitação bicameral da peça orçamentária e dos demais diplomas do ciclo orçamentário.

O processo bicameral tradicional, como estudos demonstram, vide William B. Heller (1997) [10], torna o processo orçamentário custoso e caro, no sentido de serem maiores as pressões por gastos, acarretando déficits fiscais com mais freqüência. A apreciação separada em duas Casas, inclusive com o retorno à Casa iniciante ou à comissão mista de compatibilização, dá oportunidade para que os agentes sociais pressionem com maior efetividade na alocação de recursos para satisfação de demandas localizadas, tornando o autor da proposta, em geral o Poder Executivo, mais suscetível a tais reclamos.

Sem considerações sobre o mérito ou não de tais reivindicações, o que se verifica é que, quanto mais prolongado e quanto mais intervenções ocorrem no processo orçamentário, maiores a chances de serem extrapolados os limites fiscais do Estado, pela necessidade em contemplar cada um dos inúmeros pleitos que se apresentam quando da apreciação da peça orçamentária no Parlamento. Afinal, a função do próprio Parlamento é ser a caixa de ressonância de tais pretensões. Bicameralismo, em matéria orçamentária, significa mais pressão sobre o Tesouro e maiores dificuldades da obtenção do equilíbrio fiscal, sem necessariamente resultar na adoção de melhores políticas de gastos públicos.

IV.2. Restrições ao universo legiferante da CMO

Por força do subsistema constitucional-orçamentário imprimido pós 1988, como já mencionado, o processo de apreciação dos projetos de lei relativos ao PPA, à LDO e à LOA difere do processo legislativo de apreciação das demais leis [11]. Além de conter prazos definidos para sua apresentação e apreciação, exige um conjunto de restrições especiais a que se submete o processamento de emendas e a aprovação da lei orçamentária. A competência da CMO na apreciação da matéria orçamentária e financeira, incluindo-se o exame de prestação de contas anual do Presidente da República, é excludente em relação às demais comissões temáticas permanentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, às quais somente é permitido apresentar emendas [12].

Tal exclusividade temática já não se dá na fiscalização da execução orçamentário-financeira, que é compartilhada com as outras comissões permanentes de ambas as Casas, em especial com as respectivas comissões de fiscalização e controle. Outra matéria compartilhada com as outras comissões permanentes é a relativa a projetos de planos nacionais setoriais, também apreciados no mérito pelas comissões atinentes à área de ambas as Casas.

A CMO não pode apreciar outra matéria diferente daquela prevista na Constituição. Não tem, assim, possibilidade de alterar leis que criam despesas obrigatórias continuadas, ou de leis que alterem a receita ou gerem renúncias fiscais, denominados gastos tributários, mesmo quando estas contrariem os limites orçamentários.

Não existe nenhuma sistematização entre os projetos de lei alterando a legislação permanente, que tramitam nas Comissões temáticas das Casas do Congresso, e os projetos de leis orçamentárias. O único instrumento hoje existente encontra-se na Comisssão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados onde se procede ao exame de compatibilidade e adequação orçamentário-financeira dos projetos de legislação permanente. Ainda que o exame tenha caráter terminativo, tal processo ainda vê-se incipiente e carente de aprimoramento quanto a sua eficácia.

Tem-se no exame de adequação orçamentário-financeira da legislação permanente a figura do legislador negativo, fiscal e controlador do processo legislativo, com similhitude ao exame prévio de constitucionalidade exercido pelas Comissões de Constituição e Justiça de ambas as Casas, ou, remotamente, ao controle jurisdicional concentrado da constitucionalidade das normas desempenhado pelo Supremo Tribunal Federal. O exercício de tal prerrogativa pelos parlamentares, por vezes, torna-se difícil em face dos interesses envolvidos e do tormentoso, mas necessário, distanciamento das iniciativas de seus pares ou da interferência política dos outros Poderes.

Como solução, propõe-se que o exame de compatibilidade e adequação orçamentário-financeira seja realizado pela CMO ao findar da tramitação pelas Casas do Congresso Nacional, onde os projetos, já aprovados no mérito e com impacto fiscalk, aguardariam, em caráter suspensivo, uma "janela orçamentária" a partir da qual teriam eficácia.

