APAC: a humanização do sistema carcerário

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Ante os problemas do sistema prisional tradicional, a Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (APAC) surge como uma proposta diferenciada, que se vale de ferramentas humanizadoras e eficazes à recuperação e ressocialização do condenado. Conheça um pouco mais sobre esse sistema, num paralelo traçado com o sistema prisional tradicional, que já, comprovadamente, não cumpre a função para a qual inicialmente foi proposto.

RESUMO: Visando à humanização da pena, o método APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) tem se revelado como alternativa viável e humanizada para o cumprimento das finalidades da pena, com respeito às garantias individuais do preso, diferentemente do atual Sistema Prisional Tradicional. O presente artigo tem como objetivo fazer um estudo comparativo entre o sistema tradicional e o método APAC, no que diz respeito à da efetividade da recuperação do condenado. Para realização do trabalho, utilizou-se de pesquisa bibliográfica, por meio de livros, revistas, artigos que tratam da temática em estudo. Trata-se de pesquisa qualitativa e exploratória. Os resultados obtidos através da pesquisa demonstram que a metodologia apaqueana apresenta-se como alternativa moderna e viável na recuperação dos condenados, que agindo em atuação conjunta com o Poder Judiciário no mister recuperatório, consegue fornecer ao apenado, condições para sua reintegração social, atendendo aos objetivos da Lei de Execuções Penais.

Palavras-chave: APAC. Reincidência. Recuperação. Preso.

ABSTRACT:Aiming at the humanisation of punishment, the APAC (Association for the Protection and Assistance to Convicts) method has been shown to be viable and humane for the fulfillment of the purposes of the sentence, with respect to individual rights of prisoners, unlike the current system Prison Traditional. The present article aims to make a comparative study between the traditional system and the APAC method, with respect to the effectiveness of the recovery of the convicted. For the accomplishment of the work, we used bibliographical research, through books, magazines, articles that deal with the subject under study. It is qualitative and exploratory research. Results from the survey show that apaqueana methodology is presented as modern and viable alternative in the recovery of convicts, which acting in joint action with the judiciary in recuperatório mister, can provide the convict, conditions for their social reintegration, taking into account Objectives of the Criminal Enforcement Act.

Keywords: APAC .Recidivism .Recovery.Stuck.

SUMÁRIO:Introdução. 1 Execução Penal no sistema brasileiro. 2. Considerações sobre o atual sistema prisional na ressocialização; 3. Os benefícios da humanização do sistema carcerário pelo método APAC. 4. A utilização do método APAC na recuperação dos presos. 5. Considerações finais.


INTRODUÇÃO

A criminalidade no Brasil tem tomado proporções cada vez mais assustadoras, e, nesse sentido, sempre foi motivo de diversas discussões no meio jurídico, além de alguns leigos no assunto também arriscarem opiniões, o que sempre gerou revolta, tanto por parte da sociedade como daqueles que cumprem pena nos sistemas prisionais brasileiros, sabidamente precário.

Nosso sistema prisional possui graves problemas, que impedem a real ressocialização dos presos, a superlotação das prisões, ausência de trabalho para os condenados no período da execução penal, bem como a falta de classificação e elaboração de plano individual de execução penal.

A execução penal no sistema prisional brasileiro, tema tão discutido e controverso no direito contemporâneo, possui necessidade da implementação de mudanças, uma vez que não consegue atingir o verdadeiro objetivo almejado.

O método APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenado) com seus objetivos, métodos e benefícios. Tem se revelado como alternativa viável e humanizada para o cumprimento das finalidades da pena, com respeito às garantias individuais do preso, para que a real reinserção social seja alcançada.

Além de proporcionar uma vida digna ao condenado, o método ainda apresenta grande eficiência nos seus baixos índices de reincidência.

O presente artigo busca, portanto, analisar os problemas que levam à  ineficiência do sistema prisional, mostrando o Método APAC como alternativa possível para melhorar o sistema prisional durante a execução penal, diminuindo o número de reincidências, bem como melhorar as dificuldades existentes nos estabelecimentos prisionais comuns.


