A consumação de uma conduta delituosa pelo psicopata em razão de psicopatia e seus reflexos jurídico-penais na seara criminal

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A figura do psicopata no cenário brasileiro, suas causas e principais embates enfrentados pelo judiciário quanto ao instituto da culpabilidade e ausência de estabelecimentos adequados para tratamento desse público.

1. 0. INTRODUÇÃO

Um dos temas de suma relevância e que quase não se discute na dogmática jurídica, são quais os fatores condicionantes que levam um agente ao cometimento de um delito e quais os efeitos jurídicos na seara penal. Quanto esse último existe opiniões e controvérsias entre doutrinadores e psiquiatras forenses a despeito da imputabilidade do criminoso no momento da consumação do tipo penal. Há quem defenda que, diante de inúmeros casos de crimes bárbaros e atrocidades no Brasil, aqueles que cometem crimes devem ser responsabilizados pelos seus atos de forma rígida e severa. Assim, esse estudo, estabeleceu-se como desiderato principal, elucidar quais fatores influenciam na formação de um psicopata criminoso e quais seus reflexos jurídico-penais quanto à sua culpabilidade na seara criminal?

Tem-se como hipótese que os fatores que levam psicopatas a cometerem crimes são fatores hereditários; biológicos; psicológicos, sociais e familiares que doravante trazem seus efeitos na seara penal traduzido na imputabilidade ou inimputabilidade penal quanto à responsabilidade do agente ao cumprimento de pena.

O objetivo geral consiste justamente em analisar quais fatores que levam o psicopata a desenvolver um comportamento criminoso e quais efeitos jurídicos-penais surgirão decorrentes desse comportamento no âmbito criminal, especificando-se em: conceituar psicopatia, apontando quais os métodos utilizados para identificar uma pessoa portadora desse transtorno, bem como se o comportamento criminoso tem correlação direta com fatores: Físicos; Biológicos; Psicológicos, Sociais e Familiar, delimitando o assunto conforme teorias sobre criminosos. O segundo objetivo desse projeto pauta-se em entender o instituto da culpabilidade e suas teorias no direito penal brasileiro, levantando em quais as hipóteses poderá haver a exclusão da culpabilidade do delinquente no momento da aplicação da pena. E por fim demonstrar qual posição majoritária quanto à sanção aplicada ao psicopata àluz da legislação brasileira, bem como a necessidade de se aplicar pena ao invés de medida de segurança em razão da proteção da sociedade frente à periculosidade de tais agentes.

Destarte, tem- se as justificativas, que se fundamentam, no âmbito jurídico, na Constituição Federal de 1988, que por sua vez resguarda os direitos individuais e fundamentais do cidadão, mas que funciona também como instrumento norteador e delimitador do magistrado no momento de fazer a hermenêutica da norma jurídica e colocá-lo no efetivo exercício forense de seus julgados. Outrossim, o aspecto jurídico também se justifica pelo fato de uma aferição minuciosa da sanidade mental do indivíduo através do exame de sanidade mental, para que esse possa ser responsabilizado pelo crime que eventualmente venha cometer de forma razoável e compatível com suas peculiaridades individuais e mentais, em consonância com os ditames estabelecidos no Código Penal e de Processo Penal.

Ainda assim, essa problemática surte efeitos na seara social, pois identificará à inteiração do indivíduo portador de transtorno da personalidade com outras pessoas nas mais diversas áreas, seja ela, profissional, social ou política. Logo, sendo possível descobrir previamente os fatores que levam um psicopata a cometer um delito, poderão ser instituídas políticas de conscientização popular, afim de esclarecer a sociedade quanto periculosidade desses indivíduos e o que eles são capazes de fazer. Quanto ao meio hereditário é importante estudar, se comportamento criminoso pode ser transmitido ou adquirido por pessoas que cometem reiteradas condutas delituosas. Haja, vista que, se chegar a um denominador comum quanto à transmissão do comportamento criminoso através da hereditariedade, o agente poderá ser submetido desde a infância a tratamentos psicológicos.

Em se tratando dos fatores econômicos, inúmeras das vezes o crime tem seus reflexos patrimoniais em decorrência de atos do infrator contra o patrimônio de outrem. Logo, com o descobrimento precoce do transtorno da personalidade no indivíduo, poderão ser evitadas inúmeras condutas que ainda não se consumaram através de medidas acautelatórias de supervisão e acompanhamento psicológico, impedindo, sobretudo, qualquer ato delitivo que venha inferir no patrimônio alheio causando prejuízo.