O hiato processual, hoje existente, dificulta a implantação do modelo de controle dos gastos obrigatórios de caráter continuado ínsito nos art. 15 a 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar nº 101, de 2000. O processamento separado dos temas financeiro-orçamentários, a iniciativa em tema orçamentário é privativa do Executivo, impede que os autores parlamentares ou dos Poderes Legislativo (como administração) ou Judiciário e do Ministério Público, tenham oportunidade de oferecerem despesas ou receitas como compensação ao acréscimo de gasto pretendido nos projetos de lei de sua iniciativa, dificultando a implantação do mecanismo de compensação previsto na LRF.

IV.3. Composição e estrutura da CMO

A CMO é composta por 63 deputados e 21 senadores. O número de representantes de cada partido é fixado pela Mesa do Congresso Nacional no início de cada ano, com base no critério da proporcionalidade partidária, cabendo aos Lideres de cada partido, na Câmara e no Senado, indicar os respectivos representantes.

A composição da CMO vem sendo questionada a cada escândalo na elaboração/execução orçamentária federal. Há defensores da redução do número de membros da CMO com o fito de torná-la mas ágil ao facilitar a obtenção do quorum necessário para suas deliberações.

Desde a Resolução nº 2/95-CN, não mais vige a regra que proibia a continuidade dos parlamentares por mais de um ano na Comissão Mista, permitindo hoje a presença de parlamentares com conhecimento mais especializado na matéria. Os trabalhos da Comissão são dirigidos por um Presidente e três Vice-Presidentes, escolhidos pelos membros da Comissão.

Os relatores, parlamentares incumbidos de analisar o projeto de lei e as emendas apresentadas, devem concluir pela apresentação de minuta de parecer contendo relatório e voto sobre a matéria submetida ao plenário da Comissão. Os relatores são indicados pelas lideranças partidárias da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, sendo designados pelo Presidente da Comissão. Ao contrário das outras comissões permanentes das Casas, as relatorias, das peças mais importantes, na CMO possuem critérios prévios para designação pelo Presidente. Na reforma do processo, propõe-se a obrigatória alternância dos partidos nas relatorias.

No âmbito da lei orçamentária, existe um Relator-geral, que deve elaborar o parecer preliminar. Depois, a peça orçamentária é dividida em dez áreas temáticas, distribuídas por órgãos conforme o Parecer Preliminar, atribuindo-se aos relatores setoriais o exame e a emissão de parecer para cada uma dessas áreas. Em seguida, o Relator-geral deve consolidar e sistematizar os relatórios setoriais.

A funcionalidade do processo conta também com o papel importante dos parlamentares representantes de líderes partidários junto à CMO, atribuindo-se aos mesmos o equacionamento e a composição de acordos acerca de temas e matérias muitas vezes polêmicas e complexas.

A cada ano, há alternância entre senadores e deputados na Presidência da CMO, na relatoria da LDO e na Relatoria-geral da LOA, de tal forma que se for presidente um senador, o relator da LDO e da LOA será deputado, e no ano seguinte o contrário, observado o princípio da proporcionalidade partidária.

Após receber o PLOA, a Mesa do Congresso estabelece o cronograma de apreciação do projeto.

IV.4. Normas processuais do Processo Orçamentário

O processo de apreciação é hoje regulado pela Resolução nº 01, de 2001, do Congresso Nacional, que veio a substituir a Resolução nº 2/95-CN, encerrando sucessão de resoluções de caráter temporário, que regulavam o processo, em regra, nos anos eleitorais.

Até o presente, a Resolução nº 1/01-CN somente foi alterada pelas recentes Resoluções nº 01/03-CN e 2/03-CN, a primeira alterou o processo de apreciação dos decretos legislativos liberando a execução de obras com indícios de irregularidade e a segunda alterou seu art. 25, que será comentado no item "As emendas".

As Resoluções nº 1/01-CN, 01/03-CN, e 2/03-CN foram reeditadas em 12.11.2004, nos termos do Ofício/CN nº 824/2004, do Presidente do Senado Federal, tendo sido suas vigências prorrogadas, com exceção do art. 2º da Res. nº 03/2003-CN, até que o Congresso Nacional aprove resolução disciplinando as competências da Comissão e a tramitação das matérias orçamentárias. O art. 2º mencionado determinava a perda da eficácia da Resolução nº 1/01-CN a partir de 30.08.2004. Assim, por meio de um ofício, foi revigorada a vigência de Resoluções do Congresso Nacional já revogadas.

