Assédio moral no ambiente de trabalho

Exibindo página 3 de 7
30/05/2017 às 12:35
Leia nesta página:

CAPÍTULO 4 - ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO

Atualmente vivenciamos uma grande crise mundial, que se desenvolve no ambiente de trabalho, relacionada ao assédio moral.

Muitas vezes, a situação de assediar é desconhecida ou subestimada no ambiente de trabalho, ao passo que outras vezes esta é estimulada, aceita e ou desconsiderada como se nada estivesse acontecendo. Tal situação se dá por um comportamento que pode ser individual ou coletivo, em grupos, comportamento este que subjuga uma pessoa predeterminada ou um grupo de pessoas e que pode ocorrer por diversos motivos, sendo os mais comuns: a discriminação, a inveja, o ciúme, a rivalidade, o medo de ser atacado, normas institucionais, entre outros.

O objeto do nosso estudo – o assédio moral – ocorre em várias empresas e em diversas culturas, a diferença preponderante na abordagem do tema entre os países é basicamente o nome. No entanto, o assunto é um só e em todas as culturas o assédio moral pode gerar graves consequências para o trabalhador, tanto na sua qualidade de vida, quanto à sua saúde, o que certamente implicaria em perdas para as empresas, bem como para a sociedade.

Para entendermos o conceito de assédio moral no ambiente de trabalho fomos, primeiramente, buscar nos dicionários o significado do verbo assediar, qual seja: o ato de cercar determinado espaço territorial para exercer domínio. Ora nos parece notório que a acepção do verbo assediar caracteriza uma perseguição.

Levando este conceito para o ambiente de trabalho chegamos à conclusão de que o assédio moral nada mais é do que uma perseguição imposta à determinada pessoa dentro deste ambiente. Perseguição esta que a doutrina majoritária classifica como sendo um terrorismo psicológico no ambiente de trabalho.

Contudo, existe outra parte da doutrina que classifica o assédio moral como sendo um molestamento ou ainda intimidação. No entanto, independentemente das designações dadas ao assédio moral, o objeto dos estudos é um só e com resultados graves.

O assédio moral se desenvolve por maus tratos e humilhações que são praticados desde os primórdios da relação trabalhista e, atualmente, acompanha o mercado globalizado de uma maneira mais intensa, haja vista que a globalização propicia o florescimento da prática de Assédio Moral.

Dentre os estudos sobre o assédio moral, destacamos a nossa interpretação do estudo pioneiro feito por LEYMANN: é uma agressão moral ou psicológica que ocorre de forma sutil, em alguns casos de maneira dissimulada, por uma pessoa ou grupo de pessoas que intencionalmente e pretendem desestabilizar, abalar, destruir a vítima escolhida.  

Destacamos ainda, a nossa interpretação do estudo feito pela Dra. Margarida Barreto, por ser a pioneira no Brasil: as empresas e/ou os gestores utilizam práticas que caracterizam assédio para forçar um funcionário a pedir demissão e assim se livrarem da pessoa indesejada, sendo certo que estas ações afetam a saúde física e/ou mental da vítima e podem ocasionar a morte.

Estas e outras conceituações, resumem-se na exposição dos trabalhadores a situações de pleno constrangimento e humilhação, as quais se desenvolvem de maneira periódica e prolongada dentro do seu ambiente de trabalho e durante o exercício de sua função.

Tal situação abala psicologicamente a vítima de tal maneira que a atitude negativa e antiética do agente causador do assédio moral, ao modificar o ambiente de trabalho leva a vítima a desistir do emprego.

Muitos autores tentam definir o assédio moral.

