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Democracia representativa: alguns de seus dilemas na atualidade

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05/07/2017 às 15:00
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CONCLUSÃO

Ao longo deste ensaio, buscamos abordar três situações problemáticas envolvendo a democracia na atualidade. Tratam-se de pontos que, se não forem adequadamente tratados, podem levar a supressão prática da democracia representativa.

A questão envolvendo a redução acentuada da esfera de atuação privada do indivíduo imune a ingerência do Estado deve ser controlada por uma legislação transparente, aplicada por um poder judiciário independente, que detenha mecanismo eficientes para combater qualquer abuso estatal.

Já o descrédito institucional decorrente do mascaramento de práticas autoritárias por um discurso democrático pode ser neutralizado por meio de uma avaliação do Estado a partir de dois pilares fundamentais da democracia representativa, ou seja, deve-se aferir se há, no Estado, respeito às divergências e controle eficiente do exercício do poder. Ausente algum desses elementos fundantes, o Estado não é democrático e a eventual existência de direitos sociais não passa de uma espécie de barganha compensatória pela supressão de direitos civis e políticos.

Por fim, a problemática envolvendo as manifestações populares violentas deve ser enfrentada por meio da utilização de mecanismos legais que, ao identificar a presença de uma conduta criminosa, trate-a como tal, não sendo possível que delitos sejam minimizados ou desconsiderados com base no argumento de que foram praticados num ambiente de manifestação popular, garantido pela liberdade inerente à democracia.

Tal discurso não pode ser aceito, uma vez que as manifestações violentas não têm compromisso democrático e se prestam, apenas, ao alcance de objetivos que, geralmente, não colocam uma real democracia representativa entre eles.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARISTÓTELES. Política; tradução Mário da Gama Kury. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1985.

BOBBIO, Norberto. Três ensaios sobre a democracia; tradução  Sérgio Bath. São Paulo: Cardim & Alario Editora, 1991.

______. A teoria das formas de governo; tradução Sérgio Bath. 10. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998.

BRASIL.  Lei nº 13.010 de 26 de junho de 2014. Altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para estabelecer o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante, e altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 jun. 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13010.htm>. Acesso em: 11 ago. 2014.

CONSTANT, Benjamin. A liberdade dos antigos comparada à dos modernos. Disponível em: <http://epl.org.br/files/2013/06/012-015.pdf.> Acesso em: 03  ago.  2014.

COREIA do Norte anuncia eleição com 100% dos votos para Kim Jong-Un. Folha de São Paulo, São Paulo, 10 mar. 2014. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2014/03/1423150-coreia-do-norte-anuncia-eleicao-com-100-dos-votos-para-kim-jong-un.shtml>. Acesso em: 03 ago. 2014.

SANTOS, Wanderley Guilherme dos. O paradoxo de Rousseau: uma interpretação democrática da vontade geral. Rio de Janeiro: Rocco, 2007.

SORTO, Fredys Orlando. O projeto jurídico de cidadania universal: reflexões à luz do direito de liberdade. Anuario hispano-luso-americano de derecho internacional, Madrid, Vol. 20, p. 103-126, ene./dic. 2011.

______. O uso da força nas relações internacionais: da Paz Perpétua ao Terceiro Ausente. In: TOSI, Giuseppe (Org.). Norberto Bobbio: democracia, direitos humanos, guerra e paz. João Pessoa; Ed. Universitária da UFPB, 2013, v. 2, p. 335-361.

ARENDT, Hannah. A condição humana; tradução Roberto Raposo; introdução Celso Lafer. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1983.


