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A tutela provisória e seus traços marcantes

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01/02/2018 às 13:00
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3. TUTELA ANTECIPADA

Na sequência serão analisadas as principais características das tutelas provisórias antecipadas de urgência, que, no que não forem incompatíveis, aplicam-se também as tutelas de evidência, bem como a ambas as modalidades, de urgência e de evidência, quando concedidas incidentalmente.

3.1. Tutela Antecipada de Urgência

A tutela antecipada, que como já dito anteriormente, objetivando a divisão do ônus representado pelo tempo do processo, pode deslocar no tempo os efeitos que só seriam produzidos ao final, pode fundar-se, a exemplo do que já ocorria quando da vigência do Código de Processo Civil de 1973, em urgência ou em evidência do direito.

A possibilidade genérica da antecipação dos efeitos da tutela, vale dizer, a possibilidade de sua concessão no curso do procedimento ordinário (hoje comum), qualquer que fosse a natureza da questão levada a Juízo, é relativamente recente em nosso sistema.

Apenas com a reforma processual de 1994, que trouxe significativas alterações ao Código de 1973, é que, com a nova redação dada ao artigo 273 do codex, foi aberta ao Magistrado a possibilidade da antecipação do provimento final, sem a necessidade de utilização, ainda que fora de seu habitat natural, das medidas cautelares.

A criação de um novo instituto jurídico fez com que a doutrina, de pronto, buscasse diferenciar a tutela antecipada da tutela cautelar. Não foram poucos os esforços da doutrina, mesmo, para evidenciar supostas diferenças entre os requisitos para utilização de cada uma delas. Para muitos, a verossimilhança necessária para antecipação da tutela divergia do fomus boni iuris que autorizava a cautela.

Com a uniformização do tratamento dada às tutelas urgentes, porém, trazida pelo novo diploma processual, essa discussão perdeu sua alma. Atualmente, os requisitos são os mesmos. Não que antes não fosse, mas agora não há mais espaço para qualquer discussão a respeito.

Segundo escreve Cássio Scarpinella Bueno:

A concessão da “tutela de urgência” pressupõe: (a) probabilidade do direito; e (b) perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300, caput). São expressões redacionais do que é amplamente consagrado nas expressões latinas fomus boni juris e periculum in mora, respectivamente.

A despeito da conservação da distinção entre “tutela antecipada” e “tutela cautelar” no CPC de 2015, com importantes reflexos procedimentais, é correto entender, na perspectiva do dispositivo aqui examinado, que os requisitos de sua concessão foram igualados. Não há, portanto, mais espaço para discutir, como ocorria no CPC de 1973, que os requisitos para concessão da tutela antecipada (“prova inequívoca da verossimilhança da alegação”) seriam, do ponto de vista da cognição jurisdicional, mais profundos que os da tutela cautelar, perspectiva que sempre me pareceu enormemente artificial. Nesse sentido, a concessão de ambas as tutelas de urgência reclama, é isto que importa destacar, a mesma probabilidade do direito além do mesmo perigo de dano ou risco ao resultado útil ao processo.

Sequer sobrevive, para o CPC de 2015, a diferença (artificial) entre o perigo de dano e o risco ao resultado útil do processo sugerida por alguns para distinguir, respectivamente, a tutela antecipada (vocacionada a tutelar o próprio direito material) e a tutela cautelar (vocacionada a tutelar o processo) no contexto do CPC de 1973. Aqueles dois referenciais – denotativos da necessidade urgente da intervenção jurisdicional – são empregados indistintamente para aquelas duas espécies. (2016, p. 254).

Assim é que, como já adiantado, reza o novo Código de Processo Civil, em seu artigo 300, que, para concessão das tutelas provisórias de urgência, sejam cautelares, sejam antecipatórias, dois requisitos devem estar presentes. Conforme diz Arruda Alvim:

O art. 300. do CPC/2015 apresenta, para concessão da tutela de urgência, dois requisitos a serem demonstrados pelo requerente: (a) a probabilidade do direito; e (b) o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Trata-se, na verdade, da conjugação de elementos que sempre estiveram presentes nas disposições legais a respeito do tema. (2016, p. 172).

No mesmo sentido a lição de Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

A tutela antecipada de urgência deve ser concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300. do CPC). (2015, p. 99).

Com a vigência do novo Código fica superada qualquer possibilidade de discussão acerca da similitude, equivalência ou distinção outrora existente entre o fomus boni iuris, que o Código de Processo Civil revogado trazia como fundamento para a concessão da tutela cautelar, e a verossimilhança das alegações, que justificava a concessão da antecipação de tutela. Vige agora a ideia da probabilidade do direito, tão somente. Conforme escreve Ester Camila Gomes Norato Rezende:

Quanto aos requisitos das tutelas de urgência, contudo, a opção do legislador no art. 300. do novo Código foi não reproduzir a distinção que tradicionalmente se fez entre fomus boni iuris e verossimilhança das alegações, aduzindo tão somente a “probabilidade do direito” como requisito necessário para concessão tanto da tutela antecipada, quanto da medida cautelar. (2015, p. 196).

Atualmente, assim, tanto para a concessão das tutelas cautelares quanto antecipadas, fundadas em urgência, o código exige a probabilidade do direito. Eis que o escreve Guilherme Lunelli:

No que toca à teoria geral das tutelas de urgência, talvez o maior passo dado pelo novo código foi a superação da antiga discussão doutrinária acerca das possíveis diferenças entre os requisitos presentes no código de 1973 para a concessão da tutela antecipada com base em urgência (verossimilhança das alegações e fundado receio de dano) e da tutela cautelar (fomus boni juris e periculum in mora).

Reconhecendo a artificialidade na distinção “de grau” entre os requisitos, mormente no momento cognitivo, o novel diploma unifica os pressupostos de cabimento das medidas de urgência. (2015, p. 130).

Em síntese, e uma vez mais repetindo Guilherme Lunelli:

Assim, passam a ser requisitos para a concessão tanto de tutelas antecipadas quanto cautelares: (i) probabilidade de direito e (ii) perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Trata-se de requisitos cumulativos que, para a concessão de medida, deverão sempre ser somados e demonstrados. (2015, p. 131).

Por fim, além da probabilidade do direito um segundo requisito deve estar presente para concessão da tutela provisória antecipada de urgência, qual seja, o perigo de dano.

Muitas vezes, porém, não tem o autor meio de fazer provas estanques da situação de urgência. Não raras vezes a própria urgência impede a prova. Cabe aqui a sensibilidade do Magistrado para avaliação desta prova, cuja falta não deve ser um impeditivo para realização de um direito.

A par disso, por sua própria natureza, a tutela provisória funda-se em cognição sumária, compatível com certo grau de dúvida.

Esclarecedoras as palavras de Marcelo Abelha:

Claro que a própria situação de urgência coloca o reclamante muitas vezes numa posição fragilizada e hipossuficiente em relação à prova da urgência, e por isso o magistrado deve reconhecer que a cognição sumária decorrente do adiantamento da tutela implica aceitar que nem os fatos nem as eventuais provas desses fatos são inicialmente apresentados de modo completo. Isso tudo para evitar o risco de que a referida tutela prestada seja inútil porque a prova da urgência não foi satisfatória no momento em que foi reclamada. (2016, p. 406).

Especificamente no que toca à tutela antecipada de urgência, deve estar presente um requisito negativo, vale dizer, diz o Código que não será concedida a tutela antecipada de urgência, quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Como diz Cássio Scarpinella Bueno:

De acordo com o § 3º do art. 300: “a tutela de urgência, de natureza antecipada, não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”. Trata-se de verdadeiro “pressuposto negativo”, que quer inibir a antecipação da tutela no caso do que é comumente chamado de “periculum in mora inverso”. (2016, p. 255).

A mesma observação é feita por Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

Especificamente para a tutela de urgência, de natureza antecipada, por ter caráter satisfativo, além dos requisitos citados, também se exige a ausência de perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (art. 300, § 3º, do novo CPC). (2015, p. 99).

Esta previsão também não é nova, e já estava presente no Código de 1973, como revela Ester Camila Gomes Norato Rezende:

Registre-se, porém, que mesmo inovando ao traçar a possibilidade de estabilização da tutela antecipada, preenchidos certos requisitos, o Novo Código de Processo Civil mantém a orientação, constante do Código de Processo Civil de 1973, de reversibilidade desta espécie de tutela de urgência, a dispor no § 3º o art. 300. que “a tutela de urgência, de natureza antecipada, não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”. (2015, p. 197).

Tal requisito negativo nunca foi visto com bons olhos pela doutrina, ante a possibilidade, que poderia se abrir, do próprio esvaziamento do instituto. Como escrevem Luiz GuilhermeMarinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Na contramão da lógica do provável, refere o art. 300, § 3.º, que “a tutela de urgência, de natureza antecipada, não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”. Em virtude dessa regra, seria possível pensar que o juiz não pode conceder tutela antecipatória quando ela puder causar prejuízo irreversível ao réu. Contudo, se a tutela antecipatória, no caso do art. 300, tem por objetivo combater o perigo na demora capaz de produzir um ato ilícito ou um fato danoso – talvez irreparável – ao direito provável, não há como não admitir a concessão dessa tutela sob o simples argumento de que ela pode trazer um prejuízo irreversível ao réu. Seria como dizer que o direito provável deve sempre ser sacrificado diante da possibilidade de prejuízo irreversível ao direito improvável. (2015b, p. 237).

