Da Portaria nº 6947/15 e o conflito de normas

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21/12/2017 às 08:41
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2. Da Portaria nº 6947/15-PMGO

Como já exposto supra diante de lacuna procedimental gerada pela evolução das normas, o Regulamento Disciplinar (Decreto nº 4.717/96), não disciplina normas relativas aos procedimentos administrativos, e, somente, tem por finalidade especificar e classificar as transgressões disciplinares, bem como estabelecer normas relativas à amplitude, apuração e à aplicação das punições disciplinares, à classificação do comportamento policial militar das praças e à interposição de recursos contra aplicação das punições e faz referência a Sindicância (PAD) apenas no art. 14.

Temos, ainda, a Lei nº 08.033/75, que trata do Estatuto dos Policiais Militares de Goiás que também não traz qualquer norma que regula o procedimento administrativo.

Assim, o Corregedor estabelece que a Polícia Militar de Goiás possui regramentos castrenses próprios para a apreciação de seus processos administrativos, sendo esses o Decreto nº 4.717/1996 e a Portaria nº 6947/2015.

Ressalto ainda que o dito Regulamento foi redigido no ano de 1996, de forma que posterior a Constituição Federal de 1988 e anterior a Lei nº 13.800 do ano de 2001, portanto, a questão não se regula exclusivamente pelos regramentos castrenses próprios, vez que normas inferiores, deve ser regulada pela lex novae sem qualquer prejuízo a hierarquia e a disciplina castrense, por ter previsão em lex specialis, o que não tem acato junto a PMGO, justamente por garantir amplo direito aos Administrados, Despacho nº 1103/2016:

Assim, derroga-se que a lei nº 13.800/01 não dispõe de subsídio combustível para servir como regulamentação para processos administrativos na esfera marcial, restando prejudicada a análise de qualquer fato escorado por tal legislação, já que a corporação, tendo como pilares os princípios da hierarquia e da disciplina, não pode violar o disposto no art. 5º, inciso XLVI, da constituição federal de 1988, nem os princípios da isonomia, da proporcionalidade e o da razoabilidade, pois qualquer decisão proferida por esta casa censora deve observar os preceitos legais, estatuídos na normativa material e adjetiva castrense (...). (Despacho nº 1103/2016, DOPM nº 194/2016).

As Autoridades Militares invocam a Hierarquia e a Disciplina, de forma a justificar seus atos ilegais, como se sua simples invocação, sem qualquer relação ou fundamento sirva de motivação bastante.

Em conformidade com o artigo 55 do Código de Processo Penal Militar (CPPM) reza que o Ministério Público tem o poder de “fiscalização e função especial”, em atenção especial o resguardo das normas de hierarquia e disciplina e ainda do art. 33 sobre o exercício do direito de petição, onde esse órgão se manifesta no Mandado de Segurança nº 201101905225, da seguinte forma:

O direito de petição não pode ser suprimido sob o argumento da preservação da hierarquia e da disciplina militar, pois se trata de direito fundamental inafastável. Ademais, representação junto ao Ministério Público não pode ser considerada motivação idônea para fins de justa causa para instauração de sindicância contra o impetrante.

Ainda muito bem exposto por este Sodalício onde esclarece, apesar da previsão constitucional da organização da força com base na hierarquia e disciplina, disciplina e desmandos não se confundem:

Pois bem, apesar da previsão constitucional da organização da força com base na hierarquia e disciplina, disciplina e desmandos não se confundem, “quem critica o autoritarismo não está a criticar a disciplina”. (TJGO, habeas-corpus 256007-80.2015.8.09.0000, Rel. Des. Nicomedes Domingos Borges, 1ª Câmara Criminal, julgado em 01/09/2015, DJe 1901 de 03/11/2015)

Assim, Portaria não é Lei, onde não fica dúvida pelo termo do art. 68 da Lei nº 13.800/01, por lei própria, a expressão é evidente, sem qualquer interpretação extensiva:

Art. 68 – Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta lei.

No entanto, a Portaria pode ter vigência desde que não conflite com o texto legal, pode ser aplicada, nesse confronto o ato expedido é nulo (lex specialis derogat generali), por violar o texto expresso em norma maior, que como ato administrativo, não obriga os particulares, somente os servidores do órgão sujeitos ao poder hierárquico da Administração Pública com efeitos erga omnes, interna corporis ou inter partes.