A CMO conta com um Regulamento Interno, aprovado em 28.08.2003, que detalha disposições da Resolução nº 1/01-CN.

Encontra-se em apreciação pelo Plenário do Congresso Nacional o Projeto de Resolução PRC nº 2/2005, que reforma a Resolução nº 1/01-CN, alterando vários procedimentos e criando novos intrumentos como as emendas de bancada de remanejamento, emenda de renúncia de receita, ou a Relatoria da Receita.


V. O processo de análise e apreciação da proposta orçamentária

Sumariamente, as etapas do processo de análise e apreciação são as seguintes:

1.Publicação e distribuição de avulsos contendo o PLOA;

2.Apresentação de nota técnica conjunta pelas Consultorias de Orçamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal como subsídio à apreciação do PLOA;

3.Realização de audiências públicas para discussão do projeto;

4.Publicação e distribuição da proposta de Parecer Preliminar pelo Relator-geral;

5.Apresentação de emendas ao Parecer Preliminar ;

6.Apreciação, apresentação de destaques e votação do Parecer Preliminar pela CMO;

7.Apresentação de emendas à proposta orçamentária;

8.Publicação e distribuição dos avulsos das emendas;

9.Apresentação, publicação, distribuição dos pareceres setoriais pelos Relatores setoriais;

10.Discussão, apresentação de destaques e votação dos pareceres setoriais na CMO;

11.Apresentação, publicação e distribuição do Parecer Final na CMO pelo Relator-geral, incluindo os pareceres dos comitês de apoio;

12.Discussão, apresentação de destaques e votação do Parecer Final na CMO;

13.Sistematização do Parecer Final e encaminhamento à Mesa do Congresso Nacional;

14.Apresentação de destaques no Plenário do Congresso Nacional, com parecer do Relator-geral;

15.Votação do Parecer Final da CMO e dos destaques no Plenário do Congresso Nacional;

16.Sistematização das decisões do Plenário do Congresso e geração do Autógrafo (projeto de lei orçamentária como aprovado pelo Congresso Nacional);

17.Encaminhamento do Autógrafo ao Poder Executivo para sanção ou veto presidencial, parcial ou total, promulgação e publicação no Diário Oficial da União;

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18.Apreciação dos vetos apostos pelo Presidente da República;

19.Retificações na programação durante o exercício, no caso de erros materiais identificados após a edição da lei orçamentária; e

20.Apreciação de créditos adicionais encaminhados pelo Poder Executivo, suplementares, especiais e extraordinários, ao longo do exercício financeiro.

Encaminhado pelo Presidente da República ao Congresso Nacional em 31 de agosto de cada ano, a Mensagem que acompanha o projeto de lei do orçamento é lida na sessão do Plenário do Congresso, publicada com o projeto no Diário do Congresso Nacional, e em até 48 horas, encaminhado à Comissão Mista, onde os trabalhos de exame e apreciação têm lugar.

A publicação e divulgação da proposta orçamentária apresentada pelo Poder Executivo, tanto em papel quanto por meio magnético [13] dá existência jurídica ao seu conteúdo, e tem por finalidade permitir aos parlamentares e à sociedade o conhecimento da peça orçamentária.

Nesta etapa, os órgãos de assessoramento e consultoria de ambas as Casas, Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira na Câmara dos Deputados e Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle no Senado Federal, preparam estudos e notas técnicas com análise dos seguintes pontos [14]:

- principais agregados macroeconômicos utilizados nas projeções constantes da proposta, como inflação, taxa de juros, crescimento do PIB, taxa de câmbio e outros;

- estimativas e possíveis alterações na legislação relativa à receita;

- estimativas das despesas obrigatórias, especialmente com pessoal e encargos sociais, benefícios previdenciários, gastos com saúde, gastos com o FUNDEF, benefícios assistenciais e outras despesas relevantes;

- execução da programação orçamentária vigente e dos exercícios anteriores, comparando-se com os valores propostos;

- verificação da observância dos requisitos presentes na LRF, na LDO do exercício e no PPA;

- aprimoramentos possíveis ao processo de apreciação da proposta orçamentária; e

- outros assuntos específicos que se mostrem de interesse para os parlamentares e para a sociedade.

