Aprofundamento dos aspectos relevantes da atual “guerra fiscal” dos Estados

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20/09/2017 às 20:48
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ENTENDENDO A GUERRA FISCAL

Para adentrarmos neste assunto, faz-se necessário um estudo sobre a forma de tributação do ICMS, quando das compras interestaduais, porquanto, é neste momento que os interesses entre os entes federados se avulta, na possibilidade de diminuição dos valores arrecadados por conta da competência tributária.

Esta competência tributária, como fora abordado neste estudo, tem sua determinação efetivada no momento da verificação do aspecto espacial do ICMS conjuntamente com o aspecto temporal que aponta o exato momento desta identificação, não se confundindo estes com o fato gerador da obrigação tributária, sendo permeada, de forma mais efetiva, pelo princípio da não cumulatividade, também abordado anteriormente.

É preciso salientar que temos algumas hipóteses de incidência do ICMS, conforme aborda Eduardo Sabbag:

A sistemática de recolhimento do ICMS pode, à luz dos incisos VII e VIII do § 2º do art. 155, ser assim resumida:

a) operações intraestaduais: o ICMS, por óbvio, compete ao Estado em que se realizou a operação. Se esta ocorrer no Distrito Federal (operação intradistrital), o imposto caberá ao DF;

b) operações de importação: o ICMS cabe ao Estado do estabelecimento destinatário da mercadoria ou do serviço, mesmo que o bem haja ingressado no território nacional por Estado diverso do destinatário;

c) operações interestaduais: o ICMS tem aqui uma sistemática peculiar, dependendo da atividade exercida pelo destinatário (consumidor final) da mercadoria – se contribuinte ou não. (SABBAG, 2012, p. 1067)

Diante destas possibilidades, nos deteremos, neste trabalho, somente ao último item, ou seja, operações interestaduais ao consumidor final, contribuinte ou não, por se tratar da problematização trazida pela ADI 4628, abordado como “questão de fundo similar” na justificativa para Repercussão Geral, conforme Min. Luiz Fux, no RE 680089, onde aborda aspectos relevantes do Protocolo 21/2011.

Tributação e forma de cobrança nas operações interestaduais

O método de cálculo do ICMS, que é um imposto do tipo Imposto de Valor Agregado (IVA) de tipo não cumulativo, impõe a dedução do imposto pago na operação realizada anteriormente, não onerando de forma vil a mercadoria, sendo recolhido ao estado a diferença entre os valores pagos de ICMS em operações anteriores e a operação realizada pelo empresário, tendo cálculo mensal de apuração.

As alíquotas cobradas neste tipo de transação são reguladas pelo Senado Federal, como não podia deixar de ser, diante da possibilidade de uma “guerra fiscal” que ocorreria por necessidade de arrecadação dos estados. A Resolução 22/89 fixa as alíquotas para estas operações, nos seguintes termos:

Art. 1º A alíquota do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação, nas operações e prestações interestaduais, será de doze por cento.

Parágrafo único. Nas operações e prestações realizadas nas Regiões Sul e Sudeste, destinadas às Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e ao Estado do Espírito Santo, as alíquotas serão:

I - em 1989, oito por cento;

II - a partir de 1990, sete por cento. (BRASIL, 1989)

Na tabela abaixo, podemos visualizar com mais exatidão esta informação:

Tabela 4 – Demonstrativo da alíquota interestadual

Como se pode observar, esta forma de tributação tem, em seu objetivo intrínseco, os Objetivos Nacionais instituídos pela CF/88, tentando minimizar as diferenças regionais entre os estado produtores (polos industriais) e os estados consumidores, conforme fora observado por Gedalva Braratto:

Quanto ao mérito, é esperado que as alíquotas interestaduais permitam aos estados mais pobres – ditos consumidores – auferir um saldo maior de ICMS, resultante de uma menor proporção de crédito de imposto suportado por aquisições em outros estados. Com alíquota interestadual inferior à interna o estado de destino suporta valor menor de crédito de imposto que incidiu no estado de origem e, em decorrência, resulta um saldo maior de imposto na operação subseqüente (e.g., destinada para consumidor final). Como os estados do N/NE/CO+ES compram dos estados do S/SE-ES com alíquota de 7%, inferior à incidente nas demais OIs (12%), o crédito do imposto suportado pelos primeiros e advindo dos últimos é ainda menor e o efeito distributivo de receita é potencializado. Este é o objetivo da adoção de alíquotas interestaduais inferiores às internas, fácil de ser comprovado do ponto de vista matemático (financeiro), pois em tese a carga tributária final com alíquotas uniformes ou diferenciadas é a mesma, diferindo, todavia, a apropriação de receita entre os estados nas operações intermediárias, a favor do estado de destino... (BARATO; MACEDO, 2007, p. 20-21)

Caso o destinatário da mercadoria não for contribuinte, conforme se aduz do artigo 155, § 2º, VII, “b”, da CF, o imposto caberá integralmente ao estado de origem, aplicando-se, neste caso, a alíquota interna correspondente.

