As cooperativas podem participar de licitação?

10/07/2017 às 17:57

Resumo:


  • A Lei de Licitações (Lei 8666/93) obriga entidades da Administração Pública a realizar licitações, buscando economia e transparência.

  • Cooperativas têm respaldo legal para participar de licitações, respeitando os princípios de igualdade e competitividade da lei.

  • A legislação brasileira permite a participação de cooperativas em licitações, inclusive concedendo benefícios para cooperativas de menor porte.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em diversos municípios existe uma questão que aflige o departamento de compras, o departamento jurídico e muitas vezes até o Ministério Público local; trata-se da possibilidade das cooperativas participarem de processos licitatórios.

Nestes tempos, em nosso cotidiano no escritório jurídico, apareceu referida questão, foi então buscando jurisprudências e julgados percebemos que referido assunto ainda não está pacificado em nosso ordenamento. Assim para tratar desse tema, abordaremos nosso entendimento.

A Licitação é obrigatória às entidades da Administração Pública Direta, onde podemos citar União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, assim como a Administração Pública Indireta, ou seja, Autarquias, Fundações, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e suas subsidiárias. Também estão obrigados a licitar as Corporações Legislativas, bem como o Poder Judiciário e os Tribunais de Contas. Portanto, com essa grande abrangência do processo licitatório, vemos que a lei procurou trazer mais economia e transparência em praticamente todos os setores da área pública.

Então pública e notoriamente percebemos alguns pontos que o legislador destaca na Lei 8666/93, quais sejam: o Ente Público deve contratar mediante Licitação, e vai buscar sempre fazer economia com transparência e legalidade.

Destacaremos para a brevidade do texto o caráter da economia para os cofres públicos, daí cabe uma primeira observação: “a lei deve resguardar a economicidade do ente”, buscando dentro da legalidade o menor preço possível.  Daí nasce a corrente que afirma de maneira, ao nosso ver, equivocada, que quando as Cooperativas participam do certame, estas entram com vantagens econômicas por não terem toda a carga tributária de uma S.A ou LTDA por exemplo, desrespeitando assim o princípio da igualdade.

Não podemos partilhar deste entendimento, afrontar o princípio da igualdade é justamente criar qualquer óbice para que Cooperativas regularmente constituídas participem de licitações.

A ideia de cooperativa surgiu no século XVIII, pretendendo constituir uma alternativa política e econômica ao capitalismo, eliminando o patrão e o intermediário, e concedendo ao trabalhador a propriedade de seus instrumentos de trabalho e a participação nos resultados de seu próprio desempenho. Reformadores sociais, socialistas utópicos ou socialistas cristãos como Robert Owen e Charles Fourier criaram cooperativas de produção. Louis Blanc fundou o que chamou de "oficinas sociais", ao agrupar artífices do mesmo ofício. Destacam-se, como teóricos de cooperativismo, Beatrice Potter WebbLuigi Luzzatti e Charles Gide, que chegou a propor a “república cooperativa”.

Em maio de 1838, com o movimento cartista na Inglaterra, que se disseminou pela classe média, surgiram as primeiras manifestações concretas de cooperativismo, que culminaram com a fundação da Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale ("Rochdale Society of Equitable Pioneers") (1844), que reunia 28 tecelões da localidade.

Na atualidade, especialmente nos países capitalistas mais desenvolvidos, o cooperativismo convive com outras formas de organização empresarial, como na Suécia, país onde mais e melhor se desenvolveu.

 No Brasil, sobressaem algumas cooperativas agrícolas. O modelo brasileiro de cooperativismo é o unitário, isto é, a cooperação é regulada por uma só lei orgânica. O modelo diversificado gera legislação específica para cada tipo de organização cooperativa.

Acreditamos que é justamente essa falta de legislação específica para cada área de atuação que contribui para referidas dúvidas jurídicas administrativas, por exemplo fiscalização e controle, organização territorial etc.

