Capa da publicação A liquidação do dano em seus vários matizes
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Algumas anotações sobre a liquidação do dano

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02/09/2017 às 15:47
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III – A PENSÃO DOS PAIS PELA MORTE DO FILHO EM CONSEQUÊNCIA DE ATO ILÍCITO. A PENSÃO DEVIDA AO FILHO MENOR EM CASO DE MORTE DO PAI.  

Outro tema tormentoso diz respeito a pensão dos pais pela morte de filho e seu termo final.

A pensão devida aos pais pela morte de filho em idade de trabalho tem por termo final a data em que a vítima completaria 65 anos(RSTJ 90/155). A partir da data em que a vítima completaria 25 anos, quando presumidamente constituiria nova família, a pensão pode ser diminuída em 50%(RSTJ 105/341, 121, 371, 121/373, 140/400 e 421).

A pensão devida ao filho menor em caso de morte do pai finda aos 25 anos de idade do beneficiário. Presume-se que em tal idade terá ele completado a sua formação escolar, inclusive universitária(RSTJ 100/161, 102/251, 121/255, 134/88).


IV – A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL

O Ministro Athos Gusmão Carneiro(A sentença ilíquida e o artigo 459, parágrafo único do Código de Processo Civil) afirmou que “tudo que pudesse ser provado no processo de conhecimento o juiz deveria ordenar, que fosse feito, a fim de a sentença ser liquida e certa, evitando a liquidação”.

Deveras difícil, por muitas vezes, é a fixação de indenização por dano moral.

Na matéria trago texto de José Roberto Ferreira e Vanderlei Arcajo da Silva(A quantificação dos danos morais pelo STJ):

“Nem sempre a sua reparação pecuniária foi admitida, como se pode extrair das lições de Caio Mário Pereira da Silva, o qual afirma que havia escritores (como Pothier, Brinzi, Keller, Chironi) que negavam a ressarcibilidade do prejuízo moral, sob o fundamento de que a dor é inindenizável economicamente por ser um bem jurídico inestimável, constituindo-se essa reparação algo até mesmo imoral. Assim, inexistia até o Código Civil de 1916 a indenização pecuniária por dano moral.

A partir do Código de 1916, como descreve o mesmo autor, surgiram hipóteses que abrangiam a reparabilidade do dano moral, como no caso do art. 1.538, que previa indenização adicional para as vítimas de lesão corporal que acarretasse aleijão ou deformidade e para o ofendido que fosse mulher jovem e solteira, ainda capaz de casar.

A admissibilidade da reparação do dano moral, passa, então, a se tornar pensamento dominante no cenário jurídico nacional, cristalizando-se na instituição do Código de Telecomunicações (Lei 4.117/62), da Lei de Imprensa (Lei 5.250/67) e do Código de Direitos Autorais. A Lei 4.117/62, em seu art. 81, estabeleceu a indenização por dano moral em caso de calúnia, difamação ou injúria por via de radiodifusão, fixada no mínimo de cinco e no máximo de cem vezes o salário mínimo.

Washington de Barros Monteiro, em comentários ao Código de 1916, observou que o seu art. 1.537, ao dispor sobre indenização no caso de homicídio, foi diretamente influenciado pelos escritores que inadmitiam a reparação do dano moral, por prever indenização apenas para: I) – pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família II) – prestação de alimentos a quem o defunto os devia.

Esse autor, criticando a aludida restrição, assinala a incongruência daquela norma, pois a simples lesão corporal do art. 1.538 abrangia a reparação dos lucros cessantes e do dano moral, ao passo que o homicídio, muito mais grave, excluía tais indenizações. Prosseguindo, retrata a infelicidade do legislador de 1916 nesse aspecto, asseverando a necessidade de impor ao lesante algum castigo e ao lesado algum consolo, o que seria assegurado pela indenização por danos morais.

Por outro lado, existiram, entre os doutrinadores brasileiros, aqueles que, como Lacerda de Almeida, negavam qualquer reparabilidade do dano moral mesmo após a vigência do Código Civil de 1916, posicionamento que prevaleceu até a primeira metade do século XX, sustentando acima de tudo a inexistência do dano civil de ordem não patrimonial.

A Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, incisos V e X, consagrou definitivamente a indenização por dano moral, eliminando ao menos teoricamente as controvérsias sobre sua admissibilidade, e estendendo-a às hipóteses não enumeradas expressamente em textos de leis. Mais recentemente, o Código de Defesa do Consumidor (artigo 6º, incisos VI e VII) e o Código Civil de 2002 (artigos 186, 927 e 942) também resguardaram a reparação econômica dos danos morais.