Nesse sentido a norma inferior (Portaria) não pode regular ato já regido por norma hierarquicamente superior, sob pena de desobediência expressa de lei, que em tese gera Ato de Improbidade Administrativa, da Lei nº 8.429/92 (LIA), dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos que atentam contra os princípios da administração pública, cargo, emprego ou função na administração pública em seus artigos 4º e 11, respectivamente:

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.

...

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; Negritei

Destarte, fica evidente que os agentes públicos são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos, segundo o princípio da legalidade e o entendimento do Comando da PMGO, o administrador não pode fazer o que bem entender na busca do interesse público, tem que agir segundo a lei, só podendo fazer aquilo que a lei expressamente autoriza e no silêncio da lei está proibido de agir (Despacho "CG" nº 938/2015).

Dessa forma a Administração Pública Militar, vem utilizando de motivação completamente sem fundamentação legal, o que prejudica o devido processo legal, bem como a legitimidade e veracidade dos atos administrativos ao aplicar Portaria que colide com a Lex Specialis, em determinados aspectos que serão discutidos, em detalhes:


3. Do conflito entre a Portaria nº 6947/15 e a Lei n° 13.800/01

3.1. Da citação ou intimação

O art. 18 da Portaria nº 6947/15, estabelece os documentos básicos na elaboração de sindicância, de acordo com o caráter apuratório, determina no inciso V, a citação do sindicado, (quando houver indícios do cometimento de transgressão disciplinar), já o art. 22 demonstra como deverá proceder a citação.

O Corregedor da PMGO no Despacho nº 941/16, define a citação:

Aceptivo à capitulação provisória no documento de citação, fato alentado pelo sindicado, salienta-se que o novo código de processo civil define citação, em seu art. 238, como sendo o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual. (Despacho nº 941/16 – DOPM nº 175/2016).

O Tribunal de Justiça de São Paulo, quando da discussão de sindicância, entende que é essencial a citação, para que o sindicado tome pleno conhecimento das infrações e dos dispositivos funcionais por ele infringidos, conforme Ementa:

MANDADO DE SEGURANÇA-SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA IMPETRAÇÃO CONTRA ATO COATOR QUE DELIBEROU PELA APLICAÇÃO DE PENALIDADE DIRETA DE REPREENSÃO-IMPOSSIBILIDADE-AINDA QUE A NORMA ESTATUTÁRIA CONTEMPLE A FIGURA DA SINDICÂNCIA PUNITIVA, SE CONSTATADA PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA A PRÁTICA DE INFRAÇÕES FUNCIONAIS PELO SERVIDOR, É DE RIGOR QUE PROCEDA À RESPECTIVA CITAÇÃO PARA TOMAR PLENO CONHECIMENTO DAS INFRAÇÕES E DOS DISPOSITIVOS FUNCIONAIS POR ELE INFRINGIDOS, NA FORMA DA FUNDAMENTAÇÃO-O PODER DISCIPLINAR NÃO SE FURTA À ESTRITA OBSERVÂNCIA DO DIREITO FUNDAMENTAL AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA NO ÂMBITO DA SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA SENTENÇA REFORMADA SEGURANÇA CONCEDIDA- RECURSO PROVIDO. (TJSP, 13ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, 13ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, Relator Desembargador Ferraz de Arruda)

Consta no art. 22 da Portaria, quanto a citação do Sindicado/Administrado, que tem similaridade com o art. 26 da Lei nº 13.800/01, respectivamente:

QUADRO COMPARATIVO

Portaria nº 6947/15

Lei n° 13.800/01

Art. 22. O sindicante citará o policial militar acusado para comparecer em dia e hora determinados, para audiência, sendo-lhe facultado comparecer com defensor e testemunhas.

Art. 26 – O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação dos interessados para ciência de decisão ou a efetivação de diligências.

§ 1º A citação deverá conter:

§ 1º – A intimação deverá conter:

I - a qualificação do acusado;

I – identificação do intimado e nome do órgão ou entidade administrativa;

II - a descrição do fato;

II – finalidade da intimação;

III – data, hora e local em que deve comparecer;

IV – se o intimado deve comparecer pessoalmente, ou fazer-se representar;

V – informação da continuidade do processo independentemente do seu comparecimento;

III - a capitulação regulamentar provisória da imputação.

VI – indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes.

