A palavra médico, tem como origem o verbo grego: medeo, que quer dizer: "cuidar de". Portanto, o médico é aquele que cuida. Hipócrates acentuou bem a finalidade da atuação do médico: do latim, primo non nocere ou seja, "primeiro não prejudicar". No mesmo sentido vai o adágio latino corrente no direito brasileiro, em termos de Responsabilidade Civil: naeminen laedere - "não lesar ninguém". Assim, se na sua atuação o médico causar dano a alguém, estará indo de encontro ao ditame maior da sua profissão, qual seja, não prejudicar o paciente com sua atividade profissional. Se isto acontecer, causado o prejuízo, surge, para o médico causador do dano, o dever de reparar. Nos deparamos com a necessidade de ressarcir aquele que foi lesado, já que, responsabilidade civil é a obrigação, que tem qualquer pessoa, de reparar o dano - lesão, prejuízo - causado à outrem. Surge, nestes casos, para a pessoa física e jurídica o dever de reparar os danos que causar a outra pessoa. Existem nos ordenamentos jurídicos, de praticamente todas as nações, normas estabelecendo a responsabilização do médico, em termos de Direito Civil, ou seja, a sua responsabilidade civil, através de normas gerais ou mesmo por meio de regras de responsabilidade civil específicas para o médico. Encontramos no direito positivo da Áustria, codificada pois, a definição de DANO, que transcrevemos por didática, e aplicável, que é, ao nosso tema. Está no Código Civil Austríaco (ABGB) no Parágrafo (leia-se: "Artigo") 1293, in limine, que nos diz: "§ 1293, Schade heibt jeder Nachteil, welcher jemanden an Vermögen, Rechten oder seiner Person zugefügt worden ist.". Em tradução livre do autor: Dano é a lesão - prejuízo - a que alguém é submetido no seu patrimônio, nos seus direitos, ou na sua própria pessoa.
O Código de Ética Médica (Resolução nº 1.246, de 8 de janeiro de 1988, do Conselho Federal de Medicina), no Capítulo III, que aborda A RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL, determina que : "É vedado ao médico:", especificando em seu artigo 29: "Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência". Portanto, segue o disposto, no terreno da Responsabilidade Civil, de não ser causado prejuízo ao paciente.
O artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor – CDC – (Lei nº8.078, de 11 de setembro de 1990), também determina a reparação dos danos causados por qualquer tipo de serviço, e, em tudo, se aplica ao serviço médico que for prestado, in verbis: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.".
E, a necessidade do médico de indenizar, também se encontra bem expressa no artigo 951, do Código Civil brasileiro, que estabelece: "O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.".
No Direito Civil brasileiro a responsabilidade civil é abordada sob a ótica de duas teorias mais destacadas. Temos a teoria da responsabilidade subjetiva (também chamada "teoria da culpa") e a teoria da responsabilidade objetiva. A responsabilidade civil do médico segue os mesmos ditames gerais da responsabilidade civil. Como uma das teorias da responsabilidade civil em geral, utilizadas pelos Tribunais, temos a da responsabilidade objetiva, na qual há necessidade da existência de um dano – prejuízo - sem se indagar se existe culpa na conduta do agente causador do dano. É necessário, apenas, que exista o nexo causal entre o ato do agente do dano e o prejuízo causado ao lesado, mas frise-se, deve haver nexo causal adequado entre o agir do que causou o dano e a lesão. Esta teoria – da responsabilidade objetiva – não é a aplicada pelos julgadores ao médico nos casos de responsabilização civil por danos causados à pacientes.
Encontramos também, em termos de responsabilidade civil, a teoria da responsabilidade subjetiva ("teoria da culpa"), a qual estabelece que tendo havido um agir lesivo – ato lesante – causando um dano, e entre este ato lesivo e o dano causado houver uma relação de causa e efeito, ou, seja houver nexo causal, presente estando na conduta do agente lesante – o autor do ato lesivo - a culpa, sob qualquer das suas formas (imperícia, imprudência, negligência, ou mesmo dolo), caracterizada está em nosso ordenamento jurídico a necessidade de responsabilizar civilmente o causador do dano. Deve este agente lesante reparar o prejuízo sofrido pelo que foi lesado. A "teoria da culpa" (responsabilidade subjetiva), aplica-se, pois, no erro médico, quando avaliado pelos Tribunais, sendo, inclusive, expressamente determinada a sua utilização no caso da atuação do médico, profissional liberal que é, no parágrafo 4º, do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor – CDC, que reza: "A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa." Mas, deve haver, é indispensável uma prova inequívoca de que houve culpa no proceder do médico. E, em termos de Direito Civil, é atribuição – ônus - do paciente fazer prova de que o médico agiu com culpa. A culpa, mesmo que levíssima, obriga a indenizar o paciente pelo prejuízo sofrido. Sem a prova da culpa do médico tudo será imputado unicamente ao infortúnio.