Observe que, neste último caso, com a situação do e-commerce, se torna mais gritante, pois, em um universo onde todos podem comprar produtos mais baratos diretamente dos produtores, sem atravessadores, ou melhor, sem que o produto se utilize da cadeia de mercado (produtor/indústria – atacadista – varejista), podendo comprar diretamente do produtor/indústria, e, sendo o comprador consumidor final do produto não contribuinte do ICMS, é fácil perceber que a arrecadação dos estados não produtores será fortemente afetada por esta mudança, por ser o ICMS devido integralmente ao estado de origem.

Como comentado em outros momentos deste trabalho, a legislação tributária, embora abrangente, não fora desenvolvida para realidade que se vislumbra com o comércio eletrônico, não com esta magnitude, lembrando que esta problemática atinge todos os países, tanto internamente como externamente, seja nas Américas ou na Europa, estes problemas estão sendo intensamente discutidos.

O Amago da “guerra fiscal”

A problemática, em torno deste tema, é conhecida de longa data, pois, desde 2005, já se vislumbrava tal possibilidade, conforme se denota das palavras de Gedalva Baratto:

É claro que não é fácil manter harmonizado um imposto de competência subnacional. Difícil é aceitar que no Brasil tenha-se mais dificuldade para isso do que tem a UE para lidar com EM’s soberanos. No Brasil, a diferenciação de alíquotas nas operações interestaduais, que deveria servir somente para repartir renda entre os estados produtores e consumidores, face à complexidade e variedade de benefícios fiscais e tratamentos tributários diferenciados, também acabou resultando em diferencial de competitividade e munição para a guerra fiscal. (BARATTO, 2005, p. 135)

Somente esta situação bastaria para a “guerra fiscal” entre os estados, como se pode observar no exemplo citado pelo mesmo autor, como segue:

Como há uma contradição entre a comercialização interna e a interestadual, dissemos que os estados adotam medidas para ‘desmanchar’/neutralizar o efeito da alíquota interestadual menor que a interna. Por exemplo: o sistema prevê que o estado A (do N/NE/CO+ES) venda para o estado B (também do N/NE/CO+ES) com alíquota de 12%. Mas o estado A renuncia à vantagem inerente ao modelo e razão de sua existência, edita norma para vender a 7%, à revelia do Confaz (guerra fiscal), para poder competir no mercado dos estados do N/NE/CO+ES, caso contrário os contribuintes neles localizados preferirão comprar com alíquota de 7% nos estados do S/SU-ES. (BARATO; MACEDO, 2007, p. 23)

E, como abordado por Roque Antonio, patente a inconstitucionalidade deste procedimento, porquanto, os estados são obrigados a cumprir a lei, a não ser que celebrem acordos de isenção em contrário, como segue:

... os Estados e o Distrito Federal estão obrigados a instituir e a arrecadar, em decorrência do que dispõe o inciso XII, “g”, do § 2º do art. 155 da CF, que prescreve: ‘XII – Cabe à lei complementar: (...) g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados’.

(...)

Aliás, a Constituição atual, ao utilizar a palavra ‘deliberações’ (ao contrário da anterior, que usava a palavra ‘convênios’) reforçou a idéia de que tais ‘isenções, incentivos e benefícios fiscais’ dependem da manifestação de vontade da pessoa política, o que pressupõe a participação não só do Executivo, como, também, do Legislativo.

O mandamento constitucional sob análise não pode ser desobedecido, quer direta (por meio da não-tributação, pura e simples), quer indiretamente (adotando-se um sistema de reduções, remissões, devoluções, parcelamentos, créditos presumidos etc.). (CARRAZZA, 2007, p. 562-563)

No entanto, com o advento da internet e o incremento exorbitante no e-commerce, estas dificuldades se acirrassem ainda mais, cominando na criação do Protocolo 21/11, pelos estados consumidores, condicionado especificamente ao comércio eletrônico, na tentativa de diminuir esta evasão de divisas.

