A tributação como forma de redistribuição de renda:uma análise acerca do IGF

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17/11/2017 às 13:52
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No presente trabalho analisou-se a tributação como uma forma de redistribuição de renda e melhora da desigualdade social no país e é feita uma análise acerca do Imposto sobre grandes fortunas como um instrumento para concretizar a justiça fiscal.

1 BREVE SÍNTESE DA DISTRIUIÇÃO DE RENDA NO BRASIL

A análise acerca da distribuição de renda no Brasil terá enfoque na situação do país a partir da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

A Constituição promulgada de 1988 apresenta-se como um marco de legitimação das necessidades e direitos sociais para o combate à pobreza. Neste sentido, nossa lei maior legitimou demandas sociais[1].

1.1 Relação entre distribuição de renda e desigualdade social

A desigualdade social abrange a desigualdade de oportunidade, resultado, de renda, gênero, escolaridade etc. Contudo, em uma abordagem geral, a desigualdade social é considerada como desigualdade econômica[2].

Há a atribuição da desigualdade social e da consequente má distribuição de renda do Brasil ao Brasil colônia, citando 03 motivos primordiais: a influência da ibérica, os padrões de títulos de posse de grandes latifúndios e a escravidão. Fatores esses que contribuíram para que a sociedade brasileira permanecesse estratificada[3].

O destino não estava traçado e o caminho não era único, ainda que o passado tenha o seu peso no presente. O Brasil foi fundado sobre o signo da desigualdade, da injustiça, da exclusão: capitanias hereditárias, sesmarias, latifúndio, Lei de Terras de 1850 (proibia o acesso à terra por aqueles que não detinham grandes quantias de dinheiro), escravidão, genocídio de índios, importação subsidiada de trabalhadores europeus miseráveis, autoritarismo e ideologia antipopular e racista das elites nacionais. Nenhuma preocupação com a democracia social, econômica e política. Toda resistência ao reconhecimento de direitos individuais e coletivos[4].

Todavia, a desigualdade social brasileira continuava se acentuando quando do processo de modernização, a partir do séc. XIX. Ainda que houvesse desenvolvimento econômico, as desigualdades sociais permaneciam existindo por todo o processo histórico, seja no que diz respeito à educação, saúde desemprego e concentração de renda[5].

O Brasil não se apresenta como um país pobre, mas, por outro lado, apresenta um grande número de pessoas que são consideradas pobres. Tal situação decorre da injusta distribuição de renda bem como da exclusão social e econômica dessas pessoas[6].

No país há uma população à margem da sociedade, a qual é excluída do ponto de vista econômico e social. Por essa exclusão, tornam-se massa de trabalhadores assalariados que recebem o mínimo para a sua sobrevivência e são desprotegidos socialmente, fruto da concentração de riquezas e terras (grandes latifúndios rurais e especulação imobiliária urbana)[7].

A pobreza e má distribuição de renda são fruto da ação do homem, pois a concentração de rendas e recursos que existiam desde a época colonial permaneceram enraizadas na sociedade brasileira ainda que com o desenvolvimento econômico e social da atualidade. É uma pobreza estrutural. Neste sentido, percebe-se que não houveram políticas sociais suficientes que melhorassem essa situação de desigualdade.

A pobreza, sob o prisma da insuficiência de renda, tem como causas, dentre outros motivos, a má distribuição dessa renda e a escassez de recursos. Desta maneira, para que haja uma diminuição da pobreza, imprescindível que haja distribuição igualitária da renda a partir de políticas públicas[8].

O que é considerado uma grande limitação ao desenvolvimento é, dentre outros fatores, a estagnação institucional causada pela concentração de poder político[9].

A pobreza inserida no campo da justiça social é a falta de liberdade para se conseguir meios para o desenvolvimento, ou seja, a pobreza não é simplesmente a falta de bens, a miséria, mas sim a incapacidade de conquistá-los, seja por motivos políticos ou culturais[10].

Para que haja um enfrentamento da pobreza é necessária ações e políticas que busquem solucionar o problema estruturalmente, fazendo com que o indivíduo menos favorecido tenha autonomia e acesso aos bens e recursos necessários ao seu desenvolvimento. O Estado, agente regulador, deverá proporcionar essas ações e políticas que beneficiarão os mais pobres, e não a classe dominante[11].

Dessa forma, o nível da pobreza em um país pode diminuir independentemente de sua distribuição de renda ter sido melhor efetivada, decorrendo apenas do desenvolvimento econômico[12]. Isso quer dizer que o crescimento econômico por si só não melhora a distribuição de renda se a riqueza não for melhor distribuída, mas, pode, em contrapartida, ser um meio de concentração de riquezas, terras e recursos naturais, o que fará aumentar ainda mais a desigualdade entre ricos e pobres[13].

Até a década de 1980, a cidadania era limitada aos indivíduos inseridos no mercado formal de trabalho, tal situação foi modificada com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que inseriu a Seguridade Social, fruto da luta social pela ampliação de direitos. A Seguridade Social é constituída pela Assistência Social, saúde e a Previdência Social que se tornaram políticas públicas para o enfrentamento da pobreza[14].

