5 DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS À ARBITRAGEM
A arbitragem, enquanto meio de solução de conflitos, que visa, por meio de seu agente – árbitro -, dizer o direito, não poderia deixar de observar os princípios norteadores da legislação processual civil, muito menos os princípios constitucionais.
A seguir abordar-se-á os princípios constitucionais aplicáveis à arbitragem.
5.1 Do Princípio do devido Processo Legal
Previsto no Art. 5º, LIV e LV, ambos da Constituição Federal, o princípio do devido processo legal informa o conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição. [19]
Os dispositivos constitucionais acima transcritos revelam a necessidade da observância de todas as formalidades e exigências previstas em lei para o procedimento judicial.
A Lei nº 9.307 de 23 de setembro de 1.996, em seu Art. 21, determina a observância de princípios que pressupõe o devido processo legal, respeitando a liberdade das partes e garantindo sua não interferência no exercício da jurisdição.
A lei é garantia das relações humanas. Com a aplicação estrita e correta do diploma legal, as partes têm a sensação de que a justiça se concretizou plenamente. Assim, observado o devido processo legal que visa exatamente as formalidades e exigências previstas em lei, afastada está a hipótese de procedimento, inclusive o arbitral, de insegurança jurídica e privação, de direitos e bens, injusta.
Em outras palavras, ao determinarem o procedimento que regerá o Juízo Arbitral, as partes se vinculam a ele, devendo observá-lo estritamente.
5.2 Da Garantia Processual
Para que a arbitragem atinja seu objetivo de pacificação dos conflitos de interesse, envolvendo todo o procedimento é necessária a existência de garantias envolvendo todo o procedimento.
A arbitragem, enquanto instituto de caráter jurisdicional, reclama a aplicação dos princípios jurídicos informadores do processo civil.
Nelson Nery Júnior [20] ensina que o devido processo legal é o princípio fundamental do processo civil, servindo de base de sustentação a todos os demais princípios. E resume seu conteúdo na "possibilidade efetiva de a parte ter acesso à justiça, deduzindo pretensão e defendendo-se do modo mais amplo possível [...]". Essa referência é feita, considerando-se o disposto no Art. 5º, XXXV, da Constituição Federal.
A garantia processual traduz-se em justiça quando aplicados efetivamente todos os princípios pinçados da ordem legal. Não há desconforto para aquele que reclama um direito, aquele que o defende, aquele que o diz, e o próprio Estado que vela pela ordem pública e paz social.
Uma vez que não se vislumbre a presença da garantia processual, o procedimento estará seriamente comprometido e sujeito a nulidade da sentença arbitral [21].
5.3 Do Contraditório E Igualdade Das Partes
O princípio do contraditório está previsto no Art. 5º, inc. LV da CF/88 e informa que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". Este princípio está intimamente relacionado ao princípio da igualdade das partes, disciplinado no Art. 5º, I, da Constituição Federa e reproduzido, no âmbito processual no Art. 125, inc. I do CPC, que intenta "assegurar às partes igualdade de tratamento".
Para Edouard Couture "O processo é um diálogo. Nunca haverá justiça, se havendo duas partes, apenas se ouvir a voz de uma". [22]
Nos dizeres de Humberto Theodoro Júnior [23] "O princípio do contraditório reclama, outrossim, que se dê oportunidade à parte não só de falar sobre alegações do outro litigante, como também de fazer a prova contrária". Ainda, Moacyr Amaral dos Santos [24] ensina:
O contraditório é garantia de exercício de direitos revelando a igualdade das partes ao proporcionar-lhes mesmo tratamento. Tal como no processo civil, perante o Estado do Juiz, as partes se encontram em mesmo patamar, eqüidistantes entre si e para com ele o arbitro.
Portanto, as oportunidades devem ser garantidas às partes sempre em número compatível, facultando seu exercício.
O contraditório é princípio garantidor, de respeito às partes e as suas manifestações, sempre que houver interesse e necessidade.