1.EXECUÇÃO PENAL NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Para obter com mais clareza a realidade da execução penal do sistema prisional brasileiro, torna- se necessário realizar um apanhado geral sobre a evolução desse sistema com o passar dos anos.

A primeira tentativa de criação de um código de execução penal no Brasil ocorreu no ano de 1933, com o projeto do Código Penitenciário da Republica. No entanto, o mencionado projeto não prosperou ante a promulgação do Código Penal de 1940, do qual discrepava.

Por meio de uma comissão, formada pelo Ministro da Justiça e diversos professores, foi apresentado, em 1981, anteprojeto da Lei de Execução Penal (LEP), que foi aprovada em 1984, ano em que foi publicada a Lei 7.210/84.

Trata-se de uma lei moderna, considerada uma das melhores do mundo. A LEP prevê o reconhecimento e respeito aos direitos humanos, benefícios aos detentos, p. ex., remissão da pena pelo trabalho, plano individual de execução da pena etc. O mens legis da lei não é apenas punir, mas, também, ressocializar.

Segundo Marcão, a execução penal deve objetivar a integração o social do condenado ou do internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. O objetivo da execução é duplo: punir e humanizar. (Marcão, 2015).

O art. 1º da LEP deslinda os objetivos da execução penal[5]Avena salienta:

O art. 1º da L. 7.210/1984 estabelece os dois fins primordiais da execução penal: a efetivação do mandamento incorporado à sentença penal e a reinserção social do condenado ou do internado. Pelo primeiro, busca-se concretizar o jus puniendi do Estado, realizando-se o título executivo constituído pela sentença. Já o segundo traduz a ideia de ofertar, durante a execução, os meios necessários a que os apenados e os sujeitos a medida de segurança possam alcançar a reintegração social. (AVENA, 2013, p.43)

Mirabete, ao comentar o art. 1º da LEP, salienta que a execução penal possui dupla finalidade: reprimir e prevenir. Nessa linha de idéias, ele esclarece:

A primeira é a correta efetivação dos mandamentos existentes na sentença ou outra decisão criminal, destinados a reprimir e prevenir os delitos. O dispositivo registra formalmente o objetivo da realização penal concreta do título executivo constituídos por tais decisões. A segunda é a de proporcionar condições para harmônica integração social do condenado e do internado, baseando-se por meio da oferta de meios pelos quais os apenados e os submetidos às medidas de segurança possam participar construtivamente da comunhão social. (MIRABETE, 2006, p. 28)

Na busca dos supramencionados objetivos, o Estado deverá valer-se do apoio da comunidade, conforme preconiza o art. 4º da LEP[6]. A participação da comunidade se tornou imprescindível na execução das penas e das medidas de segurança, mormente em virtude da inoperância estatal de atender minimamente as necessidades da população carcerária.

Em sua obra, Marcão destaca a importância da participação de forças comunitárias, e cita vários exemplos: Rotary, Lions Clube, igrejas católicas e evangélicas, federações espíritas, associações comerciais e a Associação de Proteção e Assistência Carcerária (Apac) ou qualquer outra com propósitos lícitos. (Marcão. 2015, p.125)

De acordo com o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal, as execuções da pena e de medidas de segurança não são simples procedimentos administrativos, pois os diretores dos estabelecimentos prisionais não podem, livremente, tomar decisões sobre tais matérias. Porém, o entendimento doutrinário é controverso.

Acerca da natureza jurídica da LEP, Avena afirma:

Não é pacífica na doutrina a natureza jurídica da execução penal, havendo, por um lado, quem defenda seu caráter puramente administrativo e, por outro, quem sustente sua natureza eminentemente jurisdicional. Prevalece, contudo, a orientação de que a execução penal encerra atividade complexa, que se desenvolve tanto no plano administrativo como na esfera jurisdicional, sendo regulada por normas que pertencem a outros ramos do direito, especialmente o direito penal e o direito processual penal [...]. (AVENA, 2013,P.36)

O art. 10º da LEP[7]aduz que a assistência ao detento e ao internado constitui obrigação do Estado, que tem por fito prevenir o crime e orientar a volta do condenado ao convívio social.