Em estudo realizado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), aspectos que devem ser observados para que haja uma melhora na distribuição de renda são: que as oportunidades para aquisição de capacidade seja equalizada; acesso ao trabalho, ou seja, uso das capacidades adquiridas; redução no tratamento desigual de trabalhadores e um sistema tributário e de gastos públicos mais eficiente e progressivo[15].

A partir de toda essa análise acerca da concentração de renda e desigualdade social o que se torna claro é que o dinheiro arrecadado pelo Estado através de suas medidas sociais precisa chegar aos mais necessitados. Ou seja, é necessário que haja uma arrecadação através apenas das classes mais abastadas para que seja aplicado em prol da melhor distribuição de renda.

1.2 Análise de dados sobre a atual distribuição de renda no Brasil

É importante analisar dados sobre a desigualdade de resultado (renda) pois trata-se do reflexo das desigualdades de tratamento, condições e oportunidades[16]{C}.

A desigualdade de renda, é na maioria das vezes, calculada pelo Coeficiente de Gini, que é um coeficiente internacional, determinado mediante cálculos matemáticos que mede a distribuição de renda de determinada região.

Segundo aponta os cálculos, através desse coeficiente, entre os anos de 2001 e 2004 a concentração de renda no país caiu em 4%. Essa queda ocorre quando a média de renda dos mais pobres cresce mais rapidamente que a média nacional, fato esse que contribuiu para a diminuição da pobreza e da extrema pobreza. Neste período o crescimento médio da renda dos 20% mais pobres cresceu um quinto mais rápido que a média da renda dos 20% mais ricos[17]{C}.

Na pesquisa realizada nessa época aferiu que 1% da população mais rica do país tem renda equivalente a 50% dos mais pobres[18]{C}.

O Brasil é um dos países com maior nível de concentração de renda. Entre os anos de 2001 e 2004 houve o maior declínio na desigualdade da distribuição de renda nos últimos 30 anos, o que melhorou substancialmente a situação de extrema pobreza, mas não tirou o país da lista dos mais desiguais[19]{C}.


Apesar desta diminuição na desigualdade social e concentração de renda, o Brasil ainda apresenta um alto Coeficiente de Gini quando em comparação com outros países, estando em situação melhor que países como o Chile, Colômbia e Haiti. Esses dados, para melhor visualização, estão discriminados em gráfico apresentado no relatório da “Distribuição Pessoal da Renda e da Riqueza da População Brasileira”[20]{C} realizada pela Receita Federal em maio de 2016:

Ou seja, Brasil apresenta índice de má distribuição de renda como sendo praticamente o dobro da Noruega, país com menor índice de concentração de rendas e riquezas. Percebe-se que, ainda que com a queda na concentração de renda, o coeficiente do Brasil ainda se apresenta como extremamente elevado.

Pode-se considerar que a queda no índice de Gini resultou de motivos diversos, mas principalmente devido ao desenvolvimento de “uma rede de proteção social mais efetiva”{C}[21]{C}.

A partir dos dados fornecidos pela Receita Federal sobre as declarações de imposto de renda, verifica-se que 71 mil pessoas, o correspondente a 0,05% da população adulta, apresentam-se como o meio milésimo mais rico do país e ganharam, em 2013, em média R$ R$ 4,1 milhões{C}[22]{C}.

Neste sentido, o relatório da “Distribuição Pessoal da Renda e da Riqueza da População Brasileira” de 2016 também mostra que os 5% mais ricos da sociedade Brasileira detém 28% da renda e da riqueza, e, desta riqueza, metade encontra-se nas mãos de apenas 1% da população[23]{C}.

Percebe-se, pois, que 15% dos bens e riquezas do Brasil estão concentrados nas mãos de apenas 1% da população, mostrando o elevado grau de concentração de renda existente.

Em 2016, em pesquisa realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia Estatística) mostra que o crescimento econômico ocorrido no Brasil na última década foi decisivo para melhorar as condições de vida dos indivíduos. O crescimento econômico dos anos 2000 a 2010 apenas apresentou uma pausa em 2009 devido à crise econômica mundial ocorrida na época, o que diminuiu o grau de desigualdade social[24]{C}.

1.3 Criação de impostos como “solução” para a redistribuição de renda

A Constituição Federal propõe que, a partir da tributação, haja uma diminuição nas desigualdades sociais e na concentração de renda. Além disso, preocupa-se em atender a capacidade contributiva do indivíduo com uma justa tributação. Ou seja, tem-se um sistema tributário que visa uma justa distribuição de renda[25].

A função distributiva da tributação no que diz respeito aos impostos é uma forma do Governo minimizar a desigualdade social. Neste sentido, a tributação sobre a renda mostra-se como meio de transferir recurso às classes menos favorecidas[26].