V.1. Audiências Públicas

A realização de audiências públicas em uma fase anterior à apreciação das matérias em pauta objetiva uma maior discussão e aprofundamento em assuntos específicos. Geralmente são ouvidos o Ministro da Fazenda, do Planejamento e Orçamento, o Secretário de Orçamento Federal e o Secretário da Receita Federal. Nesta fase, os expositores apresentam as premissas e parâmetros considerados na elaboração da proposta. A comparação dos valores estimados com os valores efetivamente verificados, durante a execução orçamentária, mostra que nos últimos anos o Poder Executivo tem apresentado estimativas sempre otimistas das principais variáveis macroeconômicas: taxa de crescimento, inflação e juros.

As consultorias preparam subsídios que possam ser utilizados na forma de questionamentos durante a audiência pública, em especial a Nota Técnica Conjunta prevista na Resolução nº 1/01-CN.

No passado, a Comissão já adotou a prática de realizar também audiências públicas regionais, com o propósito de discutir nos estados, com a presença do governo local, da bancada de parlamentares e de outros agentes da comunidade, as obras e os investimentos federais previstos para aquela região.

V.2. Parecer Preliminar

Uma das tarefas primordiais do Relator-geral da proposta orçamentária é propor à CMO a fixação de critérios que norteiem o acolhimento de emendas e as alterações que porventura venha o PLOA a sofrer na Comissão. O instrumento regimental para tal é o Parecer Preliminar. A proposta de Parecer é apresentada pelo Relator Geral e sujeita a emendas e destaques pelos parlamentares e aprovação pelo Plenário da Comissão.

O Parecer Preliminar, que antecede o trabalho dos relatores, contém:

- uma análise da receita, item por item, quadro comparativo com a execução no exercício anterior e no atual, já devendo prever as alterações em termos de receita quanto à proposta apresentada pelo Executivo;

- análise comparativa dos grandes agregados da despesa, da dívida, de tópicos especiais como salário mínimo, precatórios, obras com gestão irregular, LRF, emendas da saúde e outras matérias que devam ser reguladas previamente aos trabalhos das relatorias;

- os parâmetros e critérios que orientam o cancelamento das dotações e sua alocação nas emendas, em regra fixam-se percentual de corte global por GnD (grupo de natureza da despesa) e protegem-se de corte determinadas categorias de despesa em função de legislação anterior ou mérito

- critérios para atendimento às emendas;

- são definidas as relatorias setoriais, a divisão de atribuições de cada relator, bem como os limites que devem ser observados pelos mesmos.

É de se ressaltar que a partir do processo orçamentário de 2001 ficou fixada a obrigatoriedade da aprovação prévia pelo Plenário da Comissão, de qualquer alteração no Parecer Preliminar quando de reestimativa de receita, para fins de apropriação na despesa.

O Parecer Preliminar divide e atribui às relatorias setoriais da LOA cada uma das dez áreas temáticas distintas, por autorização da Resolução nº 1/01-CN. As áreas temáticas podem abranger um ou mais órgãos (ministérios) do governo, e que hoje servem de parâmetro para a agregação dos órgãos nos projetos de crédito adicional, são as seguintes:

1) Poderes do Estado e Representação;

2) Justiça e Defesa;

3) Fazenda e Desenvolvimento;

4) Agricultura e Desenvolvimento Agrário;

5) Infra-Estrutura;

6) Educação e Cultura, Ciência e Tecnologia e Desporto;

7) Saúde;

8) Previdência e Assistência Social;

9) Integração Nacional e Meio-ambiente;

10) Planejamento e Desenvolvimento Urbano.

O texto da LOA e seus quadros anexos, assim como a definição da receita orçamentárias e da reserva de contingência, por seu caráter amplo, são tratadas pelo Relator-geral. O assessoramento disponibiliza para o Relator-geral as informações existentes, reunindo-se com representantes de órgãos do Executivo e levantando dados em bases de acesso assegurado pelas LDOs. Como já mencionado, o

V.3. As emendas

Uma vez votado o Parecer Preliminar, abre-se prazo para apresentação de emendas ao PLOA. Em matéria orçamentária criou-se a figura das emendas coletivas apresentadas por um conjunto de parlamentares de determinado estado ou distrito federal ou de uma região, e também pelas comissões temáticas permanentes da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal.

As alterações na programação de trabalho constante dos anexos do orçamento, que contém os créditos e dotações orçamentárias, ou seja, as autorizações para o gasto pela Administração, devem ser procedidas sempre por emenda, ainda que de relator, não sendo possível o denominado "substitutivo" genérico. A mesma exigência de emenda se faz para alterações na receita, só sendo possível o "substitutivo" para alterações no texto da lei orçamentária.

