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Outros meios processuais de defesa da posse

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5. Ação de embargos de terceiro

            A ação de embargos de terceiro é o meio processual adequado para aquele que não sendo parte no processo vem a sofrer ato de apreensão de seus bens determinados pelo poder judiciário.

            É possível apenas àquele que se apresenta na qualidade de terceiro(19) em face de demanda judicial determinada, pois somente o terceiro faz jus à via judicial dos embargos.

            É ação que tem por base a defesa da posse de forma ampla uma vez que permite ao proprietário e também ao possuidor demandarem a posse subtraída por ato judicial competente.

            Funda-se tanto no direito de possuir ("jus possessionis"), como no direito de propriedade, pois o art. 1046, § 1°, do Código de Processo Civil, prevê que o terceiro "senhor e possuidor" também pode valer-se deste recurso processual, motivo pelo qual está situada entre as ações possessórias "lato sensu" ou atípicas.

            Característica importante que detém os embargos de terceiro é a possibilidade de serem demandados pelo autor com fulcro exclusivamente no "jus possessionis"(20) (direito de possuir), conforme determina o art. 1046, § 1° (última parte), do Código de Processo Civil, sendo que nesta modalidade os embargos de terceiro são muito semelhantes às ações possessórias típicas (ação de manutenção, reintegração e interdito proibitório), pois se baseiam na defesa da situação fática existente indiferente da existência do direito real de propriedade.

            O direito material que fundamenta a relação processual dos embargos de terceiro pode ser a propriedade (art. 1046, § 1°, primeira parte, CPC) e a posse (art. 1046, § 1°, última parte, CPC), motivo pelo qual os embargos não podem ser classificados entre as ações possessórias "stricto sensu".

            Outras diferenças que podem ser suscitadas para classificar os embargos de terceiro entre as ações possessórias "lato sensu" é que eles não podem ser demandados como ações principais autônomas como os interditos típicos (ação de manutenção, reintegração e interdito proibitório) uma vez que possuem caráter exclusivamente incidental dependentes totalmente de uma lide anterior instaurada pela vias dos procedimentos ordinários, cautelares e executivos.

            Paute-se ainda que os interditos típicos têm por objeto, em regra, a defesa contra ações injustas que se consubstanciam em turbação, esbulho e justo receio de moléstia na situação jurídica instaurada, enquanto que os embargos de terceiro são o remédio contra ato jurisdicional típico de constrição da posse de bens sofrido por aquele que não é parte da relação jurídica principal, mas é atingido por uma decisão de efeitos extra lide e fica privado de sua propriedade ou posse.

            Sendo assim nos embargos de terceiro conforme destaca a Professor Cláudia Aparecida Simardi:

            "... não ocorre propriamente turbação ou esbulho, porque o embaraço ou a perda do exercício da posse têm por respaldo o cumprimento de uma ordem judicial (v. g. penhora, arresto, seqüestro), que é, ao menos aparentemente, legítima, e não simples ato de vontade de uma pessoa (física ou jurídica) de molestar direito alheio" (21).

            Para que os embargos de terceiro sejam ajuizados resta somente que o Sr. Oficial de Justiça concretize os mandamentos contidos no mandado judicial expedido pela autoridade judiciária competente para que o terceiro atingido por relação jurídica processual alheia a sua esfera jurídica demande este procedimento especial contra a parte que fora beneficiada pela medida jurisdicional.

            Isto posto, deve-se reconhecer que os embargos de terceiro podem ter natureza jurídica exclusivamente no "jus possessionis" momento em que se assemelham às ações possessórias "stricto sensu", todavia por serem fundados em outras relações jurídica de direito material que não a posse "per si" encontram-se classificados entre as ações possessórias "lato sensu".


6. Ação de nunciação de obra nova

            A ação de nunciação de obra nova é ação que compete ao proprietário, possuidor, condômino e ao município contra aquele confinante que constrói ilicitamente seja violando as normas do direito de vizinhança contidas no Código Civil, seja violando as normas municipais(22), seja o co-proprietário que execute obra com prejuízo/modificação da coisa comum, seja o particular que construa contra a lei, regulamento ou código de postura (art. 934, incisos I a III, do CPC), ou seja, a ação de nunciação pode fundamentar-se no direito de propriedade, no "jus possessionis"(23), do condomínio e da quebra de regras até mesmo municipais de obras, motivo pelo qual está situada entre as ações possessórias "lato sensu".