Considerando o exposto anteriormente, verifica-se que a aplicação dos princípios constitucionais ao juízo arbitral confere aos litigantes uma maior segurança na solução de seus conflitos e reitera a supremacia das normas constitucionais, pois que aplicadas a todo o ordenamento jurídico.
6 CONCLUSÃO
Após o estudo realizado sobre a Constituição e seus princípios bem como acerca do instituto da arbitragem, o qual procurou estabelecer a relação devida apontando os princípios constitucionais aplicáveis à arbitragem, sem, contudo, esgotar o tema, é possível apresentar algumas conclusões.
A Constituição como lei fundamental de um Estado estabelece toda sua organização, prevendo também princípios que fundamentam a estrutura estatal e a conduta humana.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 tem conteúdo político e social e apresenta um rol não taxativo de princípios os quais se aplicam a todo ordenamento jurídico.
Por se tratar de lei fundamental de um Estado, as normas constitucionais são hierarquicamente superiores às demais normas do sistema conferindo-lhes validade.
O instituto da arbitragem constitui meio alternativo para solução de conflitos de interesses que envolvam direitos patrimoniais.
A arbitragem é regulamentada pela Lei 9307/96, portanto, lei infraconstitucional que deve respeitar os princípios constitucionais para ser válida, como ocorre efetivamente.
O estudo do instituto da arbitragem e sua finalidade permitiu estabelecer quais princípios constitucionais se aplicam a ela, como o devido processo legal, garantia processual, contraditório e igualdade das partes.
Cada princípio mencionado revela a preocupação do instituto com a garantia de solução de justiça dos conflitos de interesses e demonstra a validade da arbitragem.
A utilização da arbitragem como meio alternativo de solução de conflitos de interesses regida pelos princípios constitucionais estudados, que devido a sua superioridade hierárquica se aplica ao instituto, permite a justa aplicação do direito, tornando o instituto mais um aliado na concreção da Justiça e paz social.
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Notas
1 Ob.cit., p. 39-40.
2 Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 59-60.
3 cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 41.
4 cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 40.
5 Ibid.
6 Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1998, p.47-48.
7LEMES, Selma Ferreira M. "Arbitragem. Princípios jurídicos fundamentais. Direito brasileiro e comparado". RT 686/73. p. 73.
8 Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 95.
9 Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra Editora. 2000. Tomo IV.
10 Ib.Idem.
11"Arbitragem e Processo: Um Comentário à Lei 9.307/96". p.27.
12CACHAPUZ, Rozane da Rosa. " Arbitragem: Alguns aspectos do Processo e do Procedimento na Lei nº 9.307/96". p. 22.
13PARIZATTO, João Roberto. Arbitragem, Comentários à Lei 9.307/96, de 23-9-96. p. 16.
14 Contrariamente, as relações jurídicas que contemplem natureza jurídica extrapatrimonial e indisponível, não integram o conteúdo de convenção arbitral, como as coisas comuns, as públicas e as fora de comércio, por imposição da lei. Estão fora do âmbito da arbitragem questões ligadas, basicamente, ao Direito Público, como o Direito Constitucional, o Direito Penal e o Direito Administrativo.
15artigo 31 "A sentença Arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário... "
16"O caráter negativo revela-se pela prorrogação de competência que retira de via judicial estatal a função de julgamento sobre o mérito. Positivo, ao implicar atribuições jurisdicionais aos árbitros de solucionar as controvérsias. KROETZ, ob. cit., p. 131.
17CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: Um Comentário à Lei 9.307/96, p. 221.
18ob. cit. p. 222.
19CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, ob. cit. p. 82.
20NERY JR., Nelson Princípios do processo civil na Constituição Federal apud Id. ibid., p. 72.
21artigo 32, inciso VIII, da lei 9.307/96.
22COUTURE, Edouard, Introdução ao Estudo do Processo Civil apud Parizatto, ob. cit. p. 68
23THEODORO JR, Humberto. "Curso de direito processual civil", id. ibid., p. 28.
24SANTOS, Moacyr Amaral dos. "Primeiras linhas de direito processual civil". 2º v.São Paulo: Saraiva. 1979. p. 62. Também, LEMES, ob. cit., p. 80.