A despeito do que se possa cogitar, com relação à data de assinatura do referido protocolo, fazendo menção a uma crônica mal entendida ao tratar-se do dia 1º de abril, Dia da Mentira, o referido protocolo entrou em vigor e autuou contribuintes conforme podemos aduzir pela ADI 4628 que solicita ao STF a declaração de inconstitucionalidade do referido protocolo por:

“... estabelecer, em caráter geral, tributação inconstitucional e ‘inovadora’ para as operações de compra de bens não presenciais, conforme será demonstrado, se constitui em ato normativo imbuído das características de generalidade e abstração, à semelhança de uma lei, ato este inquinado, conforme veremos, de absoluta contrariedade às regras e princípios tributários da Constituição da República.” (ADI 4628, 2011, p. 3)

Devemos lembrar que o CONFAZ é um Conselho instituído pelo Convênio 377/97, na 88ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Política Fazendária, realizada no Rio de Janeiro, RJ, no dia 12 de dezembro de 1997, tendo como premissa a aprovação regimento interno deste órgão, estabelecendo que o Colegiado estabelecido pela Lei Complementar n° 24, de 7 de janeiro de 1975, denomina-se “Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ”, sendo sua missão precípua promover a celebração de convênios, para efeito de concessão ou revogação de isenções, incentivos e benefícios fiscais do imposto de que trata o inciso II do art. 155 da Constituição, de acordo com o previsto no § 2º, inciso XII, alínea “g”, do mesmo artigo e na Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, sendo explicita a determinação de unanimidade em suas decisões conforme se aduz do artigo 30, inciso I, como segue:

Art. 30. As decisões do Conselho serão tomadas:

I - por unanimidade dos representantes presentes, na concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais previstos no artigo 1º da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975; (BRASIL, 1997) (grifo nosso)

No entanto, poderia tal convênio, ao arrepio do Texto Magno, criar outros sujeitos passivos da obrigação tributária, ou ainda, determinar a ampliação da arrecadação sobre o arrepio da determinação do Senado Federal ou da Constituição? Obviamente, conforme fora exposto acima, a resposta a esta questão é um “não” peremptório. Aliás, no artigo 38 e parágrafo único, do referido protocolo, se observa que “dois ou mais Estados e Distrito Federal poderão celebrar entre si Protocolos, estabelecendo procedimentos comuns... não se prestarão ao estabelecimento de normas que aumentem, reduzam ou revoguem benefícios fiscais” (BRASIL, 1997) (grifo nosso), que não fora observado na consecução do Protocolo ICMS 21/11, porquanto outros estados não participaram da referida reunião para o acordo protocolado acima, mormente os estados produtores. Ademais, conforme entendimento do Min. Dias Tofoli, em outra ADI, ficaria prejudicada a existência do referido protocolo pela inconstitucionalidade por arrastamento de suas demais cláusulas, como se lê abaixo:

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Ação Direta de Inconstitucionalidade. AMB. Lei nº 12.398/98 – Paraná. Decreto estadual nº 721/99. (...). 6. Declaração de inconstitucionalidade por arrastamento das normas impugnadas do decreto regulamentar, em virtude da relação de dependência com a lei impugnada. (ADI nº 2158, Relator: Ministro Dias Toffoli. Órgão Julgador: Tribunal Pleno, julgamento em: 15-09-2010. Publicação em: DJ de 16-12-2010).

É mister observar que, esta tentativa de normatizar situações prejudiciais aos estados consumidores, fora exacerbada por parte dos estados signatários, por conta da invasão de competências e de um provável repasse ao consumidor, desta celeuma, conforme fora abordado no parecer da Procuradoria Geral da República na ADI 4628, como segue:

Presente a plausibilidade jurídica do pedido, verifica-se também a urgência da pretensão cautelar, que decorre da guerra fiscal provocada pelo Protocolo 21/2011 ao possibilitar tratamento diferenciado entre os entes federativos, o que, ao fim e ao cabo, representa risco de repasse do ônus ao consumidor final bem como de retenção das mercadorias pelas barreiras fiscais. (85449/2011 - 03/11/2011 - (petição eletrônica com certificação digital) advogado-geral da união - manifesta-se pelo deferimento da medida cautelar)

Neste protocolo, arbitrariamente, os estados consumidores obrigam a arrecadação da diferença do ICMS “devida na operação interestadual em que o consumidor final adquire mercadoria ou bem de forma não presencial por meio de internet, telemarketing ou showroom” (BRASIL, 2011), impondo tal condição, inclusive as operações realizadas em estados não signatários do “acordo”, instituindo, como substituto tributário, o estabelecimento remetente, na obrigação de arrecadar e repassar a diferença do imposto.