Para Marcelo Rodrigues Prata:

O assédio moral no trabalho se caracteriza por qualquer tipo de atitude hostil, individual ou coletiva, dirigida contra o trabalhador por seu superior hierárquico (ou cliente do qual dependa economicamente), por colega do mesmo nível, subalterno ou por terceiro relacionado com a empregadora que provoque uma degradação da atmosfera de trabalho, capaz de ofender a sua dignidade ou de causar-lhe danos físicos ou psicológicos, bem como de induzi-lo a prática de atitudes contrárias à própria ética, que possam excluí-lo ou prejudicá-lo no progresso em sua carreira.[26]

João Luis Vieira Teixeira destaca que para que fique caracterizado o assédio moral é imprescindível que haja intencionalidade por parte do autor, vejamos sua definição:

Jamais o assédio se configurará sem que o assediador tenha plena consciência de seus atos. Ele até poderá desconhecer algumas das suas consequências (ou todas elas), mas nunca ignorar que sua conduta é irregular e, talvez em um futuro próximo, até mesmo criminosa.[27]

Marie-France Hirigoyen entende que o assédio moral se caracteriza por qualquer conduta abusiva:

o assédio moral no trabalho é definido como qualquer conduta abusiva (gesto, palavras, comportamento, atitude...) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando o seu emprego ou degradando o clima de trabalho.[28]

A Juíza do Trabalho Márcia Novais Guedes defende a ideia de que existe diferença na ocorrência do assédio moral quando comparado o universo masculino e o feminino, isso por conta da influência dos elementos culturais que envolvem os homens e as mulheres.

As mulheres, no Brasil, ainda são consideradas frágeis, e muitas vezes esse pensamento parte da própria mulher, o que proporciona a ocorrência do assédio por brincadeiras de mau-gosto, comentários maldosos sobre a aparência, intimidação, entre outros.

Ao passo que, o Homem é tido como forte, corajoso, chefe de família, então, o assédio geralmente ocorre por meio de ofensas a masculinidade, qualificação profissional, aptidão para o trabalho, questionamento duvidoso sobre a manutenção da família.

Estas definições nos levam a conclusão de que o assédio moral, visto sob uma ótica simplificada, nada mais é do que: a pressão exercida por uma ou mais pessoas sobre outra pessoa, onde esta última acaba ocupando uma posição desprotegida e excluída com relação ao restante do grupo, dentro do seu ambiente de trabalho, o que, por consequência, constitui um risco para a saúde e segurança no trabalho.

Vale lembrar que, apesar de todo nosso esforço para deixar claro que más condutas por parte de superiores e até mesmo de colegas no ambiente de trabalho podem caracterizar o assédio moral, nem toda má conduta o caracteriza, pois pode haver situações de competitividade em que o conflito gerado leve a calorosas discussões, porém, tais discussões estarão sempre focadas em conteúdo e nunca em valores pessoais.

Desta forma quando o conflito gerado se restringir ao campo do conteúdo não alcançando os valores pessoais dos envolvidos, ainda que seja desenvolvido um grande nível de estresse em uma ou em ambas as partes, haja injurias, agressões pontuais, imposições funcionais, entre outras formas. Estaremos diante de uma situação de conflitos e não de assédio moral.

Assim o problema deverá se resolvido sob outro ponto de vista que não o do assédio moral.   

Por fim, não podemos deixar de citar que o assédio moral por ser um ato repetitivo e intencional se dá por dolo. De tal forma que o ato doloso por parte do agente é componente essencial do assédio moral, sem o qual não a que se falar em assédio moral, já que estaria afastada a intencionalidade do agente e assim descaracterizado o assédio.

 4.1 Espécies de assédio moral no ambiente de trabalho:

É pacífico na doutrina atual que o assédio vertical é a espécie de assédio que requer maior atenção, para o Direito do trabalho, pois esta espécie refere-se ao domínio exercido pelo superior sobre o subordinado, o que obviamente pode acontecer com maior facilidade dentro de um ambiente de trabalho.     

Contudo, a espécie supramencionada não é a única, existem outras que também devem ser objeto de atenção para o direito do trabalho.

Atualmente as empresas, por vezes, agem de maneira omissiva ou até mesmo encorajadora frente a uma situação de assédio horizontal ou contra superiores, isto porque estas querem estimular a competitividade e em consequência obterem maior lucro. No entanto, esta posição adotada pelas empresas influencia direta e negativamente nas relações e no ambiente de trabalho.

