O Acesso à Justiça como Instrumento Auxiliar no Processo de Combate a Pobreza

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Este artigo busca demonstrar que a garantia de um direito, como o acesso à justiça, pode mitigar os efeitos do estado de hipossuficiência de um indivíduo, ou até mesmo de todo núcleo familiar. A pesquisa foi realizada na DPU/RO.

RESUMO:Este artigo busca demonstrar que a garantia de um direito, como o acesso à justiça, pode mitigar os efeitos do estado de hipossufiência de um indivíduo, ou até mesmo de todo núcleo familiar. A pesquisa foi realizada na Defensoria Pública da União em Rondônia (DPU-RO) na cidade de Porto Velho/RO. Os dados coletados são de pessoas que foram assistidas pela DPU-RO entre os anos de 2015 e 2016. Para tanto, utilizamos na pesquisa os arquivos da DPU-RO, dados estatísticos oficiais e em uma decisão judicial procedente ao pedido do assistido interposto pela DPU-RO. Demonstrou-se, dessa forma, as modificações positivas que a concessão de benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, previsto em lei, pode agregar na vida do indivíduo que dele necessite. Portanto, conclui-se, através do estudo de caso, que o acesso à justiça funciona como um instrumento auxiliar no processo de combate à pobreza, não sendo o único, mas seus efeitos são capazes de mitigar a situação de vulnerabilidade socioeconômica.

PALAVRAS-CHAVE: ACESSO À JUSTIÇA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. HIPOSSUFICIÊNCIA.

ABSTRACT:This article seeks to demonstrate that the guarantee of a right, such as access to justice, can mitigate the effects of an individual's hypersufficiency, or even of any family nucleus. The research was carried out in the Public Defender's Office of the Union in Rondônia (DPU-RO) in the city of Porto Velho / RO. The data collected are from people who were assisted by DPU-RO between 2015 and 2016. To do so, we used the DPU-RO archives, official statistical data and a judicial decision on the request of the assisted person filed by the DPU -RO. By demonstrating in this way, the positive changes that the granting of welfare benefits, in the amount of a minimum wage, provided by law, can add to the life of the individual who needs it. Therefore, it is concluded, through the case study, that access to justice functions as an auxiliary instrument in the process of combating poverty, not being the only one, but its effects are capable of mitigating the situation of socioeconomic vulnerability.

KEY WORDS: ACCESS TO JUSTICE. CONSTITUTIONAL WARRANTY.  HYPOSSUFICIENCE.


INTRODUÇÃO

Esta pesquisa se propõe a estudar o acesso à justiça, no âmbito federal, como um dos, senão o mais importante, instrumento no processo de combate ao estado de pobreza.

O objetivo é demonstrar as transformações que o acesso à justiça opera na vida do cidadão que por ele é alcançado, especialmente para aqueles que vivem em situação de extrema pobreza, possibilitando ao indivíduo o reencontro com a sua dignidade e o seu reconhecimento como pessoa humana.

Destarte, este estudo pode ser utilizado como alicerce para a criação e o desenvolvimento de políticas públicas que possibilitem a ampliação do acesso à justiça, promovendo a isonomia de direitos a todos.

Dentro dessa perspectiva e, visando atender a população menos abastada, foram criadas as Defensorias Públicas para que atuassem na defesa do cidadão hipossuficiente, seja a hipossuficiência de caráter transitório ou permanente, para que estes possam, por intermédio da tutela jurisdicional, pleitear direitos que foram ou estão na iminência de violação, e com isso, alcançarem a integração socioeconômica.

Para tanto, utiliza-se dos arquivos da Defensoria Pública da União na cidade de Porto Velho/RO que é a única instituição implantada em todo estado de Rondônia.

No ano de 2014, Rondônia apresentava o número de 58.433 pessoas vivendo na linha de extrema pobreza, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Essa situação não é exclusividade de Rondônia, pois não ocorre de maneira isolada. Casos semelhantes e/ou iguais acontecem em várias cidades espalhadas pelo mundo, e diante da atual instabilidade político-econômica enfrentada pelo Estado Brasileiro, vê-se a necessidade de se resguardar ainda mais o acesso à justiça, pois as violações aos direitos individuais ocorrem de forma constante e crescente, e se não forem combatidos, podem gerar um número ainda maior de necessitados.

Nesse aspecto, a metodologia utilizada é a do tipo bibliográfica, exploratória qualitativa com estudo de caso, que se torna imprescindível para a demonstração fática, da modificação e melhoria de vida que o cidadão obteve através do acesso à justiça, garantido desta forma um direito antes usurpado.