Segundo o autor Itapuã Barreto há uma função socioeconômica dos tributos que vai além da arrecadação e reside na “justa alocação dos recursos arrecadados pelo Estado”[27], promovendo uma maior redistribuição da renda e aplicando-a da forma que promova a satisfação de direitos sociais (alimentação, saúde, moradia etc), atendendo princípios como a igualdade e capacidade contributiva.

Neste sentido, decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça em sede do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 797.319 – SP[28], julgado em 03 de março de 2016,  que para a auferição do valor do IPTU é constitucional, e não fere os princípios da isonomia e da capacidade contributiva, que o valor venal do imóvel seja usado como base de cálculo. Pois considerar o valor venal do imóvel  como base de cálculo para incidência do imposto  considera-se padrão idôneo para a constatação da capacidade econômica do contribuinte, e mais, permite o tratamento diferenciado de contribuintes que se encontram em situação econômica distinta.

Tal Acórdão apresenta o caráter social da tributação, uma vez que defende o tratamento diferenciado entre pessoas que se encontram em situação econômica distinta através da alíquota progressiva, esta que aumenta proporcionalmente à capacidade contributiva do contribuinte.

Ou seja, em sua fundamentação defende a aplicabilidade dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia:

Decorrente dos ideais de justiça, isonomia e mesmo da capacidade contributiva, a personificação é prevista explicitamente no art. 145, § 1º, na orientação de que as formas tributárias devem refletir as características das pessoas tributadas, podendo, inclusive, identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte para dar efetividade a isso (como acontece no Imposto de Renda das Pessoas Físicas – IRPF com as deduções permitidas)[29].

Considerando o princípio da igualdade, ainda, o imposto progressivo é uma forma de sua concretização, na medida em que aquele com maior capacidade contributiva deverá pagar um valor de imposto maior, para que assim seja proporcionalmente tributado[30].

Nas palavras de Fábio Ruthzatz, são os impostos que recaem sobre o capital e auxiliam na distribuição da renda:

o imposto excepcional sobre o capital, o imposto sobre sucessões e o imposto anual e geral sobre a fortuna. Este último, é complementar do imposto sobre o rendimento, permitindo não somente corrigir a desigualdade da tributação dos rendimentos, mas também afetar diretamente o rendimento psicológico decorrente da posse de bens suntuários e do entesouramento. Além do mais, permite o inventário das fortunas, que não só simplifica a tarefa da administração para o estabelecimento de outros impostos, mas igualmente lhe fornece um precioso instrumento de controle para o lançamento dos impostos sobre os rendimentos e sobre as sucessões[31]

Neste mesmo sentido defende Neumark{C}[32], o qual afirma ser o imposto não apenas uma forma de arrecadação por parte do Estado, como é também um instrumento capaz de influenciar na política econômica e social, tendo em vista a finalidade econômica e social da fiscalidade.

Em contrapartida à reforma social, a extrafiscalidade pode manter, conservar, a sociedade estagnada e proteger o capitalismo liberal, reduzindo direitos e garantias individuais e apresentando-se um Estado Mínimo[33].

Tem-se que, no Brasil, a parcela da população chamada de “super-ricos” paga, proporcionalmente, menos impostos que as classes menos favorecidas, o que viola o princípio da progressividade tributária (a carga tributária deve aumentar de acordo com o aumento da renda). Ocorre que, ainda, aproximadamente dois terços da renda dos “super-ricos” (0,005 da população) é isenta de qualquer incidência tributária. Conforme trazido pela Organização International Policy Center for Inclusive Growth[34], “trata-se da isenção de lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a seus sócios e acionistas”.

Em contrapartida, a tributação dos rendimentos ocorre de forma progressiva.

Ou seja, há benefício aos super-ricos na medida em que há baixa tributação incidindo sobre operações financeiras, altas taxas de juros e uma isenção quando da distribuição de dividendos de imposto de renda na pessoa física. A justificativa para essa isenção é a não incidência de nova tributação perante a pessoa física quando essa já ocorreu para com a pessoa jurídica[35].

A partir dessa análise, resta claro que há a necessidade de uma tributação que recaia apenas sobre a classe mais abastada da sociedade brasileira em benefício da justiça fiscal. Essa tributação que será arrecadada de maneira transparente e eficaz comporá o orçamento público e proporcionará à administração pública maior renda para satisfazer as demandas sociais, bem como melhorar a distribuição de renda, sendo esses investimentos prioritários.

O Imposto sobre a Renda de Pessoas Físicas (IR) é um imposto progressivo e tem aplicação de uma alíquota variada de acordo com a capacidade contributiva do contribuinte, ou seja, tem o caráter pessoal mencionado no art. 145, §1º da CF[36]. Quanto maior a renda, maior a alíquota incidente.

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A diferença entre o IR e o IGF reside no fato de que, enquanto o IGF recai sobre o patrimônio estático do contribuinte, o IR recai sobre os rendimentos deste patrimônio, ou seja, é dinâmico e variável[37].