A diferença entre a Lei e a Portaria são enormes, vez que a primeira estabelece maiores garantias ao Sindicado/Administrado, bem como aos terceiros (interessados) que são definidos no art. 9º, destacando os que iniciam o processo como titulares de direitos, interesses individuais ou no exercício do direito de representação, dentre outros descritos nos demais incisos.

Onde a citação/intimação deverá conter, a qualificação/identificação do acusado/intimado, sindicado/interessado, descrição/finalidade do ato, data, hora, local de comparecimento, sendo facultado comparecer com advogado, nos termos da sumula vinculante nº 05, a continuidade do processo independente de seu comparecimento (revelia).

3.2. Da capitulação regulamentar provisória da imputação

Situação polêmica surge no art. 22, § 1º, III, da Portaria nº 6947/15, com seu correspondente no art. 26, § 1º, VI, da Lei nº 13.800/01, a primeira determina a capitulação regulamentar provisória da imputação, a outra indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes, ou seja, deve ocorrer a subsunção fato/norma.

A Lei é explicita ao determinar que sejam indicados os fatos e os fundamentos legais pertinentes, que constitui o devido processo legal uma acusação clara, explicita e congruente conforme determina seu art. 50, quanto a motivação dos atos administrativos, subsumindo o fato ocorrido entre a norma transgredida, trazendo segurança jurídica o feito, bem como a eficiência da apuração em caso de futura sanção disciplinar, evitando vícios e posterior nulidade.

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A Portaria nesse sentido é mais ampla determina capitulação regulamentar provisória da imputação, que refere-se à indicação, na peça acusatória inicial, do preceito transgressional infringido pelo acusado, neste contexto, deve a citação, conter qual item Regulamentar (Decreto nº 4.717/96), em tese, descumprido do art. 68 violado pelo Sindicado (preceito regulamentar), sendo ausente, os atos realizados serão nulos por não cumprir formalidade normativa, por violar o devido processo legal.

Ressalto o Despacho SPPD nº 017/2017 do Comando Geral, que esclarece a questão, litteris:

Entende-se que a subsunção à norma regulamentar é a adequação de uma conduta ou fato concreto (norma-fato) à norma jurídica (norma-tipo). (Despacho SPPD nº 017/2017 - DOEPM nº 33/2017).

Da mesma forma o Corregedor da PMGO, no Despacho nº 634/2017:

Neste mesmo sentido, observou-se que o Sindicante não tomou as medidas de acordo com os ditames da ampla defesa e do contraditório, bem como com o que dispões a Portaria nº 6947/2015-PM1 (Normas para Elaboração de Sindicância na PMGO) deixando de citar e notificar o Sindicado, de juntar sua ficha funcional atualizada, de proceder a inquirição da médica do trabalho que homologou os atestados do Sindicado, bem como sua opinião quanto aos afastamentos e o fato do Sindicado ter viajado para outro Estado da Federação e participado de um congresso, ao tempo que não notificou o sindicado de todas as medidas e diligencias efetuadas perante o decorrer do processo, deixando igualmente de ofertar a correta abertura de vistas com a subsunção fato/norma e juntada de razões de defesa. (Despacho nº 634/2017 - Sindicância nº 2016.02.17776)

Superado isso, e com vazão à informação difundida pelo pretendente, alegando que a citação contida no PAD - Processo Administrativo Disciplinar, não possuía capitulação provisória, gerando tal vício a ausência de justa causa para a abertura do PAD e notório prejuízo à defesa, o que coabitaria com seu arquivamento, insta alentar que a citação encaminhada ao então sindicado obedeceu seus ditames formais e materiais, tanto que foi inclusive anexo a esta a cópia da exordial do PAD, conforme se vê claramente às folhas nº 77/78. Inobstante, mas nesse mesmo arcabouço, afixa-se que o Superior Tribunal de Justiça pontuou que não se verifica cerceamento de defesa se a portaria de instauração do processo disciplinar e o ato de citação informam, conquanto sucintamente, a infração cometida, nem ainda pelo fato de não se formalizar intimação específica para que o acusado requeira a produção de provas testemunhais, porque a legislação faculta o requerimento de meios probatórios ao processado (RMS 16757/MG, Relator o ministro Paulo Medina, 6ª turma, julgamento de 25.06.2004, DJ DE 23.08.2004, P. 276.).