A apresentação de emendas à proposta orçamentária é regulada tanto pelo art. 166 da Constituição, que veda o cancelamento de dotações relativas á dívida, pessoal e transferências constitucionais, exceto por erro ou omissão, como pela Resolução nº 1/01-CN, e pelo Parecer Preliminar , que estabelece uma série de regras complementares por força da Resolução nº1/01-CN. Em geral, não apenas aquelas despesas previstas na Constituição, mas todo conjunto de despesas obrigatórias constitucionais e legais definidas na LDO são protegidas de cancelamentos durante a tramitação do orçamento, por disposições do Parecer Preliminar .

Pela Resolução nº 1/01-CN, a apresentação de emendas à despesa está sujeita a limites numéricos e de acolhimento, para as individuais, o mesmo não ocorrendo às emendas de cancelamento da despesa, de texto ou à receita. É dada prioridade às emendas coletivas. Entretanto é assegurado às emendas individuais um montante mínimo para cada um dos parlamentares, por mandato, em um sistema de quotas, cujo valor é alterado pelos Pareceres Preliminares de R$ 2,0 milhões em 2002, R$ 2.5 milhões em 2003, chegando em 2005 a R$ 5 milhões.

O Relatório da CMPMI "Das Ambulâncias", de 2006, que investigou o desvio de cerca de R$ 300 milhões entre 2002 e 2006 com fraudes nas licitaões de ambulãncias para prefeituras, em parte veiculadas por créditos orçamentários incluídos por emendas individuais, propôs, dentre outras medidas, a extinção ou imposição de restrições profundas a tal modalidade de emendas parlamentar. Cremos que a facilidade propiciada pelas emendas individuais explica em parte o esquema, já que parcela considerável das dotações que alimentou o desvio de recursos veio de dotações globais do Ministério da Saúde.

A restrição efetiva de transferências voluntárias, ou mesmo sua extinção substituída exclusivamente por transferências constitucionais ou legais, teria mais eficácia do que a supressão das emendas. Tais emendas são mero instrumento de apropriação nos créditos e não mecanismo de execução desses créditos, fase em que efetivamente se deu a fraude e desvio dos recursos federais descentralizados ás prefeituras. O meio foi e será a forma de descentralização, por via de transferências voluntárias, sem qualquer critério prévio de distribuição ou de verficação do custo/benefício.

Questões polêmicas sobre a autoria e objeto das emendas ao orçamento não se restringem às emends individuais mas se extendem ás emendas coletivas. Critica-se a utilização de emendas coletivas genéricas que não identificam claramente a obra objeto da alocação orçamentária, a denominada "rachadinha" ou "partilhável". Muitos consideram tais emendas como desvirtuamento da emenda coletiva, pois se tratariam, na realidade, de emendas individuais, a serem especificadas, durante a execução orçamentária, já no Poder Executivo.

As emendas de comissão devem ter caráter nacional ou institucional e proporem ações na respectiva atribuição regimental. Tais emendas não podem refletir interesse tipicamente estadual ou local. Por vezes critica-se tais emendas por serem nada mais do que emendas "biombo", por representarem interesses particulares e não setoriais, sua razão de existir.

A recente edição da Resolução nº 2/2003-CN, veio a alterar o art. 25 da Resolução nº 1/2001-CN, criando, nas bancadas estaduais integradas por mais de dezoito parlamentares, a figura da iniciativa privativa de senador e de deputado na apresentação de emendas aos coletivos das bancadas estaduais, nos seguintes termos: "§ 1º Nas bancadas estaduais integradas por mais de dezoito parlamentares, fica assegurada a iniciativa aos senadores de propor três emendas, cabendo, aos deputados, a iniciativa da apresentação do restante das emendas, a serem apreciadas nos termos do inciso II deste artigo."

As consultorias, no que tange às emendas, preparam manual de instruções contendo todos os procedimentos necessários à formulação e apresentação das emendas. Paralelamente, orienta parlamentares e assessores (secretariado parlamentar) acerca da forma e do correto preenchimento do formulário eletrônico com as emendas, além de efetuar o processamento, a geração de relatórios consolidados e a análise de admissibilidade [15] das emendas apresentadas.