A Receita Federal{C}[38] disponibiliza tabela com as alíquotas incidentes a cada faixa de renda. A tabela com os valores anuais, do exercício de 2017 (ano-calendário de 2016) são os seguintes:

Tabela 2 – Alíquota IR (ano-calendário de 2016)

Base de Cálculo (R$)

Alíquota (%)

Parcela a deduzir do IRPF (R$)

Até 22.847,76

-

-

De 22.847,77 até 33.919,80

7,5

1.713,58

De 33.919,81 até 45.012,60

15

4.257,57

De 45.012,61 até 55.976,16

22.5

7.633,51

Acima de 55.976,16

27,5

10.432,32

Percebe-se, então, que até determinado valor não há incidência do Imposto de Renda, e que, na medida em que a renda se torna maior, a alíquota aumenta progressivamente, de forma a respeitar a capacidade contributiva e capacidade econômica do contribuinte.

No PLC nº 108/1989{C}[39] que visa instituir o IGF, o Deputado Federal Juarez Marques Batista, autor do projeto, faz menção à Pontes de Miranda e sua concepção acerca do IR:

O imposto sobre a renda é válvula de segurança e pode, além de tudo, exercer, na sociedade contemporânea, elevado papel político e social, além de financeiro e fiscal. É o imposto sobre os ricos. Poupa os pobres. Da sua aplicação resulta um justo corretivo à má divisão da fortuna. Paga mais quem ganha mais [...] Com o imposto sobre a renda, igualitário e nivelador, evoluímos para os ideais de equilíbrio social, diminuindo os antagonismos e diferenças de classes e de fortuna[40].

Desta forma, a justiça fiscal, prevista na Constituição Federal de 1988, traduz que o Estado deve respeitar a função social do tributo não apenas na instituição e arrecadação dos tributos, mas também no que diz respeito às questões orçamentárias, devendo essas atender a uma justa distribuição da renda[41].

Para o Francês Thomas Piketty{C}[42], uma solução para a questão da desigualdade e que geraria maior transparência quanto ao patrimônio, é um imposto global e progressivo sobre o capital. Para ele, este imposto sobre o capital faria prevalecer o interesse coletivo em detrimento do interesse particular, além de regulamentar os fluxos financeiros internacionais e o sistema bancário.

Este imposto global é considerado uma utopia, uma vez que impossível pensar que todas as nações concordariam com tal medida, porém, essa solução pode ser pensada e defendida em um âmbito regional.

O livro intitulado “O Capital do Século XXI” faz um retrato da repartição da riqueza global, considerando-a um problema político. Ou seja, faz uma análise a nível global, trazendo como uma das medidas para solucionar o aumento da desigualdade entre as classes sociais a criação deste imposto global sobre o capital.

Esta medida impediria uma “espiral desigualadora”, e regularia a dinâmica de concentração e distribuição de renda[43]. No ideal do Francês, este imposto seria cobrado de forma anual e progressiva, que incidisse sobre o capital individual, sobre os ativos de cada pessoa[44].

Ou seja, a finalidade é tributar os ativos dos maiores patrimônios, não excetuando qualquer deles, seja financeiro, corporativo ou imobiliário[45].

Em sua concepção, a instituição de impostos é uma questão eminentemente política, sobre decidir o que deve ser pago, a quem e em nome de quais princípios. Por esse motivo há grande divergências quanto à sua instituição, principalmente quanto aos impostos sobre a renda e capital[46].

No ordenamento jurídico brasileiro, em sua Carta magna, há a previsão de um imposto que recaia sobre grandes fortunas, imposto esse que nunca foi instituído.

Para Hugo de Brito Machado{C}[47], o motivo do referido imposto nunca ter sido instituído é meramente político, uma vez que os titulares destas fortunas estão investidos de poder, ou, se não estão, possuem influência sobre aqueles os quais exercem. E mais, para ele, se um dia houver o imposto sobre grandes fortunas, os titulares de fortunas não arcarão com sua incidência, mas será embutido na enorme carga tributária já suportada pela classe média.

2 DO IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS

2.1 Previsão Constitucional do IGF

O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) está previsto no art. 153, VII, CF/88 e deve ser instituído mediante lei complementar, porém a sua regulamentação não foi efetivada pelo ente federativo competente, a União[48].

O Imposto foi adicionado à CF/88 pelo legislador constituinte, pela sua preocupação de reverter o sistema tributário nacional que era progressivo, mas recaía apenas sobre as rendas dos salários e dos autônomos. Ele foi apresentado pela Comissão Provisória de Estudos Constitucionais e foi inserido na Carta Magna após diversas discussões lideradas pelo então Deputado Plínio de Arruda Sampaio[49].