A seu turno, o art. 11 da LEP [8]enfatiza que o Estado deve prestar ao apenado assistência material (alimentação, vestimentas, condições de higiene etc.), além de assistência jurídica, educacional, social, religiosa e à saúde. É preciso lembrar que a dignidade da pessoa humana é preservada durante a execução.

Sobre esse tema Sanches destaca que:

Garante a Constituição Federal a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva (art.5º,VII) e assistência jurídica integral e gratuita a ser prestada pelo estado aos que comprovam insuficiências de recursos (art.5ºLXXIV).

A LEP, seguindo apenas os referidos mandamentos, mas também regras internacionais sobre os direitos da pessoa presa, enumerou no art.11º as várias formas de assistência, instrumentos de reinserção social do condenado. (SANCHES, 2013, p.20)

Assim, infere-se que é nítida a preocupação com a ressocialização do condenado, visto que vários direitos lhes são garantidos.

Em uma de suas obras Nery discute o tema:

Presos e direitos humanos. Tanto quanto possível, incumbe ao Estado adotar medidas preparatórias ao retorno do condenado ao convívio social. Os valores humanos fulminam os enfoques segregacionistas. A ordem jurídica em vigor consagra o direito do preso ser transferido para local em que possua raízes, visando a indispensável assistência pelos familiares. (NERY,2006,P 164).

Com vistas a garantir o retorno do condenado ao convívio social, a LEP se vale do sistema progressivo de cumprimento da pena (art. 33, §2º, Código Penal[9]). O sistema progressivo é calcado em dois pilares: o lapso temporal, que gradualmente reduz o rigor no cumprimento da pena restritiva de liberdade; e a educação do indivíduo, que possui índole humanitária, que favorece a preparação do preso para o retorno ao convívio social.

Sobre a importância da ressocialização, muito se tem discutido, inclusive formas de alcançar sua efetividade, o que, evidentemente não se tem alcançado no atual sistema prisional. O papel da ressocialização do indivíduo apenado após a sua saída da prisão é a quimera que se pretende alcançar, veremos a importância desse estudo a diante.


2. CONSIDERAÇÕES SOBRE O ATUAL SISTEMA PRISIONAL NA RESSOCIALIZAÇÃO

Apesar de a LEP representar inegável avanço legislativo e em matéria de direitos humanos, a mesma não é adequada e efetivamente aplicada, pois o Poder Público é negligente em cumprir as disposições legais, o que funciona como obstáculo para a garantia dos direitos e deveres dos condenados.

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O sistema carcerário brasileiro é marcado pela superlotação. Sabe-se que atualmente o Brasil possui cerca de 622.202 presos, o que representa um aumento de 167% em 14 anos, sendo a 4ª maior massa carcerária do mundo. São os dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, divulgado em26 de abril de 2016 pelo Ministério da Justiça. O déficit de vagas chega a alcançar a absurda quantidade 200 mil, segundo o mesmo levantamento.

Além das estatísticas alarmantes, outra constatação que assusta é a maneira como os condenados são submetidos a condições desumanas, a título de exemplo podemos citar a insalubridade das celas, e, além disso, não são ofertadas oportunidades de trabalho em quantidades suficientes e em condições adequadas. A negligência estatal militar em desfavor da individualização da pena, e, consequentemente, em desfavor da reinserção social. Toda a sociedade perde com tais atitudes.

Sobre a pena privativa de liberdade Mirabete assevera que:

A ressocialização não pode ser conseguida numa instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciárias, tendem a converter-se num microcosmo no qual se reproduzem e se agravam as grandes contradições que existem no sistema social exterior [...] A pena privativa de liberdade não ressocializa, ao contrário, estigmatiza o recluso, impedindo sua plena reincorporação ao meio social. A prisão não cumpre a sua função ressocializadora. Serve como instrumento para a manutenção da estrutura social de dominação. (MIRABETE, 2002, p.24)

Lamentavelmente, a aplicação da LEP não se dá de maneira minimamente satisfatória. A execução penal é infirmada de várias formas: aspectos de ordem material (estrutura das celas, condições de salubridade etc.); falta de políticas carcerárias sérias; despreparo dos profissionais do sistema prisional etc.