V. 4. As Relatorias Setoriais e Geral

A apreciação das emendas inicia-se pelos relatores setoriais. As relatorias setoriais fazem o primeiro exame da proposta apresentada quanto à programação de trabalho das unidades orçamentárias a elas afetas. Devem observar as regras do Parecer Preliminar

Os critérios de cancelamentos permitidos aos relatores setoriais e ao Relator Geral são fixados no Parecer Preliminar. Geralmente, os cortes nos investimentos e inversões financeiras (GnD 4 e 5) são atribuição dos relatores setoriais. Tais cortes só podem ocorrer dentro do setor. Os recursos liberados pelos cortes, classificados por fontes, são utilizados pelos relatores setoriais para o atendimento das emendas.

Na verdade, é o Relator-geral, com sua prerrogativa de identificar distorções na receita orçamentária, que acaba provendo a maior parte dos recursos necessários ao fechamento dos relatórios setoriais. As eventuais reestimativa de receitas sugeridas pelo Relator-Geral, com o apoio de um Comitê Consultivo, depois de aprovadas pelo plenário da Comissão, também podem ser utilizadas como fonte de atendimento de emendas. O critério de repartição dos recursos identificados pelo Relator-geral aos relatores setoriais observa, em regra, a proporcionalidade com o número de emendas coletivas apresentadas para cada setor.

O Relator-geral desempenha fundamentalmente o papel de sistematizador das decisões setoriais, podendo aumentar ou reduzir os valores atendidos para cada emenda. No entanto, o Relator-geral não pode aprovar emenda totalmente rejeitada pelos relatores setoriais, tão pouco acrescerem dotações além da proposta orçamentária. Os relatores não podem inovar, ou seja, não podem incluir despesas que não foram objeto de emenda apresentada, salvo erros e omissões de ordem técnica ou legal, devidamente justificadas.

Propõe-se, na reforma do processo orçamentário, a criação da Relatoria da Receita, a quem seria incumbida a tarefa de exame da receita prevista na proposta do Executivo e propor alterações na mesma, segregando assim a tarefa de estimar a receita de apropriar a despesa, tarefa dos Relatores Geral e setoriais. Espera-se que a segregação de funções diminua as críticas do Poder Executivo às reestimativas de receitas realizadas pela CMO nos últimos anos, tornando-as mais neutras e realistas. Observe-se que tais reestimativas de receitas tem, em sua maioria, se efetivado, em parte pelo fato do crescimento da carga tributária ocorrida na última década.

As consultorias, no atendimento aos relatores, elaboram estudos e notas técnicas demandados acerca de pontos de maior indagação e questionamentos que constaram da proposta. Além disso, apresentam relatórios gerenciais que facilitam o processo decisório, acompanhando as discussões públicas sobre o tema. Elaboram ainda, sob orientação dos autores, a minuta do parecer, e efetuam o processamento das decisões das relatorias e da Comissão, observando e garantindo [16] a compatibilidade das fontes de recursos com as emendas atendidas. Uma atribuição importante dos órgãos de assessoramento é o de alertar os relatores, inclusive por escrito, sempre que constatar que determinada emenda ou decisão da relatoria não observa algum dos requisitos constitucionais, legais ou regimentais [17].

É exigência regimental a apresentação de relatórios que contenham elementos técnicos que permitam o conhecimento exato das mudanças que estão sendo propostas.

Os relatórios de cada setor vêm sendo aprimorados com maiores detalhamentos das alterações processadas e com análises de aspectos especiais de pontos da proposta encaminhada pelo Executivo. As decisões do relator quanto às emendas são detalhadas em relatório, tanto por modalidade (coletivas, individuais e de relator) como por unidade da federação ou órgão/unidade orçamentária. Nos relatórios é dada ênfase aos reflexos das decisões adotadas em relação à proposta do Executivo.

Enquanto durar a leitura e discussão do relatório são aceitos destaques à proposta orçamentária ou às emendas apresentadas. Tais destaques são discutidos e votados assim que for aprovado o relatório, ressalvados os destaques apresentados. A Resolução nº 1/01-CN, seguindo tendência de outras resoluções extraordinárias anteriores, restringiu as possibilidades de destaque, sendo vedado o uso desses como substitutos de emendas. Os destaques, na verdade, representam um pedido de reconsideração acerca do parecer das emendas já apresentadas, não podendo, portanto, criar nova ação ou ultrapassar o valor solicitado na emenda ou o valor a ser recomposto do projeto original. Os assessores acompanham e apoiam todas as votações na Comissão. Ao longo dos trabalhos são gerados relatórios parciais e, no encerramento, todas as deliberações são organizadas e implantadas no sistema informatizado.