Como podemos perceber acima, a Cooperativa tem como objetivo prestar serviços a seus associados, não existe vínculo empregatício entre cooperativa e prestadores de serviço, conforme narração do artigo 90 da Lei 5.764/71, o que de forma nenhuma a impede de participar de Licitação.

As Cooperativas tem condição jurídica para participarem de Licitação, não permitir sua participação é algo vedado em nosso ordenamento, pois fere o caráter isonômico e competitivo da lei 8666/93.

O art. 3°, da Lei 8.666/93, complementa disposto no dispositivo supramencionado acrescentando que “a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.

TCU – Acórdão 2079/2005 – 1ª Câmara – “9.3.1. abstenha-se de incluir nos instrumentos convocatórios condições não justificadas que restrinjam o caráter competitivo das licitações, em atendimento ao disposto no art. 3° da Lei n° 8.666/93;”.

TCU – Decisão 369/1999 – Plenário – “8.2.6 abstenha-se de impor, em futuros editais de licitações, restrições ao caráter competitivo do certame e que limitem a participação de empresas capazes de fornecer o objeto buscado pela Administração Pública, consoante reza o art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei nº 8.666/93;”

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O doutrinador Marçal Justen Filho nos ajuda a elucidar a questão e explica que o edital tem de estabelecer as regras necessárias para seleção da proposta vantajosa. Se as exigências serão ou não rigorosas, isso dependerá do caso concreto. “Respeitadas as exigências necessárias para assegurar a seleção da proposta mais vantajosa, serão inválidas todas as cláusulas que, ainda indiretamente, prejudiquem o caráter “competitivo” da licitação” (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 14º Ed, São Paulo: Dialética, 2010, p. 63).

E arremata: "Essas considerações permitem afirmar que é possível e viável a participação de cooperativa em licitação quando o objeto licitado se enquadra na atividade direta e específica para a qual a cooperativa foi constituída. Se, porém, a execução do objeto contractual escapar à dimensão do ‘objeto social" da cooperativa ou caracterizar atividade especulativa, haverá atuação irregular da cooperativa. Seria hipótese de sua inabilitação." (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 10ª ed. p. 306).

Ivan Barbosa Rigolin, explica que: “A lei permite que o edital estabeleça requisitos habilitatórios a serem atendidos por todos participantes, pena de eliminação no certame. Se o edital exigir, e se a Cooperativa atender – dentro daquilo que jurídica e institucionalmente exista nas sociedades cooperativas, uma vez que a lei de licitações não permite, nas habilitações, exigir das empresas licitantes algo que a sua legislação específica delas já não exija – então não se vislumbra em que, para esse efeito, difere uma cooperativa de uma S/A ou S/C. (...).

Ademais, a licitação é justamente para se obter uma proposta mais vantajosa à Administração Pública. Por que não permitir a participação de cooperativas que recolhem menos tributos?

Sendo certo que caso as cooperativas apresentem propostas tão baixas tornando os contratos inexequíveis, existem remédios jurídicos na própria lei de licitações cito artigo 48, inciso II e §1°, assim podendo ser desclassificadas como qualquer outra empresa.

Acrescenta-se que, a 15 de junho de 2007, foi publicada a Lei nº 11.488, cujo artigo 34 prescreve o seguinte:

Art. 34.  Aplica-se às sociedades cooperativas que tenham auferido, no ano-calendário anterior, receita bruta até o limite definido no inciso II do caput do art. 3o da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, nela incluídos os atos cooperados e não-cooperados, o disposto nos Capítulos V a X, na Seção IV do Capítulo XI, e no Capítulo XII da referida Lei Complementar."

Assim sendo, nas licitações, as cooperativas cujas receitas anuais não ultrapassam R$ 2.400.000,00 devem ser beneficiadas com os privilégios previstos na Lei Complementar nº 123/06 destinados às microempresas e às empresas de pequeno porte.

De todo modo, concluindo, é importante ressaltar que não há impedimento à participação de cooperativas em licitações promovidas por municípios, quer nas modalidades tradicionais da Lei nº 8.666/93, quer no pregão, presencial ou eletrônico.

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