De todo modo, impende rememorar ao requerente que a orientação jurisprudencial dominante do superior tribunal de justiça prepondera no sentido de que não há que se decretar a nulidade do processo administrativo disciplinar por causa da ausência de descrição dos fatos no ato de instauração, porque a corte entende que o rito no PAD apenas demandaria a formalidade no ato de oferta de vistas, libelo acusatório, quando verdadeiramente ocorre a subsunção fática, ou seja, quando deverão ser especificados os fatos e o seu respectivo enquadramento legal, além das provas manejadas contra o sindicado, e não desde a portaria inaugural do feito disciplinar. assim, resta solidificado que o superior tribunal de justiça firmou compreensão segundo a qual não se exige a descrição minuciosa dos fatos na portaria de instauração do processo disciplinar, quiçá da citação, pois proveniente da primeira. tal exigência tem momento oportuno, qual seja, conforme já supra argumentado, por ocasião da abertura de vistas ao sindicado. O mesmo juízo foi reiterado nos julgamentos do MS 12061, da 3ª seção, em 16-2-2009, MS 8401/DF, também da 3ª seção, em 22-4-2009, além de outros julgados do colendo Superior Tribunal de Justiça: (Recurso Especial nº 585.156 - RN (2003/0158109-3), Relator: Ministro Paulo Gallotti, recorrente: João Maria de Andrade Lima, Advogado: Rivandi Freitas De Melo e outro, recorrido: união, sexta turma, por unanimidade, Brasília (DF), 02 de outubro de 2008 (data do julgamento), dje: 24/11/2008); (MS 6861/DF, DF DE 04.02.2002, P. 272, 3ª SEÇÃO).

o STJ reiterou esse juízo: (MS 7736/DF, dj de 04.02.2002, p. 277, 3ª seção); (MS 6723/DF, dj de 25.06.2001, p. 101, 3ª seção: "somente depois de concluída a fase instrutória, onde o acusado terá direito à ampla defesa, é que, se for o caso, será tipificada a infração disciplinar, formulando-se o indiciamento do servidor, com a especificação dos fatos e das respectivas provas, sendo, então, na condição de indiciado, citado para apresentar defesa (artigo 161 da lei 8.112/90)."); (MS 8259/ DF, dj de 17.02.2003, p. 219, Relator o Ministro Hamilton Carvalhido, 3ª seção.); (ROMS 13542/SP, 2001/0091977-3, dj de 22.09.2003, p. 343, relator o Ministro Gilson Dipp, decisão de 12.08.2003, 5ª turma.). A corte superior preferiu o entendimento de que, apesar da deficiência da portaria inaugural e por decorrência da citação, se o servidor teve conhecimento pleno das acusações articuladas contra ele no curso do processo administrativo disciplinar, em que respeitados rigorosamente os consectários do procedimento contraditório, não há que se falar em nulidade, em nome do princípio do prejuízo, sendo aplicável o princípio do pas de nullité sans grief, pois a nulidade de ato processual exige a respectiva comprovação de prejuízo. In casu, o requerente/sindicado teve pleno conhecimento dos motivos ensejadores da instauração do processo disciplinar. entrementes, houve, também, farta comprovação do respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, ocasião em que pretendente/sindicado pôde apresentar defesa escrita e produzir provas, inclusive de forma prévia, abalizando tal sentido, tem-se: (STJ, MS 8834/DF; DJ de 28.04.2003, P. 171, Relator o Min. Gilson Dipp, 3ª SEÇÃO.).

O STJ tem flexibilizado ainda mais sua jurisprudência, apontando ser desnecessário que a portaria inaugural, entenda-se, a citação, dela decorrente, do procedimento administrativo descreva, em minúcias, a imputação feita ao servidor, posto que a documentação que acompanha o referido ato esclarece a situação, sendo suficiente para que o servidor apresente sua defesa, não havendo qualquer prejuízo. Logo, após a juntada da informação disciplinar, ainda que posteriormente ao oferecimento das alegações finais, o servidor tem pleno acesso aos autos, tanto que se manifesta sobre outros aspectos, nesse sentido: (ROMS 16850/BA, 2003/0143205-1, dj de 10.05.2004, p. 307, relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, decisão de 13.04.2004, 5ª turma.). O Superior Tribunal de Justiça tem sido tolerante até no caso de alusão genérica aos fatos justificadores na portaria, inexistindo nulidade quanto à portaria de instauração do processo disciplinar por ter feito referências genéricas aos fatos imputados ao servidor, deixando de expô-los minuciosamente, exigência esta a ser observada apenas na fase de indiciamento, após a instrução: (MS 6881/DF; dj de 24.02.2003, p. 181, relator o Ministro Félix Fischer, 3ª seção.). Pelo disposto, fica sepulcrado consignar a exigibilidade de capitulação provisória, bem como a ocorrência de vício, ausência de justa causa e/ou notório prejuízo à defesa conquanto ao inferido pelo pretendente. (Despacho nº 1103/2016, DOPM nº 194/2016)

