A conciliação como método alternativo de resolução de conflitos

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Este artigo faz um breve estudo sobre um método alternativo de resolução de conflitos, a conciliação.

1.      INTRODUÇÃO

O objeto desse presente trabalho é analisar um dos mecanismos alternativos de tratamento dos conflitos, a conciliação em seus diversos aspectos, como alternativa do judiciário, contribuindo para a eficácia no atendimento dos interesses de grupos e indivíduos. Para tanto, abordando as justificativas de seu modelo ideológico e seu confronto com a prática. Partindo desses pressupostos, tentaremos entender algumas problemáticas que podem surgir a respeito deste processo que está em tanto vigor no Brasil.

 

2.      CONCILIAÇÃO E SEU CONTEXTO

Em uma perspectiva preliminar, a conciliação é um dos mecanismos que permite ao poder judiciário propor uma nova forma de solucionar os conflitos que surgem na sociedade, saindo da formalidade comum ao judiciário, com a figura de um juiz e todo aparato do Estado, para que as partes possam dispor de mais liberdade no tratamento dos seus litígios, dentro dos limites que a lei dispõe.

A definição que o site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos oferece a cerca da conciliação é a seguinte:

É um meio alternativo de resolução de conflitos em que as partes confiam a uma terceira pessoa (neutra), o conciliador, a função de aproximá-las e orientá-las na construção de um acordo. O conciliador é uma pessoa da sociedade que atua, de forma voluntária e após treinamento específico, como facilitador do acordo entre os envolvidos, criando um contexto propício ao entendimento mútuo, à aproximação de interesses e à harmonização das relações.

A partir dessa breve definição, é interessante, para um melhor entendimento do tema, expô-lo no contexto em que aparece dentro da sociedade e do judiciário. Assim, torna-se desde já importante ressaltar a advertência que Rocha (2009) faz ao apresentar o problema de abordar os meios de tratamento de conflitos dentro de uma perspectiva histórico-linear, como se, por exemplo, tivéssemos um período inicial em que se caracterizaria a barbárie, com predomínio da autotutela, autocomposição, e posteriormente um período no qual teríamos um estágio mais elevado de civilização, como no aparecimento da jurisdição. Essa forma de tratar o problema, segundo ele, é ideológica. Na verdade, podemos notar que a história é permeada pela contradição, não seguindo um “princípio de justiça”, absoluto ou algo parecido, mas a razões diversas. Tendo em vista isso, podemos dar início à exposição.

A busca desses meios alternativos, segundo o conciliador Alberto Dias de Souza, já possui seu gérmen, por exemplo, em alguns estudiosos que visualizaram a composição do Estado, como Hobbes, Rousseau, Locke, Habermas, entre outros, em especial dentro constitucionalismo, em que albergaram a questão da compreensão dos fenômenos do Estado que dizem respeito à resolução de conflitos. Hodiernamente, toda resolução de conflito é constitucionalizada, ou seja, é enxergada sob uma perspectiva constitucional. Mas, quando nós estudamos a teoria do processo, descobre-se que há mecanismos de resolução dos conflitos diferentes da jurisdição, que são a autotutela e a autocomposição. Na autotutela, temos uma situação na qual o indivíduo busca se defender imediatamente, quando não pode esperar a intervenção do Estado em sua causa, poderia, por exemplo, caracterizar uma situação de legítima defesa; a autocomposição, por sua vez, é quando existe um problema evidente entre indivíduos e eles buscam resolvê-lo entre si, não necessitando a substituição pelo judiciário.