Assim é que, também já desde o Código revogado, ao comentar este ponto, a doutrina sempre colocou sob holofotes a necessidade da ponderação dos valores em jogo. Como diz Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

Não obstante, essa questão deve ser avaliada pelo juiz em cada caso concreto, ponderando os valores em discussão, pois o direito que se objetiva garantir por meio da tutela antecipada pode ter peso superior à eventual alegação de irreversibilidade. (2015, p. 101).

Expondo a mesma ideia, mas com mais vagar, escrevem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, ressaltando que devem ser considerados o valor em jogo e o perigo a que submetido o direito do autor:

A superação da proibição da concessão de antecipação da tutela cujos efeitos são irreversíveis pressupõe a demonstração de que a vedação, acaso observada no caso concreto, frustrará o direito à tutela adequada, efetiva e tempestiva do direito do autor. A resistência à superação deve ser tanto menor quanto maior for o perigo de o direito do autor ser violado igualmente de maneira irreversível sem a antecipação da tutela e quanto mais importante for constitucionalmente o bem jurídico que se pretende proteger com a técnica antecipatória. Nesse caso, deve prevalecer a lógica da tutela do direito provável em detrimento do direito improvável, sob pena de a ordem jurídica confessar-se impotente diante da ameaça ou da efetiva violação dos direitos. (2015a, p. 205).

Ainda, dizem também Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, que sempre deve ser dada guarida ao direito provável, em detrimento do direito improvável. Havendo risco, o direito provável deve ser protegido:

Não há qualquer lógica em não admitir a concessão da tutela antecipada destinada a combater o perigo na demora sob o argumento de que sua concessão pode trazer prejuízo irreversível ao demandado. Em algumas situações não há como não se aceitar o risco de eventual prejuízo ao demandado. Nos casos em que o direito do autor (que deve ser mostrado como provável, uma vez que a probabilidade do direito é requisito para a própria concessão da tutela antecipada), está sendo ameaçado por perigo na demora, é ilógico não se conceder a tutela sumária com base no argumento de que ela pode trazer um dano ao direito que é improvável. (2015b, p. 238).

Parte da doutrina, ainda que chegando à mesma conclusão, trilha caminho diverso. Guilherme Lunelli argumenta, em situação como a agora em discussão, que o aplicador do direito coloca-se frente à verdadeira inconstitucionalidade. Como diz o autor:

Trata-se de opção que merece algumas observações. Doutrina e jurisprudência, há muito, vêm se posicionando no sentido de que a exigência de reversibilidade do provimento (ou de seus efeitos – parece-nos que a mudança redacional pouca coisa muda) é condição que, diante dos valores em jogo no caso em litígio, permitiria a flexibilização dos rigores da exigência legal. Para nós, a situação não deve ser encarada propriamente como um simples juízo de “ponderação de valores” (afinal, a lei democraticamente instituída não pode simplesmente ser afastada conforme livres valorações subjetivas do julgador), mas, sim, de controle difuso de constitucionalidade. Diante das peculiaridades da situação levada a juízo, poder-se-ia, mediante decisão judicial suficientemente fundamentada, considerar o texto, naquele caso concreto, inconstitucional, afastando-se a sua aplicação. (2015, p. 131/132).

Cássio Scarpinella Bueno adota a mesma posição, expondo que:

É necessário superar a interpretação literal do dispositivo para contornar o reconhecimento de sua inconstitucionalidade substancial: a vedação da concessão da tutela antecipada fundamentada em urgência nos casos de irreversibilidade não deve prevalecer nos casos em que o dano ou o risco que se quer evitar ou minimizar é qualitativamente mais importante para o requerente do que para o requerido. É implícito ao sistema – porque decorrente do “modelo constitucional” – o chamado “princípio da proporcionalidade” a afastar o rigor literal enunciado pelo dispositivo. (2016, p. 255).

Não é demais lembrar, porém, que também há aqueles que vêem, na previsão do requisito da reversibilidade dos efeitos da decisão, verdadeira consagração de princípios constitucionais protetivos do réu, como Arruda Alvim:

O art. 300, § 3º, do CPC/2015, diz que a tutela de urgência “não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”. A reversibilidade é necessária até mesmo pela regra do art. 5º, LIV e LV, da CF/1988, pois, se irreversível fosse, alguém restaria condenado sem o devido processo legal e sem a garantia do contraditório. Mas poderá ser mitigada a regra geral quando o bem da vida a ser protegido tenha uma grandeza superior. (2016, p. 174).

Há de se ressaltar, porém, que ainda que com fundamentos diversos, como exposto, tanto doutrina quanto jurisprudência são unânimes em afirmar que a questão da irreversibilidade dos efeitos da decisão cede passo à realização de valores mais caros ao ordenamento. Segundo as palavras de Arruda Alvim:

Essa regra geral de irreversibilidade tem sido acatada pelos tribunais, em especial pelo STJ. No entanto, e em situações absolutamente excepcionais, deve ceder em face de um bem jurídico de significação maior. Incide aí um necessário juízo de proporcionalidade entre direitos fundamentais que podem vir a ser lesados e o direito (também fundamental) à tutela jurisdicional definitiva concedida após o devido processo legal. (2016, p. 175).

O próprio Código de Processo Civil, contudo, previu um remédio jurídico para a hipótese, tornando possível a concessão da tutela provisória de urgência, mesmo quando presente a possibilidade da irreversibilidade dos efeitos da decisão judicial. Assim é que o CPC abre a possibilidade de que o Magistrado exija, daquele que postula a tutela provisória que pode ter efeitos definitivos, a prestação de caução. Citando palavras de Ester Camila Gomes Norato Rezende:

Assim, vislumbrando que a concessão da ordem cautelar ou de tutela antecipada se sujeita ao perigo de, concluída a prestação jurisdicional definitiva, a parte que suportou o provimento provisório sofrer grave dano, o magistrado pode valer-se da caução como medida de contracautela, como remédio ao risco causado pela tutela de urgência. (2015, p. 198).

Até o momento nenhuma grande novidade, quando comparados os códigos, atual e revogado.

Sensível mudança veio, porém, no que toca ao momento em que a tutela antecipada de urgência pode ser pedida. Aqui, mais uma vez, o Código de Processo Civil aproximou os regimes das tutelas antecipada e cautelar ao permitir, a exemplo do que já ocorria com estas, no regime processual anterior, o requerimento de tutela antecipada de urgência em caráter antecedente, antes mesmo da exata delimitação da lide. Eis o que diz Arruda Alvim a respeito:

No CPC de 1973, as medidas de caráter antecipatório eram requeridas a qualquer momento durante o trâmite do processo que visava à resolução definitiva do mérito. Isto é, o momento inicial para sua postulação seria o da petição inicial. Neste ponto o CPC/2015 apresenta uma inovação significativa, possibilitando que a satisfação do direito ocorra mesmo antes da propositura da ação ordinária. Trata-se da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, disposta nos arts. 303. e 304 do CPC/2015. (2016, p. 181).

Neste ponto, mais uma vez, o Código mereceu críticas da doutrina. Conforme escreve Guilherme Lunelli:

Anteriormente, ao falarmos de tutela antecipada, dissemos tratar-se de medida de cunho satisfativo, que adianta total ou parcialmente o próprio provimento final pretendido. Firmes em tal premissa, parece-nos que a técnica adotada pelo legislador foi, no mínimo, estranha. Isto, pois, por intermédio dela, em última medida, adianta-se um provimento final sem que sequer já exista pedido de provimento final. Em verdade, adianta-se uma expectativa de pedido final – que só virá com o aditamento. (2015, p. 138)

De fato, causa estranheza a possibilidade de antecipação de um provimento ainda não formulado. Ficaria o autor adstrito ao quanto narrado na petição em que pediu a tutela antecipada antecedente? A resposta positiva parece resolver a questão. O fato, porém, é que a ferramenta processual foi colocada à disposição dos operadores do direito. A questão está posta e somente a passagem do tempo e o aperfeiçoamento da sua utilização trarão a resposta à luz.

Luz que também pode alterar a percepção dos fatos, antes objeto apenas de cognição sumária. Por ser provisória, a tutela antecipada de urgência pode ser revista qualquer tempo, em decorrência do aprofundamento da cognição e da vinda de novas provas aos Autos. Esta característica foi objeto de comentário de Cássio Scarpinella Bueno:

Não obstante, e justamente por causa de sua característica, a provisoriedade, a tutela aqui estudada pode ser revogada ou modificada “a qualquer tempo”. A expressão, extraída do caput do art. 296, deve ser compreendida de acordo com o sistema dopróprio CPC de 2015: a revogação ou modificação da tutela provisória pressupõe aprofundamento de cognição e, ainda quando for tomada de ofício pelo magistrado, prévio contraditório (arts. 9º e 10). (2016, p. 252).