1.   O ACESSO À JUSTIÇA E SUAS METAMORFOSES JURÍDICA

1.1.Transformações Gerais do Acesso à Justiça

O surgimento da expressão acesso à justiça, como um direito, se deu muito antes da promulgação de nossa Carta Magna em 1988. Estudos revelam que o acesso à justiça sempre foi defendido, mas a sua definição e aplicabilidade se transformou ao longo de sua história.

Mauro Cappelletti; Garth  (1988. p. 9.) explana que, nos séculos XVIII e XIX o acesso à justiça era tratado como um direito natural, sendo que a intervenção do Estado acontecia de forma mínima, sua atuação se limitava apenas em preservar, ao indivíduo agravado, a oportunidade de ação ou de contestação. Sendo assim, não cabia ao Estado sopesar e/ou mitigar possíveis diferenças no âmbito econômico que pudessem beneficiar o acesso ao sistema jurídico por alguma das partes, sendo seu papel simplesmente formal e dogmático.

Fato esse, que para o cidadão menos abastado, recorrer a tutela jurisdicional representava uma grande perda, pois os recursos aos quais dispunha, muitas vezes eram insuficientes ou estavam no limite para a manutenção de seu próprio sustento, o que tornava o acesso à justiça, através da jurisdição, inacessível puramente por questões econômicas, pois sua condição financeira se apresentava como empecilho, por não poder arcar com as custas ao longo de todo processo e muito menos ter a assistência de profissional qualificado.

Em que pese o Estado possibilitar a apreciação judiciária da lide, as “armas” utilizadas e disponíveis para a defesa das partes, não eram igualitárias, pois o hipossuficiente continuava em desvantagem e desassistido.

Diante deste imbróglio, foi necessário repensar o acesso à justiça com a finalidade de mitigar-se os efeitos negativos do atual modelo. Diante disso, surgiram posicionamentos que aparentemente solucionariam as desproporções apresentadas e colocariam as partes em uma posição isonômica.

Cappelletti; Garth (1988, p. 31) descreve que a partir do ano de 1965 os países do ocidente apresentaram 3 posições básicas como alternativas de soluções dos problemas relacionados ao acesso à justiça, que foram denominados como “ondas”, surgindo uma após a outra de forma cronológica. As “ondas” eram movimentos articulados na tentativa de minimizar as diferenças entre as partes e tornar a justiça acessível a todos que a ela recorressem.

Dessa forma, a “primeira onda”, trazia enfoque à assistência jurídica para os pobres, mas não nos moldes que conhecemos hoje, pois ao prestar assistência jurídica o profissional não era remunerado por seus serviços, o que acarretava prejuízo tanto para a parte, quanto para o advogado, pois este não atuaria com tanto comprometimento/empenho. Somente no ano de 1972, o Estado começou a custear os encargos com os honorários advocatícios.

A “segunda onda” assegurou representação jurídica na defesa de direitos difusos, como por exemplo a proteção ao meio ambiente. Esse movimento foi considerado uma revolução, pois o processo civil até então, era reconhecido como um assunto a ser tratado entre as duas partes, sendo assim não havia espaço para a proteção dos interesses pertencentes a um grupo a um todo, são os chamados direitos difusos.

A “terceira onda” trabalhou no enfoque ao acesso à justiça propriamente dito, centrando “atenção no conjunto geral dos mecanismos, das instituições, das pessoas e os procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas” (Cappelletti; Garth . 1988, p. 67). Ressalta-se que esse método não abandonou os anteriores, pois objetivava a celeridade dos processos judiciais, levando a justiça aos cidadãos, ou seja, que o sistema judiciário se enquadrasse a sociedade e não o contrário, agindo de forma ágil, para então atingir um maior número de pessoas.

Assim, Cappelletti; Garth (1988, p.12 ) frisam que “O acesso à justiça, pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar, os direitos de todos.”

Portanto, a transformação e ampliação do acesso à justiça se tornou inevitável, e sua importância ao longo da história ficou ainda mais evidente, pois através dela se pode mitigar as diferenças entre as partes, podendo ainda ser reconhecida como uma mola propulsora no sentido de se ter uma sociedade mais igualitária/equilibrada, contando com a participação contundente do Estado em sua forma positivada, promovendo a acessibilidade à justiça para todos como meio garantidor dos direitos sociais basilares.

1.2    Acesso à Justiça no Brasil e suas Metamorfoses Jurídicas

No Brasil o acesso à justiça também sofreu transformações ao longo da história e possui como principal fonte do direito as ordenações advindas do reino de Portugal, quais sejam elas: as ordenações Afonsinas (1.446), as Manuelinas (1.521) e as Filipinas (1.581), e a partir do ano de 1.603 realizou-se uma transformação na estrutura e organização da justiça.