A lógica seguida, e isso é uma característica sociológica do povo brasileiro, em geral, da sociedade ocidental, é que somos belicosos.  Por qualquer problema, recorremos logo ao judiciário. O judiciário é o superego da sociedade. Superego é a parte do inconsciente na qual estaria o nosso senso de moralidade, certo ou errado, nessa dimensão da psique. O superego da sociedade, segundo o próprio conciliador Souza, seria um irmão mais velho, a quem poderíamos recorrer quando não estivéssemos em condição de resolver os nossos problemas. Com a conciliação, que é aquele momento de resolução que já tem um albergue da justiça, uma proteção do judiciário, as partes têm a possibilidade de conversarem e resolverem a sua situação de vida, os pontos que estão lhes causando problemas, sofrimentos. Isso sem a interposição de um terceiro, notadamente o juiz, que substituiria a vontade das partes e aplicaria uma solução de caráter impositiva. Então, a conciliação surge nesse espírito diferenciado, de incentivar as pessoas a comporem sua lide, a comporem os seus conflitos de forma amigável.

A conciliação latu sensu, portanto, é um movimento muito antigo. O conciliador Souza nos lembra que sempre se buscou, diante do judiciário brasileiro, uma forma alternativa de resolução dos conflitos, pois não somente a jurisdição é capaz de resolver os conflitos.

No Brasil, a Conciliação já pode ser identificada como formalidade de importante relevância para as Ordenações do Reino, que no art. 161 da 1ª Constituição Imperial proclamava: “Sem se fazer constar que se tem intentado o meio da reconciliação não se começará processo algum”. Posteriormente, contudo, é possível observar momentos em que a conciliação esteve menos presente e outros, mais. Na segunda metade do século XIX, por exemplo, a conciliação começou a ser banida, sendo esquecida pelo Código de Processo Civil de 1939. Sé com o Código de Processo Civil de 1974 que se ressuscitou a conciliação, ganhando ainda mais relevância com o novo Código de Processo Civil, de 2015, que objetiva a promoção da conciliação em qualquer fase do processo.

A volta da conciliação ao ordenamento jurídico brasileiro pode ser considerada por inúmeros motivos. Podemos citar alguns dos motivos apontados por Rocha (2009), que são, entre outros: sobrecarga dos tribunais; maior rapidez na solução dos litígios; maior harmonia; concepções político-ideológicas, almejando a maior autonomia dos indivíduos.

Hoje no Brasil a conciliação está prevista nos Juizados de Pequenas Causas – Lei 7244\84; nos Juizados Especiais - Lei 9099/95; Instituto da Arbitragem – Lei 9307/96; Juízes de Paz – Lei Complementar 59, de 18/01/2001; CPC atual, que prega que o Juiz deve tentar a conciliação a qualquer tempo; Juizados de Conciliação – Resolução 460/2005( Revogou a Resolução 400/200)- havendo 66 Juizados de conciliação em BH e 238 no interior, somando um total de 304 juizados de conciliação no estado de Minas Gerais; Centrais de Conciliação de Varas de Família – Resolução 407/2003.

Algumas dessas mudanças já referidas podem ser entendidas melhor com a seguinte explicação. Em um âmbito global, Ivan Alemão e José Luiz Soares (2009) contextualizam o cume da busca por resoluções alternativas de conflitos no momento após as guerras do séc. XX, em que ocorre a multiplicação dos direitos do homem. O Estado, a partir desse momento, aprecia a individualidade dos sujeitos de direito, considerando-os em toda sua diversificação, ou seja, mulher, homem, idoso, doente; não estariam para o Estado apenas como um ente genérico, desprovidos de particularidades. Ressalta-se também a extensão desse conceito para sujeitos diversos ao homem, como família, grupos sociais, etc., que foram “individualizados”. Começava a existir, portanto, uma maior possibilidade de o Estado atuar consonante à realidade social em sua complexidade. Essas mudanças, no entanto, trouxeram consigo novos dilemas aos sistemas jurídicos modernos, como a capacidade de processar as crescentes demandas que lhes eram solicitadas, como se faria para viabilizar a recorrência de grupos e indivíduos até então impossibilitados na busca de seus direitos por meio do judiciário, entre outras questões.  É em torno desses dilemas acerca da execução dos direitos, das leis, das sentenças judiciais, que surge o apogeu da busca por novas formas de resolução dos conflitos, como a conciliação, na tentativa de se adequar à nova ambientação.

