Shopping Center, segundo a ABRASCE (Associação Brasileira de Shopping Centers), é “um centro comercial planejado sob uma administração única, composto de lojas destinadas exploração comercial e à prestação de serviços, sujeitas a normas contratuais padronizadas, para manter o equilíbrio da oferta e da funcionalidade, assegurando a convivência integrada e pagando um valor de conformidade com o faturamento”.
Do conceito, extrai-se facilmente que a essência da estrutura organizacional do Shopping está calcada no conceito de contrato. Todavia, pergunta-se, que contrato? Por outras palavras, qual a natureza jurídica do contrato de Shopping Center?
Para respondermos a essa vexatissima questio, passaremos por um critério exclusivo, eliminativo de possibilidades assentes em figuras próximas, até chegarmos ao que nos parece o ponto de vista mais plausível de acordo com a melhor doutrina.
Em primeiro lugar, cumpre evidenciarmos que não se trata de condomínio. Embora os lojistas, antes mesmo do prédio estar construído, já comecem a contribuir com certa quantia para ultimação do empreendimento, pagam uma res sperata, que é o sobrefundo de comércio do Shopping, ou seja, pagam para ter um lugar no centro comercial, não para adquirirem a propriedade do imóvel (fala-se a respeito em ágio). E sem domínio, não pode haver condomínio.
Por outro lado, uma vez edificada a obra, os lojistas continuam despendendo um quantum mensal em favor do dono do imóvel, chamado empreendedor, que parece ser o título de locação (assim o trata a Lei 8245/91, no seu art. 54). Mas é mera aparência, pois só haveria locação se o preço pago decorresse unicamente do uso e gozo da coisa, ou melhor se a causa do contrato fosse a posse do imóvel; o que não é o caso, já que essa quantia é variável segundo o lucro do lojista que também pode ser o valor devido, dependendo de qual é o maior. Se a porcentagem sobre o lucro bruto superar a quantia mínima (fixa), aquele será o valor devido; se não houver a superação , a quantia impõe-se. Ademais, em dezembro a quantia mínima é sempre cobrada em dobro, o que mostra que efetivamente se tem em mira, nesse contrato, o lucro obtido pelo lojista, já que é de supor-se que esse mês é o de maior incremento de vendas. De outra parte, o comerciante instalado em Shopping sofre sérias restrições no uso do imóvel uma vez que qualquer alteração a que ele vise realizar tem de seguir os rígidos padrões do tenant mix (planta do centro comercial); sem olvidar o fato de que o empreendedor (proprietário do imóvel) pode exercer severa fiscalização sobre os ganhos brutos dos lojistas, o que definitivamente descaracteriza esse contrato como sendo de locação.
Seguindo essa ordem de idéias, chegou-se a levantar a hipótese de que o Shopping seria uma sociedade em cota de participação, pela comunhão de interesse que há entre os lojistas e o empreendedor pois ambos almejam o lucro. Todavia, um único argumento pode profligar essa tese: falta a affectio societatis no contrato de Shopping Center. E isso tanto é verdade que, se imaginássemos os lojistas como sócios do empreendedor só pelo fato de buscarem o lucro, estaríamos a admitir que um empregado que aufere percentagens sobre vendas seria igualmente sócio de seu empregador, já que ambos buscam o máximo de vendas possível.
Houve quem dissesse também que o Shopping Center seria uma joint venture, ou seja, uma associação de duas ou mais empresas, por tempo limitado, para a consecução de um fim lucrativo comum, sob uma única personalidade jurídica. É facilmente rechaçável esse pensamento, basta dizer que o Shopping não possui personalidade jurídica.
Por fim, após a conclusão dessas refutações necessárias, coloquemos a opinião que achamos a mais acertada.
O contrato de Shopping Center é, em realidade, um contrato atípico misto, ou seja, embora guarde características de todos os contratos supracitados, não se confunde com nenhum deles; tem unidade orgânica autônoma, por consistir em instrumento jurídico que reflete, em boa parte, a complexidade econômica do centro comercial. Não se pode nem dizer que ele é constituído por um conjunto de contratos coligados, em outras palavras, uma união meramente externa de negócios jurídicos. O que ocorre é verdadeiramente a aparição contrato ex novo, fruto da autonomia privada no campo cinzento deixado pelo legislador.
É preciso que se diga que, no direito positivo, não é essa a opinião vigente, dados os termos expressos da Lei 8245/91, tratando o Shopping como locação. Força é convir, entretanto, que é muito mirrado o esquema de aluguel para abarcar essa figura e cremos que, de lege ferenda, o que se deve afirmar é a independência do centro comercial como contrato autônomo.