No segundo semestre de 2012, viajei até Taubaté, interior de São Paulo para conhecer a Fundação Casa – antiga FEBEM – e poder tornar mais palpável o objeto de estudo da minha monografia para conclusão do curso de Direito na UFF.
Tal visita teve êxito graças a um projeto da Defensoria Pública do Estado de São Paulo que seleciona pessoas para conhecerem a Fundação Casa e assistirem à reprodução de um filme junto aos menores internados em sala especial para tal fim, seguido de um debate.
A parte externa da instituição é similar a de um presídio comum, com muros altíssimos, muito policiamento e extrema burocracia para conseguir agendar uma visita. No hall de entradas a semelhança continua presente, percebendo-se diversos agentes carcerários, grades de proteção e revista pessoal.
O interior da Fundação Casa é que realmente a diferencia de um presídio para maiores de idade. A semelhança agora se dá com uma escola, vez que existem diversas salas de aula, muitos professores e voluntários circulando pelo ambiente e quadros negros preenchidos de lições de português.
Tive a oportunidade de conversar com a diretora daquela Fundação, Dra. Moradei, e notei empenho e dedicação em sua fala quando abordava a questão da infra-estrutura da instituição. Explicou-me que existe hoje uma parceria público-privada para tentar melhorar as condições da Fundação Casa e que já estava apresentando resultados dignos de aplausos.
Até entrar na sala reservada para a reprodução do filme não havia notado nenhum adolescente internado circulando pelos corredores, o que me causou estranheza. Após alguns minutos, os adolescentes apareceram enfileirados, de cabeça baixa, vestidos exatamente iguais e guiados por um agente carcerário nada simpático.
Apesar de quase todos ostentarem tatuagens que faziam referência à vida do crime, percebia-se que se tratava de crianças que cresceram rápido demais, com expressões sofridas no rosto e muitas cicatrizes pelo corpo.
Ali, comecei a perceber que a “escola” que eu havia notado era quase que uma farsa em função da visita que naquele dia ocorria. Percebi grades que separavam os “quartos” e uma tensão no ar que não era comum.
Durante a exibição do filme, aqueles que se atreviam a rir ou a comentar alguma coisa eram prontamente advertidos pelos funcionários da Fundação Casa e voltavam a ficar estáticos e mudos.
Ao final do filme, fez-se uma mesa redonda para discussão, onde o defensor público fez algumas considerações e abriu para perguntas, que não foram feitas por nenhum dos menores, por razões óbvias.
Quando saí da Fundação Casa fiquei com a impressão de que tudo não passava de uma encenação, que aqueles garotos deviam sofrer muito naquele local, mas eram “arrumados” para aquele tipo de visitas. Impressionante também era a falta de liberdade de expressão destes jovens e a perda da personalidade, vez que estavam todos uniformemente disciplinados, sem vontade própria e sem possibilidade de expressar seus sentimentos.
A visita foi satisfatória, tendo em vista que consegui tornar mais palpável o objeto de estudo e perceber que não se consegue ressocializar ninguém com a simples impossibilidade de se expressar. O que ocorre ali é uma neutralização dos impulsos e sentimentos de uma criança para conseguir vê-la adaptada a não pensar, não querer e não questionar.
A ressocialização é impossível nestes moldes e a visita mostrou que apesar de a estrutura da Fundação Casa estar adaptada aos fins da internação a ideologia de tratamento baseado em calar o interno não alcança estes objetivos e deve ser repensado para que não criemos um “rebanho de ovelhas” que só seguem o que lhes é indicado, sem pensar, questionar, protestar.
Em suma, a experiência serviu para demonstrar que a parceria público-privada neste caso pode ser muito útil e que já trouxe mudanças importantes em relação à infra-estrutura da Fundação Casa, mas que o que deve mudar mesmo é a forma de ressocializar os adolescentes que lá estão, tratando-as como seres pensantes que são, e não como um estorvo à sociedade que deve aceitar tudo aquilo que a ele é imposto.