Na atual realidade carcerária, os detentos ficam sem nenhuma atividade de ocupação, sem oportunidade de praticar atividades laborais, principalmente em razão do descaso estatal. O mencionado fator impede, de forma substancial, a possível ressocialização daqueles que estão privados de sua liberdade. O egresso do sistema prisional, além do rótulo de ex-presidiário, não possui educação secular e nem experiência profissional para buscar um posto no mercado de trabalho, o que muitas vezes força a volta para o mundo do crime.

Nesse sentido, Falconi[10]assevera:

Vê-se a cruzeta como que o estado trata seus encarcerado. Se cumprir parte da norma jurídica tudo bem. Afinal nós somos ferrenhos apologistas da laborterapia. O risco está em não se dar ocupação ao preso e, ao final mata-lo de inanição. Não se pode esquecer, jamais, que vivemos na doente América Latina, onde os detentores do poder são, em grande parte vingativos, carrascos e desumanos. Somente lembram os “Direitos Humanos” quando os destinatários são eles próprios. A história está aí, vive e atual.

Sobre a ressocialização, Greco afirma:

Parece-nos que a sociedade não concorda, infelizmente, pelo menos à primeira vista, com a ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, o impede de retornar ao normal convívio em sociedade.

A população carcerária brasileira cresce em progressão geométrica, enquanto que as vagas no sistema prisional crescem aritmeticamente. A superlotação é altamente desfavorável no processo de reeducação do indivíduo privado de sua liberdade. As cadeias brasileiras são verdadeiras masmorras.

Nesse sentido, Rolin salienta:

O Brasil como a maioria dos países latino-americanos, assiste imobilizado ao desenvolvimento de uma crise crônica em seu sistema penitenciário. Especialmente nesta última década, os indicadores disponíveis a respeito da vida nas prisões brasileiras demonstram de maneira inconteste um agravamento extraordinário de problemas já muito antigos como a superlotação carcerária, a escalada de violência entre os internos, as práticas de abusos, maus-tratos e torturas sobre eles, a inexistência de garantias mínimas aos condenados e o desrespeito sistemático e institucional à legislação ordinária e aos princípios dos direitos humanos.”

Por falta de classificação dos condenados e elaboração de planos individuais de execução da penal, apenas o caráter punitivo da pena é cumprido. Já a função ressocializadora é colocada em xeque, o que contribui para os elevados índices de reincidência. O Estado brasileiro é inflado do ponto de vista legislativo, com várias leis modernas, mas sem estrutura e boa vontade para executá-las.

Acerca da individualização da pena Mirabete assevera que:

É norma constitucional, do Direito brasileiro, que a lei regulará a individualização da pena. A individualização é uma das chamadas garantias repressivas, constituindo postulado básico de justiça. Pode ser ela determinada no plano do legislativo, quando se estabelecem e se disciplinam as sanções cabíveis nas várias espécies delituosas, no plano judicial, consagrada no emprego do prudente arbítrio e discrição do juiz, e no momento executório, processada no período do cumprimento da pena que abrange medidas judiciais e administrativas , ligadas ao regime penitenciário, à suspensão da pena, ao livramento condicional etc.

A individualização da pena encontra respaldo constitucional e legal. A individualização da pena é direito fundamental do condenado. No entanto, o que se vê é o Estado dispondo livremente do aludido direito. A individualização deve levar em consideração os antecedentes e a personalidade do condenado (art. 5º, LEP).

Nos termos da LEP, o condenado deve ser recolhido em cela individual, que deverá conter dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Além disso, deve atender condições de salubridade e ter área mínima de 6 (seis) metros quadrados. Na prática, tais exigências legais são flagrantemente violadas.

Portanto, na atual realidade do sistema penitenciário brasileiro a função ressossializadora da pena não é atingida, tendo em vista o descaso estatal para com os condenados e seus direitos. A seguir será analisado o método APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), que se apresenta atualmente como opção para o cumprimento das finalidades da pena, de maneira adequada e humanizada.

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Sobre os autores
Willian Prates

Acadêmico do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

Isa Nunes e Evaristo

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

América Gabriel O. Carvalho Lauro

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

Eustáquio Tadeu Nogueira

Bacharelando em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros.

Cynara Silde Mesquita Veloso

Professora da Unimontes. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Doutora pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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