Legalmente, depois de 1973, que o surgimento do código de processo civil de então, o instinto da conciliação foi se ampliando. Na década de 90 começou-se a falar de arbitragem e medição. Em 1997, sobreveio a lei da arbitragem. Na conciliação judicial, o conciliador apresenta as alternativas às pessoas, mas são elas que decidem o que querem. Depois de 1973, houve um incentivo pelo judiciário brasileiro à tentativa de conciliação. Depois da lei 9099/95 houve a institucionalização da conciliação no âmbito dos juizados especiais. Os juizados especiais são elementos fracionados do judiciário brasileiro, são partes integrantes do judiciário brasileiro, e eles servem para o julgamento de causas de menor complexidade. Não são as pequenas causas, vale ressaltar: são as causas de menor complexidade. A dimensão do que venha a ser uma causa pequena não é unânime, mas uma causa menos complexa já tem um amparo maior, já se entendo melhor o que seja ou não. Pode-se dizer que, se um agricultor tem duas vacas; se ele vende uma dessas vacas, vende metade do patrimônio dele. Se o comprador não paga, ele teve prejudicado a metade de seu patrimônio. Enquanto para nós é uma simples compra-e-venda, inadimplemento contratual, mas para ele não é algo pequeno, desesperador. No âmbito dos juizados especiais, as causas de menor complexidade são julgadas. Não é somente aí que existe uma possibilidade de resolução com um amparo do Estado na mediadas de conciliação, existe, na CF, no art. 96, que fala da criação da Justiça de Paz, que é um sujeito que, eleito para comunidade, para auxiliar as pequenas disputar sem o auxílio do judiciário, mas com poder do estado. Celebra casamentos e tal. A Justiça de Paz ainda não foi efetivada, mesmo com 24 anos de vigência da cont. de 88. A conciliação, então, foi surgindo nesses momentos em uma tentativa do judiciário ofertar às partes, antes da instrução processual, uma possibilidade de comporem, de resolverem seus conflitos sem uma substituição através da decisão judicial, que pode nem sempre ser o melhor caminho, pois alguém pode sair insatisfeito, podendo aderir a recursos, protelando o corrimento do processo. Assim sendo, são muitas etapas podem ser evitadas no momento em que se busca a conciliação.

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O CNJ difundiu a campanha de que, na conciliação, pudesse existir uma relação que ilustrou como “vencer x vencer”, ou seja,em que todas as partes sairiam ganhando, ao contrário do processo comum, em que sempre uma parte sairia perdendo. Esse fato se daria por conta das partes entrarem em um acordo no qual fariam concessões mútuas.

No entanto, como sugere Laura Nader, esse tipo de resolução alternativa daria espaço para o confronto de indivíduos desiguais, gerando uma relação em que um dos indivíduos envolvidos pode se submeter a um acordo desfavorável. Nenhum de nossos sistemas jurídicos modernos é imune à crítica. Só existiria uma harmonia verdadeira se o acordo satisfizesse todos os envolvidos e não somente desse fim ao litígio, rapidez ao processo, pois esses erros podem acarretar em até mesmo um ato fraudulento.   

É importante verificar casos em que alguns funcionários não tiveram seus direitos plenamente efetivados. Há exemplos, nesse contexto, de grandes empresas que, devendo indenização aos seus funcionários, isentaram-se de parte dessa obrigação por meio da conciliação.

3.      A CONCILIAÇÃO NA PRÁTICA

É de fundamental importância para que o processo de conciliação seja de qualidade, que o conciliador faça o uso de técnica, que atue em ambiente adequado, que se relacione bem com as partes envolvidas e que atente para o fato de que os acordos não violem direitos ou valores éticos. Possuir o conhecimento das técnicas de conciliação e usá-las corretamente possibilita o conciliador a ter mais facilidade, firmeza e segurança ao conduzir sessão – isso, contudo, é adquirido com a prática.