A Autoridade Administrativa em seu longo discurso, tenta validar seu ato ilegal, amealha diversos julgados da Corte Superior, a discussão neste tópico não se refere ao entendimento dos Tribunais, mas o fato da norma contemplar a capitulação provisória da imputação (art. 22, § 1º, III), ou seja, ao desconsiderar essa norma, com vasta jurisprudência, demonstra a incoerência de seus atos ao determinar que o regramento castrense próprio tem respaldo na Portaria nº 6947/2015, a qual desconsidera sua vigência, quanto ao art. 22, § 1º, III, onde a aplicação de determinado preceito se encontra respaldado em sua conveniência, quando nega a aplicação expressa de norma. Onde expressa seu entendimento de que pelo disposto, fica sepulcrado consignar a exigibilidade de capitulação provisória, bem como a ocorrência de vício, ausência de justa causa e/ou notório prejuízo à defesa, da qual conforme exposto discordamos.

Consta ainda no Despacho nº 941/2016, exarado pelo Corregedor da PMGO, demonstrando a tese supra, onde a PMGO, cria norma inútil, que não é observada pelos Oficiais, que agem da forma como bem entendem, com a criação de teses e subterfúgios para validar seus atos ilegais:

Ademais, a citação vergastada expõe claramente a imputação, mesmo que não de forma detalhada ou com "capitulação provisória". o acusado se defende dos fatos e não da capitulação legal. Lastreia tal entendimento, precedente do Superior Tribunal de Justiça – STJ.

...

nesse esteio, temos também, evidenciada a não obrigatoriedade de "capitulação provisória", pelo que dispõe o decreto estadual nº 4.717/96 (regulamento disciplinar da PMGO), ipisis litteris:

Sendo tal preceito uma garantia ao Sindicado/Administrado, que ao ser tipificado (art. 22, § 1º, III) pela Administração Pública Militar, passa a fazer parte do devido processo legal desta Instituição, que deve ser seguida pelos castrenses (erga omnes, interna corporis), sendo inobservada traz prejuízo a parte fazendo parte do devido processo legal (pas de nullité sans grief), norma essa oriunda do Comando Geral da Corporação, com aplicação em todos os procedimentos disciplinares na PMGO, não cabe interpretação diferente.

Ainda o art. 2º da Portaria nº 6947/2015, determina que os atos processuais obedecerão aos princípios da dignidade da pessoa humana, da moralidade, da legalidade, da publicidade, da impessoalidade, da motivação, do informalismo, da economia processual e da garantia da ampla defesa e do contraditório, que como dito, sendo inobservado traz prejuízo, com a consecutiva nulidade.

Temos ainda que a citação deverá conter a capitulação provisória da imputação, ou seja, deve o instrumento de convocação trazer em seu bojo a indicação do preceito transgressional infringido pelo Sindicado, de forma provisória, temporária ou passageira, capitulação essa, que pode ser modificada no decorrer do procedimento até a apresentação do libelo acusatório, momento em que será promovida a imputação definitiva, para que seja realizada a defesa do acusado.

Como dito inicialmente, situação polemica, vez que o instituto da capitulação provisória da imputação, em determinados casos é relegada, demonstrando o animus nocendi, da administração quanto a determinados sujeitos passivos, bem como ausência de motivação e interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento de sua finalidade pública, vedada aplicação retroativa de nova interpretação, com decisão conforme sua vontade e não conforme a norma e o direito.