De acordo com Jorge L. O. Silva o assédio moral horizontal por aderência ocorre:

porque algumas pessoas vislumbram, numa aderência ao assediador, a possibilidade de angariar pontos positivos no trabalho ou a oportunidade de ser ‘solidário’ ao chefe. Quando esta aderência é verificada, a rotina do assediado fica insuportável, sendo os danos, geralmente, de maior monta, tanto no que se refere ao caráter psíquico, quanto no que se refere ao contexto patrimonial”. O horizontal propriamente dito, “consiste na prática do assédio moral diretamente por parte dos colegas de trabalho, sem que haja um impulsionador concreto por parte da chefia. Neste caso, a empresa passará a figurar como corresponsável pelos danos causados pelo assédio moral.[29]

Jorge L. O. Silva ainda classifica como terceira espécie o assédio moral ascendente, “onde o subordinado detém conhecimentos, relevantes, relacionados ao processo de trabalho e os utiliza como instrumento para protagonizar um sistema de terror psicológico, destinado a descompensar e desestabilizar a chefia” (JORGE L. O. SILVA, 2005. p 4)

 Existe ainda, a espécie mista de Assédio Moral, que é classificada pelos estudiosos do assunto, como sendo àquela em que a vítima, de uma só vez, sofre a pressão do assediador vertical e horizontal. 

O importante para caracterização do assédio moral, não é o nível hierárquico do assediador ou assediado, mas a conduta adotada: a prática de situações humilhantes no ambiente de trabalho, de forma repetida.

Em resumo, podemos dizer que atualmente existem quatro espécies de assédio moral, para o direito do trabalho, quais sejam: 

4.1.1    Vertical

No assédio moral descendente a violência parte do superior para com o subordinado (do chefe para o empregado), o estado de subordinação existente na relação de trabalho proporciona a ocorrência deste tipo de conduta, não é determinante que o superior tenha poder de direção sob o subordinado assediado, basta que haja divisão hierárquica na estrutura organizacional e que o assediador esteja acima do assediado nesta estrutura.

Alkimin, descreve esta modalidade como:

[...] os detentores do poder – empregador ou superior hierárquico – visando uma organização do trabalho produtiva e lucrativa, acabam por incidir no abuso de poder, adotando posturas utilitaristas e manipuladoras através da gestão sob pressão (onde se exige horários variados e prolongados, diversificação de função, cumprimento a todo custo de metas etc.). Notadamente o superior hierárquico, que se vale de uma relação de domínio, cobranças e autoritarismo por insegurança e medo de perder a posição de poder, desestabilizando o ambiente de trabalho pela intimidação, insegurança e medo generalizado, afetando o psiquismo do empregado, e, consequentemente sua saúde mental e física, [...]. Assim, os detentores do poder se valem de manobras perversas, de forma silenciosa, visando excluir do ambiente aquele que representa para si uma ameaça ou para a própria organização do trabalho [...].[30]

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Esta modalidade é cada vez mais comum no mundo atual e se agrava com a presença de crise econômica, seguida de grande índice de desemprego, como o cenário vivido hoje no Brasil.

Isso ocorre porque os trabalhadores têm medo de perderem os seus empregos e conseguirem se recolocar no mercado de trabalho com a velocidade necessária para evitar que eles próprios e/ou suas famílias sejam expostas a necessidades financeiras, então, como consequência, muitos trabalhadores acabam se sujeitando a situações de assédio e os assediadores muitas vezes têm consciência do problema sócio econômico, bem como, das necessidades do assediado e se aproveita deste cenário para cometer o ato de assédio.