A prática da substituição tributária é amplamente utilizada, tanto em sua forma progressiva como regressiva, pelos entes federados; apesar da veemente crítica doutrinária apontada pelos diversos doutrinadores com relação a este instituto fictício, conforme José Eduardo (cf. MELO, 2008, p. 196-200), Sacha Calmon (cf. COÊLHO, 2008, p. 323-329), Eduardo Sabbag (cf. SABBAG, 2012, p. 1060-1061), Ricardo Alexandre (cf. ALEXANDRE, 2010, p. 315-325) etc., no entanto, infringi norma constitucional do § 7º, do artigo 150 da CF, que indica como sendo necessária criação de Lei, em sentido formal, para a determinação de substituto tributário, além de, nesta situação, onerar excessivamente o estabelecimento remetente que, consequentemente, irá repassar tal tributo, para o consumidor final, inviabilizando as vendas pela internet por conta do valor agregado ao custo, impedindo, desta forma, a livre circulação entre os estados federados, tendo caráter confiscatório, o que é igualmente proibido por conta do Princípio Constitucional da Vedação ao Confisco.

É preciso salientar que, embora não explícita uma taxa objetiva em nosso ordenamento jurídico, poderíamos vislumbrar uma taxa para, efetivamente, provar o confisco, mesmo em um País com uma escorchante carga tributária, lembrando, como dissemos anteriormente que, para identificarmos os objetivos constitucionais almejados pelo constituinte originário, devemos olhar retrospectivamente, por se tratar do conhecimento prévio do legislador, além de contarmos com o direito comparado para dirimir tais problemáticas.

A Constituição de 1934 foi a primeira a determinar parâmetros objetivos para tal problemática em seu artigo 185 onde afirmava que “Nenhum imposto poderá ser elevado além de vinte por cento do seu valor ao tempo do aumento” (BRASIL, 1934) (grifo nosso), cabe salientar que, o legislador, com o passar dos anos, retirou tal objetividade, penso que de forma premeditada, embora não tenhamos como provar tal argumentação, porquanto, atualmente, existem diversas discussões sobre este assunto, por ter o mesmo a roupagem de vedação instituída no artigo 150, inciso IV, da CF. Observe que, tal situação, fora flagrada na ADI 4628, onde se assevera que o incremento do ICMS, ao se implementar o Protocolo 21/11, seria de 58,82% sobre o valor retido anteriormente, claro confisco.

No que tange ao direito comparado, Eduardo Sabbag, nos ensina:

Ad argumentandum, no plano do Direito Comparado, em breve comentário, insta registrar a experiência argentina com o postulado. Conquanto o princípio da vedação ao confisco não esteja previsto de forma explícita no texto constitucional argentino, a Suprema Corte daquele país, com fundamento na garantia ao direito de propriedade, firmou outrora o entendimento de que a alíquota incidente sobre os impostos imobiliários e sucessórios não podia ser superior a 33%, sob pena de o imposto (sobre a renda ou patrimônio) tornar-se confiscatório. Assim, por meio de um “standard jurídico”, considerou confiscatório o imposto imobiliário que consumisse mais que o percentual de 33% da renda calculada (ou seja, a renda produzida pela exploração normal média do imóvel), e também estipulou que seria confiscatório o imposto sobre heranças e doações que excedesse ao percentual de 33% do valor dos bens recebidos pelo beneficiário. O objetivo foi invalidar os chamados ‘impostos esmagadores’. (SABBAG, 2012, p. 234)

Patente, portanto, tanto no plano interno como no plano do direito comparado, a assertiva afirmação do confisco com relação ao referido imposto.