V.5. A votação do parecer final

A harmonização e adequação dos relatórios setoriais e sua consolidação final é feita na segunda etapa de apreciação do orçamento pelo Relator-Geral, que submete o seu Parecer, com o respectivo Substitutivo (o projeto de lei modificado pelas emendas parlamentares aprovadas) ao plenário da Comissão.

Os recursos disponíveis do relator-geral são utilizados para atendimento das emendas coletivas, uma vez que as emendas individuais geralmente são todas atendidas na fase setorial, com recursos tanto do relator setorial quanto do geral. As discussões que se estabelecem nesta fase são tipicamente regionais, onde cada bancada estadual procura melhorar sua posição no conjunto de investimentos do orçamento da União.

É bastante comum a realização de reuniões públicas seqüenciais com a presença do Relator-geral, do Comitê de Apoio à Avaliação de Emendas Coletivas, e dos parlamentares e representantes de cada um dos estados da federação. Este fórum é provavelmente o que exigem maior capacidade de negociação e conciliação de interesses antagônicos: de um lado, a escassez de recursos orçamentários, e, de outro, a extrema necessidade dos estados do apoio federal na condução dos seus investimentos. Perfazem o quadro a busca da justiça distributiva ao nível de federação e os apelos sempre presentes de correção dos desequilíbrios regionais.

Entretanto, verifica-se crescente interesse dos parlamentares no debate acerca de temática não regional, a exemplo dos recursos necessários aos gastos decorrentes do aumento do salário-mínimo ou ao mínimo constitucional para a saúde.

As assessorias, além de acompanharem e prestarem esclarecimentos técnicos durante as reuniões de trabalho, preparam relatórios mostrando os recursos que foram destinados para cada unidade de federação e comparando tais valores com aqueles dos anos anteriores.

Após a aprovação pela Comissão, e sua sistematização, o substitutivo segue para a apreciação pelo plenário do Congresso Nacional. Assim como nos relatórios setoriais, o relatório final após discussão é votado, ressalvados os destaques apresentados, os quais são posteriormente discutidos e votados.

V.6. Sistematização do Parecer Final e encaminhamento à Mesa do Congresso Nacional

A sistematização do Parecer Final consiste de uma série de procedimentos e ajustes que devem ser realizados pelas consultorias técnicas. Nesta etapa são conferidas todas as despesas e fechados os quadros de receita. O equilíbrio entre receitas e despesas, corrente e primário, a compatibilidade de fontes e destinações, e outras verificações, também fazem parte das tarefas.

Também nesta etapa deve ser verificada a adequação das metas físicas dos subtítulos com o montante final da dotação orçamentária consignada. Assim, se um subtítulo teve seus recursos duplicados, as metas físicas, em regra, também devem ser aumentadas na mesma proporção. As metas físicas, em especial nos projetos, permitem a aferição da eficiência e economicidade no atingimento dos objetivos. Até hoje não foi dada a devida importância à verificação da metas propugnadas na lei. As LDOs prevêem que os custos unitários das obras não poderão ser superiores à mediana daqueles constantes do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil - Sinapi, mantido pela Caixa Econômica Federal.

V.7. Votação e Sistematização das decisões - Plenário do Congresso e Autógrafo

No plenário do Congresso Nacional, todos os parlamentares podem, teoricamente, participar novamente do processo de discussão da peça orçamentária. A aprovação da matéria pela Comissão significa que a proposta orçamentária, com as alterações efetuadas, já apresenta consenso suficiente para uma votação consensual no Congresso. Observamos ser vedada a apresentação de emendas no Plenário do Congresso. As emendas sujeitas à apreciação são as mesmas que foram apresentadas à Comissão Mista, podendo, no entanto, ser destacadas no Congresso Nacional, desde que haja apoiamento regimental ao destaque. No plenário a matéria orçamentária é relatada pelo mesmo Relator-geral que relatou o projeto na Comissão.