A visão hoje predominante é a de que, embora a dor não tenha preço e nem seja mensurável, os danos morais são plenamente reparáveis. A indenização em dinheiro não visa à restituição absoluta do statu quo da vítima anterior ao dano e nem à recomposição total da dor e da angústia por ele vivenciados. O seu escopo é o alívio, a amenização, a diminuição dos sentimentos negativos suportados pelo lesado, sob uma perspectiva de “correspondência” ou “proporcionalidade”, e não de “equivalência”, buscando ainda sancionar o lesante a fim de que ele não reitere a conduta ofensiva.

Assim, num contexto mais amplo, consiste o objetivo dessa reparação pecuniária na defesa dos valores essenciais à preservação da personalidade humana e do convívio social, atribuindo à vítima algum tipo de compensação, bem como lhe devolvendo, na medida do possível, sua integridade física, psicológica e emocional.”

A  indenização dos danos morais, conforme assinala frequentemente o próprio STJ, dispensa a prova objetiva do prejuízo, sendo necessário provar apenas o fato e o nexo de causalidade entre ele e o dano sofrido (ao contrário dos danos materiais, que exigem prova exata do desfalque sofrido no patrimônio da vítima).

Incidindo, portanto, os danos morais sobre um campo probatório limitado, facilita-se a atuação do STJ no controle de sua quantificação, já que esse Tribunal tem sua competência e sua estrutura direcionadas substancialmente às matérias de direito, e não às de fato. Por fim, acrescente-se que já é admitida a análise do valor indenizatório até mesmo em decisão monocrática pelo relator do recurso no STJ, o qual poderá modificá-lo ou mantê-lo, conforme verificamos no AI 496.359/SP  ou no RESP 609.225/PB.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou o método bifásico para analisar a adequação de valores referentes a indenização por danos morais. O  novo critério foi adotado em julgamento realizado no dia 4 de outubro de 2016.

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do processo, a aplicação desse método – que já foi utilizado pela Terceira Turma – uniformiza o tratamento da questão nas duas turmas do tribunal especializadas em direito privado.

O magistrado explicou que o método bifásico analisa inicialmente um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes que apreciaram casos semelhantes. Em um segundo momento, o juízo competente analisa as circunstâncias do caso para fixação definitiva do valor da indenização.

O ministro Luis Salomão, em voto que foi acompanhado pelos demais ministros da turma, disse que na segunda fase do método o juiz pode analisar a gravidade do fato em si e suas consequências; a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente; a eventual participação culposa do ofendido; a condição econômica do ofensor e as condições pessoais da vítima. Para o magistrado, o método é mais objetivo e adequado a esse tipo de situação.

“Realmente, o método bifásico parece ser o que melhor atende às exigências de um arbitramento equitativo da indenização por danos extrapatrimoniais, uma vez que minimiza eventual arbitrariedade de critérios unicamente subjetivos do julgador, além de afastar eventual tarifação do dano”, argumentou.

Quando analisa o pedido de dano moral, o juiz tem liberdade para apreciar, valorar e arbitrar a indenização dentro dos parâmetros pretendidos pelas partes. De acordo com o ministro Salomão, não há um critério legal, objetivo e tarifado para a fixação do dano moral. “Depende muito do caso concreto e da sensibilidade do julgador”, explica. “A indenização não pode ser ínfima, de modo a servir de humilhação à vítima, nem exorbitante, para não representar enriquecimento sem causa”, explica.

Para o presidente da 3ª Turma, ministro Sidnei Beneti, essa é uma das questões mais difíceis do Direito brasileiro atual. “Não é cálculo matemático. Impossível afastar um certo subjetivismo”, avalia. De acordo com o ministro Beneti, nos casos mais frequentes, considera-se, quanto à vítima, o tipo de ocorrência (morte, lesão física ou deformidade), o padecimento da própria pessoa e dos familiares, circunstâncias de fato (como a divulgação maior ou menor), e consequências psicológicas de longa duração para a vítima

O STJ já estipulou alguns parâmetros para estipulação dos danos morais.

a) Recusa em cobrir tratamento médico-hospitalar(sem dano à saúde); R$20 mil; REsp 986.947; 

b) Recusa em fornecer medicamento(sem dano à saúde); R$4,65mil; REsp 801.181; 

c) Cancelamento injustificado de voo: R$8 mil; REsp 740.968; 

d) Compra de veículo com defeito de fabricação(resolvido pela garantia): não há dano; REsp 750.735; 

e) Inscrição indevida em cadastro de inadimplentes: R$10 mil; REsp 1.105.974; 

f) Revista íntima abusiva: R$23,2 mil; REsp 856.360; 

g) Omissão de esposa ao marido sobre a paternidade biológica das filhas: R$ 200 mil; REsp 742.137; 

h)) Morte após cirurgia de amídalas: R$ 200 mil; REsp 1.074.251; 