Dado o exposto, essa pesquisa tem como referencial teórico as teorias de Cesare Lombroso, Enrico Ferri e Raffaele Garofalo. Todavia, quanto ao mérito do trabalho em xeque tem-se o fenomenal criminologista Nestor Sampaio Penteado Filho[1] o qual aduz que o portador de psicopatia não é necessariamente um doente, na acepção estrita do termo, no entanto se acha à margem da normalidade emocional e comportamental, ensejando dos profissionais de saúde e do direito redobrada atenção em sua avaliação.

Nesse projeto, fez-se necessário o emprego de algum método de investigação através da metodologia, que, no presente caso, relaciona-se ao indutivo, onde para chegar ao conhecimento ou demonstração da verdade, faz-se necessário partir de fatos particulares; de teorias já consolidadas quanto os fatores biológicos, psicológicos, hereditários ou sociais que já foram estudas, sobretudo, o direito penal já positivado, para que daí então se possa extrair uma conclusão genérica de que ainda que todos esses fatores influenciem na predisposição para o crime, existe a possibilidade do agente considerado inimputável para o direito penal, ser punido com pena e com aplicação de medida de segurança ou isenção de pena.

O procedimento adotado quanto ao objeto da pesquisa caracteriza-se no exploratório, por quanto foram feitos estudos bibliográficos por meio de fichamentos e resenhas; exploração sobre as razões psicossomáticas que desencadeiam comportamentos criminosos e seus efeitos na seara penal; análise se fatores hereditários; biológicos; psicológicos e sociais são determinantes para efetivação da conduta delituosa e quais efeitos essas condutas gerará na seara criminal.

A situação do psicopata quanto a aplicação da sanção adequada no processo penal, desdobrando em imputável, semi-imputável ou inimputável. Ainda será avaliado se o acusado tem possibilidade de ser responsabilizado pelo crime cometido como plenamente imputável ainda que sofra de patologias psicológicas. Se a conduta delituosa tem correlação com fatores biológicos, hereditários ou sociais.

Por conseguinte, a pesquisa pode ser definida como qualitativa, sendo, todavia, um estudo não estatístico, que identifica e analisa em profundidade dados de difícil mensuração de um grupo de criminosos em relação a uma problemática específica. Entre eles estão sentimentos, sensações e motivações que podem explicar determinados comportamentos apreendidos com o foco no significado que adquirem para os indivíduos.

Ademais, a pesquisa utilizará a técnica bibliográfica amparada em fontes primárias e secundárias. A primeira por abranger a própria legislação e a segunda por englobar a jurisprudência e o que já se publicou em torno do assunto em livros, artigos, teses, monografias, periódicos científicos.

Enfim, o enfoque da aprendizagem em questão será multidisciplinar, verificando-se a integração e complementaridade dos assuntos abordados dentro dos ramos do direito; da psicologia; da antropologia criminal, como o Direito Penal, Psicologia Forense, e Criminologia. O conhecimento acerca de Direito Penal serve de base à análise do tratamento do agente considerável imputável ou inimputável no galgar do processo.


2.0. A QUESTÃO DA MORALIDADE E A PROBLEMÁTICA DO CRIME

Uma das questões humanas mais remotas refere-se à forma de como devemos nos conduzir corretamente, distinguindo o certo do errado, como nós os diferenciamos e como deveríamos agir para encontrar tal diferença. Na prática há elementos morais comuns a todas as sociedades, como a valorização da verdade, a importância das crianças ou o valor quase supremo da vida do nosso semelhante, sendo o motivo mais óbvio para isso que, sem tais regras, as sociedades não conseguem se viabilizar[2].

Tal constatação levou alguns filósofos, sobretudo os chamados contratualistas, como Hobbes e Rousseau, à formulação de que a moralidade é derivada de um contrato social, consistindo em regras para governar as relações mútuas, gerando benefício a todos, desde que houvesse adesão geral dos membros da sociedade[3].

Kant em sua Fundamentação da Metafísica dos Costumes, define seu Imperativo Categórico em duas formulações: “age somente conforme a máxima pela qual você, simultaneamente, pode desejar que se torne uma lei universal”, e “age de tal modo que possas usar a humanidade, tanto em tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como um fim ao mesmo tempo e nunca apenas como um meio”[4].