Para dar um ar de legitimidade ao referido protocolo, este reproduz o que determina a Resolução do Senado 22/89, no que se refere às alíquotas interestaduais, em sua cláusula terceira, acrescido do parágrafo único onde afirma que o “ICMS devido à unidade federada de origem da mercadoria ou bem, relativo à obrigação própria do remetente, é calculado com a utilização da alíquota interestadual” (BRASIL, 2011), portanto, determinando outra base de cálculo para a compensação do imposto devido, suprindo, assim, as dificuldades encontradas neste novo cenário, dando, ainda, poderes para que nas barreiras alfandegárias estaduais possa ser exigido o respectivo documento com os valores pertinentes, conforme se aduz do parágrafo único, da cláusula quarta, do referido protocolo, como segue:

Será exigível, a partir do momento do ingresso da mercadoria ou bem no território da unidade federada do destino e na forma da legislação de cada unidade federada, o pagamento do imposto relativo à parcela a que se refere a cláusula primeira, na hipótese da mercadoria ou bem estar desacompanhado do documento correspondente ao recolhimento do ICMS... (BRASIL, 2011) (grifo nosso)

Observe que, embora a ADI 4628 aborde os fatos aduzidos nos capítulos anteriores deste trabalho, não há justificativa para que o protocolo em tela se insurja contra Norma Constitucional, conforme fora sustentado pelas unidades federadas, ainda que, sob a ótica do não cumprimento da preservação da repartição do produto da arrecadação do imposto, infringindo os Objetivos Constitucionais instituídos no artigo 3º, da CF, e outros tantos, porquanto, ao fazê-lo, insurge-se contra o Estado Democrático de Direito, não respeitando as regras Constitucionais instituídas pelo Constituinte Originário.

Nas manifestações da Advocacia Geral da União e da Procuradoria Geral da União, os órgãos se posicionaram a favor do deferimento de liminar suspendendo o derradeiro protocolo em seus efeitos.

De outra sorte, fora impetrado um MS no processo 2011107355, do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, 04/05/2011, meses após a assinatura do Protocolo ICMS 21/11, em que a empresa B2W CIA GLOBAL DO VAREJO, solicita a segurança contra ato do referido estado, diante da apreensão de mercadorias vendidas ao consumidor final, com base no protocolo em tela. Neste mesmo entendimento o TJSE acolheu a segurança do referido pedido, que fora objeto de Recurso Extraordinário pelo Estado de Sergipe, cominando no RE 680089, sendo acolhido pelo STF.

Ao analisar tal recurso, o Min. Luiz Fux, utilizando-se do mecanismo de repercussão geral, transformou este no leading case do STF em relação ao ICMS, quanto à possibilidade do Estado impugnar ou não créditos de ICMS oriundos de benefícios fiscais concedidos por outros Estados, bem como, na possibilidade de cobrança de ICMS sobre consumidor não contribuinte do imposto em compras realizadas pela internet,

Em todas as fases destes processos, os argumentos utilizados, apontam para a inconstitucionalidade flagrante do Protocolo ICMS 21/11.

Logo, não há de se falar em surpresas quanto à segurança jurídica tributária, ainda que, alguns juristas fiquem apreensivos com relação a estes julgamentos e outros, não analisados neste trabalho, em especial os Embargos de Divergência em Agravo 1234662/MG e o REsp 773675/RS, que tratam também de questões correlatas à cobrança do ICMS em operações interestaduais, tudo indica que a posição do STF será coerente com relação ao assunto, mesmo porque este já vinha se posicionando contrariamente a alguns posicionamentos do CONTRAF.

Observe que a problemática em tela se insurge por conta da necessidade de atualização da legislação e de um pacto federativo mais consistente, que demandaria uma reforma tributária de difícil entendimento, por conta dos diversos interesses envolvidos nesta demanda. Daí, pela dificuldade de se encontrarem decisões que agradem aos diversos entes envolvidos, o Congresso Nacional, responsável por dirimir e normatizar estas dificuldades, não se movimenta, deixando que o Judiciário resolva tal problemática, não desgastando, com isto, a imagem do Congresso, aliás, típico procedimento dos nossos governantes, onde podemos lembrar casos emblemáticos, como a regulamentação do direito a greve do servidor público, nos MIs 670/ES, 708/DF e 712/PA. Outra afirmação interessante, quanto a postura do Congresso Nacional, em não se posicionar diante de situações controversas, trata do caso do pedido de renúncia do ex-presidente do PT, José Genuíno, também Senador, sobre o qual pendia uma votação de cassação de mandato no respectivo órgão, que declarou ser melhor a renuncia para evitar um possível desgaste da instituição pela grande possibilidade de não ser cassado pelo Senado.

No entanto, a necessidade de regulamentação quanto ao e-commerce, e o avultado volume dos valores envolvidos tem obrigado uma movimentação dos legisladores, a despeito das dificuldades encontradas.