i) Paciente em estado vegetativo por erro médico: R$ 360 mil; REsp 853.854; 

j) Estupro em prédio públlico: R$ 52 mil; REsp 1.060.856; 

l) Publicação de noticia inverídica: R$22,5; REsp 401.358; 

m) Preso erroneamente: R$ 100 mil; REsp 872.360 

Anoto, ainda, que a privação da lilberdade é reparada mediante indenização dos danos materiais, liquidados regularmente. Quanto aos danos morais, como ensinou Aguiar Dias(Da Responsabilidade Civil, volume II, pág. 417), consistem na inquietação e angústia causadas à vítima. Nesse conceito não se enquadrariam as ações antijuridicas que apenas estorvam o livre exercício da vontade, como as ameaças, mas somente aquelas que representam coação material traduzida em sequestro ou detenção. Pode ocorrer por via de prisão ilegal ou por outro modo que lhe se equipare. Veja-se nessa linha de pensamento o que prescreve o Código Civil: 

Art. 954. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.

Parágrafo único. Consideram-se ofensivos da liberdade pessoal:

- o cárcere privado;

II - a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé;

III - a prisão ilegal.

A questão da quantificação do dano moral é realmente de extrema complexidade. Como ficaria o caso a seguir julgado pelo STJ em caso de quantificação de um dano moral?

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"Após o falecimento da mãe, a filha, única beneficiária do seguro de vida, tem o benefício negado em razão do atraso de duas prestações do contrato de seguro.

Foi o que aconteceu no caso apreciado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando julgou o AREsp 625.973. Embora a filha tivesse providenciado o pagamento das duas parcelas após o falecimento da mãe, a seguradora alegou que o atraso levou à extinção automática do contrato.

O Tribunal de Justiça do Ceará  (TJCE) determinou o pagamento da indenização porque a segurada não havia sido comunicada do atraso e nem dos efeitos contratuais da inadimplência. A decisão foi mantida no STJ. Segundo o relator, ministro Villas Bôas Cueva, o entendimento aplicado está em consonância com a jurisprudência do STJ.

“Com efeito, como consignado na decisão agravada, a Segunda Seção desta corte superior consagrou o entendimento de que o mero atraso no pagamento de prestação do prêmio do seguro não importa em desfazimento automático do contrato, pois exige-se, ao menos, a prévia constituição em mora do segurado pela seguradora, mediante notificação ou interpelação”, afirmou o relator."

Em recente decisão, como se observa do site do STJ, dia 29.08.17, , a  Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve condenação da Globo Comunicações e Participações ao pagamento de indenização de R$ 30 mil a figurante que se acidentou durante as gravações da novela América. A decisão foi unânime.  

O acidente aconteceu em 2005. De acordo com os autos, enquanto trabalhava em uma gravação nos estúdios da emissora, a figurante caiu de uma arquibancada de aproximadamente quatro metros de altura e sofreu trauma na região lombar.

Segundo a autora da ação, a Globo arcou com o tratamento médico até 2007, mas cancelou seu plano de saúde antes que ela obtivesse recuperação total do acidente.

Além de determinar o custeio de tratamentos médicos solicitados e não realizados e o pagamento de pensão vitalícia, o juiz de primeiro grau fixou em favor da figurante indenização por dano moral de R$ 20 mil. O valor foi elevado para R$ 30 mil após julgamento de recurso de apelação pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, lembrou, inicialmente, que o TJRJ apontou que, no momento do acidente, a autora possuía contrato com agência para prestação do serviço de figurante. Além disso, o tribunal utilizou no julgamento laudo pericial que identificou incapacidade parcial permanente em 50%, motivo pelo qual afastou o caráter temporário do pensionamento.

“Portanto, o acórdão recorrido decidiu a questão, em sintonia com a jurisprudência da Terceira Turma do STJ, no sentido de que a pensão por incapacidade permanente, cujo termo inicial é a data do evento danoso, é vitalícia, pois a invalidez total ou parcial para qualquer atividade laborativa acompanhará a vítima ao longo de toda a sua vida”, afirmou a relatora.

Em relação ao dano moral, a ministra destacou que o tribunal fluminense fixou a quantia de indenização com base na lesão física permanente, no sofrimento físico e emocional e na redução da capacidade laborativa da figurante. Para a relatora, os valores foram proporcionais à necessidade de compensar o prejuízo extrapatrimonial e desestimular práticas lesivas.

“No tocante à fixação da compensação por dano moral, a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a modificação do valor somente é permitida quando a quantia estipulada for irrisória ou exagerada, o que não está caracterizado neste processo”, concluiu a ministra ao negar o recurso especial da Globo(REsp 1.646.276).

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Algumas anotações sobre a liquidação do dano . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5176, 2 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60123. Acesso em: 29 mar. 2024.

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