Diante das dificuldades das teorias anteriores, no século XX a Teoria da Virtude formulou a proposta de um retorno aos valores Aristotélicos; segundo ela, ao recusarmos a figura de um legislador universal, antes identificado em Deus, não haverá meios de encontrar a lei moral, só sendo possível julgar o ponto central da vida moral: a motivação. Um dos filósofos dessa teoria[5] propôs o caso de um amigo que visita outro no hospital para lhe dar suporte em sua enfermidade; o doente agradece sinceramente emocionado a atitude altruísta do amigo, mas este diz estar apenas cumprindo o que achar ser certo, nada além disso, não o tendo visitado por gosto e sim pelo cálculo racional.

Segundo Blair, existiria um mecanismo de inibição de violência baseado nas reações afetivas dos indivíduos diante de situações imorais, que só posteriormente seriam interpretadas racionalmente como erradas, por conta do mal-estar gerado[6].

Esses estudos retomam a teoria dos sentimentos morais do filósofo escocês David Hume, em seu Tratado da Natureza Humana, de 1739, que acreditava ser impossível derivar uma justificativa racional para uma prescrição moral; para ele, bem como para a escola emotivista, são nossas emoções que primeiramente sinalizam o que aprovamos como certo ou rejeitamos como errado, vindo as justificativas a posteriori[7].

Diante de todo exposto, o grande problema a ser enfrentado é o paradigma da moralidade, pois é algo que está diretamente ligado ao campo das emoções de cada sujeito. Logo, a ciência da Psicologia ainda se carece de estudo no ramo das emoções interiorizadas pelo agente.

2.1. PSICOPATIA

A psicopatia pode ser entendida como um transtorno de personalidade antissocial, também denominado psicopatia, sociopatia, transtorno de caráter, transtorno sociopático, transtorno dissocial. A variação terminológica reflete a aridez do tema e o fato de a ciência não ter chegado a conclusões definitivas a respeito de suas origens, desenvolvimento e tratamento[8].

No mesmo sentido, de acordo com o Dicionário Aurélio, a terminologia psicopatia refere-se a “um estado patológico caracterizado por desvios, sobretudo, caracterológicos que acarretam comportamentos antissociais”[9].

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Para Nestor Sampaio Penteado Filho[10], os transtornos de personalidade não são tecnicamente doenças, mas anomalias do desenvolvimento psíquico, sendo consideradas, em psiquiatria criminal, perturbações da saúde mental. No plano policial-forense os transtornos de personalidade revelam-se de extrema importância, pelo fato de seus portadores (especificamente os antissociais) muitas vezes se envolverem em atos criminosos.

Ainda neste contexto, impossível não citarmos Nelson Hungria[11], para o qual a psicopatia é resultado de uma personalidade defeituosa e não oportunamente corrigida, e que se formou sem a adoção de princípios éticos e pela inadequação de instintos; ou veio a deformar-se pela adoção de hábitos contrários a lei e ao que se entende como moralmente correto. Genival França[12] corrobora com a mesma opinião e entende que “as pessoas acometidas pela personalidade psicopática não são enfermos, visto que sua inteligência mantêm-se normal, o problema encontra-se em suas emoções e seu caráter, já que este sim são afetados”.

No meio forense a psicopatia é entendida como um grupo de traços ou alterações de conduta em sujeitos com tendência ativa do comportamento, tais como avidez por estímulos, delinquência juvenil, reincidência criminal, descontroles comportamentais, entre outros. É classificada como a mais grave alteração de personalidade, uma vez que os indivíduos caracterizados por essa patologia são responsáveis pela maioria dos crimes violentos, cometem vários tipos de crime com maior frequência do que os não-psicopatas e, ainda, têm os maiores probabilidades de reincidência apresentados[13].

A psiquiatria forense não qualifica a psicopatia na visão tradicional de doença mental, visto que o sujeito não apresenta nenhum tipo de desordenação, desorientação ou desequilíbrio, ou seja, não manifestam nenhum tipo de sofrimento psicológico. No entanto, podemos afirmar que o termo “Psicopatia” se destaca por descrever indivíduos inadaptados socialmente. Estes são brutais, mentirosos, perversos, degenerados e veiculam conotações negativas referentes a uma consciência social, já que a sua perturbação é do domínio da moralidade[14].