Na organização jurídica da época já havia uma preocupação com a assistência jurídica gratuita aos necessitados, como se nota no Terceiro Livro das Ordenações, Título XXVIII:

E os Clérigos e Religiosos não vão às audiências para advogar, nem procurar por outrem, salvo se por si, ou pelos seus, ou por aqueles, por quem de Direito o podem fazer, assim como por suas Igrejas, e pelas pessoas miseráveis, e por seus pais, ou mães, ou outros ascendentes, ou irmãos...”

Observa-se, que a cultura de assistência jurídica era encarada como responsabilidade ética da igreja, modificando e ampliando ainda mais o leque de possíveis responsáveis.

Após a queda do absolutismo o movimento humanista ganhou força e as ideias de liberdade cresciam. No ano de 1.789 foi reconhecida a Declaração do Direitos do Homem e do Cidadão, sendo assim, era dever do Estado mitigar as desigualdades sociais.

Em 1.890 cria-se oficialmente a assistência jurídica no Brasil, por meio do Decreto 1.030/1.890, com o propósito de garantir aos pobres, tanto, assistência jurídica, como liberará-los dos pagamentos das custas das causas cíveis e criminais, conforme demonstra a transcrição dos artigos abaixo.

Art. 175. Os curadores geraes se encarregarão da defesa dos presos pobres, á requisição do presidente do Jury ou da camara criminal.

Art. 176. O Ministro da Justiça é autorizado a organizar uma commissão de patrocinio gratuito dos pobres no crime e civel, ouvindo o Instituto da Ordem dos Advogados, e dando os regimentos necessarios.

Porém, mesmo com a garantia legitimada através do decreto, ainda havia um encalço, pois como definir o pobre e/ou necessitado? Diante disso, e visando resguardar um direito criou-se o decreto 2.457/1897 que estabeleceria o conceito de pobre, in verbis:

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Art. 2º. - Considera-se pobre, para os fins desta instituição, toda pessoa que, tendo direitos a fazer valer em Juízo, estiver impossibilitada de pagar ou adeantar as custas e despezas do processo sem privar-se de recursos pecuniários indispensáveis para as necessidades ordinárias da própria manutenção ou da família.

No ano de 1.930, através do Decreto 19.408/1.930, artigo 17, institui-se a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), veja:

Art. 17. Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, orgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pêlos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.

Até então, a assistência jurídica não passava de uma recomendação, com a criação da OAB ela passou a ser obrigatória, e o advogado que se recusasse a prestá-la incorreria em desobediência sendo penalizado com multa.

Assim, seguiu-se até o ano de 1.934, ano em que foi promulgada a terceira constituição brasileira, e que pela primeira vez trouxe em seu texto constitucional a égide do acesso à justiça por meio da prestação da assistência jurídica, conforme prevê o artigo 113, inciso 32, vejamos:

Art. 113 – A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade á subsistência á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:

32) A União e os Estados concederão aos necessitados assistencia  judiciária creando, para esse efeito  órgãos especiaes e assegurando a isenção de emolimentos, custas, taxas e sellos.

Mas, infelizmente esse momento durou pouco, pois em 1937 foi instituído pelo próprio presidente Getúlio Vargas, o Estado Novo, que era centrado no nacionalismo e autoritarismo. Com isso, não houve mais espaço para a política de assistência jurídica, momento esse que perdurou até a promulgação da quarta constituição brasileira, ocorrida em meados de 1946, que trouxe novamente em seu texto o amparo jurídico aos necessitados, conforme demonstra transcrição abaixo:

Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

§ 35 - O Poder Público, na forma que a lei estabelecer, concederá assistência judiciária aos necessitados.

Corroborando com essa garantia fundamental estabeleceu-se, por meio da lei 1.060/1.950, as normas para a concessão de assistência jurídica gratuita, com o intuito de se afastar aqueles que dela não necessitassem, e como referencial utilizou-se o aspecto estritamente econômico.

Apesar de todo o aparato jurídico apresentado até o momento, para garantir o acesso da justiça à todos os cidadãos, ela ainda não conseguia abranger a todos de forma nivelada, e o Brasil atravessou 20 anos de governo militar (1964-1984), onde o estatuto de acesso à justiça foi minimizado.