            Em busca de cumprimento do tema de nosso trabalho cabe observarmos o caráter possessório da ação de nunciação de obra nova, o qual está disposto no inciso I, do art. 934, do Código de Processo Civil.

            Tal dispositivo legal prevê que o "proprietário ou possuidor" pode valer-se desta ação de procedimento especial para afastar os prejuízos decorrentes de obra nova em prédio vizinho, não podendo o mero detentor ajuizar ação de nunciação, conforme observa Rita Gianesini que informa terem legitimidade ativa no caso do inciso I, do art. 934, do CPC, as seguintes pessoas:

            "Tem legitimidade ativa, portanto, o proprietário ou possuidor que possa ser prejudicado pela obra nova, assim como o titular do domínio, o enfiteuta, o usufrutuário, o usuário, o habitacionário, o comodatário, ou qualquer outro titular de direito real do uso e fruição, o testamenteiro, o inventariante, o curador de ausentes, o depositário, o administrador... Não tem, porém, legitimidade o mero detentor, por não possuir a coisa em nome próprio". (24)

            Temos como requisitos da ação de nunciação de obra nova uma obra nova em prédio vizinho que traga prejuízo ao bem imóvel do autor, sendo que o legitimado passivo para a ação é sempre o dono da obra prejudicial.

            Demanda como autor da ação de nunciação aquele que se vê prejudicado em face de obra em prédio vizinho e pese que esta obra por ilegal e prejudicial possa causar turbação ou esbulho ao proprietário ou possuidor, mesmo assim sua "causa petendi" será o prejuízo decorrente de obra ilícita proporcionada por confinante em imóvel vizinho, jamais a turbação ou o esbulho sofridos poderão ser "causa petendi" da nunciação de obra nova, o que tem levado inclusive alguns Tribunais Estaduais a decidirem ser possível a fungibilidade consagrada pelo art. 920, do CPC, às ações possessórias típicas quando o autor da nunciação visa tutelar a posse diretamente(25) atingida.

            A ação de nunciação de obra nova não pode ser tida como possessória "stricto sensu", haja vista que não tem por escopo proteger a situação fática estabelecida entre a pessoa e a coisa, pois conforme esclarece a professora Cláudia Aparecida Simardi é instrumento processual para:

            "... proteção do bem imóvel possuído (ou do qual se tenha o domínio) contra atos decorrentes do prosseguimento de construção, reforma, remodelação, demolição ou quaisquer atos que correspondam a uma nova obra prejudicial que esteja sendo realizada no imóvel vizinho. Verifica-se, portanto, que o ato ofensivo que se pretende paralisar com essa ação não é dirigido diretamente à posse, mas à própria coisa".(26)

            Os interditos possessórios típicos (ação de manutenção, reintegração de posse e interdito proibitório) têm como "causa petendi" a ameaça eminente ou concreta já sofrida pela coisa, ao passo que a causa de pedir da nunciação de obra nova e sempre o embargo da edificação em imóvel vizinho.

            Em síntese a ação de nunciação de obra nova pode tutelar de forma indireta a posse, todavia está possibilidade não a situa entre as ações de natureza possessória "stricto sensu" como desejaram alguns doutrinadores, pois a pretensão do autor é embargar a obra que está sendo construída e causando-lhe prejuízos, restando-lhe ser reconhecida como ação possessória "lato sensu", em detrimento de poder ser ajuizada pelo possuidor.

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7. Ação de imissão de posse

            Apesar de ser a ação de imissão de posse contemplada pelo Código de Processo Civil de 1.939 no capítulo referente às ações possessórias prevista nos art. 381 a 383, não entendemos tratar-se de ação possessória "stricto sensu", haja vista que encontra fundamentação no direito de possuir decorrente da propriedade(27) ("jus possidendi") contra os que detenham a coisa adquirida seja o alienante, seja terceiro em nome deste.

            O Código de Processo Civil de 1.973 não a mencionou entre as possessórias específicas, nem mesmo entre as ações de procedimento especial o que levou alguns doutrinadores a desconhecerem sua existência dentro do ordenamento jurídica por imprevisibilidade do novo estatuto processual de 1.973.