 Desta forma, caracterizando um estado mental patológico, a psicopatia define, apropriadamente, desequilíbrios do caráter que provam condutas antissociais, despidas de culpabilidade. Por outro lado, pode ser entendido como uma disfunção moral as quais estimulam o delinquente a praticar frequentemente crimes contra a sociedade, sem a mínima chance de sentirem qualquer sentimento de culpa ou remorso por seus delitos cometidos.

A importância das pesquisas da psicopatologia no âmbito jurídico é de total relevância para o nosso estudo, por abordar fatores que fazem parte do dia-dia da instrução processual criminal quando se trata de crimes cometidos por psicopatas.

2.2. FACES DE UM PSICOPATA

O termo psicopata pode dar a falsa impressão de que se trata de indivíduos loucos ou doentes mentais. A palavra psicopata literalmente significa doença da mente (do grego, psyche = mente; e pathos = doença). No entanto, em termos médico-psiquiátricos, a psicopatia não se encaixa na visão tradicional das doenças mentais. Esses indivíduos não são considerados loucos, nem apresentam qualquer tipo de desorientação. Também não sofrem de delírios ou alucinações (como a esquizofrenia) e tampouco apresentam intenso sofrimento mental (como a depressão ou o pânico, por exemplo). Ao contrário disso, seus atos criminosos não provêm de mentes adoecidas, mas sim de um raciocínio frio e calculista combinado com uma total incapacidade de tratar as outras pessoas como seres humanos pensantes e com sentimentos[15].

Os psicopatas em geral são indivíduos inescrupulosos, dissimulados, mentirosos, sedutores e que visam apenas o próprio benefício. Eles são incapazes de estabelecer vínculos afetivos ou de se colocar no lugar do outro. São desprovidos de culpa ou remorso e, muitas vezes, revelam-se agressivos e violentos. Em maior ou menor nível de gravidade e com formas diferentes de manifestarem os seus atos transgressores, os psicopatas são verdadeiros "predadores sociais", em cujas veias e artérias corre um sangue gélido. Tais indivíduos podem ser encontrados em qualquer raça, cultura, sociedade, credo, sexualidade, ou nível financeiro. Estão infiltrados em todos os meios sociais e profissionais, camuflados de executivos bem-sucedidos, líderes religiosos, trabalhadores, "pais e mães de família", políticos etc[16].

2.3. MÉTODO UTILIZADO NA PSICOLOGIA PARA IDENTIFICAR UMA PESSOA PORTADORA DE PSICOPATIA

Na década de 1980 existiram alguns problemas nos estudos da psicopatia, faltava um método padrão para avaliar com maior precisão e fidedignidade, o que tornava difícil comparar os resultados dos estudos que se propunham em esclarecer e tomar consciência dos processos psíquicos que norteiam esse comportamento. Para avaliar e diagnosticar um indivíduo com característica psicopata é necessário ter consciência de quão complexo é esse fenômeno. Robert Hare, um dos principais especialistas em psicologia moderna dando ênfase na psicopatia, criou um método de operacionalização desse tema através do inventário da psicopatia[17].

Robert Hare é frequentemente creditado como o responsável pela explosão das pesquisas durante as últimas décadas devido à sua criação da medida de psicopatia mais amplamente utilizada, o Psychopathy Cheklist (PCL) e o atual Psychopathy Cheklist Revised (PCL-R)[18].

Embora esse não seja o método único de avaliar a psicopatia o PCL-R tornou-se a medida padrão de conhecimento. O PCL-R compõe-se de 20 itens que podem ser divididos em dois grupos. Os psicólogos forenses são responsáveis por marcar as alternativas que estão presentes e identificar se o sujeito apresenta características significativas de psicopatia[19].

2.4. TRATAMENTO DO TRANSTORNO DA PERSONALIDADE PSICOPÁTICA

Segundo Laura Silva[20], não há medicamentos que se mostraram eficazes para a cura do psicopata. O indivíduo com esse transtorno não sente sofrimento ou desconforto emocional, não sendo possível um tratamento de um sofrimento inexistente.

Na concepção de Davidson, o tratamento do psicopata é para um alívio da sintomatologia, pois é uma condição crônica. O uso de lítio pode ser útil para a agressividade e anticonvulsivantes podem aliviar irritabilidade e impulsividade. Diversos tipos de intervenção psicoterápica são propostas, tendo melhores resultados os que tratam de sintomas específicos[21].