Segundo o art. 146, III, a, CF/88 as normas gerais de Direito Tributário deverão ser regidas por lei complementar, que irá dispor sobre os fatos geradores dos tributos, bases de cálculo e seus contribuintes respectivos. Trata-se da lei 5.172/66, o Código Tributário Nacional, recepcionado pela Carta Magna como sendo complementar. Porém, não há, em seu bojo, a previsão de tais requisitos no que diz respeito ao IGF[50]

O Legislador Constituinte elegeu como hipótese tributária para incidência do IGF “ser proprietário de grande fortuna”. Sendo fortuna conjunto de bens e direitos que ensejem benefício pecuniário a seu proprietário. Porém, não há definido na Constituição o local ou em qual o lapso temporal necessário para a incidência do imposto[51].

Ou seja, os aspectos específicos do IGF deverão estar introduzidos na lei complementar instituidora, esta que irá delimitar os elementos da obrigação tributária, atendendo ao princípio da legalidade. Deverá, inclusive, determinar especificamente o que será considerado como “grande fortuna”, uma vez que se trata de conceito indeterminado. Obedecerá aos demais princípios do direito tributário, não sendo nenhuma exceção à limitação constitucional ao poder de tributar. Assim sendo, se instituído, deverá respeitar as anterioridades anual e nonagesimal e a irretroatividade[52].

O fato gerador deste imposto trata-se da posse de grandes fortunas. Porém, a definição do que seria considerado como uma grande fortuna depende da referida lei complementar não instituída[53].

Quanto à base de cálculo de o IGF abranger bens e direitos que já sofrem incidência de outros tributos, entendemos que a lei complementar federal instituidora deve regular, na forma de deduções, a possibilidade de o contribuinte abater da incidência do IGF, preferencialmente antes de se calcular sua faixa de incidência e respectiva alíquota aplicável, os demais tributos que incidirem sobre os bens e direitos que compõem a fortuna[54].

Para Peixoto e Diniz{C}[55] as receitas arrecadadas pelo IGF devem ser utilizadas com a finalidade de corrigir as diferenças sociais e distribuição de renda, sob pena de o aumento da tributação não possuir justificativa senão aumento de arrecadação e superávit financeiro.

Neste sentido de destinação é apresentado o mais recente PLP proposto no Senado Federal com a finalidade de regulamentação do Imposto sobre grandes fortunas. O referido projeto, em sede de justificativa, defende a destinação prioritária dos recursos arrecadados no campo da educação e da saúde, respeitando, obviamente, a não vinculação que é característica dos impostos (art. 167, IV, CF)[56].

Para Leonardo de Menezes Curty, em seu artigo “A falácia do imposto sobre grandes fortunas como instrumento determinante para justiça fiscal”, a maior dificuldade do legislador infraconstitucional seria o de elaborar um meio para que os bens do possível contribuinte sejam avaliados de maneira que reflitam a sua capacidade econômica[57].

Além disso, é apresentado que os proprietários de bens de mais fácil avaliação e constatação como imóveis e automotores seriam prejudicados frente aos proprietários de bens de mais difícil avaliação, como joias e obras de arte[58]. Essa barreira administrativa seria o principal problema para a regulamentação do IGF.

Porém, como se verá a seguir, os projetos de leis complementares que visam a instituição do IGF já trazem em seu bojo qual seria a base de cálculo e a forma de sua contabilização e declaração.

Outro óbice à efetivação do IGF reside na possibilidade do contribuinte proprietário de uma grande fortuna (aquele que tem pode usar, fruir, dispor ou reaver) pulverizar o seu direito sobre essa propriedade transferindo a terceiros, ou seja, seria de fácil evasão e, assim, ser de baixa arrecadação[59].

Para Curty, se fosse comprovado tais medidas de caráter evasivo, seria configurado abuso de direito e tais transferências não poderiam ser oponíveis ao fisco[60]. Este argumento utilizado para a não regulamentação do imposto, alegando que seria fácil ao contribuinte evadir seu patrimônio, não pode ser considerado motivo para sua não regulamentação. O fisco deve aprimorar seus mecanismos de controle.

O fato de a renda e riquezas que seriam consideradas fortunas estarem concentradas nas mãos de poucas pessoas ajudaria para que o controle se tornasse efetivo[61].

As medidas antievasivas estão presentes em projetos de lei que visam a regulamentação do IGF, são elas, por exemplo, multas para o caso de subavaliação e ocultação de bem pelo proprietário, os bens não declarados seriam considerados como sonegados também no IR[62].

Ainda, é apresentado que a regulamentação do IGF afugentaria o capital e teria pouca arrecadação. Porém, nas palavras do ex-secretario de Finanças Públicos da cidade de São Paulo e Mestre em Finanças Públicas Amir Khair:

Em vez de afugentar, deve atrair mais o capital ao permitir a desoneração do fluxo econômico, gerando maior consumo, produção e lucros. Não teria nenhum conflito com os impostos existentes, pois sua base tributária é o valor total dos bens. Quanto às dificuldades de avaliação dos títulos mobiliários, o registro eletrônico das transações e as posições fornecidas pelos bancos podem resolver o problema[63].