            Todavia, esta assertiva deve ser tida como falsa, pois mesmo ausente do Código de Processo Moderno (1973) sua previsão manteve-se expressa nos arts. 494 e 524, do Código Civil Brasileiro, como orienta Cláudia Simardi:

            "Tal assertiva, porém, não se sustentou por muito tempo, posto que o Código Civil continuou a dar amparo à pretensão da imissão, nos arts. 494 e 524, não sendo possível inadmitir a respectiva ação para o exercício desse direito conferido pela lei material. É o que estabelece o art. 75 do CC: "a todo direito corresponde uma ação que o assegura"(28).

            Em face da imprevisão legal do Código de Processo Civil de 1.973 acerca da inclusão da ação de imissão de posse entre os procedimentos especiais e possessórios e sua manutenção no ordenamento jurídico pela norma material a ação de imissão de posse passou a ser acatada pela doutrina e jurisprudência desde que o autor utilizasse a via máxima de cognição(29).

            Passada a discussão doutrinária acerca da mantença da imissão de posse em nosso ordenamento jurídico inobstante a não inclusão dela no quadro geral do diploma processual de 1.973, vamos analisar seu caráter possessório.

            Vislumbrando a letra da lei temos que a "causa petendi" do autor da ação de imissão de posse é nitidamente a existência de título aquisitivo da propriedade em seu nome e seu "petitum" é a obtenção da posse direta da coisa, a qual nunca existiu em poder do adquirente.

            Resta-nos analisar que estamos diante da figura do "jus possidendi", haja vista que o autor da ação de imissão de posse visa adquirir a posse em detrimento de seu direito de propriedade advindo do título, ou seja, estamos frente a frente quando tratamos da imissão de posse de uma ação de natureza dominial, de tal sorte que fundamentada na propriedade(30).

            Era ação exclusiva do adquirente que utilizando título de domínio (art. 382, do CPC/39) requeria para si a posse através de procedimento possessório contra o alienante ou o terceiro que detivesse a posse em seu nome(31), sendo que contestada a ação atingia-se o rito ordinário conforme prescrevia o art. 383, do CPC/39.

            O professor Ovídio A. Batista da Silva destaca em sua obra imprime o limite de alcance da legitimidade passiva desta ação:

            "A ação de imissão de posse jamais poderá ser concedida ao adquirente para haver a posse contra terceiros possuidores, ou, como veremos, sequer, contra detentores que não sejam servidores da posse em nome do próprio alienante".(32)

            Partindo das idéias do professor Ovídio da Silva entendemos ser a ação de imissão de posse de natureza dominial, pois em momento algum poderia ter a posse "per si" como fundamento, uma vez que a tutela jurisdicional procedente desta demanda deve conferir ao autor o direito à posse através da demonstração de um título aquisitivo da propriedade o que denota seu caráter petitório, não nos restando outra assertiva além da impossibilidade de inclui-la entre as ações possessórias "lato sensu" e "stricto sensu". Deve-se considerar, por último, a posição de contrária de alguns doutrinadores(33) para os quais a ação de imissão de posse detém caráter possessório.


8. Conclusão

            Estudadas as ações que não são os interditos possessórios típicos (ação de manutenção de posse, ação de reintegração de posse e interditos proibitório) é importante manter-se a idéia de que há outros meios processuais idôneos para a defesa da posse como os embargos de terceiros, todavia ações classicamente posicionadas entre as possessórias não merecem em face da legislação moderna este patamar como a imissão de posse, por exemplo.

            Assim, esperando ter alcançado o objetivo inicial deste estudo que era a transmissão de um posicionamento próprio a respeito da existência de outras ações de natureza possessória além das contidas no Código Civil e no Código de Processo Civil e sua justificação dentro da ciência do direito resta-me agradecer ao meu pai que me ajudou na pesquisa bibliográfica e emprestou o material necessário à confecção deste trabalho.

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Sobre o autor
Solon Angelim de Alencar Ferreira

advogado, pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil no Centro Integrado de Ensino da Amazônia (CIESA), mestrando e doutorando pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Solon Angelim Alencar. Outros meios processuais de defesa da posse. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 47, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/591. Acesso em: 24 abr. 2024.

Mais informações

Este trabalho alcançou nota máxima no Módulo de Direitos Reais ministrado pela Professora Maria Antonieta Zanardo Donato (Mestrado PUC/SP e Doutorando PUC/SP), e em no Curso de Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil desenvolvido no Centro de Ensino Integrado da Amazônia – CIESA no mês de setembro de 2000.

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