As empresas, por sua vez, muitas vezes, aceitam este tipo de condução/gestão, corroborando os abusos cometidos pelos gestores ou simplesmente fingindo que não sabem o que está acontecendo, isso porque, entendem que o resultado alcançado é satisfatório, pois conseguem atingir metas ou em alguns casos conseguem forçar um funcionário indesejado a pedir demissão, aliviando a indenização rescisória por parte da empresa, além isso, de outro lado não sofrem consequências adequadas, suficientes, para conscientiza-las de que aquele modelo de gestão é prejudicial para toda sociedade.

Outra hipótese é a de que o chefe pode cometer o assédio por puro abuso de poder, por vingança, ou para mostrar o poder que possui, ou para não perder o controle da equipe, ou por qualquer outro motivo.

Em qualquer um dos casos o assediador pode agir diretamente contra o assediado ou utilizar um ou mais integrantes da equipe, os quais por medo, vontade de acompanhar a opinião do chefe, ou simplesmente por que estão sendo manipulados, passam a atacar a vítima assediada.

4.1.2    Horizontal

Esta modalidade é praticada entre “pares” colegas do mesmo nível, inexistindo diferença de nível hierárquico entre o assediado e o(s) assediador(es).

Os motivos mais comuns são: discriminação sexual; intolerância religiosa; discordância de opinião política; concorrência por uma promoção, etc.

Com exceção da concorrência por uma promoção, os demais motivos são velhos conhecidos da maior parte da população que frequentou um ambiente escolar, pois, é muito comum neste ambiente este tipo de assédio entre as crianças e adolescentes.

O fato é que no ambiente de trabalho esta modalidade de assédio tem um peso maior, sem querer menosprezar a importância e o valor, que certamente tem o estudo do assédio moral no ambiente escolar e os profissionais das diversas áreas que estudam esta modalidade de assédio.

Mas, quando falamos do ambiente de trabalho estamos falando de pais de família, mães de família, filhos que são arrimos de família, é dependem daquele emprego para sustentar seus filhos, irmãos, pais, com o mínimo de dignidade e isso tudo somado aos demais problemas da vida adulta, o que acaba causando danos para o assediado, para a família, para o Governo, para toda sociedade.

Vejamos o que diz Marie-France Hirigoyen:

Essa espécie de assédio lembra muito a figura do Bullying (no Brasil usado também como sinônimo de Assédio Moral). À princípio, esse instituto, muito utilizado na Inglaterra, foi criado para caracterizar o comportamento hostil e humilhante de uma criança ou grupo de crianças, em relação à outra ou outras. E sabe-se que entre crianças é muito comum este tipo de comportamento. Não existe uma hierarquia entre elas, mas pode ocorrer a agressão como forma de exclusão por motivos muitas vezes de características pessoais ou de personalidade. Este instituto, segundo Marie-France Hirigoyen, se estendeu às agressões observadas no exército, nas atividades esportivas, na vida familiar - em particular com relação a pessoas de idade, e, evidentemente, no mundo do trabalho.[31]

Algumas empresas, direta ou indiretamente permitem a ocorrência de uma situação de assédio horizontal, geralmente porque acreditam que a pressão, concorrência, fiscalização, mesmo entre pares pode gerar aumento da produtividade. 

4.1.3    Ascendente

Esta espécie de Assédio Moral é praticada pelo subordinado em relação ao seu chefe, no entanto, é de difícil ocorrência, pois tanto o poder diretivo e disciplinar quanto a precariedade da relação de emprego contribuem para que esta modalidade de Assédio não aconteça.

Apesar de ser mais difícil a ocorrência desta modalidade de assédio, ela também existe e acontece no ambiente de trabalho, como exemplo, podemos imaginar que determinado funcionário (um estagiário ou uma secretária) que tenha acesso a informações sobre seu superior hierárquico, tente se beneficiar das informações que possui pedindo ou exigindo do seu superior determinados privilégios, em outras palavras assediando o seu superior hierárquico, com a ameaça de divulgar informações confidenciais.