Importante ressaltar, porém, que somente com fundamento em novas evidências a decisão que concedeu a antecipação pode ser revista. Somente um novo estado de coisas autoriza o Magistrado a modificar a situação jurídica das partes. Neste sentido:

Assim, não será possível reacender e rediscutir a análise do provimento adiantado urgente, ainda que provisório, desde que com fulcro na mesma cognição, com base nas mesmas provas e fatos que ensejaram a concessão da medida, sob pena de se criar uma insegurança jurídica indesejável para o sistema. (ABELHA, 2016, p. 412)

E segue Marcelo Abelha dizendo que:

A cessação da situação de risco serve de fundamento para que a parte possa requerer a sua revogação, o que pode se dar no curso do processo onde foi concedida, ou até mesmo de forma autônoma quando o processo (na qual a medida for concedida) tiver findo. (2016, p. 407).

Já adiantado, linhas acima, que o novo Código de Processo Civil trouxe algumas mudanças, notadamente procedimentais, à tutela antecipada de urgência, que serão analisadas a seguir.

3.1.1. Questões Procedimentais

Uma das grandes novidades trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015 consiste na possibilidade da formulação de pedido de tutela de urgência antecedentemente, ainda que antecipada. Cumpre notar que, no regime anterior, apenas havia a possibilidade de tutelas cautelares fossem requeridas antes da apresentação do pedido em si.

Conforme escreve Cássio Scarpinella Bueno:

Para o prezado leitor mais experimentado, que já traçou suas primeiras linhas (e quiçá outras tantas) durante a vigência do CPC de 1973, a mesma afirmação tem significado muito mais complexo, até chocante, porque até o advento do CPC de 2015, o direito processual civil brasileiro desconhecia uma tutela antecipada antecedente, característica exclusiva da tutela cautelar. Aliás, essa era uma das diferenças objetivamente constatáveis entre aquelas duas formas de tutela e que justificava, até mesmo, a distinção feita, desde a teoria geral do processo, entre os “processos de conhecimento”, de “execução” e “cautelar”. (2016, p. 257/258).

E mais do que isso, ao que parece o legislador pretendeu transformar a tutela antecipada antecedente em regra, tanto que pouco se dedicou à disciplina da tutela antecipada incidental. Ainda seguindo o raciocínio de Cássio Scarpinella Bueno:

A única regra específica do CPC de 2015 sobre a tutela provisória requerida em caráter incidental (durante o processo) está no art. 295. Como se lê daquele dispositivo, “a tutela provisória requerida em caráter incidental independe do pagamento de custas”. (2016, p. 253).

Como não poderia deixar de ser, o Juízo competente para concessão da tutela antecipada é aquele da causa.

Em sendo a tutela antecipada incidental, não há espaço para discussão. Da mesma forma, em sendo a tutela antecipada antecedente, o Código é claro ao estabelecer que a competência é do Juízo a que cabe a apreciação do pedido principal, que será posteriormente formulado. Neste sentido escreve Guilherme Lunelli:

No que concerne ao juízo competente para apreciar a tutela provisória, pouco muda. Será esta requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal. A distribuição de requerimento antecedente, seja este apreciado ou não, exista ou não a sua complementação via aditamento, tornará prevento o juízo. Entendimento diverso possibilitaria a parte burlar o princípio do juiz natural.

Ressalvada disposição legal em contrário, nas ações de competência originária dos tribunais, ou mesmo em sede recursal, a tutela provisória será requerida ao órgão jurisdicional responsável pelo julgamento do mérito da ação ou do recurso. Mais uma vez, nenhuma novidade. (2015, p. 128/129).

Como não poderia deixar de ser, ante a clareza da regra legal, Marcelo Abelha também escreve que:

A regra não poderia ser mais clara, pois se se tratar de pedido incidental no curso do processo, então o pedido de tutela provisória deverá ser dirigido ao próprio juízo da causa, mas se for requerida em processo antecedente, isto é, antes de ser proposta a demanda principal, então deve ser requerida no respectivo juízo onde se pretenderá discutir ou satisfazer o referido direito.

Tratando-se de competência originária e/ou derivada no âmbito dos tribunais, prevalece a regra de que ela será requerida ao órgão jurisdicional com competência para apreciação definitiva do mérito da demanda ou do recurso. (2016, p. 399/400).

Por fim, para encerrar este ponto, simplificam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Na linha com o seu caráter interinal, a tutela sumária deve ser requerida ao juiz da causa, não dando lugar a um incidente processual ou a um processo autônomo. É um ato do procedimento. Apenas quando antecedente dará lugar a um processo autônomo, o qual posteriormente será complementado por outro processo destinado à tutela definitiva do direito. A competência, no entanto, não varia – o juízo competente para conhecer o pedido de “tutela provisória” é o juízo competente para prestar tutela jurisdicional ao direito de forma definitiva. (2015a, p. 208).

Seguindo, e neste ponto não há qualquer novidade, e nem há espaço para tal, a decisão judicial que aprecia o pedido de tutela de urgência, seja para negá-la ou para concedê-la, deve ser fundamentada. Segundo Cássio Scarpinella Bueno:

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A decisão que conceder, negar, modificar ou revogar, a tutela provisória, precisa ser fundamentada. É o que o art. 298. exige, ao dispor que o “juiz justificará as razões de seu convencimento de modo claro e preciso”. (2016, p. 251).

Verdadeira novidade, trazida pelo recente diploma processual, consiste em que restou facultada à parte, quando a urgência é concomitante à propositura da ação, a formulação, unicamente, do pedido de tutela antecipada de urgência, postergando a apresentação do pedido da tutela final. Assim escreve Cássio Scarpinella Bueno:

De acordo com caput do art. 303, quando a urgência for contemporânea à “propositura da ação”, ou seja, à época do protocolo da petição inicial (art. 312), o autor pode limitar-se a apresentar petição inicial em que requeira a tutela antecipada – conquanto deva indicar o pedido de “tutela final” (que só pode ser a tutela jurisdicional pretendida sobre o interesse perseguido em juízo, mesmo e independentemente da tutela antecedente) -, e na qual exponha a “lide” (a controvérsia com a parte contrária, que justifica o pedido de tutela), o direito que pretende realizar, além do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. (2016, p. 258).

Segundo escreve Arruda Alvim, é inegável a aproximação do novo regime das tutelas antecipadas ao que já existia no regime anterior, mas que era voltado, unicamente, às tutelas cautelares:

De certa forma, mas com algumas reservas, o procedimento da tutela antecipada antecedente se assemelha com o que ocorre nas medidas cautelares preparatórias do CPC/1973 (arts. 796. e 806). O autor deve sumarizar seu pedido, comprometendo-se a futuramente mover a ação correspondente sob risco de revogação da medida de urgência. Guardadas as devidas proporções, o mesmo ocorre aqui. (2016, p. 182).

Esta aproximação também foi destacada por Ester Camila Gomes Norato Rezende:

O art. 303. do novo Código de Processo Civil trata da tutela antecipada antecedente, inovação em comparação regulação vigente sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, que apenas previa expressamente a dedução da pretensão urgente satisfativa concomitante ou quando já deduzida a pretensão principal. O novo Código de Processo Civil aproxima o procedimento da tutela antecipada daquele empregado para a medida cautelar, permitindo que ambas, como integrantes do gênero tutela de urgência, possam ser requeridas antes de se deduzir em juízo o pedido principal, situação que se justifica quando a urgência do provimento provisório assim reclama. (2015, p. 202)

A petição que leva a Juízo o pedido de tutela antecipada antecedente deve expor, ainda que forma sucinta, os fatos em que se funda e indicar qual será o pedido de tutela final. Além disso, por óbvio, deve evidenciar a situação de perigo. Esta é a lição de Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

Nos casos em que urgência for contemporânea à propositura da ação (ou seja, quando a urgência existe quando do ajuizamento da demanda), a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição sumária da lide (entendido, aqui, como o conflito que deu origem à propositura da ação), do direito que se busca realizar e do perigo e dano ou do risco ao resultado útil do processo (art. 303. do CPC). (2015, p. 102).

Posteriormente caberá à parte o aditamento da petição inicial, a fim de que, na mesma relação processual já estabelecida pelo pedido de concessão de tutela antecipada, seja processado o pedido da tutela final. Assim escreve Ester Camila Gomes Norato Rezende:

No novo Código de Processo Civil, no entanto, o pedido principal é deduzido na mesma relação jurídico-processual inaugurada pela pretensão de urgência, pela via do aditamento da petição inicial, que representará cumulação de pedido, não sendo necessário, pois, instalar nova relação, como se verifica na regulação da medida cautelar antecedente no Código de Processo Civil de 1973. (2015, p, 203).

Ainda que claro, nunca é demais observar, como diz Cássio Scarpinella Bueno, que o valor da causa é aquele do pedido final:

A petição inicial elaborada pelo autor, no caso de a tutela antecipada ser requerida antecedentemente, deverá também indicar o valor da causa levando em consideração “o pedido de tutela final” (art. 303, § 4º) e manifestar sua vontade de valer-se do “beneficio previsto no caput deste artigo” (art. 303, § 5º). (2016, p. 259).

Contudo, e como dito, a adoção da nova sistemática é facultada à parte, que, caso entenda mais conveniente, pode desde logo apresentar em Juízo o pedido de tutela final, requerendo sua antecipação, tal qual ocorria anteriormente. Neste sentido a lição de Ester Camila Gomes Norato Rezende:

É claro que é possível que o requerimento do provimento de urgência seja deduzido logo na petição inicial do feito, reclamando-se por uma prestação jurisdicional de plano em vista da urgência exigida no caso concreto. (2015, p. 200).

Via de regra, e isso parece consequência lógica da própria urgência que justifica a formulação do pedido de tutela de urgência de forma antecedente, ela pode e deve ser concedida liminarmente, vale dizer, sem que se dê oportunidade de manifestação à parte contrária. Assim escreve Cássio Scarpinella Bueno:

A “tutela de urgência” pode ser concedida liminarmente, no início do processo sem a oitiva da parte contrária, ou após justificação prévia (art. 300, § 2º). A concessão liminar é absolutamente harmônica com o “modelo constitucional”. É situação bem aceita de preponderância do princípio da efetividade do direito material pelo processo sobre os do contraditório e da ampla defesa. Por isto mesmo é correto entender que a hipótese envolve mera postergação (adiamento) do contraditório, não sua eliminação. Concedida a tutela provisória, é mister que o réu seja citado (para o processo) e intimado de sua concessão para reagir a ela, inclusive, se assim entender, recorrer dela por agravo de instrumento (art. 1.015, I). (2016, p. 254/255).

Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero detalham as hipóteses em que o contraditório pode ser postergado, sem ofensa ao ordenamento jurídico:

Quando a parte postula tutela do direito mediante decisão provisória fundada na urgência, o contraditório poderá ser postergado: (i) quando a oitiva da parte contrária for capaz de colocar em risco a possibilidade de obtenção da tutela específica do direito do autor, isto é, quando a demora inerente à formação do contraditório implicar concretização da ameaça que se pretende inibir, reiteração de ilícito ou a sua continuação, ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação ou agravamento injusto do dano experimentado pela parte; e (ii) quando a oitiva da parte contrária for capaz de colocar em risco a eficácia da tutela provisória, isto é, quando a atuação da parte contrária for capaz de frustrar o resultado que com ela se pretende obter. A possibilidade de o tempo ou a atuação da parte contrária frustrar a efetividade da tutela sumária constitui pressuposto para postergação do contraditório no processo civil. Isso vale tanto para a concessão liminar da tutela satisfativa (tutela antecipada) como para a tutela cautelar. (2015a, p. 207).

A possibilidade da concessão liminar, porém, não deve transformar a tutela antecipada antecedente em assassina do contraditório. Sempre que possível, desde que não coloque em risco a efetividade da medida, a parte contrária deve ser ouvida, antes da decisão acerca da concessão, ou não, da antecipação. Segundo a lição de Arruda Alvim:

A tutela de urgência, via de regra, é concedida sem a oitiva da parte contrária, dada a rapidez com que precisa ser analisada. No entanto, embora o art. 9º, I, do CPC/2015, seja expresso em permitir que a tutela provisória de urgência seja decidida sem a manifestação da parte contrária, é sempre saudável que institutos como este respeitem o princípio da bilateralidade da audiência. (2016, p. 173/174).

Entendendo o Magistrado que não estão presentes os requisitos autorizadores para a concessão da medida urgente, pode ele determinar a realização de audiência de justificação, em que caberá ao interessado a prova respectiva. Também nesse caso, conforme entende Cássio Scarpinella Bueno, o contraditório pode ser postergado:

A “justificação prévia” referida pela parte final do § 2º do art. 300. merece ser compreendida como a designação de audiência para que o requerente da tutela provisória produza prova (notadamente, embora não necessariamente, a oral) relativa à presença dos requisitos autorizadores. Aqui também, justamente por se tratar de tutela provisória fundamentada em urgência, é legítima a postergação da citação do réu, ainda que o caso seja de designação de referida audiência. (2016, p. 255).

Ainda citando as palavras de Cássio Scarpinella Bueno, uma vez determinada a citação do réu, resta evidente que o pedido formulado pelo autor, ainda que não explicitamente, foi negado pelo Magistrado. Da decisão negativa, abre-se espaço para interposição do recurso de agravo de instrumento. Vejamos:

Se o magistrado entender que o caso concreto, a despeito da alegação de urgência do requerente, aceita o prévio estabelecimento do contraditório, a determinação de citação equivale ao indeferimento da tutela provisória de urgência, sendo importante entender que se trata de decisão agravável de instrumento nos moldes do mesmo artigo que acabei de indicar. (2016, p. 255)

De outro lado, concedida a antecipação da tutela, caberá ao autor o aditamento da petição inicial, que, de forma sucinta, trouxe o pedido de tutela de urgência a Juízo.

Poderá o autor complementar sua argumentação, tanto de fato quando de direito, bem como apresentar novas provas, e deverá formular o pedido de tutela final. O prazo é de 15 dias, caso outro maior não seja fixado pelo Juiz.Assim diz Cássio Scarpinella Bueno:

Se concedida a tutela antecipada, o autor deve aditar a petição inicial, complementando sua argumentação, juntando, se for o caso, novos documentos e confirmando o pedido de “tutela final” (meramente indicado de início), tudo no prazo de quinze dias, salvo se o magistrado conceder prazo maior (art. 303, § 1º, I). (2016, p. 259).

O aditamento da petição inicial não é faculdade do autor, mas imposição legal. Deve o autor formular o pedido de tutela final, sob pena de que a ação seja extinta, sem apreciação de mérito, com a revogação da antecipação concedida. Nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Concedida a tutela antecipada na forma antecedente, tem o autor o ônus de aditar a petição inicial, com a complementação da sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em quinze dias ou em outro prazo que o juiz fixar (art. 303, § 1.º, I). O aditamento da petição inicial dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais (art. 303, § 3.º). Não realizado o aditamento, o processo será extinto sem resolução do mérito (art. 303, § 2.º).

Realizado o aditamento, o réu será citado para a audiência de conciliação ou de mediação (art. 334). Não havendo autocomposição, começará a fluir o prazo para contestação (art. 335). (2015a, p. 215).

Ainda, concedida a antecipação o Código manda que o réu seja intimado para cumprimento da decisão, bem como para comparecimento em audiência de conciliação. Conforme Cássio Scarpinella Bueno:

Ainda tratando da hipótese de a tutela antecipada ter sido concedida, o inciso II do § 1º do art. 303. impõe a citação (para o processo, que teve início com a petição inicial da tutela antecipada antecedente) e a intimação (da concessão desta mesma tutela) do réu para a audiência de conciliação ou de mediação nos termos do art. 334. Não havendo autocomposição, o prazo para contestação observará o disposto no art. 335. (art. 303, § 1º, III). (2016, p. 259).

A decisão que concede a tutela provisória antecedente é, também, provisória, podendo ser revista a qualquer momento, desde que com fundamento em alteração fática.

A circunstância de que seja provisória, porém, não retira sua eficácia, que se estende até que seja confirmada ou revogada. Eis a lição de Cássio Scarpinella Bueno:

A despeito de sua provisoriedade, a tutela aqui estudada conserva sua eficácia, isso é, tem aptidão de produzir seus regulares efeitos enquanto o processo se desenvolver e, como dispõe o parágrafo único do art. 296, mesmo quando o processo for suspenso, salvo se houver decisão em sentido contrário. (2016, p. 251/252).

Por fim, calado o legislador, têm-se que a possibilidade de concessão, de ofício, de tutela antecipada é de extrema excepcionalidade. A inércia do Magistrado, em tais situações, decorre de nossa tradição jurídica e do modelo processual traçado pela Constituição da República, repetido pelo novo Código de Processo Civil. Assim, Guilherme Lunelli:

Em resumo, temos que, no CPC/73, a possibilidade de atuação de ofício do órgão julgador em matéria cautelar era situação de máxima excepcionalidade, condicionada a autorização expressa de lei. Podemos dizer, então, que, com o advento do novel codex, nada muda. Quedando-se o legislador de 2015 calado sobre o tema, de se concluir que, a luz do nosso sistema constitucional, inviável a concessão oficiosa de qualquer modalidade de tutela de urgência, salvo quando (e se) expressamente autorizado por lei. (2015, p. 134).

Por fim, em inovação bastante bem-vinda, o novo Código alterou o regime de formulação de pedido de antecipação de tutela em sede recursal. O novo sistema, mais racional, é detalhado por Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

O parágrafo único do art. 299, contudo, traz importante inovação em relação ao direito anterior – e acertadamente dispõe em sentido contrário às Súmulas 634 e 635, STF. Quando a tutela provisória tiver que ser requerida em ação de competência originária do tribunal e em sede recursal, o juízo competente é do juízo destinado a conhecer o mérito do recurso – e não aquele competente para a sua simples admissibilidade, ressalvada apenas a hipótese em que há sobrestamento do recursal (art. 1.029, § 5.º, III). Assim, como regra, o pedido de tutela do direito mediante técnica antecipatória deve ser formulado diretamente ao juízo competente para prover ou desprover o recurso (arts. 299, parágrafo único, e 932, § 3.º, II). Apenas na hipótese em que há sobrestamento do recurso – por força de afetação de recurso repetitivo – é que a formulação do pedido será formulada ao tribunal local. (2015b, p. 241).

Ponto de indagação surge quando indeferida a antecipação da tutela, que será adiante analisado.

3.1.2. A Questão da Emenda

O novo Código, em seu artigo 303, parágrafo sexto, reza que, não estando demonstrados os requisitos necessários para a concessão da tutela provisória de urgência antecipatória, o Magistrado determinará sua emenda, no prazo de até cinco dias, sob pena de indeferimento da petição inicial.

O texto legal traz mais dúvidas que respostas, como diz Guilherme Lunelli:

Aqui nada faz sentido. Afinal, o texto se refere a que? A possibilidade de, não estando a petição antecedente adequada (por exemplo, lhe faltando documentos essenciais) o juiz determinar a sua emenda? Ou será que o legislador empregou má técnica e onde disse “emenda” queria dizer “aditamento”? (2015, p. 141/142).

A dúvida nasce da circunstância de que, conforme visto no tópico anterior, com a concessão da tutela provisória abre-se prazo que a parte adite a petição inicial, complementando-a e trazendo a Juízo o pedido de tutela final. Aqui, ao dizer “emenda”, estaria o legislador referindo ao “aditamento”? Vale dizer, deve a parte complementar a petição inicial, trazendo a Juízo o pedido de tutela final? Parte da doutrina entende que sim. Conforme Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

O legislador fala em emenda à petição inicial. É certo, porém, que não se trata propriamente da emenda à petição inicial que se refere o art. 329: trata-se de aditamento da petição inicial a fim de que o processo, em sendo o caso, desenvolva-se regularmente. Em suma: é o aditamento a que se refere o art. 303, § 1.º, I. (2015a, p. 215).

Esta, porém, não parece ser a opinião mais acertada. Afinal, caso fizesse referência ao mesmo instituto, não teria o legislador motivo para fazer uso de dois rótulos diferentes. A par disso, não haveria razão, também, para a fixação de prazos diferentes. Caso pretendesse o legislador o aditamento da petição inicial, teria feito uso desta palavra e fixado o mesmo prazo estabelecido para o caso de deferimento da tutela provisória.

Neste sentido escreve Guilherme Lunelli:

Destas dúvidas, outras decorrem: se considerarmos que onde consta “emenda” o legislador na verdade quis dizer “aditamento”, por que nesse caso o prazo conferido a para aditar seria menor do que nos casos de deferimento da tutela? E ainda: se, efetivamente, emenda significar emenda, a ausência de requisitos para concessão da antecipação da tutela deveriam ensejar a extinção do processo? Não seria muito mais lógico que o autor, mesmo tendo sua tutela antecedente indeferida, pudesse também aditar a inicial, trazendo aos autos os seus pedidos de tutela final? (2015, p. 141/142).

Seguindo o raciocínio de Guilherme Lunelli, parece claro que o legislador fixou prazo que a parte emende a petição inicial que não cumpriu seu objetivo, não evidenciando os requisitos necessários para a concessão da tutela de urgência.

Assim, caberá à parte, no curto prazo de 5 dias, adequado à urgência da medida postulada, sanar a petição inicial, estritamente no que toca à tutela provisória, trazendo aos Autos argumentos e provas que evidenciem sua necessidade. Eis o que escreve:

Apresentaremos aquela que nos parece a melhor solução.

Primeiramente, no que concerne ao citado dispositivo (art. 303, § 6º), temos para nós que, efetivamente, trata-se de uma possibilidade de emenda a inicial. Caso a petição inicial não cumpra seus requisitos, apresente defeitos ou lhe faltem documentos, poderá o juiz oportunizar ao autor sua correção. O prazo menor para emenda, quando comparado com a regra geral do art. 321, justifica-se pela urgência intrínseca a técnica antecedente. Também é a urgência (ou melhor, a perda dela) que explica a extinção do processo no caso (e somente nesse caso) de não realização tempestivamente da emenda. Ora, não se coloca crível que a parte (que alegava estar tão desesperada pela tutela antecipada a ponto de não poder aguardar mais alguns dias e manejar uma inicial já contendo todas suas teses e pretensões) deixe decorrer in albis o prazo facultado pelo juízo. (2015, p. 141/142).

Assim, não emendada a petição inicial, no prazo assinalado pelo Juiz, a ação será extinta em julgamento de mérito.

Já emendada a petição inicial, deverá o Magistrado apreciar o requerimento de tutela provisória. Tanto concedendo-a, quanto negando-a, porém, abre-se ao autor a possibilidade, agora sim, de aditamento da petição inicial, para formulação do pedido de tutela final e definitiva.Mais uma vez conforme escreve Guilherme Lunelli:

Aqui, sem sombra de dúvidas, a solução é aplicar o mesmo procedimento visto para os casos de concessão da medida. Em que pese o art. 303, § 1º, preveja a possibilidade de aditamento somente quando “concedida a tutela antecipada”, impõe-se necessário estender o alcance do dispositivo também para aqueles casos em que a tutela antecipada seja negada. É essa a interpretação que melhor conformará o procedimento à principiologia constitucional, aos ideais de economia e eficiência processual e as premissas interpretativas no novo código (primazia do julgamento de mérito e do máximo aproveitamento processual). Com escoro em tais pilares, se colocaria absurdo que, diante da inexistência dos requisitos para a concessão da tutela antecipada, fosse o processo simplesmente extinto. Ademais, lembremos, que o autor já recolheu as custas processuais para tanto. Seria justo exigir dele novo recolhimento das despesas tão somente pelo fato do juiz (frise-se: em cognição meramente sumária) entender que não era caso de concessão da liminar? (2015, p. 141/142).

Inegável, porém, que o Código de Processo Civil não é claro a esse respeito e que as opiniões divergem.

A única certeza que se tem, e ela decorre do texto do próprio Código, é a de que, segundo opina Cássio Scarpinella Bueno, deverá o Magistrado, ao ordenar a emenda da petição inicial, esclarecer ao autor que postura deve tomar, ou seja, o Juiz deve deixar claro se deve o autor já trazer a Juízo o pedido de tutela final, completando a petição inicial, ou se deve ater-se, ainda, apenas ao pedido de tutela de urgência:

Nesse caso, será determinada ao autor a emenda da petição inicial no prazo de até cinco dias (o magistrado é que o fixará, até o limite de cinco). Como se trata de prazo especial, ele prevalece sobre o genérico de quinze dias previsto no art. 321, embora seja indispensável que o magistrado indique o que deve ser trazido ao processo pelo autor à guisa de emenda da inicial, como exige a parte final daquele dispositivo.

Se a inicial não for emendada, prossegue o mesmo § 6º, a inicial será indeferida e o processo, também aqui, será extinto sem resolução de mérito. (2016, p. 260).

Novidade trazida pelo Código, essa expressa e extreme de dúvidas, consiste na possibilidade de estabilização da tutela provisória concedida, que se passa a examinar.

3.1.3. Estabilização da Tutela Antecipada de Urgência Antecedente

A possibilidade da estabilização da tutela antecipada de urgência, concedida antecedentemente, quiçá, seja a grande novidade trazida ao ordenamento jurídico nacional pelo Código de Processo Civil. Essa é a opinião de Arruda Alvim:

O instituto da estabilização da tutela antecipada (art. 304. do CPC/2015) é novidade criada pelo CPC/2015, antes inexistente no sistema processual brasileiro, embora já estudado pela doutrina. (2016, p. 183).

A novidade legislativa, porém, já era objeto de estudos da doutrina pátria, e já tinha até mesmo figurado em projeto de lei anterior, como diz Ester Camila Gomes Norato Rezende:

O novo Código de Processo Civil de processo civil inaugura, por seu art. 304, no sistema jurídico legal brasileiro a técnica que se convencionou denominar de estabilização da tutela antecipada, matéria que já vinha sendo pauta de estudos de processualistas pátrios e, inclusive, objeto de previsão no Projeto de Lei do Senado 186/2005, anterior ao projeto que originou o novo Código de Processo Civil. O art. 304. prevê “a tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso”. (2015, p. 205).

Ainda que já de conhecimento da doutrina, e objeto de discussão anterior no Congresso Nacional, a hipótese da estabilização da tutela antecipada é inovadora e consiste de grande novidade, que vem calcada na inércia do requerido, que não se levanta contra a decisão que a concede. Conforme sintetiza Arruda Alvim:

A hipótese é bastante inovadora, especialmente tendo em vista que a inércia do réu, ou seja, a não impugnação da medida por meio de recurso importa na extinção do processo, com a manutenção estabilizada da medida concedida (art. 304, caput e § 1º, do CPC/2015). (2016, p. 184).

A possibilidade da estabilização da tutela de urgência antecipada antecedente veio na esteira da autonomia do procedimento implementado pelo Código para sua concessão. Conforme escrevem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, uma vez concedida a tutela antecipada, antes da apresentação do pedido da tutela final, pode a primeira estabilizar-se sem que se adentre na discussão da segunda. Veja-se:

Fugindo ao desenho tradicional da tutela antecipada, o legislador brasileiro inovou ao tornar procedimentalmente autônomo o juízo sumário que leva à concessão da tutela antecipada (art. 303). Em uma palavra: autonomizou a tutela antecipada. Trata-se de uma opção que tem como objetivo principal viabilizar a introdução do mecanismo da estabilização da tutela antecipada no direito brasileiro (art. 304). (2015a, p. 214).

Assim é que apenas a tutela antecipada de urgência antecedente é que pode ser estabilizada, com a inércia do requerido. Visa o legislado evitar que se adentre ao mérito da demanda.

Portanto, caso a tutela de urgência seja concedida incidentalmente, quando já instaurada a discussão do mérito, não há que se falar em estabilização. Nas palavras de Guilherme Lunelli:

Por opção legislativa, a estabilização da tutela só ocorrerá nos casos de concessão antecedente da medida. Assim, caso a tutela seja concedida de forma incidental, não há como se falar na sua estabilização. Aparentemente, o principal escopo da estabilização é dispensar o desenrolar processual se a parte já obteve a satisfação de seu direito. (2015, p. 144).

Neste mesmo sentido também escreve Ester Camila Gomes Norato Rezende:

O novo Código de Processo Civil restringiu a possibilidade de estabilização à tutela antecipada concedida de modo antecedente, fixando como requisito necessário para sua ocorrência a inércia da parte sucumbente, não o estendendo, portanto, aos demais provimentos provisórios satisfativos. Assim, mesmo tratando de tutela antecipada, se concedida de modo incidental, em vista de pleito deduzido na inicial ou no curso do processo, descabe a estabilização. (2015, p. 205).

A mesma Ester Camila Gomes Norato Rezende, continuando a discorrer sobre o assunto, traz que, visando a evitar a estabilização da tutela provisória concedida, deve o requerido necessariamente, fazer uso do recurso de agravo de instrumento, a ser manejado contra a decisão que a concedeu. Eis o que escreve:

O legislador no Novo Código estabelece que a conduta da parte sucumbente na tutela antecipada antecedente hábil a obstar a estabilização é o recurso interposto contra a decisão que concedeu a tutela antecipada, isto é, o agravo de instrumento. Logo, nos termos positivados pelo Novo Código de Processo Civil, caso a parte sucumbente não recorra da decisão que concede a tutela antecipada, sua conduta será caracterizada como inerte, conduzindo à estabilização, tornando desnecessário que o autor (se assim este entender) adite a inicial nos termos do art. 301, visando a composição definitiva da lide. (2015, p. 205/206).

Já Cássio Scarpinella Bueno defende a ideia de que quando o legislador faz a referência a recurso, não se limita ao agravo de instrumento, mas, sim, faz referência ao recurso adequado para revisão da decisão que veiculou a concessão da tutela de urgência:

A decisão concessiva da tutela antecipada nos termos do art. 303. torna-se estável se não houver interposição do respectivo recurso (art. 304, caput). Nesta hipótese, o processo será extinto (art. 304, § 1º).

A que recurso refere-se o dispositivo? Se se tratar de processo na primeira instância, o recurso cabível é, inequivocamente, o de agravo de instrumento (art. 1.015, I). Se a tutela antecipada antecedente for pleiteada perante algum Tribunal – em casos em que aqueles órgãos jurisdicionais ostentem competência originária -, a decisão muito provavelmente será monocrática. Como tal, contra ela cabe agravo interno (art. 1.021). Na eventualidade de se tratar de acórdão, não custa aventar esta possibilidade, contra ele caberá recurso especial e/ou extraordinário, consoante o caso. (2016, p. 261).

Seguindo adiante na análise da matéria, Arruda Alvim é enfático ao afirmar que, a seu ver, é sempre necessária a interposição de recurso a fim de que a estabilização seja impedida. Segundo escreve, é insuficiente, para tanto, qualquer outra manifestação do réu:

Em primeiro lugar, é preciso questionar se quando o Código se reporta a recurso, quer significar apenas o agravo de instrumento, já que há previsão específica para esta hipótese no art. 1.015, I, do CPC/2015. Em princípio, a redação do dispositivo é bastante clara, e parece ser adequada uma interpretação restritiva para impedir que outras manifestações do réu que signifiquem a quebra da sua inércia e impugnação da decisão que concedeu a medida podem evitar a extinção do processo. Note-se, no entanto, que o CPC/2015 não exige o provimento do recurso, mas sua mera interposição – quer, portanto, uma atitude qualificada do réu. Não serve, para impedir a estabilização, mero requerimento; é necessário recurso, que nem sempre será o agravo de instrumento. Pense-se, por exemplo, na tutela provisória urgente antecedente que não for concedida em primeira instância. Se o autor interpuser agravo de instrumento, a eventual decisão monocrática do tribunal pode ser impugnada através de agravo interno (art. 1.021. do CPC/2015) para que não se estabilize. O mesmo vale para a reclamação (art. 988), que ostenta natureza de sucedâneo recursal, quando a decisão impugnada contrariar jurisprudência vinculante. Por outro lado, se o réu se antecipar e desde logo oferecer sua contestação, essa atitude não deve servir para evitar a estabilização e a extinção do processo. (2016, p. 185).

Cássio Scarpinella Bueno segue aprofundando o assunto e chega à conclusão, que parecer ser a mais acertada, por mais racional, de que não é sempre necessária a interposição de recurso, bastando a inequívoca manifestação do requerido no sentido de que não está de acordo com a estabilização. Eis o que escreve:

Dúvida pertinente, caro leitor, é saber se a estabilização só pode se dar na falta do recurso apropriado para seu reexame. São variadas as possibilidades: e se o réu não recorreu, mas compareceu à audiência de conciliação ou de mediação? E se ele se manifestou nos autos pugnando pela revogação da tutela provisória concedida? E se ele, dando-se por citado e independentemente da referida audiência, contestar? E se ele apresentou embargos de declaração da decisão concessiva indicando vício que tem a aptidão de conduzir o magistrado a retratar-se? Em suma: é possível interpretar ampliativamente o disposto no caput do art. 304. para afastar, diante desses acontecimentos, a estabilização da tutela provisória?

A melhor resposta, penso, ao menos por ora, é a de aceitar a interpretação ampliativa do texto do caput do art. 304. Qualquer manifestação expressa do réu em sentido contrário à tutela provisória antecipada em seu desfavor deve ser compreendida no sentido de inviabilizar a incidência do art. 304. E, a propósito, o rol de questões do parágrafo anterior é mero exercício de adivinhação; ele não quer, evidentemente, suplantar as ocorrências da prática forense, que são muito mais amplas e bem mais diversificadas. (2016, p. 262).

Neste mesmo sentido a opinião de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

É claro que pode ocorrer de o réu não interpor o agravo de instrumento, mas desde logo oferecer contestação no mesmo prazo – ou, ainda, manifestar-se dentro desse mesmo prazo pela realização da audiência de conciliação ou de mediação. Nessa situação, tem-se que entender que a manifestação do réu no primeiro grau de jurisdição serve tanto quanto a interposição do recurso para evitar a estabilização dos efeitos da tutela. Essa solução tem a vantagem de economizar o recurso de agravo e de emprestar a devida relevância à manifestação de vontade constante da contestação ou do intento de comparecimento à audiência. Em ambas as manifestações, a vontade do réu é inequívoca no sentido de exaurir o debate com o prosseguimento do procedimento. (2015b, p. 246).

É de todo razoável que qualquer manifestação do réu seja capaz de afastar sua inércia processual e impedir a estabilização da tutela provisória. Pode o réu contestar a ação, comparecer à audiência de conciliação, ou, mesmo, simplesmente peticionar nos Autos e manifestar sua intenção de ver o seguimento do feito, até prolação de sentença que aprecie o mérito da demanda, ou seja, que aprecie o pedido de tutela final.

É que pode ocorrer que, no momento processual, logo após a decisão que conceda a antecipação, não tenha o réu elementos para apresentar um recurso de agravo de instrumento viável, mas almeje, após a instrução processual e a produção e apresentação de suas provas, a possibilidade de que tenha sua pretensão acolhida em Juízo, vendo ser rejeita a do autor.

Com isso se evitará a multiplicação, como já vem ocorrendo, de interposição de recursos de agravos de instrumento sem qualquer viabilidade, e que não visam a revisão da decisão que concedeu a antecipação, mas apenas e tão somente evitar sua estabilização. Trata-se de recurso inútil, gravoso tanto ao requerido quanto ao Poder Judiciário, e, por via reflexa, a todos os jurisdicionados.

Outro ponto a ser analisado consiste em que a estabilização da tutela antecipada somente importa na extinção da ação caso abarque toda a matéria a ser posta em Juízo, vale dizer, caso a tutela antecipada coincida com a tutela definitiva. Caso contrário, ou seja, caso a tutela definitiva pretendida seja apenas parcialmente antecipada, natural que a ação trilhe seu curso, até apreciação de todo o mérito da demanda. Assim escreve Guilherme Lunelli:

Dissemos regra geral, pois, conforme já abordamos, a tutela antecipada requerida em caráter antecedente poderá ser total ou parcial. Pode o autor realizar pleito antecedente de urgência, mas almejar, quando do aditamento, trazer pedidos de outra natureza que aquele antecipado.

(...)

Com efeito, o juiz somente extinguirá o processo quando a tutela antecipada estabilizada constituir a única pretensão final apontada pelo autor. Existindo pleitos outros, a questão estabilizada permanece indiscutível, mas o processo deve seguir seu regular trâmite para o julgamento das demais questões.

(...)

Nesse caso, o juiz deverá extinguir parcialmente o processo no que toca a tutela estabilizada e, no que concerne aos demais pedidos, prosseguir com a marcha processual. (2015, p. 144).

Acrescente-se que a decisão estabilizada não importa em coisa julgada, em que pese a similitude da disciplina jurídica de ambas. Outrossim, esta decisão pode ser revista a pedido de qualquer das partes, em ação a ser ajuizada com este fim, no prazo de dois anos. Mais uma vez citando as palavras de Guilherme Lunelli:

Diz a lei que a decisão estabilizada não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, no prazo máximo de dois anos contados da extinção do processo antecedente. (2015, p. 143).

Discorrendo acerca da similitude existente entre a coisa julgada e a estabilidade da decisão escrevem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

O legislador refere que a decisão que concede a tutela antecipada não fará coisa julgada (será apenas estável), mas seus efeitos não poderão ser afastados de modo nenhum se, depois de dois anos, não for proposta ação tendente ao exaurimento da cognição. (2015a, p. 216).

Já Cássio Scarpinella Bueno é bastante claro ao expor as diferenças existentes entre uma e outra:

O § 6º do art. 304. tem o condão de evitar discussões interessantíssimas sobre haver, ou não, coisa julgada material na decisão que concedeu a tutela antecipada a final estabilizada. Não há e nisso o dispositivo é claríssimo, revelando qual é a opção política que, a esse respeito, fez o legislador. O dispositivo ensaia, até mesmo, resposta a pergunta inevitável diante do § 1º do art. 304: trata-se de extinção do processo com ou sem resolução de mérito? Para quem associa coisa julgada material e decisão de mérito, a resposta é imediata.

A circunstância de, passados os dois do § 5º do art. 304, não haver mais meios de rever, reformar ou invalidar aquela decisão não faz com que ela transite materialmente em julgado. Há, aqui, mera coincidência (não identidade) de regimes jurídicos, em prol da própria segurança jurídica. Não há como, por isso mesmo, querer infirmar aquela decisão com fundamento no art. 966, que trata da “ação rescisória”, técnica processual codificada para o desfazimento da coisa julgada material em determinadas hipóteses. (2016, p. 263).

Como a estabilização não importa em coisa julgada, não há que se falar em ação rescisória, e, consequentemente, em julgamento colegiado. A ação destinada a rever a decisão que concedeu a antecipação, e se estabilizou, será de competência do próprio Juízo que a concedeu e tramitará pelo rito comum. Nas palavras de Guilherme Lunelli:

No entanto, merece atenção o fato que, não fazendo a tutela estabilizada coisa julgada, não falaremos aqui em ação rescisória, mas, sim, em uma demanda que tramitará pelo procedimento comum. Não se exige, portanto, julgamento colegiado: diante da prevenção, tal feito será de competência do próprio juízo que concedeu a tutela estabilizada. (2015, p. 143).

Para encerrar, merece ser mencionada a circunstância de que tanto autor quanto réu podem ir a Juízo pedir a revisão da decisão que antecipou a tutela.

No caso do requerente, pode ele pretender a complementação da decisão, para inclusão de novas situações, ou mesmo a solução definitiva da lide, aí sim com a formação da coisa julgada material. Como diz Ester Camila Gomes Norato Rezende:

Não se pode perder de vista, no entanto, que o próprio autor, mesmo beneficiário da tutela antecipada estabilizada, pode deter interesse na composição definitiva da lide, seja para nela abarcar pretensões que não integram a tutela provisória, seja para modificar seus contornos. Por isso, o ajuizamento de ação visando à solução definitiva da lide já provisoriamente composta pela tutela antecipada estabilizada pode ser promovido por qualquer das partes: o réu, por óbvio, que pretenda se desvincular da obrigação que lhe fora imposta pela tutela antecipada estabilizada, bem como pelo próprio autor, nas hipóteses acima conjecturadas (art. 304, §§ 2º e 4º). (2015, p. 206).

Traçados os contornos gerais da tutela provisória antecipada de urgência, passa-se à análise da tutela antecipada de evidência.

3.2. Tutela Antecipada de Evidência

Muito do que já foi dito, no que toca à tutela provisória antecipada de urgência aplica-se, também, à tutela de evidência. Assim é que, neste ponto serão ressaltadas algumas características da tutela de evidência, que a diferenciam da primeira e lhe dão contornos próprios.Diga-se, de início, que a possibilidade da concessão da tutela antecipada de evidência não é novidade trazida pelo novo Código. O instituto já vinha disciplinado no Código de Processo Civil de 1973, ainda que não com este título. Segundo diz Ester Camila Gomes Norato Rezende:

O novo Código de Processo Civil inova, também, em comparação ao CPC/1973, ao positivar a expressão “tutela de evidência”, que muito embora já conhecida na doutrina e na legislação pátria, não contava no Código de Processo Civil anterior com referência expressa a essa denominação. (2015, p. 185).

A possibilidade da antecipação da tutela calcada no abuso do direito de defesa, ou no manifesto propósito protelatório do requerido, já vinham disciplinados pelo codex revogado. O atual, além de mantê-la, ampliou as possibilidades de antecipação. Assim escreve Ester Camila Gomes Norato Rezende:

Conforme se detalhará a seguir, no Código de Processo Civil de 1973, a hipótese legal correspondente ao que se denomina de tutela de evidência é o art. 273, II, segundo o qual “o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, convença-se da verossimilhança da alegação e: (...) II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu”. O novo Código de Processo Civil amplia as hipóteses de cabimento da tutela de evidência, conferindo regulamentação mais ampla do que dispunha a legislação então em vigor. (2015, p. 185).

Segue, Ester Camila Gomes Norato Rezende, afirmando que:

O Código de Processo Civil de 1973 prevê no art. 273, II (acrescentado pela Lei 8.952, de 13.12.1994), hipótese de tutela satisfativa provisória que prescinde de urgência e tem cabimento quando se constata o abuso do direito de defesa do réu. Cuida-se de espécie de tutela de evidência, sendo a elevada probabilidade de procedência da pretensão do autor corroborada pela frágil defesa do réu.

O novo Código de Processo Civil segue elencando como hipótese de tutela de evidência quando “ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte” (art. 311, I), devendo, é claro, haver juízo de probabilidade positivo sobre o direito alegado pelo autor. Assim é que a probabilidade do direito, aliada à defesa abusiva do réu, confere à pretensão autoral a possibilidade de ser tutelada provisoriamente, se assim pleiteado pelo autor.

Inova o novo Código ao positivar outras espécies gerais de tutela de evidência, diga-se, aplicáveis à generalidade dos procedimentos. (2015, p. 213).

A grande diferença entre as tutelas provisórias antecipadas de urgência e de evidência, notada por Cássio Scarpinella Bueno, consiste em que, para a concessão desta última dispensa-se a ocorrência de periculum in mora, marco central da primeira. Assim, a concessão da tutela antecipada de evidência funda-se na aparência do direito do autor, forte o suficiente para que os efeitos da provisão final sejam adiantados em seu favor. Conforme ele escreve:

O art. 311. do CPC de 2015 ocupa-se com a “tutela da evidência”, ou, mais precisamente, com a tutela provisória fundamentada em evidência, distinguindo-a, inclusive no local em que regulamentada da “tutela de urgência”, iniciativa plenamente harmônica com a distinção feita desde o caput do art. 294. entre uma e outra destas espécies (v. n. 3, supra).

A concessão da “tutela da evidência” independe de demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, isto é, para empregar a expressão geralmente usada para descrever uma e outra situação, de periculum in mora.

A evidência que nomina a técnica não merece ser interpretada literalmente, mas de forma mais genérica, no sentido de que o requerente da medida tem direito mais provável que o do seu adversário assim entendidas as afirmações de direito e de fato que, por portarem maior juridicidade, recomenda proteção jurisdicional. Em suma, a expressão merece ser compreendida no sentido de que, à luz dos elementos apresentados, tudo indica que o requerente da medida é o merecedor da tutela jurisdicional. (2016, p. 267).

Neste mesmo sentido a lição de Arruda Alvim:

A tutela da evidência quer proteger o requerente que tem a seu favor uma flagrância tão grande do direito que justifica, como dito nos tópicos anteriores, a redistribuição do ônus de suportar o tempo do processo, mesmo sem a situação de urgência. (2016, p. 194).

As hipóteses em que se abre a possibilidade da concessão da tutela provisória calcada em evidência vêm arroladas pelo novo texto legal, em rol exaustivo, no artigo 311, tendo, segundo escrevem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, como característica comum a inconsistência, ainda que provável, da defesa do réu:

O legislador procurou caracterizar a evidência do direito postulado em juízo capaz de justificar a prestação de “tutela provisória” a partir de quatro situações arroladas no art. 311. O denominador comum capaz de amalgamá-las é a noção de defesa inconsistente. A tutela pode ser antecipada porque a defesa articulada pelo réu é inconsistente ou provavelmente o será. (2015a, p. 200).

Justamente porque o Código se satisfaz com a probabilidade da inconsistência da defesa, em hipóteses que ele mesmo elenca e que são bastante restritas, é que abre-se a possibilidade de que tutela antecipada da evidência também seja concedida liminarmente, com postergação do contraditório. Assim escrevem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Também quando a parte postula tutela ao direito mediante decisão provisória fundada na evidência é possível postergar o contraditório. Em regra, a configuração de defesa inconsistente depende de seu efetivo exercício, o que leva à conclusão de que a concessão da tutela da evidência depende sempre da prévia realização do contraditório. No entanto, o legislador erigiu duas situações em que a defesa do réu será potencialmente inconsistente: a uma, quando o autor funda o seu pedido em precedentes do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em jurisprudência em incidente de resolução de demandas repetitivas pelos Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais (art. 311, II); a duas, quando for formulado pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito (art. 311, inciso III). (2015a, p. 207).

As hipóteses, como já dito, elencadas exaustivamente pelo CPC, em que pode ser concedida a tutela provisória antecipada fundada em evidência, vêm estabelecidas no artigo 311 do codex e foram arroladas por Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

A tutela antecipada da evidência deve ser concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III – tratar-se de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que deve ser decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável (art. 311. do CPC). (2015, p. 112/113).

A primeira das hipóteses em que se abre a possibilidade da tutela provisória de evidência consiste no abuso do direito de defesa, por parte do requerido, ou no manifesto propósito unicamente protelatório de sua parte. Conforme discorre Arruda Alvim:

A primeira das hipóteses de tutela de evidência é a situação em que fica caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte (art. 311, I). Nesses casos, o juiz haverá de ter presente a ausência de plausibilidade da defesa apresentada, pois o réu estará extrapolando seu direito ao contraditório, de forma a retardar o curso do processo. De forma semelhante, o réu poderá não só apresentar defesa inconsistente, como também oferecer obstáculos com o único objetivo de protelar o andamento processual. Ainda que originariamente a defesa estivesse revestida de plausibilidade, durante o processo, com incidentes e expedientes, poder-se-á caracterizar a situação de abuso de direito de defesa. (2016, p. 195).

Ressalte-se, aqui, uma vez mais repetindo as palavras de Cássio Scarpinella, que na hipótese em comento resta dispensada a ocorrência de qualquer urgência para a concessão da tutela provisória, fundada exclusivamente na aparência de probabilidade do direito do autor e na fragilidade da defesa do requerido:

A situação do inciso I do art. 311. merece ser compreendida levando em conta a exigência genérica do caput do art. 300. no sentido de haver elementos que evidenciem a probabilidade – sempre entendida no sentido de maior juridicidade – do direito. O que o caput do art. 311. dispensa no caso é a “demonstração do perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo” e não a circunstância de o direito do requerente da tutela ser mais “evidente” – ou, como acabei de escrever, mais merecedor da tutela jurisdicional – que o do requerido. Isto porque o mal comportamento do réu (abusando do direito de defesa ou atuando de modo procrastinatório) nada diz sobre a maior ou menor juridicidade do direito do autor. E a tutela, por ser da evidência, pressupõe este elemento (juridicidade do direito), a despeito de dispensa aquele (perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo). (2016, p. 268).

Nestes casos, obviamente, a tutela provisória somente poderá fazer-se presente após a apresentação da defesa. Afinal, apenas após a apresentação da defesa é que poderá ser avaliada sua inconsistência e, consequentemente, a probabilidade do direito do autor, que, assim, deve ser protegido dos malefícios do tempo. Está é a síntese do que defendem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Nessa linha, o art. 311, I, deve ser lido como uma regra aberta que permite a antecipação da tutela sem urgência em toda e qualquer situação em que a defesa do réu se mostre frágil diante da robustez dos argumentos do autor – e da prova por ele produzida – na petição inicial. Em suma: toda vez que houver apresentação de defesa inconsistente. Trata-se, portanto, de uma importante técnica processual voltada à atípica concretização do princípio da igualdade e da paridade de armas entre os litigantes (arts. 5.º, I, da CF/1988, e 7.º do CPC) – destinada, portanto, a colocar em evidência o lado oculto do processo, aquele que não pode ser visto pelo processualista que olha apenas para o plano normativo: o fato de que a resistência indevida no processo não pode ser fonte de vantagens econômicas para quem por detrás dela se esconde, mormente quando o autor depende economicamente do bem da vida, hipótese em que o desprezo pelo tempo do processo e o conseguinte fortalecimento da posição do réu acentua a desigualdade entre as partes, transformando o princípio da igualdade em uma abstração irritante. (2015a, p. 201).

A segunda hipótese de tutela provisória de evidência, trazida pelo Código de Processo Civil, a bem da verdade, muito pouco se afasta da primeira, sendo dela mero detalhamento. Diz o texto legal que pode ser concedida a tutela provisória quando o autor fizer prova documental dos fatos que alega e tiver sua tese jurídica já firmada em súmula vinculante ou em decisão prolatada em julgamento de recursos repetitivos. Segundo Arruda Alvim:

Uma das hipóteses específicas de defesa inconsistente é a de que, em processo onde se discute uma questão já decidida de forma pacífica pelos tribunais superiores, o réu insiste em reiterar argumentos já rechaçados por aquelas cortes. Para a situação há previsão específica de concessão da tutela da evidência: o art. 311, II, autoriza a concessão da tutela de evidência quando “as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante”. (2016, p. 195).

A terceira hipótese contempla situação bem específica, atinente a contratos de depósito. A regra é bastante clara e dispensa maiores comentários, tanto que Arruda Alvim também limita-se à repetição do texto legal. O mesmo ocorre com a quarta e última hipótese:

A terceira hipótese prevista pelo art. 311. é bastante específica. Diz o inc. III deste artigo que a tutela de evidência será concedida quando “se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa”. O caso é de contrato de depósito no qual o bem litigioso não tenha sido entregue a quem de direito. A prova documental que for suficiente para comprovar esse fato será suficiente para que, mesmo sem urgência, seja determinada a entrega.

Por último, será possível conceder tutela provisória baseada somente na evidência do direito quando “a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável” (art. 311, IV, do CPC/2015). Trata-se de uma hipótese um pouco mais branda do que ocorre quando uma parcela dos pedidos feitos pelo autor torna-se incontroversa, quando o réu sequer apresenta impugnação a respeito. (2016, p. 196).

Como dito alhures, também a tutela provisória de evidência pode ser concedida liminarmente. Isso ocorre nas hipóteses dos incisos II e III, do artigo 311, do Código de Processo Civil.

Nestas hipóteses os fatos alegados pelo autor encontram-se comprovados documentalmente, e seu direito encontra-se amparado em súmula vinculante ou em tese firmada em julgamento de recursos repetitivos, no primeiro caso, ou em contrato de depósito, no segundo. Entende o legislador, portanto, que o direito do autor é tão evidente que a defesa do requerido será, presumidamente, inconsistente, a ponto de restar justificada a concessão da tutela provisória de evidência, liminarmente.

Segundo o texto de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Também quando a parte postula tutela ao direito mediante decisão provisória fundada na evidência é possível postergar o contraditório.

(...)

Nesses casos, o contraditório é diferido porque é injusto fazer com que o autor aguarde para ver realizado um direito que já se encontra definido pelas Cortes Supremas ou que se encontra apropriadamente confortado pela prova específica que o instrumentaliza no plano do direito material. (2015b, p. 240)

Questão que merece ser respondida, por fim, consiste na possibilidade que a tutela provisória concedida com base em evidência possa estabilizar-se, a exemplo do que ocorre com as tutelas concedidas com fundamento na urgência do provimento. Cássio Scarpinella Bueno entende que sim, nos casos de concessão liminar da antecipação, que são perfeitamente compatíveis com o instituto. Conforme escreve:

Uma última questão se mostra pertinente: é possível que a tutela da evidência torne-se estável, nos moldes do art. 304? A resposta positiva parece pressupor que o pedido do autor fundamente-se nos incisos II ou III do art. 311, únicos que, de acordo com o parágrafo único daquele mesmo dispositivo, aceitam a ocorrência da hipótese do art. 303. (2016, p. 270)

A incompatibilidade da estabilização, quando a tutela provisória de evidência for concedida incidentemente, consiste em que já feita a apresentação do pedido de tutela final cujo mérito deve, portanto, ser enfrentado.Assim, foram apresentados os principais pontos que diferenciam a tutela provisória da evidência daquela concedida com base na urgência.

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Sobre o autor
Rodrigo Emiliano Ferreira

Defensor Público do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Rodrigo Emiliano. A tutela provisória e seus traços marcantes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5328, 1 fev. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59534. Acesso em: 4 dez. 2024.

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