Assim, a responsabilização na justiça civil se dá a partir da constatação da culpa, em seu sentido amplo, no agir do médico. A culpa, no sentido amplo, poderá estar presente sob a forma de dolo, ou como culpa no sentido estrito. O dolo se caracteriza por um agir voluntário – consciente. O agente, no caso o médico, com a sua conduta, quer obter um determinado resultado danoso - específico - ou assume o risco de que ele ocorra. A culpa no sentido estrito, por sua vez, se caracteriza por um atuar não direcionado para obter um resultado danoso, mas inconscientemente – involuntariamente – adota, o médico, conduta profissional viciosa – errônea - causando dano ao paciente. Não quer causar dano ao paciente, mas sua atuação - postura - profissional está corrompida por imperfeições.
A imperícia, a imprudência ou a negligência, estando presentes em um ato médico que provoque dano em um paciente, estará caracterizada a presença de culpa no sentido estrito, no agir do profissional médico, pois são estas as maneiras desta se apresentar no agir culposo, em seu sentido estrito. A imperícia, do latim imperitia, se caracteriza por um agir sem noções técnicas satisfatórias ou com inadequada utilização dos conhecimentos sobre a sua área de atuação profissional – incompetente, inábil para a sua profissão. De imprudentia, também do latim, vem o termo imprudência. Apresenta um caráter comissivo – como um agir intempestivo, precipitado, irrefletido. Caracteriza-se por uma atuação sem a cautela adequada àquele momento da atividade profissional. Negligência vem igualmente do latim, neglegentia. Tem característica omissiva – é uma omissão aos deveres que uma determinada situação profissional exigir – seria uma abstenção (por inação, indolência, preguiça mental) da conduta médica indicada para determinada ocasião – um não atuar.
Há uma necessidade, aqui, de se distinguir entre um agir, por parte do médico, de maneira diligente (zelosa), cautelosa e com habilidade, perfeitamente ciente de seus deveres profisssionais e perfeitamente adequado ao contexto do atendimento médico (circunstâncias de tempo e lugar), mas que resulte, por imprevisível, em um dano ao paciente – erro escusável, daquele atuar do médico de uma maneira inadequada – imperita, negligente ou imprudente – caracterizando a presença de culpa em sua conduta profissional e que resulte em prejuízo ao paciente – erro inescusável, previsível.
E, o Código Civil, prevê este agir, no caso do dolo ("ação ou omissão voluntária"), da negligência e da imprudência, como um ato ilícito, no terreno do Direito Civil, em seu artigo 186, in verbis: "Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.". Em tudo e por tudo aplicável à atividade médica, exemplificando, além de outras razões, com o fato do médico em determinadas circunstâncias profissionais extrapolar os limites da sua competência técnica em um determinado caso, ou apresentar desvios de conduta, com isto causando danos ao paciente, encontramos, complementando o artigo 186, os comandos legais do artigo 187, do Código Civil brasileiro, in verbis: "Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.". Também complementando o artigo 186 (e o 187), em seu comando de responsabilizar por danos ao paciente o médico, há o artigo 927, do mesmo Código Civil, que diz: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.".
Portanto a conduta negligente e imprudente subsume-se no descrito no artigo 186, do nosso Código Civil, gerando a responsabilização do médico na esfera civil pelos danos porventura ocasionados a um paciente com esta conduta profissional culposa. A imperícia, tem sua responsabilização civil prevista no artigo 951, do mesmo Código Civil, in verbis: "O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.". Dispõe ainda este artigo, também, mais uma vez, a previsão de responsabilização nos casos de conduta médica eivada de culpa na forma de imprudência ou negligência.
E, dizem os artigos 948, 949 e 950, do nosso Código Civil:
"Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima."
"Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido."
"Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.".
Tudo isto porque a relação médico-paciente se constitui em uma relação contratual. Raras vezes é extracontratual, como em determinados casos de emergências médicas em que o paciente esteja inconsciente ou lhe falte capacidade jurídica para se autodeterminar. Em sendo um contrato cabe lembrar que, à esta relação, se aplica o disposto no artigo 389 do Código Civil brasileiro, que diz: "Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.". Se o médico não cumprir com a sua obrigação com o paciente, identifica-se a sua conduta com o disposto no referido artigo, com as repercussões legais daí decorrentes.