Outro exemplo seria a união intencional ou não de um grupo de funcionários para retirar/excluir um superior hierárquico que não agrada os funcionários de maneira geral ou que foi recém promovido, ou ainda que tenha vindo de uma outra empresa por conta de uma fusão, os motivos são “N” e podem ser os mais variados.

Marie-France Hirigoyen descreve bem esta situação:

É a cumplicidade de todo um grupo para se livrar de um superior hierárquico que lhe foi imposto e que não é aceito. É o que acontece com frequência na fusão ou compra de um grupo industrial por outro. Faz-se um acordo relacionado à direção para ‘misturar’ os executivos vindos de diferentes empresas, e a distribuição dos cargos é feita unicamente por critérios políticos ou estratégicos, sem qualquer consulta aos funcionários. Estes, de um modo puramente instintivo, então se unem para se livrar do intruso.[32] 

4.1.4    Mista

A modalidade “mista” requer a presença do assediador vertical, do assediador horizontal e do assediado, ou seja, o assediado sofrerá pressão por parte dos pares/colegas de trabalho e do superior hierárquico ao mesmo tempo.

É comum que um determinado trabalhador que sofre assédio moral de seu superior hierárquico, com o tempo passe a suportar assédio moral por parte de determinados colegas de trabalho.

Isso ocorre porque estes pares do assediado têm medo de sofre pressão do superior hierárquico então começam a segui-lo no assédio contra aquele determinado colaborador ou simplesmente porque estes pares do assediado querem ocupar posição próxima a do superior hierárquico e para tanto agem de maneira similar e o acompanham nos atos de assédio moral.

Uma característica marcante desta modalidade é a força da sua agressividade, o impacto sobre a vítima e a velocidade do resultado, isso porque o assediado é atacado por seu superior hierárquico e pares ao mesmo tempo, tendo que suportar os atos de assédio e seus reflexos a todo momento e sem ter qualquer rota de fuga ou chance de recuperação, o que culmina com a queda do assediado muito mais rápido que as outras modalidades de assédio.

4.2  Caracterização 

Apesar do assédio moral ser um tema muito presente no ambiente de trabalho, ainda não existe uma definição padrão sobre o assunto, uma regra única e/ou balizadora para tratar de maneira igual os diversos conflitos envolvendo este assunto. Temos diversas definições sobre o assédio moral: doutrina, leis Estaduais/Municipais e Jurisprudências.

A professora Sônia Mascaro Nascimento faz uma boa reflexão sobre a caracterização do assédio:

O assédio, o assédio sexual, a lesão à intimidade, a lesão à imagem e a lesão à honra no trabalho podem ser considerados espécies de um gênero denominado medidas de constrangimento no ambiente de trabalho. Elas implicam comportamentos diferentes por parte do sujeito que pratica o ato constrangedor [...]. Porém, todas as medidas de constrangimento no trabalho possuem uma única finalidade: causar dano à moral e à dignidade ínsita à pessoa do trabalhador e, no limite, forçar que a vítima peça demissão.[33]

Analisando o estudo da professora Sônia Mascaro chegamos a conclusão que o assédio moral no ambiente de trabalho é apenas uma espécie de constrangimento, a qual pode ser confundida, interpretada de maneira equivocada, errada, daí a importância de estudarmos e conceituarmos o assunto, padronizando as ações consequentes do assédio.

A psicóloga Marie-France Hirigoyen tem interessante entendimento neste sentido:

[...], é necessário, para uma tomada de posição, precisar o campo de ação, seja com vistas a uma punição das ocorrências, seja para a adoção de uma prevenção eficaz [...] Para o psiquiatra, interessam há muito tempo as consequências desse tipo de atitude maldosa sobre a saúde e a personalidade das vítimas. [...]. São poucas as outras agressões que causam distúrbios psicológicos tão graves a curto prazo e consequências a longo prazo tão desestruturantes.