Uma vez que o IGF incidiria sobre o capital acumulado, como as poupanças, o contribuinte, para não se ver tributado, investiria tal riqueza/patrimônio em serviços e atividades produtivas que possam gerar renda, não se tornando necessariamente uma desestimulação à poupança[64].

Ainda, em combate ao argumento de que o IGF afastaria investimento de capital no Brasil, Tilbery acredita que um imposto com alíquota a 1% não traria esse efeito[65].

Há o argumento de que a tributação sobre as grandes fortunas é uma invasão à propriedade privada e um desestímulo ao acúmulo de riquezas, porém, o livre mercado aumenta ainda mais a desigualdade social e, ainda, não há propriedade sem Estado, ou sejas, todos os direitos, ainda que fundamentais, têm algum custo.[66]

Segundo nota técnica lançada pelo IPEA, países como Japão, Suécia, França e Espanha tiveram uma diminuição da concentração de renda durante o século XX ao instituírem tributação progressiva sobre a renda, riqueza e herança. Ainda, informa que no Brasil o IR tem se mostrado pouco distributivo frente à regressividade dos impostos de produção[67].

Ainda na concepção da referida nota técnica, ainda que a tributação não tenha um retorno substancial de arrecadação para a distribuição de renda, este retorno, ainda que não muito expressivo é melhor do que nenhum retorno[68].

2.2 Propostas legislativas sobre o IGF

O presente tópico apresentará as propostas legislativas do Congresso Nacional que visam instituir o imposto sobre grandes fortunas. Como parâmetro para estudo e comparação, serão analisados o primeiro e o último projeto de lei complementar de cada casa legislativa. Será apontado, principalmente, o que passa a ser considerado uma grande fortuna, a base de cálculo do imposto e sua alíquota.

 São os PLPs apresentados no Câmara dos Deputados: PLP nº 108/1989; PLP nº 208/1989; PLP nº 218/1990; PLP nº 236/2003; PLP nº 277/2008; PLP 48/2011; PLP nº 61/2011 PLP 26/2011; PLP nº 26/2011; PLP nº 02/2015; PLP 335/2016; PLP 294/2016; PLP nº 302/2016; PLP nº 324/2016.

São os PLPs apresentados no Senado Federal: PLP nº 162/1989; PLP nº 69/1995; PLP nº 128/2008; PLP nº 50/2008; PLP nº 100/2008; PLP nº 43/2010; PLP 534/2011; PLP nº 315/2015; PLP 139/2017.

O primeiro Projeto de Lei Complementar que visou instituir o imposto sobre grandes fortunas que foi proposto na Câmara dos Deputados foi o PLP nº 108/1989[69]. O referido projeto foi proposto pelo Deputado Federal Juarez Marques Batista do PSDB de Mato Grosso do Sul. Sua proposição está sujeita a apreciação do Plenário.

Os artigos mais importantes deste PLP é o parágrafo único do art. 1º e o art. 2º, que definem quais são as bases de cálculos e alíquotas do IGF:

Art. 1º É criado o imposto sobre grandes fortunas (IGF), da competência tributária da União, cuja cobrança fica autorizada a partir do exercício superveniente ao da publicação desta lei. Parágrafo único. Para efeitos deste artigo, grande fortuna constitui a soma dos valores dos bens e direitos de uma pessoa física e seus dependentes legais, que, na forma desta lei, ultrapassem o equivalente a 2.999.999 Bônus do Tesouro Nacional (BTN), ou expressão que represente atualização da moeda que, porventura, venha substituir o BTN.

Art. 2º O Imposto sobre Grandes Fortunas incide, de forma progressiva, sobre a totalidade dos bens ou direitos, mediante a aplicação das alíquotas do 1%, 2%, 3% e 4%, na forma da tabela em anexo[70].

O IGF teria incidência anual e seria apurado em 31 de dezembro de cada ano o seu valor com o preenchimento da declaração de bens.

Como justificativa à propositura de tal PLC é apresentado que a tributação sobre o capital e bens, ainda que considerada uma afronta à economia liberal, tem que ser realizada em um país onde há extrema miséria e apenas pequena parcela da população é beneficiada pelos avanços econômicos.  Defende, ainda, que a tributação é a melhor forma do Estado buscar equidade, liberdade e equilíbrio para a população, respeitando a sua capacidade contributiva.

Já o projeto de lei nº 324/2016{C}[71] é o mais recente proposto na Câmara dos Deputados que visa instituir o imposto sobre grandes fortunas, seu fato gerador, base de cálculo, alíquota, lançamento e fiscalização. Foi proposto pelos deputados Flavinho do PSB de São Paulo, Givaldo Garimbão do PSH de Alagoas e Joaquim Passarinho do PSD do Pará. Atualmente, sua proposição está sujeita a apreciação do Plenário.

