Recentemente fui instigado pela pergunta acima, num site jurídico, em que se apresentavam algumas respostas em relação ao tema proposto, com minhas considerações são um pouco mais longas, resolvi fazer minha resposta sob a forma de um breve artigo. Na consulta havia referências à expressão intimação, termo muito vago mas que mexe com o imaginário do leigo, e, muitas vezes, causa confusão até nos mais experimentados profissionais da área.
Em verdade, sob uma perspectiva técnica, devemos compreender que existem formas de cientificação (comunicação) dos atos processuais. Vou opinar no âmbito do direito civil, minha área de formação. No entanto, em outros ramos do direito essas formas também existem (ao menos a citação e a intimação, mas as consequências que delas extraímos são diferentes – na revelia do acusado, no processo penal, por exemplo, não se permite concluir pela presunção fática do quanto alegado pelos Promotores de Justiça que acusam).
A mais conhecida e mais importante das formas de comunicação processual é a citação - nesse caso as providências são graves. Citação é ato através do qual alguém toma ciência de que está sendo processado e de que dispõe de um prazo para responder ao processo - na maioria das vezes (regra geral) por meio de um advogado (mas há exceções, por exemplo, nos Juizados Especiais Cíveis, causas de menos de vinte salários-mínimos quando a outra parte não tem advogado).
Em jogo, aliás, em uma citação, a discussão da garantia do contraditório pleno, antes apenas prevista no texto constitucional e intuída no sistema legal, agora restando como garantia prevista também no novo CPC (com isso o acesso que antes era reservado apenas ao STF passa a ser tecnicamente possível também ao STJ)
Como o mundo é um lugar juridicamente perigoso para se viver (muitas vezes as pessoas podem estar descumprindo leis que sequer ignoram – mas para o legislador vale a regra romana – ignorantia legis nemo excusat – ou a ninguém é dado alegar ignorância da lei – artigo 3º LINDB) valem as máximas do Príncipe de Lampedusa na obra "O Leopardo", no sentido de aquele que advoga para si só pode ter um tolo como cliente - convém sempre buscar o conselho de um advogado (alguém de fora raciona com a cabeça e não com o fígado – quem está em litígio geralmente raciocina com raiva o que turva a visão quanto à melhor estratégia).
Vale lembrar, o que é sempre esquecido, uma citação provoca vários efeitos (é um fenômeno juridicamente complexo), dentre eles materiais (pontua a mora e interrompe prescrição, por exemplo) e processuais (induz litispendência).
Se a comunicação judicial for uma citação e você não comparecer pode ser considerado revel, ou seja, sem defesa, e isso pode acarretar como consequência que você, por ficção, confessa que todos os fatos alegados pelo outro são verdadeiros (regra geral que comporta algumas exceções - por exemplo direitos indisponíveis). Ou seja a consequência é grave.
Há outros meios de comunicação judicial, como por exemplo as intimações. No ambiente do CPC/39 (antes ainda do CPC/73) havia a intimação que se referia a atos ocorridos no passado (por exemplo, diga sobre um documento já juntado no processo) e a notificação processual que se dirigia a atos a serem praticados no futuro, por exemplo, venha para audiência no dia 30 de junho, p. f..
No CPC ambas as figuras se mesclaram e seguem como hoje, ou seja, quando não for caso de citação, os atos processuais serão comunicados por intimação (e, via de regra, não obstante haja exceção, como por exemplo na Lei do Mandado de Segurança em qua a autoridade coatora será notificada para prestar informações).
Em tratando de intimação dependerá do alcance em que ela se desenvolve - às vezes, quando o ato de intimação for expresso em relação a tanto - existe o caráter mandamental - e o fato de não se atender à ela pode implicar no famigerado crime de desobediência (o artigo 139, inciso IV CPC/15 se refere ao fato de que o Juiz pode atribuir efeito mandamental ao seu ato - daí o perigo, quando isso ocorre, daquele que não atende o ato, poder se ver processado criminalmente).
Noutras vezes, o descumprimento da intimação pode acarretar sanções de outra ordem. Pense-se, por exemplo, num terceiro que guarda um objeto ou documento de interesse das partes – se o Juiz intimà-lo para a exibição e essa não for feita, poderá haver busca e apreensão do mesmo por Oficial de Justiça (se for a própria parte quem se omite no que tange à exibição, as consequências serão diversas, como por exemplo, presunção de que o documento comprovaria o fato alegado pela parte contrária – a priori não dá para cobrar astreintes nesse caso por conta da orientação da Súmula nº 372/STJ aparentemente não revogada pelo advento do novo CPC).
No CPC/73 havia previsão de outras formas então tidas como cautelares nominadas (artigo 867) que seriam o protesto, a notificação e a interpelação - o protesto judicial é mais genérico, visa prevenir responsabilidades e preservar direitos (por exemplo, um engenheiro protesta o dono da obra para que compre material desta ou daquela qualidade sob pena de não responder em caso de ruína da obra) - esse protesto não se confunde com o protesto extrajudicial do Cartório do Protesto (pontua impontualidade em título de crédito).
A notificação é menos genérica - é meio técnico de se compelir alguém a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa. Enquanto que a interpelação é meio técnico de se constituir alguém em mora.
Alguns diplomas legais não são tão técnicos assim, como o caso da Lei de Alienação Fiduciária (Lei nº 9.514/97) que utiliza o termo notificação como se interpelação fosse, mas o Código Civil é mais técnico. No caso dessas três modalidades (protesto, interpelação e notificação) não há relevância quando não se responde - não há cominação de qualquer pena – muitas vezes advogados se opõem a eles com contra-notificações, contra-interpelações e contra-protestos.
No CPC/15 essas três modalidades passam a ser tidas não mais como cautelares nominadas, sendo tratadas como procedimentos de jurisdição voluntária - com a peculiaridade de que não comportam defesa ou recurso. Mas isso não fere a Constituição que exige o contraditório sempre ? Pergunta que frequentemente ouço em cursos de pós graduação.
Não, porque do ponto de vista lógico, uma vez que alguém resta como notificado, por exemplo, não há como se “desnotificar” – a finalidade do ato se esgotou – eventual defesa ou recurso não tornariam a pessoa desnotificada. Daí a técnica desenvolvida em doutrina, de se enviar uma nova notificação, em sentido contrário, uma contra-notificação.