Na sessão, o conciliador dá oportunidade para que os participantes exponham o motivo de estarem ali, o que os levaram a procurar o órgão. Nesse momento o conciliador escuta as versões dos fatos ocorridos. Às vezes, necessitando intervir para que as partes não se exaltem, devido à carga emocional. Após ouvir, ele expõe a sua interpretação dos fatos, tentando entender o que ocorreu. Aqui difere da mediação, na qual a terceira pessoa (o mediador) precisa ter conhecimento específico do assunto a ser discutido, por exemplo: numa discórdia entre dois vendedores de automóveis, geralmente pede-se que o mediador seja alguém que possua conhecimento desse ramo; já na conciliação o mediador não precisa ter conhecimento específico de determinados assuntos. A ele são apresentados vários tipos de causa e, com a análise disso, ele busca mostrar uma forma que os dois entrem em consenso, expondo vantagens e desvantagens, sempre tentando chegar a uma solução harmônica para ambos. Se as duas partes estiverem de acordo com o proposto, é concluída a sessão, porém, se ao menos uma não concordar, e não havendo a possibilidade de acordo, o conciliador encerra a sessão conciliatória e encaminha o processo ao juiz da vara em questão. Há também a possibilidade de uma das partes não comparecer à sessão, impossibilitando que o conciliador possa dar início ao processo. Sendo necessário que as duas partes estejam presentes, portanto, o processo torna-se inviável, como no caso referido. Quando as sessões são impossibilitadas de se iniciarem ou se concluírem o caso é enviado ao juiz que levará em consideração a versão e as provas apresentadas por quem compareceu, que na maioria dos casos é o indivíduo promovente, naturalmente sentenciando a favor deste; já no caso da ausência de ambas as partes o caso será extinto.

Sendo assim, pode-se concluir que existem casos nos quais os processos de conciliação podem ser impedidos de serem iniciados ou de chegarem a uma conclusão. São exemplos disso: a ausência de uma das partes em sua representação, ou até mesmo nenhuma delas, e a não concordância de ambas as partes no que for proposto para solucionar o caso. Nesses casos o processo é encaminhado para o juiz de competência, exceto no caso da ausência de todas as partes envolvidas das partes.

4.      CONCLUSÃO

Conclui-se, com este trabalho, que a conciliação, mais que um meio para desobstruir o judiciário, é um meio benéfico às partes, pois elas têm a chance de evitar um processo desgastante, diminuindo os custos processuais e evitando desgaste emocional, segundo o próprio CNJ. É uma forma célere, ou seja, mais rápida, e assim evita a incerteza do término do processo e/ou mais problemas advindos do processo comum. Portanto, os impactos sociais são em sua grande maioria, positivos.

 

 

REFERÊNCIAS

ALEMÃO, Ivan & SOARES, José Luiz. Conciliação é Legal?. 2009. Disponível em: < site >. Acesso em 05/12/12.

NADER, Laura. Harmonia coerciva: a economia política dos modelos jurídicos. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, outubro de 1994, nº 26, 18-29. Disponível em: <http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_26/rbcs26_02.htm>. Acesso em 05/12/12.

PORTO, Ana Paula Girão. Juizados Especiais Cíveis – O Papel do Conciliador. , Fortaleza, 2008. Disponível em: <http://bdjur.tjce.jus.br/jspui/bitstream/123456789/259/1/Monografia_Ana_Paulo_Girão_Porto.pdf >. Acesso em 28/11/12.

Movimento pela Conciliação, Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Conciliar- O que é conciliação?.Disponível em: <http://www.conciliar.cnj.gov.br/conciliar/pages/conciliacao/Conciliacao.jsp.> Acesso: 03 de dezembro de 2012.

Constituição Política do Império do Brasil, de 25/03/1824. Constituição Política do Império do Brasil, elaborada por um Conselho de Estado e outorgada pelo Imperador D. Pedro I, em 25.03.1824.

 

ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. Atlas - 10ª Ed. 2009

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Sobre os autores
José Otavio Vasconcelos Lendengue da Costa

Estudante de Direito da Faculdade Luciano Feijão

Augusto José Linhares de Carvalho

Estudante de Direito da Faculdade Luciano Feijão

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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