No momento, clínicos gerais e psiquiatras não sabem identificar de forma adequada a especificidade desse tipo de violência e os respectivos sintomas decorrentes. Os médicos do trabalho, lidando há muito tempo com esse tipo de situação, nem sempre sabem como proteger as vítimas. Os juristas, por sua vez, tentam encontrar uma definição, livre tanto quanto possível de qualquer subjetividade para que sejam classificadas penalmente esses processos violentos [...].[34]

Para conceituarmos o assédio moral temos que considerar todos os estudos sobre o tema, das diversas áreas interessadas e não somente os estudos realizados no campo jurídico, para tentarmos esgotar o assunto de maneira conglobada e assim chegarmos a melhor definição do tema.

Uma boa definição é a de Hirigoyen, aliás, é a definição mais aceita atualmente:

[...] o assédio moral no trabalho é definido como qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho. Qualquer que seja a definição adotada, o assédio moral é uma violência sub-reptícia, não assinalável, mas que, no entanto, é muito destrutiva. Cada ataque tomado de forma isolada não é verdadeiramente grave; o efeito cumulativo dos microtraumatismos frequentes e repetidos é que constitui a agressão. Este fenômeno, no início, pode ser comparado com o sentimento de insegurança existente nos bairros, resumido no termo “incivilidade”. Com a continuação sistemática, todas as pessoas visadas se sentem profundamente atingidas.[35]

Está claro que para caracterização do assédio moral se faz necessário o preenchimento de alguns requisitos específicos, sem isto estaremos diante de uma agressão moral, mas, que não se configura em assédio moral.

Para a caracterização do assédio moral é necessário o preenchimento de alguns requisitos mínimos: conduta abusiva; repetição da conduta; o intuito de humilhar, destruir, a vítima do assédio.

As agressões advindas do assédio prejudicam a imagem da vítima perante seus colegas de trabalho, além disso, abalam psicologicamente a vítima, deixando-a em estado de frustração e as vezes até mesmo de depressão, o que causa a diminuição da satisfação pelo emprego, pelo ambiente de trabalho.

Vejamos a visão de Maria Aparecida Alkimin sobre a caracterização do assédio:

Não podemos mencionar ou descrever uma conduta/ação típica para caracterizar o assédio moral, pois este pode ser realizado mediante qualquer conduta imprópria e insuportável que se manifeste através de comportamentos, palavras, atos, escritos, capaz de ofender a personalidade e dignidade, com prejuízos à integridade física e psíquica do empregado, criando condições de trabalho humilhantes e degradando o ambiente de trabalho, além de colocar em perigo o emprego.

Dentre as várias causas que geram a conduta assediante, podemos mencionar várias: deficiências na organização do trabalho, precariedade de comunicação e informação interna, corrida pela competitividade e lucratividade, ausência de uma política de relações humanas, rivalidade dentro do setor, gerenciamento sob pressão para forçar a adaptação e a produtividade, inveja, ciúmes, e até mesmo a perversidade inerente a muitas pessoas.[36]

Não existe uma regra sobre a repetição da conduta, não há periodicidade pré-estabelecida, basta que seja habitual, frequente, como bem ensina Alkimin:

Para que a conduta degradante e humilhante se caracterize como assédio moral, casuisticamente, não se pode apresentar como fato isolado, portanto, o comportamento, gestos, palavras e atos direcionados contra o assediado e que visam desestabilizá-lo, afetando sua dignidade e direitos de personalidade, devem ser praticados de forma reiterada e sistemática, ou seja, com uma certa frequência. Logo, não caracteriza o assédio moral um conflito temporal no ambiente de trabalho, tão menos uma agressão pontual partida do superior hierárquico ou colega de serviço, posto que, no conflito, há interesses contrapostos, preponderando o binômio ataque-resistência, nada impedindo que pela repetição, uma das partes ceda e passe a ser vítima do assédio moral; ao passo que no caso da agressão pontual, esta esgota-se em si mesma, não implicando perseguição ou discriminação na relação de trabalho.[37]

Como dito anteriormente o assédio moral é uma das formas de agressão contra uma pessoa, no entanto, diferentemente das outras formas de agressão, no assédio moral a violência pode ocorrer de forma silenciosa, de maneira aparentemente calma e tranquila, com ações sutis, mas constantes, que levam a vítima ao desespero, ao limite do estresse, a frustração, a depressão, ao suicídio.