Mas em 1.988 com a promulgação da nova Constituição, a chamada Constituição Cidadã, instituiu-se novas formas de prestar essa assistência, surgindo assim as Defensorias, que são instituições públicas, criadas pelo Estado, para que prestem assistência jurídica gratuita àquelas pessoas que não possui condições de pagar por esse serviço, sendo esse momento o ápice do acesso à justiça, pois os modelos apresentados até o momento não funcionavam de forma satisfatória, principalmente pelo fato de que os advogados dativos, pagos pelo Estado, não possuíam independência funcional para litigar contra órgãos públicos.

Destarte, um novo modelo foi criado, no qual o advogado possuía autonomia funcional, mesmo sendo remunerado pelos cofres públicos.

Portanto, através da jurisdição o indivíduo tem a possibilidade de questionar e requerer análise de sua queixa perante o judiciário, respeitando o princípio do devido processo legal.

Visando atender a todos, hipossuficientes ou não, o acesso à justiça pode ser garantido de duas maneiras, por meio da advocacia privada e da advocacia pública.

A advocacia privada/particular, já vinha sendo ofertada há muito tempo, porém a inovação veio com a criação das defensorias, para os casos em que a parte não possuísse meios de arcar com as despesas processuais. Então o demandante podia contar com a advocacia pública, que nada mais é, do que um advogado intitulado como Defensor Público, custeado pelo Estado, conforme preconiza o artigo 5º, inciso LXXIV, veja:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; (grifei)

Assim, o acesso à justiça poderá ser construído pela junção da sociedade civil e a Defensoria Pública, função essencial da justiça, uma vez que ela é instituição autônoma e portando não mais, parte de nenhum poder, podendo se capilarizar pelos rincões do Brasil, onde haja sede da justiça, promovendo a difusão da informação e da assistência jurídica gratuita, tendo a sociedade civil, papel fundamental na provocação do órgão autônomo.

Nesse panorama, Rodrigues (2014, p. 11), explana sobre o fundamental papel do acesso à justiça, vejamos:

O acesso à justiça se faz necessário, para a manutenção do exercício da cidadania no Brasil, pois em um país onde o Poder Executivo tem tendência a negar direitos, seja por falta de estrutura física ou de recursos humanos, o acesso à justiça se faz como a ponte que liga o cidadão ao seu direito.

Portanto, garantir o acesso à jurisdição é uma forma de garantir à justiça, e a efetivação desse acesso pode ser utilizado como instrumento no processo de combate à pobreza, pois permitirá acesso a bens e serviços que garantem dignidade a condição humana, ou seja, a aquisição de bens e serviços que melhorem a qualidade de vida dessa população proporcionando cidadania.

1.2.1   O acesso à justiça através da advocacia privada

A Constituição Federal em seu art. 133 prevê a prestação da advocacia como função essencial à justiça, vejamos:

Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

Assim, a advocacia não pode ser vista como uma mera atividade profissional, sua função vai muito além disso, pois possui em sua essência a defesa dos interesses de terceiros, possui capacidade postulatória, conferida pela sua inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), atendendo e observando sempre os interesses de quem os postulam, além de respeitar todos os princípios jurídicos, como também o estatuto e ética inerentes ao bom exercício da profissão.

A Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, mais conhecida como Estatuto da Advocacia, prevê no § 1º do artigo 2º que o advogado sendo indispensável à administração da justiça, e que mesmo agindo na forma privada, presta serviço público, pois o operador de direito, exerce atividade com cunho social, o que o faz alcançar o múnus público, como bem define Benedito Calheiros Bomfim:

É preciso formar consciência de que a advocacia é atividade político-jurídica, possui múnus público, conteúdo ético, político e social, constitui uma forma de participação, de inserção na comunidade, e opção de justiça, de luta pelo direito e pela liberdade, de tutela dos interesses da sociedade, de defesa dos valores jurídicos e princípios fundamentais dos direitos do homem e da dignidade do trabalho. acarretado de encargos e deveres.

Verifica-se, portanto, que na advocacia não há espaço para neutralidade, pois ela é uma atividade cidadã-participativa, um instrumento posto à disposição da sociedade na busca de soluções para os possíveis conflitos.

A ordem jurídica é extensa e complexa, porém harmônica, e a orientação jurídica de um profissional é extremamente importante, pois ele possui conhecimento técnico e capacidade postulatória, que permite ao advogado atuar em nome/defesa de quem dele necessitar, pois não há ordem sem respeito à ordem jurídica, tudo está subordinado ao que determina a lei.

Mas nem todos que recorrem à justiça possuem condições de custeá-la, por essa razão criou-se a advocacia pública, como meio de garantir a todos o acesso à apreciação judiciária de forma a proporcionar meios igualitários ao longo de todo o processo.

