Arguição de descumprimento de preceito fundamental - adpf e seus contornos já delineados pela jurisprudência do stf e pela doutrina

Arguição de descumprimento de preceito fundamental

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18/07/2017 às 14:46
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Legitimados para propositura de arguição de descumprimento de preceito fundamental

Quanto à legitimidade ativa para propositura da arguição, o texto enviado para sanção presidencial estabelecia no art. 2º, I, que são os mesmos legitimados para ação direta de inconstitucionalidade (vide art. 103 da CF) e no inciso II, previa a possibilidade de qualquer pessoa lesada ou ameaçada pelo poder público ter legitimidade ativa para propositura da arguição. No entanto, o referido inciso II foi vetado pelo Presidente da República.

O referido veto presidencial foi mantido, embora represente um retrocesso em relação ao princípio constitucional do acesso à justiça. Daí cabe a indagação da Professora Maria Garcia: “Quem senão o cidadão poderia deter a legítima titularidade de tal medida democrática?”

O § 1º do referido art. 2º dispõe que pode a pessoa lesada representar ao Procurador-Geral da República, e este examinando os fundamentos jurídicos do pedido, decide do cabimento do ingresso em juízo.

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre a legitimidade ativa para propositura da arguição, na ADPF nº 11-SP, proposta por Fábio Monteiro de Barros Filho, cujo autor teve a inicial indeferida sob o fundamento de que o mesmo não era titular da legitimatio ad causam ativa. Portanto, só os legitimados previstos no art. 103 da Constituição Federal podem propor a ADPF.


Arguição de descumprimento de preceito fundamental e ofensa reflexa à CF

Conforme noticiado no site do STF, em 14 de julho de 2017, “o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli não conheceu da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 468, ajuizada contra portarias do Ministério da Justiça e Segurança Pública que autorizam a atuação da Força Nacional no policiamento ostensivo do Estado do Rio de Janeiro. Para o ministro, é inviável o trâmite da ação no STF, uma vez que a análise da matéria demandaria o exame de normas infraconstitucionais.o ministro Dias Toffoli explicou que as “ofensas constitucionais” relatadas pelos autores da ação estão entremeadas com alegações de ofensas a normas infraconstitucionais. “Nesse quadro, a apreciação da suposta ofensa a preceito fundamental alegada pelos autores perpassaria, necessariamente, o exame do referido plexo normativo infraconstitucional. Resta evidente, portanto, que a suposta ofensa à Constituição Federal, caso configurada, seria meramente reflexa ou indireta, cuja análise não é cabível em sede de controle abstrato de constitucionalidade, conforme jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Federal.”


Principais inovações introduzidas pela Lei 9882/99 (ADPF)

Destacamos as principais inovações introduzidas pela Lei 9882/99, no nosso sistema de fiscalização da constitucionalidade de lei e ato normativo, que são as seguintes:

a) Natureza híbrida. A Lei 9882/99 começa a fundir o controle difuso e concentrado, de sorte que caminha para a consolidação de um modelo único de controle, qual seja, o concentrado, permitido, inclusive que o STF venha a declarar a inconstitucionalidade de atos municipais, o que só até então era permitido tão somente pela via difusa;

b) Modulação temporal e seus efeitos. A Lei 9882/99 dota o Supremo Tribunal Federal de competência para restringir os efeitos da decisão ou sobre o momento de sua eficácia em sede de ADPF, dispondo no art. 11 que ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de arguição de descumprimento de preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado;

c) Observamos, ainda, que a Lei 9882/99 inovou com a possibilidade de se impugnar normas pré-constitucionais perante o STF, ou seja, atribui competência ao Supremo Tribunal Federal para declarar a inconstitucionalidade de atos normativos editados anteriores a Constituição vigente que estejam em desacordo com o texto Constitucional de 1988. 


Conclusões

Após a breve reflexão sobre o advento da Lei nº 9.882/99 no corpo deste estudo, em cotejo com as posições do STF, chegamos as seguintes constatações: 

a) - Definição de preceito fundamental - Não há na referida Lei, nem ainda foi definido com precisão pela doutrina o que seja preceito fundamental. Todavia, em princípio, todo dispositivo constitucional corresponde a um preceito fundamental; 

b) - Meio eficaz de sanar a irregularidade. No sistema de controle difuso há vários instrumentos para sanar irregularidades de normas em desacordo com a Constituição, a princípio uma das hipóteses que se vislumbra de caber à arguição, em face de ineficácia do meio, é na decisão definitiva proferida no mandado de injunção, onde o Poder Legislativo não tem prazo para cumprir a omissão; 

c) - A propositura da ação constitucional de arguição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do art. 4º, § 1º, da Lei nº 9.882/99, rege-se pelo princípio da subsidiariedade. De modo que, o STF tem firmado entendimento no sentido de que não é admitida a propositura da referida ação quando houver qualquer outro meio juridicamente idôneo, apto a sanar, com efetividade real, o estado de lesividade emergente do ato impugnado; 

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d) - Finalmente, pode-se afirmar que mesmo em razão da regulamentação do art. 102, § 1º da Constituição Federal, pela nº 9882/99, ainda há necessidade de se traçar, com mais precisão, os contornos da ação de descumprimento de preceito fundamental. Tarefa esta que depende do esforço conjunto da doutrina e do Supremo Tribunal Federal.


Referências Bibliográficas

BRASIL. www.stf.gov.br/Informativo

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Sobre o autor
Francisco de Assis Cabral

Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pelo UNIPÊ/JPA (1991). Mestre em Direitos Fundamentais pelo UNIFIEO-SP. (concluído em 2005, sob orientação da Profa. Dra. Anna Cândida da Cunha Ferraz - Livre Docente e Professora Associada da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – FD-USP). Ex-Procurador da FUNDAC/PB – Fundação de Desenvolvimento da Criança. Filiado ao Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC, ao Instituto de Hermenêutica Jurídica – IHJ e ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito (CONPEDI) . Advogado em São Paulo de 1993 a 2003. Ex-Professor de Direito Constitucional e Hermenêutica Jurídica da Faculdade Integrada do Recife – Primeiro colado na seleção pública de docente para a disciplina de Direito Constitucional – I na Faculdade Integrada de Pernambuco - FACIPE (2008). Obras do autor: a) coautor da obra Constituição Federal Interpretada - artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. Coordenador/Organizador: Machado, Antônio Cláudio da Costa & Ferraz, Anna Cândida da Cunha. São Paulo: 8ª edição, Editora Manole, 2017; b) Controle de constitucionalidade. Editora Schoba, Salto-São Paulo 2009; c) Controle de constitucionalidade. 2ª edição, Editora Saraiva, São Paulo 2016.

Informações sobre o texto

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