Insta salientar que o assédio moral pode caracterizar-se tanto em condutas comissivas, quanto em condutas omissivas, não importando a posição do agressor e do agredido na estrutura organizacional da empresa, basta que ocorram ações lesivas e com o preenchimento dos requisitos estudados.  

4.3  Consequências do assédio moral no ambiente de trabalho

O assédio moral provoca consequências em diversos níveis, os quais passaremos a estudar a seguir:

I – A sociedade suporta os altos custos decorrentes das enfermidades profissionais sofridas em consequência do assédio.

Na maior parte das vezes estes altos custos decorrem dos seguintes fatores: aposentadorias prematuras, geradas pela incapacidade do trabalhador de continuar exercendo as suas funções; o aumento na taxa de desemprego, que gera custos como o pagamento do seguro-desemprego" data-type="category">seguro desemprego, além de prejudicar a manutenção da economia; custos médicos e possível hospitalização, entre outros.

II – As organizações também sofrem consequências na medida em que suportam o baixo rendimento apresentado pela vítima do assédio; com os custos gerados pela necessidade de responder a ações judiciais ou simplesmente para manter afastada de suas atividades a vítima, por um determinado período.

No que tange a ações judiciais a empresa pode sofrer com os custos por uma rescisão indireta amparada no art. 483 da CLT, por falta grave do empregador, por exemplo, neste sentido ensina Maria Aparecida Alkimin:

O assédio moral se traduz em prática degradante e humilhante, atingindo a dignidade humana da pessoa do trabalhador; outrossim, impede um meio ambiente do trabalho sadio e equilibrado (CF, art. 225) e é capaz de tornar insuportável a continuidade da relação de emprego, em razão da grave violação pelo empregador ou pelo preposto deste das obrigações contratuais trabalhistas. Sob o prisma das obrigações contratuais, todas as atitudes, gestos, comportamentos, palavras caracterizadoras do assédio moral se enquadram nas hipóteses tipificadas no art. 483 da CLT, consubstanciando grave violação patronal das obrigações legais e contratuais, além de violar o dever geral de respeito à dignidade e intimidade do trabalhador, legitimando a despedida indireta por justa causa ou falta grave do empregador.[38]

Com relação ao empregado que cometeu o assedio moral, este também poderá sofrer consequências, como a despedida por justa causa amparada pelo art. 482 da CLT.

Não é comum, mas pode ainda o assediador sofrer responsabilização civil e penal, quando ficar caracterizado crime contra a honra na conduta que gerou o assédio, por exemplo art. 138; 197, I; e 203 todos do código penal, reproduzidos abaixo:

 Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

        Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Art. 197 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça:

        I - a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias:

        Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência;

Art. 203 - Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho:

        Pena - detenção de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente à violência. [39]

III – Por fim, temos as consequências sofridas pela vitima do assédio moral, que de acordo com estudos realizados, por diversos autores, passa a apresentar um ou mais dos seguintes sintomas: cansaço excessivo, enxaquecas, distúrbios do sono, distúrbios digestivos, baixo estima, dores na coluna, insegurança, dores generalizadas, medo, pânico, depressão profunda a ponto de histerismos e violência podendo chegar ao suicídio.

Além dos danos causados a vítima propriamente dita, temos ainda os danos causados a família, que muitas vezes sofre com a pressão no ambiente familiar, com a necessidade de apoio psicológico, com a necessidade de apoio financeiro para tratamento médico ou até mesmo com a necessidade de acompanhamento em visitas médicas.