A obrigação do médico com o paciente é uma obrigação de meios. Na OBRIGAÇÃO DE MEIOS, aquele que é o contratado se obrigou a utilizar os procedimentos adequados para cumprir com a sua tarefa. A conduta do profissional, sob o ponto de vista técnico, o atuar propriamente dito, é que é inserido na relação jurídica - adimplindo a obrigação aquele que se obrigou profissionalmente, no caso o médico, se atuou da maneira adequada. Tendo agido com diligência, prudência e habilidade, tendo um atuar compatível com a legis artis ("estado da arte") médica, naquele determinado local e momento, o médico cumpriu com a sua obrigação. Não há o dever específico de curar, mas de se desempenhar a contento, em conformidade com as regras da profissão, sem vícios de conduta. Empregando todos os seus esforços para alcançar a cura do paciente, estará o profissional executando aquilo pelo qual se obrigou, ou seja, cumprindo sua obrigação contratual.
Mencione-se que a par da obrigação de meios existe a OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. Nesta, o compromisso, por contrato que é, consiste em efetuar um determinado procedimento médico no paciente para obter um resultado específico - determinado. Nessa obrigação, dentro da relação jurídica, se encontra a necessidade de obter um dado resultado, sendo esse devido pelo obrigado, no caso o médico. O médico só adimplirá a obrigação contratual se alcançar aquele específico resultado contratado. Aplica-se em termos de contrato de prestação de serviço médico a obrigação de resultado – atingir com o tratamento médico um fim determinado – nos casos, em nossos Tribunais, em que são analisados erros médicos na área da cirurgia plástica estética. A jurisprudência pátria é dominante – majoritária - neste sentido, apesar de existirem vozes discordantes.
O erro médico é um inadimplemento, bem caracterizado, de um contrato. Estamos frente à uma conduta bem definida de falha na prestação de serviços, no caso médicos, emergindo daí a necessidade de ser responsabilizado o profissional, em termos de responsabilidade civil, quando acompanhado de culpa o seu agir. Isto redunda - quando em juízo assim decidem os Tribunais brasileiros - em uma sanção, imposta ao médico, de indenizar o paciente lesado pela sua conduta culposa.
Utilizam-se, para juridicamente responsabilizar o médico pelo erro, todos os meios de prova aceitos em direito. Os prontuários, fichas clínicas dos pacientes, onde se encontram os seus dados clínicos e detalhes do atendimento, são de crucial importância, como elemento probatório. Acentue-se a importância da prova pericial, pela complexidade e controvérsias sobre as condutas em um tratamento médico, motivo pelo qual pode esta perícia, até, tornar-se indispensável.
Exoneram, o médico, da responsabilização pelos danos ao paciente, em sede de responsabilidade civil, a força maior ou o caso fortuito. No caso fortuito, como na força maior não se cogita de agir culposo por parte do profissional. Não havendo atuação culposa, já que o dano ao paciente foi decorrente de força maior ou caso fortuito, há exoneração da responsabilidade civil do médico, perante os Tribunais.
A força maior tem por característica ser um acontecimento não pertencente à relação médico-paciente. Mesmo que identificada e previsível, a força maior se caracteriza por não ser evitável pelo agir do homem. Mesmo que assim deseje o ser humano não consegue impedir nem que ocorra, nem as suas consequências.
Já o caso fortuito é inerente ao agir humano, na relação médico-paciente, decorre desta relação (é intrínseco à esta relação). Não é previsível, é inesperado, logo, não pode ser evitado. Assim, independe a sua ocorrência tanto dos profissionais de saúde, como do paciente. Ou seja, ocorre, o caso fortuito, independentemente da vontade do médico ou do paciente.
Também, a culpa exclusiva do paciente por um dano que tiver sofrido, exonera o médico da responsabilização civil pelo prejuízo que deste tenha advindo.
No terreno do erro médico o Direito Civil tem, pois, orientações bem definidas de responsabilidade civil para o manejo jurídico deste pelos Tribunais. Ressalte-se, dentre estas que abordamos e outras, a necessidade de haver NEXO CAUSAL, relação de causa e efeito, entre o ATO MÉDICO CULPOSO, ao qual se quer atribuir a responsabilidade de ser o causador da lesão, e o DANO sofrido pelo paciente.