Sucessão testamentária no corpus iuris civilis

21/11/2017 às 21:20
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Comparação das regras do direito sucessório contidas no Título X e XXV do Livro Segundo das Institutas de Justianiano com o Código Civil Brasileiro. Mais especificamente, tratará das formalidades dos testamentos e Codicilos.

DAS FORMALIDADES

Justiniano dispôs regras específicas acerca das formalidades. Este título se aproxima do disposto no Artigo 1.862 e seguintes do Código Civil, onde constam as disposições gerais  quanto às formas ordinárias de testamento, mais especificamente o Testamento Público.

As disposições dos três primeiros parágrafos do Título X do código Justiniano sintetizam o histórico das Sucessões no Império Romano. O § 4º determina que o testamento seja escrito a mão, pelo testador, ou, alternativamente, por duas testemunhas (Justiniano, p. 124). Tal disposição é similar ao disposto no Artigo 1.858, primeira parte, pois trata-se de ato personalíssimo. Uma pequena distinção reside na possibilidade de redação por parte das testemunhas no Códido Justiniano, ao passo que o artigo 1864, I, determina que o testamento público seja assinado pelo tabelião e lido na presença de duas testemunhas (inciso II).

Comparado com o testamento na modalidade Particular (Art. 1.876 e seguintes do CC), o previsto no §4º exige duas testemunhas, ao passo que o ordenamento pátrio exige a presença e subscrição de três testemunhas.

O § 5º atribui fé pública à assinatura das testemunhas, desde que estas registrem sua ciência do fato por meio de um sinete, facultando inclusive o compartilhamento do anel para registrar a ciência das testemunhas. Tal disposição se assemelha ao previsto no Artigo 1.864, III, que exige a assinatura do testador (vide o disposto no § 4º), do tabelião e das testemunhas.

O código Justiniano restringe, no §6º, a capacidade de ser testemunha por meio da proibição de que mulheres, impúberes, escravos, loucos, mudos, surdos, próditos interditos, e os que as leis declaram ímprobos e incapazes de testar.

Tal restrição encontrou, até a entrada em vigor da Lei 13.146 de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), certa semelhança com o Código Civil de 2002, eis que os deficientes mentais, aqueles que não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil e aqueles que, por causa transitória, não possam exprimir sua vontade[1]. A partir da entrada em vigor do Estatuto mencionado, não há mais que se falar da total incapacidade dos portadores de necessidades para os atos da vida civil. Além disso, não há qualquer disposição similar à proibição de mulheres para os atos da vida civil. O referido dispositivo Justiniano, em sua parte final, encontra disposição compatível com o Código Civil de 2002 na proibição de ser testemunha daqueles a quem a lei declarar incapazes, como ocorre com o caput do Artigo 3º.

A disposição prevista no § 7º trata da testemunha que era considerada juridicamente livre à época da confecção do testamento, mas que, posteriormente, foi reputada como escrava. Justiniano sustenta que o testamento deve ser declarado válido na hipótese de, a época, não ter havido qualquer impugnação. O atual ordenamento jurídico brasileiro não possui qualquer disposição similar no direito sucessório (situação de escravo).

O disposto no § 8º permite que um genitor e mais uma pessoa sob seu poder, ou dois irmãos vinculados ao mesmo pai, sejam testemunhas no mesmo testamento. O livro das Sucessões no CC/2002 não traz restrições quanto àqueles que podem figurar como testemunhas de um terceiro no testamento.

A regra do § 9º proíbe que alguém sob o pátrio poder do testador seja testemunha. A mesma vedação ocorre quando um filho militar arrola o pai como testemunha. A primeira proibição não consta especificamente do livro das Sucessões, mas está no rol do artigo 228 do CC/2002. Indiretamente, embora não faça menção aos militares, o atual Código Civil veda também que ascendente figure como testemunha (Art. 228, V). A regra do § 10 explicita e traz um relato histórico quanto à limitação do herdeiro para figurar como testemunha.

A disposição do § 11 permite que legatários e fideicomissários sejam testemunhas, desde que não figurem como sucessores do testador. O Código Civil não traz qualquer proibição para que fideicomissários ou legatários figurem como testemunha.

A norma do § 12 permite que se registre o testamento em tábua, pergaminho ou outra matéria. Das disposições tanto do testamento Público (Art. 1864), quanto o Cerrado (Art. 1.868), o Particular (Art. 1.876) e os Codicilos (Art. 1.881), no que diz respeito aos ordinários; e o Marítimo e Aeronáutico (Art. 1.888) e o Militar (Art. 1.893), no que tange aos Especiais, são registrados em papel[2]. A disposição seguinte permite a reprodução de exemplares do testamento, desde que guarde os requisitos formais. Justiniano ressalta que existe a possibilidade de o testador ter relações jurídicas diversas, e que dependam do teor do testamento para que sejam concretizadas. Não há qualquer disposição similar no Código Civil.

Por fim, Justiniano arremata, no §14, que as disposições deste título somente se aplicam aos testamentos escritos. Caso o testador opte por testamento não escrito, são necessárias sete testemunhas.


DOS CODICILOS

O último título do Livro Segundo traz disposições específicas aos codicilos. Do §1.º se extrai que é possível redigir um testamento em conjunto com o codicilo e prescrever um fideicomisso em formato de codicilo, mesmo que o testador não tenha redigido testamento. Proíbe o §2.º que seja concedida ou retirada herança por meio de codicilo, bem como que se estabeleçam condições ao herdeiro instituído; no entanto, permite que a herança seja deixada por meio de fideicomisso. Por fim, autoriza o §3.º que sejam prescritos diversos codicilos, e não se exige qualquer formalidade para isso.

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O codicilo pode ser usado para disposições funerárias do autor da herança, assim como prescrever bens de pequeno valor (artigo 1.881, caput). Equipara-se a codicilo qualquer prescrição com este conteúdo, mesmo que não seja testamentária (artigo 1.882 do CC). O fideicomisso, conforme já salientado em tópico anterior, permite que um patrimônio seja transferido a um fiduciário, o qual, por sua vez, transmitirá o bem ao fideicomissário quando falecer. Por restrição do artigo 1.881, o codicilo deve abranger bens de pequeno valor e, se assim o quiser o autor da herança, prescrever disposições para a cerimônia do enterro. O Código Civil utiliza a expressão pouca monta para qualificar aquilo que pode ser objeto de codicilo. É uma disposição que ficará ao prudente arbítrio do juiz decidir se está ou não dentro desta qualidade. Tartuce (2016) arremata: codicilo é um ato particular de última vontade simplificado e de expressão não considerável, para o qual a lei não exige maiores solenidades, em razão de ser o seu objeto de menor importância tanto para o falecido quanto para os seus herdeiros.


Notas

[1] A anterior redação dos incisos II e III do Artigo 2º do Código Civil de 2002 tratava as pessoas mencionadas como absolutamente incapazes.

[2] Art. 19, § 5º; Art. 143, caput; Art. 146, caput; Art. 147, caput; dentre outras disposições da Lei de Registros Públicos.

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Sobre o autor
Bruno Nóbrega

Servidor Público do TJDFT há 6 anos. Ex-servidor do Ministério da Saúde e FUNAI.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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