Segundo Morana, Stone e Filho, muitos psicopatas homicidas, quando presos, enganam médicos, psiquiatras, psicólogos e agentes penitenciários, fazendo que eles acreditem que ele se curou e sendo uma pessoa capaz de voltar a conviver com a sociedade. E quando essa errônea decisão é tomada surgem novas vítimas desse psicopata. Sendo pessoas que não aprendem com punições e não havendo cura para a psicopatia, esses indivíduos se tornam predadores irremediáveis para a sociedade, a prisão permanente desses inimigos parece ser a única defesa da comunidade[22].

2.5. FATORES QUE INFLUENCIAM NA FORMAÇÃO DE UM PSICOPATA CRIMINOSO

Ao decorre dos anos, muitos estudos foram direcionados ao descobrimento da origem da psicopatia em determinadas pessoas, ou seja, das motivações de comportamentos tão diferentes e insensíveis que certos indivíduos possuem para com o próximo. Ainda que as forças que produzem a psicopatia permaneçam obscuras para os pesquisadores, muitas teorias apontam causas diferentes para seu surgimento: enquanto algumas indicam os fatores genéticos ou biológicos (ou seja, da natureza) para explicar tal origem, outras afirmam que o mencionado transtorno resulta de um ambiente social problemático[23], contudo, outros por outro lado dividem opiniões que fatores psicológicos são determinantes para a consumação da conduta delitiva no momento da introjeção de experiência negativas que somadas na psique podem gerar o comportamento criminoso. Destarte, o ambiente familiar também tem influência direta na formação do caráter e da personalidade das pessoas, inclusive em crianças em fase de aprendizagem e na adolescência.

2.5.1. FATOR HEREDITÁRIO

O fator hereditário pode influir nas impulsões para o crime. Todavia, o problema está por ora muito longe da solução integral; mas convém mencionar desde já algumas explicações, das quais deliberadamente excluímos os mecanismos mentais.

Certas anomalias corporais hereditárias (assim como as adquiridas), gerando no indivíduo um complexo de inferioridade, podem arrastá-lo ao crime. Os homens disformes, os de "má catadura”[24] encontram, para ambientar-se na vida amorosa ou social, maior dificuldade que os outros; são mais frequentemente que os outros, ofendidos pela zombaria e pelo desprezo, a cujos estímulos, aliás, se mostram muito sensíveis.

A hereditariedade pode conduzir ao crime também pelo "déficit" de inteligência. Aschaffenburg, Goring e Godsard afirmavam mesmo que o tipo criminal se caracterizaria pela insuficiência intelectual. Não há dúvida que é essa, de fato, uma das veredas da hereditariedade para a delinquência[25].

2.5.2. FATOR BIOLÓGICO

Os fatores biológicos no tocante aos comportamentos delitivos estão diretamente ligados ao ramo da biologia criminal trabalhada paulatinamente por Cesare Lombroso e que doravante sofreu inúmeras e severas críticas. Não obstante, as teorias de orientação biológica têm seu enfoque, em localizar e identificar em alguma parte do corpo do homem ou no funcionamento deste, algum fator diferencial que explique uma conduta delitiva, essa se supõe como consequência, portanto, de alguma patologia, disfunção ou transtorno orgânico[26].

Embora hoje já não se aceite mais suas ideias e teorias, principalmente acerca do determinismo biológico, segundo o qual o indivíduo portador de certas características físicas venha a ser inevitavelmente um criminoso, é inegável a sua contribuição para o desenvolvimento de estudos de cunho biológico a cerca, por exemplo, dos hormônios, lesões cerebrais, anormalidades cromossômicas, etc, os quais se sabem que de uma forma ou outra podem agir na eclosão da ação criminosa[27].

Hoje a influência dessa teoria foi bastante reduzida principalmente pelo fato de que esta é baseada na consideração do crime como produto puro de um fenômeno biológico[28].

2.5.3. FATOR PSICOLÓGICO

O ramo da psiquiatria criminal tem por objeto o estudo dos transtornos anormais da personalidade, isto é, as doenças mentais, retardos mentais (oligofrenias), demências, esquizofrenias e outros transtornos, de índole psicótica ou não[29].

Ainda essa problemática nos leva a diversos questionamentos, o qual se destaca no que leva a pessoa a cometer um ato de agressão? Quais fatores psicológicos contribuíram de forma conjunta para que uma pessoa se torne um assassino em série? Por que algumas vítimas de bullying reagem posteriormente atirando em colegas de escola e professores e posteriormente cometem suicídio?