1.2.2    O acesso à justiça através da advocacia pública

A assistência jurídica gratuita já era prevista no ordenamento brasileiro, mas o grande marco dessa conquista, foi estabelecido com a promulgação da Lei Federal nº 1.060/1.950 que determina como e a quem essa assistência seria concedida.

Todavia, o que tange a garantia do acesso à justiça, ainda era preciso mais, e foi a partir daí que as Defensorias Públicas surgiram, como uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado, conforme determina a Constituição Federal em seu artigo 134, vejamos:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

Com isso, a procura pelos serviços prestados pela Defensoria Pública cresceu consideravelmente, chegando ao ponto de sua demanda ser tão alta, que a estrutura física e a quantidade de servidores disponibilizados à sociedade não eram capazes de atender a toda demanda.

Dessa forma, o Conselho Superior da Defensoria Pública da União diante da análise do público que a ela recorria, observou que era preciso estabelecer um novo critério de hipossuficiência. E para tanta, utilizou como um dos principais critérios de definição da condição de necessitado a renda do grupo familiar, que inicialmente era de três salários mínimos, e que a partir de 2016 passou a ser de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Essa medida foi tomada devido ao crescente número de pessoas que são atendidas diariamente nas DPUs, que ultrapassam a capacidade de atendimento das unidades, somado a isso, ainda se teve que administrar a redução orçamentária da verba destinada à instituição, o que dificulta ainda mais o desempenho de suas atividades.

No entanto, tomou-se como base para a alteração do valor para definir a condição de necessitado, a faixa de isenção do imposto de renda/2016, que girava em torno de R$ 1.999,00 (mil, novecentos e noventa e nove reais)., ou seja, para fazer jus a assistência jurídica gratuita, a renda familiar da pessoa que dela precisar, não pode ultrapassar o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), exceto se comprovado gastos extraordinários e exorbitantes com tratamentos de saúde entre outros.

Assim, cumprido esse primeiro critério, outros mais serão analisados a fim de determinar a necessidade econômica do demandante.

A Resolução nº 133 de 7 dezembro de 2016 dispõe sobre a concessão da assistência jurídica, vejamos alguns deles:

Art. 2º. Presume-se economicamente necessitada a pessoa natural integrante de núcleo familiar cuja renda mensal bruta não ultrapasse valor fixado pelo Conselho Superior da Defensoria Pública da União para atuação do órgão

(...)

§ 4.º São indícios de hipossuficiência econômica do núcleo familiar a percepção de rendimentos decorrentes de:

I - programas oficiais de transferência de renda;

II - beneícios assistenciais e previdenciários mínimos pagos a idoso ou deficiente;

Antes de estudar o caso concreto é a realizada uma análise interna das condições do requerente, denominado na instituição de assistido, a fim de averiguar se ele faz jus à assistência jurídica gratuita ou não.

Ainda será exigido a documentação mínima para dar continuidade a assistência, também previstos na resolução n 13, vejamos:

Art. 9º. Será exigido do requerente da assistência:

I - a documentação pessoal e a necessária para a comprovação da necessidade;

II - o preenchimento de pesquisa destinada à identificação de seu perfil social e econômico;

III - a declaração de necessidade, com suas razões.

Art. 10. Poderá ser solicitada do requerente da assistência jurídica a assinatura de outorga de poderes especiais, quando a situação o exigir.

Há casos em que o autor não pode comparecer a unidade de atendimento, sendo assim o representante poderá assinar apenas a redução a termo, ficando pendente de colher as assinaturas na outorga e a declaração de necessidade, previsto no artigo 11 da mesma resolução.

Após o cumprimento de todos os requisitos estabelecidos, assim como a juntada de toda a documentação comprobatória, finalmente será deferida a assistência gratuita, dando inicio de fato a análise da viabilidade jurídica e ajuizamento da ação.

Nos casos de indeferimento, comunica-se ao assistido a razão do indeferimento e o processo administrativo é arquivado. Mas isso não é razão impeditiva do retorno do assistido a DPU/RO, pois a situação econômica é variável e a razão que impedia a prestação de atendimento pela DPU pode não existir mais.  

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Sobre os autores
Enmanuely Sousa Soares

Advogada OAB/RO Pós Graduanda em Direito Aplicados aos serviços de Saúde. Assessora jurídica de Startup Ativadora Local da AB2L em Rondônia.

Ricardo da Silva Rodrigues

Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, professor da Faculdade de Rondônia e servidor da Defensoria Pública da União em Rondônia. Email: ricardorodrigues87a@hotmail. com

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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