O principal artigo desse projeto de lei é o art. 2º, no qual é determinado o fato gerador do imposto e quem seriam seus contribuintes:

Art. 2º O fato gerador do imposto é: I - a titularidade de bens e direitos de qualquer natureza pela pessoa física, no Brasil ou no exterior, durante o ano-calendário, superior a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) por contribuinte; II – o faturamento anual auferido por pessoa jurídica com sede no Brasil superior a dez vezes o valor máximo definido no art. 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 123, de 27 de outubro de 2016; III – a titularidade de bens e direitos de qualquer natureza no Brasil pela pessoa física ou jurídica domiciliada no exterior superior a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) por contribuinte[72].

O inciso segundo mencionado refere-se ao Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, dessa forma, apenas serão tributadas as pessoas jurídicas com faturamento superior a 10 vezes o valor máximos desses tipos societários, os quais não sofrerão com a incidência do IGF.

No referido projeto de lei, a alíquota seria de 0,5% para as pessoas físicas titulares de fortuna de 2 milhões de reais, no limite de 5 milhões. Ultrapassado esse valor, a alíquota passaria a ser de 0,8%. Já para as pessoas jurídicas, a alíquota seria de 1% sobre o faturamento anual bruto.

Acerca do lançamento, declaração e penalidades, será aplicado, no que couberem, os dispositivos que regulamentam o Imposto de renda (art. 8º[73]).

Em justificativa acerca do projeto de lei, os deputados defendem como sendo um processo que auxilia uma sociedade mais justa e igualitária, principalmente devido à atual conjuntura do país. Ou seja, defendem que uma redistribuição dos ônus fiscais são meios para a reconstrução econômica.

O PLP mais antigo que consta no acervo do Senado Federal é de autoria do Senador Fernando Henrique Cardoso (PLP nº 162/1989)[74]. O referido projeto de lei encontra-se arquivado desde fevereiro de 2007, depois de decisão da Câmara dos Deputados, foi aprovado no Senado, mas rejeitado na Comissão de Tributação e Finanças da Câmara. A esse projeto, após ser aprovado pelo Senado Federal e dirigir-se à Câmara dos Deputados tornou-se de nº 202-A de 1989, o qual sofreu emendas.

Em umas das emendas, traz uma alíquota progressiva, que será de acordo com o valor total do patrimônio tributado, e com incidência diferente para os ativos produtivos e improdutivos.

O Relator foi contrário à emenda que determinou a base de cálculo fortunas iguais ou superiores a 126 milhões de cruzeiros, uma vez que a diminuição do limite da isenção descaracterizaria o imposto. Nas palavras de Ives Granda da Silva Martins:

O tributo apenas permitirá a incidência sobre "grandes fortunas", nem mesmo podendo incidir sobre "fortunas" que não sejam grandes. Definitivamente, a classe média e a classe alta não detentora de grande fortuna estarão a salvo deste tributo, se a Constituição for respeitada pelos legisladores. Fortuna é mais do que riqueza. E grande fortuna é mais do que fortuna. A pessoa rica, portanto, não se deverá submeter a qualquer imposição, incidível apenas sobre os grandes bilionários deste país. O universo de sua aplicação terá que ser necessariamente restrito[75].

Até o início do ano de 2017, o mais recente Projeto de Lei era o de nº 315/2015[76], de autoria do Senador Paulo Paim do PT do Rio Grande do Sul. Atualmente, a matéria está com a relatoria, para dar continuidade à tramitação.

Segundo este projeto, são contribuintes os brasileiros, residentes no Brasil ou no exterior. Sua base de cálculo são os bens e direitos que ultrapassem a quantia de 50 milhões de reais no dia 31 de dezembro de cada ano civil. A base de cálculo seria obtida mediante declaração anual e incidiria alíquota no importe de 1%.

Não irá integrar o patrimônio, para incidência deste imposto, segundo o §1º do art. 2º do PLP:

Art. 2º O imposto incide sobre o patrimônio de pessoa física ou de espólio de valor mínimo definido no art. 4º, assim considerado o conjunto de todos os bens e direitos, móveis, imóveis, fungíveis, consumíveis e semoventes, em moeda ou cujo valor, situados no País ou no exterior.

§ 1º Não integram o patrimônio, para os fins de incidência do imposto:

I – o imóvel de residência do contribuinte e os bens de pequeno valor, de uso doméstico, conforme o disposto em Regulamento; II – os bens de produção e instalações utilizados para obtenção de rendimentos de trabalho autônomo; III – os bens objeto de tombamento ou de declaração de utilidade pública pelo Poder Público e os gravados por reserva legal ou voluntária para fins de utilização social ou de preservação ambiental; IV – os bens dados em usufruto a entidades culturais, educacionais, filantrópicas, religiosas e sindicais, ou reconhecidas como de utilidade pública, enquanto durar a dação; V – os bens cujo uso esteja interditado por posse, invasão ou esbulho possessório, assim reconhecido por sentença judicial e enquanto durar a interdição; VI – os bens consumíveis não destinados à alienação; VII – os bens guardados por cláusula de inalienabilidade[77].