Odon Ramos Magalhães explica que na abordagem do ato criminoso, devem ser considerados três fatores: tendências criminais (disposições do indivíduo), a situação global (solicitações momentâneas) e as resistências mentais e emocionais da pessoa ao estímulo (mecanismo repressor). A ação criminosa resultaria de um choque entre as tendências criminais mais a situação global contra a resistência. Se o primeiro grupo vencesse, o ato resultante seria criminoso, caso a resistência fosse a vencedora, o ato já seria socialmente aceito[30].

Esta resistência é constituída pela personalidade, que por sua vez vai sendo construída através de valores e fatores introjetados no indivíduo, desde a infância, possibilitando a ele a formulação de críticas e o desenvolvimento de meios capazes de conter impulsos. São chamados de primários ou psico-evolutivos os fatores que atuam na primeira fase de estruturação da personalidade, podendo ser tanto de ordem biológica, social ou psicológica. Os fatores que atuam sobre uma personalidade já estruturada são denominados de secundários, são esses os estímulos que surgem levando alguém a agir[31].

Para Newton Fernandes, a personalidade seria o produto final das “experiências adquiridas e paulatinamente incorporadas, de forma a que cada pessoa, através da integração de todos esses elementos, adquira a sua forma de ser própria e unitária”[32].

2.5.4. FATOR SOCIAL

O comportamento criminal não pode ser estudado in vácuo, como se fosse um comportamento à parte. A possibilidade da ação delitiva varia inversamente com as probabilidades abertas a um indivíduo para a satisfação de suas necessidades por meios legítimos, estabelecendo-se uma correlação entre as inferiores condições de vida, o baixo nível de educação, desemprego, etc[33].

Outrora, a criminologia passou a ter uma direção voltada para a realidade e não ao campo de especulação teórica e da discussão acadêmica, ao qual estava condicionada. A criminologia pertence ao âmbito das ciências empíricas, significando que seu objetivo (delito, delinquente, vítima e controle social) se insere no mundo real, do verificável, do mensurável, e não dos valores[34].

2.5.5. FATOR FAMILIAR

A ideia de que as relações estabelecidas na infância, pelo indivíduo, com seus familiares, e de fundamental importância na formação da sua personalidade, e largamente aceita pelos chamados profissionais de saúde mental, de várias tendências. Psiquiatras forenses caracterizarem como potencialmente criminogênicas e patogênicas situações do tipo: Famílias onde ocorreu a morte do pai ou o abandono precoce por parte deste; famílias onde o pai bebe, está preso ou doente; famílias onde a mãe cria o filho sem o pai, ou onde a mãe tem filhos de homens diferentes; famílias onde a mãe está ausente, mesmo que seja por ter que trabalhar; famílias onde a mãe bebe, está presa, é prostituta, etc[35].

Mas o principal eixo interpretativo e aquele que reconhece no preso as chamadas “carências infantis”, confundindo num só bloco carências afetivas e carências materiais. Um sem-número de situações são apontadas como geradoras deste tipo de carências e, quando, tentamos lista-las, concluímos que qualquer acontecimento familiar pode ser tomado como causa: morte de genitores, separações, brigas de marido e mulher, traições, vícios e até mudanças frequente de domicilio. O fato de a mãe ter que trabalhar fora e deixar o filho sob os cuidados de outrem, o fato de o pai ter que se ausentar do lar por longos períodos devido ao trabalho, todos estes incidentes podem ser daninhos a personalidade da criança[36].

E logo nos podemos concluir que todos os graves indícios de anormalidade mental ou de tendência a delinquir encontrados na história familiar dos indivíduos examinados fazem parte da realidade mais comum e cotidiana vivida pela camada da população a que pertencem. Outrora, outro fator que também impacta de forma significativa na formação da personalidade criminoso é a forma de agrupamento familiar. Nas mais tradicionais famílias formados apenas por pai, mãe e filhos o índice de criminalidade é menor do que em ambientes onde o agrupamento são compostos, ou seja, integrados por além do genitor, a genitora e a prole, existe a integração de sogro, sogra, cunhados, sobrinhos, etc. Nesses casos existe uma miscigenação cultural que traz, sobretudo, reflexos na forma de criação e desenvolvimento da criança no âmbito familiar[37].

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