Mais uma vez nos utilizaremos dos ensinamentos da Dra. Maria Aparecida Alkimin:

A vítima injustamente atingida em sua dignidade e personalidade de homem e trabalhador suporta significativas perdas, passando a viver no ambiente de trabalho tenso e hostil, em constante estado de incômodo psicofísico, capaz de gerar distúrbios psicossomáticos, refletindo em desmotivação, stress, isolamento e prejuízos emocionais de toda ordem, comprometendo sua vida pessoal, profissional, familiar e social.

[...] O assédio moral gera sofrimento psíquico que se traduz em mal-estar no ambiente de trabalho e humilhação perante os colegas de trabalho, manifestando o assediado sentimento e emoção por ser ofendido, menosprezado, rebaixado, excluído, vexado, cujos sentimentos se apresentam como medo, angústia, mágoa, revolta, tristeza, vergonha, raiva, indignação, inutilidade, desvalorização pessoal e profissional, que conduzem a um quadro de depressão com total perda da identidade e dos próprios valores, com risco de suicídio.[40]

A respeito deste último tópico, aliás, sem dúvida nenhuma o mais importante para o direito laboral, temos inúmeros estudos, que apresentam inclusive os índices detalhado dos prejuízos causados ás vítimas.

Assim vamos nos valer de um estudo realizado pela médica do trabalho Margarida Barreto, o qual segue abaixo:

O estudo trouxe dados importantes, que demonstram o tamanho do problema, bem como a necessidade de ação:

Dentre os tipos e incidências de atos do agressor revelados, observou-se o predomínio de instruções confusas e imprecisas (65%); bloqueio ao trabalho e referência de erros imaginários (61%); fazer de conta que o outro é invisível ou não existe (55%) e solicitar trabalhos urgentes para posteriormente jogá-los no lixo ou deixá-los na gaveta, sem qualquer utilidade (49%). Outras vezes, faz o trabalhador realizar tarefas abaixo da sua capacidade profissional, como servir cafezinho, limpar banheiro (44%). São frequentes os comentários maldosos em público (41%), assim como não cumprimentar (38%), impor horários injustificados e forçar o trabalhador a pedir demissão (35%), impedir de almoçar ou conversar com um colega, disseminando boatos que o trabalhador está doente e com problema mental ou familiar (30%).

Outra prática comum é a retirada do material necessário à execução do trabalho como fax, computador, telefone, isolando e separando-o do convívio com os colegas.[41]

O mesmo artigo apresenta a diferença entre os atos de assédio moral contra os homens e contra as mulheres, bem como as suas consequências:

ressentimentos, vontade de chorar, isolamento, angústia, ansiedade, alterações do sono e insônia, sonhos frequentes com o agressor, alterações da memória, distúrbios digestivos e náuseas, diminuição da libido, cefaleia, dores generalizadas, palpitações, hipertensão arterial, tremores e medo ao avistar o agressor, ingestão de bebida alcoólica para esquecer a agressão, pensamentos repetitivos, entre outros [...] Para os homens a sensação de fracasso é acentuada e os pensamentos tornam-se confusos e repetitivos. Isolam-se e, por vergonha, evitam comentar o acontecido [...].

Aumenta o uso de drogas, principalmente o álcool. Sobressai o sentimento de inutilidade, verbalizadas em expressões como “objeto”, “um ninguém”, “um lixo”,“um zero”, “um fracassado”. Predominam quadros de características depres-sivas, precordialgia, hipertensão arterial, dores generalizadas, dispnéia, isolamento, irritabilidade e suscetibilidade. Todos em algum momento tiveram pensamentos suicidas e 18,3% tentaram suicídio, revelando a dor masculina como desesperadora e devastadora.[42]

Os problemas advindos do assédio podem desenvolver na vítima a SÍNDROME DE BURNOUT, uma doença ocupacional gravíssima, decorrente de extremo estresse suportado no ambiente de trabalho, que pode causar obesidade, depressão profunda, problemas cardíacos, perda de memória, entre outros.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Rodolfo Daniel Veiga

Sou advogado militante na área Trabalhista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso de Pós Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho - Escola Paulista de Direito.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos