O sensacionalismo midiático e seus reflexos no tribunal do júri

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25/08/2017 às 12:09
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3 PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS DO INSTITUTO

O Dicionário Aurélio define o princípio como: 1. O primeiro impulso dado a uma coisa. 2. Ato de principiar uma coisa. 3. Origem. 4. Causa primária, com base nessas definições, pode-se concluir que o princípio é à base de tudo e o norte para alguma coisa.

Nesse sentido, destaca Nucci, que o termo princípio é o “momento em que algo tem origem, é a causa primária ou o elemento predominantemente na constituição de um todo orgânico”. (NUCCI, 2012, p.27).

Todo instituto, independentemente de ser do ramo do direito ou não, possui princípios norteadores para embasar sua criação e sustentar a necessidade de sua existência.

No campo da área penal não é muito diferente, pois existem inúmeros princípios para garantir uma correta aplicação desse ramo.

O instituto do Tribunal do Júri conforme relatado anteriormente adquiriu e perdeu princípios importantes ao longo da sua formação em comparação do que se tem hoje.

O principio constitucional há de ser respeitado como elemento irradiador, que imanta todo o ordenamento jurídico. Além disso, é fundamental considerar existirem os princípios concernentes a cada área do Direito em particular. Por isso, há os princípios processuais penais, que independem dos constitucionais. Eles produzem, na sua esfera de atuação, o mesmo efeito irradiador de ideias e perspectivas gerais a serem perseguidas pelo aplicador da norma processual. (NUCCI, 2012, p.27).

Desde a promulgação da Constituição de 1988, o instituto do Tribunal do Júri, possui esses princípios previstos no artigo 5º em seu inciso XXXVIII, com o arcabouço de garantia constitucional e dotado do benefício da clausula pétrea como já destacado no capítulo anterior.

Nucci preleciona que “é reconhecida à instituição do Júri com a organização que lhe der a lei, assegurados como princípios: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos, e a competência para os julgamentos dos crimes dolosos contra a vida. (NUCCI, 2014, p.632).

Dessa forma, não há de se pensar em uma correta e eficiente aplicação do instituto do Tribunal do Júri sem o devido respeito aos seus princípios, sob pena de nulidade do processo a ausência de algum.

3.1 Plenitude de defesa

O primeiro princípio a ser observado, esta disposto na alínea “a”, do artigo 5º da Constituição, em seu inciso XXXVIII, onde se assegura a todos a plenitude de defesa.

A plenitude de defesa, uma dupla faceta, afinal a defesa esta dividida em técnica e autodefesa, A primeira, de natureza obrigatória, é exercida por profissional habilitado, ao passo que a última é uma faculdade do imputado, que pode efetivamente trazer a sua versão dos fatos, ou valer-se do direito do silêncio. (TÁVORA e ALENCAR, 2015, p.975).

Não têm como existir um autêntico processo legal, assegurado pela Constituição, se não for resguardado ao acusado, os princípios do contraditório e ampla defesa.

Nucci reforça que aos “réus, no Tribunal do Júri, quer se a defesa perfeita, dentro, obviamente, das limitações naturais dos seres humanos”. (NUCCI, 2012, p.82).

Com esse princípio, busca-se assegurar que os acusados tenham a seu favor todo tipo de defesa e recursos disponíveis na lei, sem que em nenhum momento sua liberdade seja cerceada de qualquer forma, sob pena de ter todo o julgamento anulado.

Com relação a esse princípio, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais adota o seguinte entendimento:

Fica clara a intenção do constituinte ao conceder ao réu no Júri, além da ampla defesa outorgada a todo e qualquer réu, em qualquer processo cível, administrativo ou criminal, a plenitude de defesa, privilegiando-o em relação a acusação, pois ele é a parte mais fraca da relação. (AP.10155.03.004411-1 – 3º Câmara Criminal - j. 02.05.2006, rel. Jane da Silva).

 A plenitude de defesa é imprescindível para uma defesa plena do acusado, sem qualquer tipo de cerceamento, com o objetivo é que no fim do julgamento consiga se obter a verdade do processo, absolvendo ou condenando o réu de acordo com os fatos e provas de todo o processo.

3.2 Sigilo das Votações

Trata-se do segundo princípio a ser observado e também esta devidamente previsto no artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “b” da Constituição.

Capez informa que “é um princípio informador específico do Júri, a ele não se aplicando o disposto no artigo 93, IX da Constituição, que trata do princípio da publicidade do Poder Judiciário”. (CAPEZ, 2013, p.633).

Esse princípio tem como finalidade, a proteção ao Conselho de Sentença, com a intenção de impedir que os jurados sejam intimidados em dar o voto, independente ou não de estarem na presença do acusado e de todo um público.

Távora e Alencar asseveram que “o sigilo das votações envolve o voto e o local do voto. Para evitar intimidação dos jurados, as votações ocorrem em sala especial, com a presença de pessoas indispensáveis a esse ato processual”. (TÁVORA e ALENCAR, 2015, p.975).

Art. 485 Não havendo duvida a ser esclarecida, o Juiz Presidente, os jurados, o Ministério Publico, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ao à saca especial, a fim de que seja procedida a votação. (BRASIL, 1941).

Ressalta-se ainda que o mesmo artigo seu parágrafo 1º, na falta de sala especial, o Juiz Presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas já mencionadas no caput.

Esse princípio possui grande importância, pois a intenção dele é garantir total proteção e oferecer auxílio aos jurados, por isso o voto não precisa e nem pode ser assinado pelo jurado, ou seja, não é necessário realizar qualquer identificação no seu voto, além do que o voto acontece em sala específica, onde só é permitida a presença das pessoas legalmente autorizadas.

Tonello e Rodrigues destacam que “a principal preocupação do legislador constituinte ao inserir esse princípio, foi garantir a imparcialidade, a independência, a liberdade de convicção e de opinião dos jurados”. (TONELLO e RODRIGUES, 2012, p.190).

Para assegurar o sigilo e cumprir a Constituição é adequado que o juiz se acautele para suspender a divulgação dos demais votos assim que se definir a votação de cada quesito, evitando que seja o sigilo violado por uma eventual votação unânime. (TÁVORA e ALENCAR, 2015, p.976).

O sigilo das votações será sempre resguardado, pois em hipótese alguma será revelado todos os votos, em caso de decisão unânime, o juiz irá finalizar a decisão quando se chegar na maioria dos votos, sem a necessidade de abertura do restante dos votos.

Nesse sentido, Capez menciona “que por essa razão, há quem sustente que deva a votação do quesito ser interrompida assim que surgir o quarto voto idêntico”. (CAPEZ, 2013, p.633).

A natureza do instituto do Tribunal do Júri dispõe aos jurados certa proteção necessária para um julgamento correto e adequado, garantindo dessa forma aos mesmos o sigilo, além do que apesar de todo o processo ser público, lhes é preservada a prerrogativa de não votar na frente de todos.

Esse princípio possui suma importância é e indispensável para uma correta utilização do instituto do Tribunal do Júri.

3.3 Soberania dos veredictos

Disposto na alínea “c”, do artigo 5º, inciso XXXVIII da Constituição, o princípio da soberania dos veredictos possui algumas importantes peculiaridades.

De acordo com Távora e Alencar, “o princípio da soberania dos veredictos alcança o julgamento dos fatos. Os jurados julgam os fatos. Esse julgamento não pode ser modificado pelo juiz togado ou pelo Tribunal que venha a apreciar um recurso.” (TÁVORA e ALENCAR, 2015, p.976).

Esse princípio traz a presunção de que a decisão do Conselho de Sentença é soberana. Sendo assim, não poderá ser alterada, ainda que seja para beneficiar o réu. No entanto, esse princípio não é absoluto, existem algumas situações na lei em que esse princípio será relativizado, alterando uma decisão já prolatada ou ainda anulando todo um julgamento.

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Assevera Capez que “trata-se de um princípio relativo, pois no caso de apelação das decisões do Júri pelo mérito, o Tribunal pode anular o julgamento e determinar a realização de um novo, se entender que a decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova dos autos”. (CAPEZ, 2012, p.633).

Nesse caso, é possível notar que a decisão do Tribunal não altera o julgamento, resolvendo o mérito da questão, ele simplesmente anula o julgamento já realizado e cria-se a oportunidade para novo julgamento. (TÁVORA e ALENCAR, 2015, p.976).

Com base em Capez “na revisão criminal, a mitigação do princípio é ainda maior, porque o réu condenado pode ser até mesmo absolvido pelo Tribunal revisor, caso a decisão seja arbitrária”. (CAPEZ, 2012, p.633).

Esse princípio possui grande importância, pois garante ao acusado a segurança jurídica, tendo em vista que, em regra, sempre será preservada a soberania do veredicto.

    Ainda quando a lei autoriza a relativização desse princípio por algum erro cometido no julgamento, tem como pressuposto aumentar as garantias e direitos da pessoa do acusado, para que o mesmo tenha a possibilidade de realização de outro julgamento de forma correta.

3.4 Competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida

Quarto e último princípio do instituto do Tribunal do Júri esta previsto no artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “d” da Constituição e tem como ideia a definição de quais os crimes serão julgados pelo Tribunal do Júri.

Destaca Porto que “a competência do Tribunal do Júri, um dos órgãos que exercem a jurisdição penal, decorre de fonte constitucional, estando voltada para os julgamentos dos crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados, previstos no Código Penal”. (PORTO, 2005, p.43).

O artigo 74 do Código de Processo Penal regula que a competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri.

Destaca ainda o parágrafo 1º do mesmo artigo que compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos artigos 121, §1º e 2º, 122 § único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.

Nesse sentido, o mestre Aury Lopes Junior assevera:

A competência do Júri é assim muito bem definida no artigo 74, § 1º do Código de Processo Penal, de forma taxativa e sem admitir analogias ou interpretação extensiva. Logo, não serão julgados pelo Tribunal do Júri os crimes de latrocínio, extorsão mediante sequestro e estupro com resultado morte, e demais crimes em que se produz o resultado morte, mas que não se inserem nos crimes contra a vida. (LOPES. JR, 2014, p.1016).

Nesse contexto, há de se notar que os crimes que não produzam como resultado a morte não serão em hipótese alguma submetidos ao Júri Popular, com uma rara exceção quando este crime estiver conexo a algum dos crimes contra a vida, dessa forma seu julgamento será de responsabilidade de um juiz singular.

Os crimes contra a vida são o homicídio; o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio; o infanticídio e o aborto. Desses apenas o homicídio possui forma culposa, sendo assim, este é o único crime contra a vida excluído do Tribunal do Júri. (TÁVORA e ALENCAR, 2013, p.196).

Apesar de o texto da Constituição destacar de forma clara que é assegurada a competência do Tribunal do Júri para os crimes dolosos contra a vida, não é somente eles.

Nessa ótica, o Supremo Tribunal do Federal destaca “a competência do Tribunal do Júri, fixada no artigo 5º, XXXVIII, da Constituição, quanto ao julgamento de crimes dolosos contra a vida é passível de ampliação pelo legislador ordinário.” (HC 1015421. SP – 1º TURMA – j.04.05.2010, Rel. Ricardo Lewandowski).

De acordo com o posicionamento do Supremo, caso o legislador ordinário sinta ou perceba a necessidade poderá ampliar a competência para o devido julgamento no Tribunal do Júri.

Pondera Távora e Alencar, “além disso, importante lembrar que o genocídio não é crime contra a vida, mas sim crime contra a humanidade, razão pela qual só será processado pelo Júri, se estiver em conexão com o crime doloso contra a vida”. (TÁVORA e ARAÚJO, 2013, p.196).

O genocídio, crime contra a humanidade e o latrocínio roubo seguido de morte; apesar de existir uma morte no curso do delito, não se tratam de crime contra a vida, e sim crime contra o patrimônio, por isso a competência para o processo e julgamento é do juiz singular e não do Tribunal do Júri, de acordo com a Súmula 603 do STF.

Importante lembrar que todos os princípios aqui destacados possuem elevada importância, pois se tratam de direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição de 1988 e que em hipótese alguma podem ser suprimidos, a não ser que a própria carta magna autorize a sua relativização como no caso do princípio da soberania dos veredictos.

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Sobre a autora
Kênya Roberta Pereira Passos

Administradora e Advogada

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada a Famig – Faculdade Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.Orientadora: Rosilene Queiroz.

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