A justificativa para a propositura deste PLP está no objetivo da CF/88 de construir uma sociedade livre, julga e igualitária, com a erradicação da pobreza. Argumenta que para conseguir atender a esses objetivos o Estado deve prover de meios efetivos, sendo a tributação um deles. Neste sentido, a carga tributária deve recair sobre quem tem maior capacidade contributiva. 

O mais novo projeto publicado é o PLP nº 139/2017{C}[78], proposto no Senado Federal de autoria da Senadora Vanessa Grazziotin do PCdoB do Amazonas. Este projeto, atualmente, está na Comissão de Assuntos Econômicos (Secretaria de apoio à Comissão de Assuntos Econômicos) aguardando a designação de um relator.

Se aprovado, a tributação ocorrerá sobre as pessoas que tiverem o patrimônio correspondente a oito mil vezes o limite mensal de isenção do imposto de renda, hoje correspondente a patrimônio maior que 15,2 milhões de reais. A alíquota incidente será progressiva, nos valores de 0,5, 0,75 e 1% sobre a base de cálculo.

Sua justificativa reside em uma homenagem ao princípio da progressividade, no sentido de que os indivíduos com maior capacidade contributiva paguem mais impostos, com a finalidade de distribuição da carga tributária.

Cabe salientar ainda que procuramos destinar a arrecadação do IGF prioritariamente a investimentos governamentais no campo da educação e da Saúde, sempre lembrando que a vinculação completa da arrecadação desse tributo desrespeitaria o disposto no art. 167, IV, da Constituição Federal[79].

 É percebido que em todos os PLPs, a justificativa de sua propositura reside na má distribuição de renda no país, vendo como objetivo de uma menor desigualdade social a regulamentação do IGF.

É demonstrado em nota técnica apresentada pelo IPEA:

Os projetos de lei propostos por deputados e senadores desde 1989 apresentam uma certa similaridade entre si. Possuem poucos artigos, poucas medidas antievasivas e texto simples, onde muitas vezes as diferenças se encontram apenas na estrutura de alíquotas e no limite de isenção. O estabelecimento do limite de isenção é um fator muito importante, pois a alíquota efetiva do imposto é fortemente influenciada por ele. Quanto menor o limite de isenção, maior será a efetividade do imposto e menor o incentivo à transferência da titularidade da propriedade. Um menor número de alíquotas também inibe a transferência da propriedade, como forma a ser tributado por uma faixa menor[80].

O argumento para as derrotas dos PLPs foi de que o IGF seria um imposto caro e de pequeno potencial arrecadatório, citando países nos quais foi retirada tal tributação, porém não fazem menções à países como Colômbia, Uruguai e Argentina, os quais a tributação da riqueza ocorreu de forma eficiente[81].

Antes de levar os projetos a votação, os parlamentares deveriam realizar uma análise de previsão de arrecadação, o que poderia ser solicitado junto à Receita Federal, que por meio da declaração de bens dos contribuintes do Imposto de Renda poderia fornecer, de maneira anônima, a base tributária do IGF[82].

Diante de tudo o que foi analisado, chega-se a conclusão que o imposto sobre grandes fortunas não apenas visa a redistribuição de riquezas, mas também combate o sistema tributário nacional regressivo, no qual os mais pobres pagam proporcionalmente mais caro que os mais ricos através dos impostos indiretos que incidem sobre o consumo[83].

Assim, conclui-se que a regulamentação ocorreria de forma correta com um imposto com base de cálculo que respeite uma isenção baseada no valor incidente do IR, alíquota progressiva que não ultrapasse 1%, nos moldes do PLP proposto pela Senadora Vanessa Grazziotin, e com restrição expressa a patrimônio com destinação especial, assim como foi estipulado no Projeto de Lei nº 315/2015 do Senador Paulo Paim. E mais, a fiscalização deve ser efetiva por parte do fisco, tendo como medida antievasiva, por exemplo, tornar-se inoponível ao fisco a alienação e dissipação de patrimônio fraudulenta.

Nestes termos, o IGF poderia ser um instrumento para auxiliar a melhora da desigualdade social em um país que tem a sua renda concentrada nas mãos de pouquíssimas pessoas. Segundo análise no “Relatório da distribuição pessoal da renda e da riqueza da população brasileira”[84], elaborada pelo Secretaria de Política Econômica, a concentração de renda e riqueza entre os mais ricos é substancial, assim como demonstrado no Capítulo 2 da presente pesquisa.

Contudo, apesar de seus benefícios ao sistema tributário e, consequentemente, para a sociedade, é certo que dificilmente o imposto seria regulamentado, principalmente porque seus possíveis contribuintes detém o poder ou têm influência sobre ele, ou seja, é politicamente impossível.

As análises sobre a distribuição de renda no Brasil visam a elaboração de políticas públicas que tenham por objetivo diminuir o nível de concentração de renda e riqueza e, ainda, diminuir os efeitos negativos que esta desigualdade acarreta ao desenvolvimento social do país. Ou seja, estas informações esclarecem a dinâmica da riqueza no país e possibilitam a criação de “políticas sociais e tributárias mais equilibradas e harmônicas”[85].

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