Notas

[1] Nas palavras de Aristóteles: “Costumamos chamar de reino uma monarquia cujo objetivo é o bem comum; o governo de mais de uma pessoa, mas somente poucas, chamamos de aristocracia, porque governam os melhores homens ou porque estes governam com vistas ao que é melhor para a cidade e seus habitantes; e quando a maioria governa a cidade com vistas ao bem comum, aplica-se ao governo o nome genérico de todas as suas formas, ou seja, governo constitucional (há boas razões para isto, pois embora um homem, ou uns poucos homens possam preponderar por suas qualidades, quando o número é maior passa a ser difícil que todos atinjam a perfeição em todas as qualidades, mas eles podem preponderar em valor militar, porquanto este aparece mais no maior número; nesta forma de constituição, portanto, a classe que luta pela cidade na guerra é mais poderosa, e são os possuidores de armas que influem no governo). Os desvios das constituições mencionadas são a tirania, correspondendo à monarquia; de fato, tirania é a monarquia governando no interesse do monarca, a oligarquia é o governo no interesse dos ricos, e a democracia é o governo no interesse dos pobres, e nenhuma destas formas governa para o bem de toda a comunidade (grifamos)” [1279b].

[2] Não é correto, no entanto, sustentar a tese de que na antiguidade a noção de democracia vinculava-se sempre a uma visão de forma de governo degenerada. Na Roma antiga, conforme bem observa Bobbio (1998, p.67-68), o historiador Políbio, que era grego de nascimento, considerava a democracia como uma das três formas boas de governo, que poderia se degenerar no que ele denominava de “oclocracia”, que se pode compreender atualmente como uma espécie de “governo das massas”.

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[3] Ao se fazer referência termo cidadão se referindo a antiguidade, é importante que ele não seja confundido com a totalidade dos habitantes da cidade-estado antiga. Isso porque, a cidadania na antiguidade era profundamente discriminatória, uma vez que alcançava apenas uma pequena parcela da população, dentre a qual não se incluía, por exemplo, as mulheres, os escravos e os estrangeiros.

[4] Ao comentar a supressão gradativa da diferença entre as esferas familiar e política, Arendt (1983, p. 43) faz as seguintes considerações: “O desaparecimento do abismo que os antigos tinham que transpor diariamente a fim de transcender a estreita esfera familiar e ‘ascender’ à esfera política é fenômeno essencialmente moderno.” Isso significa dizer que para os antigos, a intimidade de suas relações estava mais protegida do que na atualidade, ensejando uma situação de visível incomunicabilidade entre as esferas privada e pública de cada indivíduo.

[5] Santos (2007, p. 19), adverte que “quando se chega à conclusão de que o problema político de uma nação não está essencialmente em suas leis, mas nos que as executam, as soluções possíveis afastam-se da revisão dos diplomas legais, aproximando-se dos métodos radicais de remoção dos governantes: revolução ou golpe de Estado.”

[6] Alguns ditadores chegam ao ridículo quando se utilizam de instrumentos da democracia representativa, como o voto. Em eleições realizadas em 2014 na Coréia do Norte, a imprensa oficial do país divulgou que cem por cento dos eleitores compareceram aos locais de votação e referendaram, na integralidade, a manutenção no poder dos atuais dirigentes do país (FOLHA DE SÃO PAULO, 2014). Tal resultado, além de deixar evidente o sistema de repressão da Coréia do Norte, que impede qualquer dissidência, demonstra que o exercício do voto e a realização de eleições periódicas não se prestam para caracterizar um país como democrático.

[7] Reconhecemos a existência de diversas controvérsias no tocante ao significado do termo “ideologia”. Neste trabalho, utilizamos tal vocábulo como sendo o conjunto de ideias incrustadas na estrutura de governo do Estado, tidas como hegemônicas e como as únicas ao quais se deve atribuir respeito, sendo, por consequência, utilizadas como argumentos de autoridade por quem se encontra no exercício do poder.

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Sobre o autor
Gilvânklim Marques de Lima

Doutor e mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Juiz Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Gilvânklim Marques. Democracia representativa: alguns de seus dilemas na atualidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5117, 5 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58281. Acesso em: 22 dez. 2024.

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