Nessa continua o Despacho nº 941/2016, onde motiva que não realizada a citação com a capitulação provisória, por não se vislumbrar transgressão disciplinar, ou seja, o procedimento busca somente o animus puniendi, demostrando a ausência da convicção da acusação e da ausência da ampla defesa, com a ampla acusação ou a busca de subterfúgios com animus nocendi:

Assim, sobre a necessidade de capitulação provisória no documento de citação, esta não foi realizada, única e exclusivamente, porque não se vislumbrava até então, uma transgressão disciplinar específica ao sindicado, conforme fundado no julgado supra. Logo, para o perfeito entendimento sobre a conduta do sindicado e por consequência, para que fossem respeitados os princípios da ampla defesa e contraditório, faziam-se necessárias algumas diligências e o seu interrogatório. Noutra vertente, corria-se o risco de se criar uma capitulação errada, vaga e autoritária. Nota-se que a acusação foi perfeita e oportunamente apresentada perante o libelo acusatório, contendo a tipificação da transgressão supostamente cometida pelo sindicado, e, portanto, com a subsunção da conduta ao tipo administrativo, em tese, transgredido pelo policial militar. Em relação às folhas nº 127/133, juntadas ao feito em conjunto com a abertura de vistas, deu-se ciência à defesa de todos os documentos presentes nos autos e também a oportunidade para manifestar-se a respeito destes. sobre tal assunto, não foi comprovado nenhum prejuízo à defesa. (Despacho nº 941/2016 - DOEPM nº 175/2016)

Como exposto a PMGO, cria norma que determina que a citação deve constar capitulação provisória da imputação, norma que a própria PMGO deixa de cumprir.

Deixo o seguinte questionamento: Qual o sentido de criar norma e não cumpri-la?

Desta forma o art. 23 da Portaria, determina que a citação válida torna-se prevento a autoridade disciplinar, induz ciência da acusação e estabelece a relação jurídica disciplinar para o fato e circunstâncias em apuração, nesse sentido deixa claro que a citação valida, neste caso quando cumpre o rito normativo, de outra forma deixa de ser válida, sendo, portanto, nula.

3.3. Outras disposições sobre a citação intimação

Portaria nº 6947/15

Lei n° 13.800/01

§ 2º A citação deverá ser feita pessoalmente, com pelo menos 24 (vinte e quatro) horas de antecedência e, preferencialmente, no máximo em 72 (setenta e duas) horas da audiência, ou por edital, neste caso, a publicação do edital será por duas vezes em boletim ou diário, com intervalo de dois dias entre as publicações.

§ 2º – A intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento.

§ 3º Far-se-á citação por edital nos casos em que o militar da reserva ou reformado não forem encontrados, ou nos casos de militar ausente, extraviado ou desertor.

§ 3º – A intimação poderá ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado.

§ 4º – No caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial.

Art. 23. A citação válida toma-se prevento a autoridade disciplinar, induz ciência da acusação e estabelece a relação jurídica disciplinar para o fato e circunstâncias em apuração.

§ 5º – As intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade.

Art. 27 – O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.

Parágrafo único – No prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.

Art. 28 – Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e atos de outra natureza, de seu interesse.

Conforme o quadro comparativo:

No § 2º a Lei determina que a intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento, já a Portaria estabelece que a citação deverá ser feita pessoalmente, com o prazo mínimo de 24 horas e máximo de 72 horas, consta ainda a citação por edital, a qual entendo inviável, vez que o militar se não for encontrado é considerado ausente.

Já o § 3º da Portaria, trata da citação por edital quando militar da reserva, reformado ausente, extraviado ou desertor, onde a Lei estabelece que pode ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado, onde no § 4º, no caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial.

A Lei determina no § 5º que as intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade, quando a Portaria no art. 23, que a citação válida torna-se prevento a autoridade disciplinar, induz ciência da acusação e estabelece a relação jurídica disciplinar para o fato e circunstâncias em apuração.

Como já exposto a Lei nº 13.800/01, traz maiores garantias ao Sindicado/Administrado/Interessado, vez que no art. 28 é categórica que devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e atos de outra natureza, de seu interesse. Neste caso o termo Interessado, é extensivo a todos os sujeitos procedimentais, dada a possibilidade de prejuízo a qualquer destes por envolver dever, ônus, sanção ou restrição a direitos.

Temos ainda que o art. 27, o desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado, pois no prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.

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Sobre o autor
Rogério Pires Goulart

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Uni-Anhanguera em Goiânia Goiás. Consultor Jurídico em Direito Administrativo Militar

Informações sobre o texto

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