Proposituras legislativas sobre a questão

Ao pesquisar as PEC’s que fazem menção ao assunto estudado, verificamos algumas situações correlatas ao que fora abordado acima, com relação às dificuldades apresentadas para chegarmos a um pacto federativo ou uma reforma tributária significativa em nosso País. São diversas tentativas sem êxito.

O que se desponta no cenário legislativo são as compensações por perdas orçamentárias, com relação a projetos de diminuição das alíquotas do ICMS sobre vendas interestaduais, ou seja, relacionados à Resolução 22/89 do Senado Federal, que, tem proposta de escalonamento, para baixo, das alíquotas, até 2025.

O último projeto de Lei, PLS 106/2013, teve a aprovação de 24 estados na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, conforme noticia divulgada pelo próprio Senado Federal, como segue:

O projeto que trata da compensação aos estados por perda de receita (PLS 106/2013), que se encontra na pauta da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) nesta terça-feira (12), contém um novo arranjo para a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em tramitação no Senado.

As alíquotas interestaduais que constam do PLS 106/2013 estão de acordo com um convênio – 93/2013 – que chegou a ser submetido ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e teve o apoio de 24 estados. O texto só não foi aprovado por não ter recebido a aprovação dos estados de Santa Catarina, Goiás e Ceará. (LIMA, 2013)

No entanto, parece-me paliativo o tratamento que o Governo Federal tem dado ao problema, pois, supre a necessidade imediata dos estados, fornecendo recursos (296 bilhões de reais) ao invés de resolver o problema da guerra fiscal de forma mais efetiva e contundente.

A PEC 354/2013 (apensada a PEC 310/2013 e 406/2009), todas se relacionam ao assunto abordado acima, destinando recursos para compensação de perdas dos estados quanto a alteração das alíquotas interestaduais do ICMS, mas não tratam, especificamente, sobre a questão das compras pela internet.

Temos a PEC 282/2013, trata de forma mais específica sobre as compras pela internet, determinando a alteração da responsabilidade de arrecadação e o valor da alíquota que, para o contribuinte, será significativa, é uma reprodução do Protocolo ICMS 21/11, que provavelmente será tido por inconstitucional. Vejamos o que a PEC propõe:

Art. 1º Os incisos VII e VIII do § 2º do art. 155 da Constituição da República passam a vigorar com a seguinte redação:

‘Art.155...............................................................................

§2º.......................................................................................

VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, aplicar-se-á a alíquota interestadual, cabendo ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;

VIII – a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:

a) ao destinatário, quando for ele contribuinte do imposto;

b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte dele;

..................................................................................’ (NR) (SENADO, 2013) (grifo nosso)

Observe que serão aplicadas as alíquotas interna e interestadual para as operações realizadas por contribuinte ou não do imposto, portanto, segue o mesmo entendimento do Protocolo ICMS 21/11, sendo que o inciso VIII, da PEC, confirma este entendimento e responsabiliza o contribuinte pelo recolhimento do referido tributo.

Como fora abordado anteriormente, tal proposição infringe o Princípio Constitucional da Vedação do Não Confisco, sendo inconstitucional tal propositura, como o é para o Protocolo ICMS 21/11.

Ademais, em uma manobra muito astuta, impõe o destinatário como responsável pelo recolhimento do tributo quando este for contribuinte do mesmo, interessante manobra por se tratar de estabelecimento que estará ao alcance do ente arrecadador, tornando mais fácil a sua cobrança e controle.

Atualmente, esta PEC, encontra-se aguardando parecer na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), com regime de tramitação especial, portanto, esperamos que a CCJC verifique o ônus social desta alteração legislativa e impeça seu andamento.

Neste sentido temos as PEC’s 113/2011 e 56/2011, que oneram o contribuinte de forma semelhante, ampliando a base para a arrecadação do valor do ICMS, como anteriormente descrito. Estas PEC’s foram arquivadas e estão prejudicadas em seu andamento, embora estejam caminhando em conjunto com a PEC 103/2011.

Esta última, PEC 103/2011, onera igualmente o contribuinte das compras não presenciais, somente com a diferença de que o estado de localização do destinatário terá direito a 60% da diferença entre a alíquota interestadual e alíquota interna do imposto devido.

Diante de tudo o que fora exposto, não podemos esperar uma solução para o referido impasse sem que o mesmo cause significativo aumento nos tributos incidentes sobre estas operações.

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Sobre o autor
Carlos Massarelli

Advogado em Praia Grande (SP).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão do Curso de Pós Graduação em Direito Tributário.

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