Ao final dá-se nova sistematização à semelhança do procedido no âmbito da Comissão, só que em menor escala, pois as alterações de Plenário são em menor número, uma vez que se espera sempre que a Comissão envie ao Congresso uma matéria politicamente já conciliada e acordada. Nesta etapa são gerados todos os quadros consolidados previstos na Lei 4.320/64 e na LDO, imprimindo-se a versão final do autógrafo, ou seja, documento com o conteúdo e a forma final da lei, pronto para se enviado à sanção. As consultorias devem ficar atentas às eventuais modificações havidas no âmbito do plenário do Congresso para que possam ser devidamente processadas.

A complexidade do processo e a velocidade nas deliberações sobre a peça orçamentária, associada à exiguidade de prazos, tem levado à identificação, à posteriori, de erros materiais no processamento das decisões, acarretando o envio pelo Congresso Nacional de retificações do autógrafo ao Poder Executivo, mesmo depois de ter sido sancionada e publicada a lei orçamentária. Tal procedimentos mantém paralelismo com o envio de mensagens presidenciais e mesmo ofícios ministeriais sugerindo alterações da proposta durante sua apreciação no Congresso Nacional.

V. 8. Sanção presidencial, promulgação e publicação pelo Presidente da República

Uma vez aprovado o substitutivo, agora chamado de autógrafo, o mesmo é remetido ao Presidente da República para sanção e publicação da LOA, no prazo máximo de 15 dias úteis. Ocorrendo vetos, o Congresso terá trinta dias para apreciá-los, podendo torná-los sem efeito, caso seja esta a decisão da maioria absoluta dos congressistas.

Vimos que a participação do Legislativo é essencial para legitimar o orçamento em uma sociedade democrática. Mas sendo o orçamento uma lei, a mesma pode ser vetada pelo Presidente da República. Os vetos devem incidir sobre o total de cada dotação orçamentária, ou seja, não é admitido veto sobre uma parcela da dotação autorizada, por paralelismo com a vedação constitucional de veto parcial a dispositivo de lei. Nos termos do § 8º do art. 166 da Constituição, os recursos que, em decorrência de veto, ficarem sem despesas orçamentárias correspondentes poderão ser utilizados, conforme o caso, mediante créditos especiais ou suplementares.

Nos últimos anos, o Presidente da República não tem usado de sua prerrogativa para vetar partes da programação de trabalho, restringindo-se a vetar dispositivos do texto da LOA. Tais vetos estão vinculados em sua maioria á interpretações divergentes entre o Executivo e o Congresso quanto ao real sentido do princípio constitucional da exclusividade da lei orçamentária, para melhor apreciação deste tema ver artigo nosso publicado em Cadernos ASLEGIS nº 19 [18].

Em verdade, não é necessário o veto para a não execução dos créditos considerados "não prioritários" pelo Executivo, as restrições aos créditos ocorrem durante a execução orçamentária com o uso do mecanismo do contingenciamento, hoje regulado pela LRF e LDOs.

E se o orçamento não for sancionado antes do início do exercício a que se refere? Dada a lacuna constitucional acerca de tal situação, as LDOs prevêem que, nesta hipótese, chamada de vazio (legal) orçamentário, o orçamento poderá ser executado dentro dos limites e montantes do projeto de lei, mas apenas quanto às despesas consideradas obrigatórias, de natureza constitucional ou legal (despesas como transferências constitucionais, juros e serviços da dívida, pessoal e encargos sociais, previdência, etc.); as demais despesas, discricionárias, não poderão ser executadas.

No exercício de 2006, a demora na aprovação da lei orçamentária, Lei nº 11.306, de 16.5.2006, trouxe à balia a questão do uso e abuso de medidas provisórias para abertura de créditos extraordinários com programações constantes da proposta, ainda não aprovada para o exercício, mas não autorizadas pela LDO/2006 como execução antecipada, em especial investimentos de cunho eleitoral. Entendemos que, se o legislador regulou exaustivamente o tema na LDO, discriminando a programação passível de execução antecipada, não pode Poder Executivo valer-se de mecanismo excepcional como as medidas provisórias, autorizadas pela Constituição unicamente para despesas urgentes e imprevisíveis, para executar sua proposta ainda não aprovada.

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Sobre o autor
Eber Zoehler Santa Helena

consultor de orçamento e fiscalização financeira da Câmara dos Deputados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HELENA, Eber Zoehler Santa. O processo de alocação dos recursos federais pelo Congresso Nacional: Versão 2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 422, 2 set. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5611. Acesso em: 7 mai. 2024.

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