Conclusão
Em linhas gerais, foi possível perceber que o modelo de persecução penal brasileiro, amparado em duas fases, uma administrativa e inquisitória, e outra judicial e acusatória, não foi uma criação, mas resultado da evolução de nossa sociedade.
O fato da fase investigatória (administrativa) ser um procedimento inquisitivo, não afasta as garantias constitucionais, muito pelo contrário, funciona como lastro para que se garanta a imparcialidade da autoridade policial, que deve se manter equidistante de quaisquer lados, devendo sempre nortear-se pela busca da verdade, e isso por si, já representa uma garantia fundamental a aplicação da justiça.
A fase judicial por sua vez, muito embora não se veja dependente da administrativa, funciona muito melhor quando harmonizada com esta, visto que existe entre ambas uma complementaridade óbvia e natural.
Considerando ainda que o estado de direto fundamenta-se em dois grandes pilares, quais sejam o equilíbrio e independência entre poderes e os direitos e garantias constitucionais (individuais e coletivas), é temerário observar que ainda existam linhas cinzentas entre as atribuições da polícia e ministério público. Vemos o poder investigatório do Ministério Público como uma garantia, a ser complementada por sua atribuição constitucional de exercer o controle externo da polícia, e não como uma carta branca para imiscuir-se num mister que não lhe é precípuo. Nesse diapasão, é essencial que as atuações sejam complementares, não excludentes. E que se diga, obviamente, que o risco de invasão de atribuições, além de oferecer um enorme risco ao sucesso das investigações, ainda provoca um desequilíbrio tremendo à persecução, concentrando nas mãos do parquet, tanto o poder de conduzir a investigação e produzir provas como o de acusar, o que pode acabar por retirar das mãos do magistrado a possibilidade de avaliar provas produzidas com imparcialidade, numa fase puramente inquisitória e imparcial.
Existe ainda uma enorme discussão em torno da eficiência do inquérito policial. Sobre o tema, fica claro, pela análise das caraterísticas elencadas no trabalho, bem como pelo breve histórico apresentado, que o inquérito nada mais é que um instrumento, e que, como tal, pode ser utilizado de maneira adequada ou não.
O fato é que, como a persecução penal está estruturada em duas fases, e que nosso sistema judicial é, além de fortemente garantista, baseado no civil law, não como há conceber a extinção da fase administrativa, ou sua existência dissociada da instrumentalização que o inquérito oferece.
A propagada ideia de que a quantidade de inquéritos abertos e sem solução é culpa da polícia judiciaria também é absurda, pois, quem decide ou não arquivar inquérito é o judiciário em entendimento com o ministério público, não podendo o delegado de polícia nem mesmo se manifestar a respeito, e quem determina sua abertura é a lei, justamente com o fim de apurar a possível prática de um crime. Por outro lado, é obvio que, além da polícia não dispor de meios para investigar tudo, em tempo hábil, muitos crimes, realmente acabam sem solução, e seria hipocrisia ignorar tal fato.
Assim, hoje, o que vemos como ideal, seria a reformulação do sistema persecutório, com a desvinculação da polícia do executivo e com o aumento de sua independência, além da criação de um procedimento menos garantista e burocrático para condução de investigações de crimes menos graves.
A criação de uma nova dinâmica que possibilitasse o pronto arquivamento de inquéritos sem possibilidade de solução ou sem lastro mínimo seria também fundamental para diminuição da sobrecarga que hoje assola os cartórios das delegacias.
Consoante todo o exposto, percebe-se que o grande problema em relação ao tema é o desconhecimento por parte da sociedade, e o descaso por parte do legislador.
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