A perspectiva da nova maioridade penal: discussões jurídicas sociais e políticas no Brasil

25/01/2018 às 18:16
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A nova maioridade penal tem sido tema amplamente discutido por profissionais de Direito, legisladores e leigos nos dias atuais, pois o cenário penal atual tem apresentado diversos casos de envolvimento nessa faixa etária na seara criminal.

 

INTRODUÇÃO

É senso comum achar que o adolescente gosta de estar envolvido com a criminalidade por se achar impune e com esse pensamento tira-se o foco do real problema e dos verdadeiros responsáveis. E assim, aqueles que realmente podiam se corromper menos e investirem mais nas políticas públicas afirmativas para que beneficiassem as famílias carentes se tornam impunes, enquanto são lastimadas as maiores vítimas do descaso e da injustiça social. Basta olhar de fato toda a estrutura política e social percebe-se claramente a verdadeira tendência.

 Segundo Beccaria (2001, p.07):

“No entanto, entre os homens reunidos, nota-se a tendência contínua de acumular no menor número os privilégios, o poder e a felicidade, para só deixar à maioria miséria e fraqueza”.

“Só com boas leis podem impedir-se tais abusos. Mas, de ordinário, os homens abandonam a leis provisórias e à prudência do momento o cuidado de regular os negócios mais importantes, quando não os confiam à discrição daqueles mesmos cujo interesse é oporem-se às melhores instituições e às leis mais sábias”.

 

Há de se convir, portanto, a conclusão de que essa mudança no fundo real possui tendência viciada onde demonstra a falta de prudência e preocupação com a sociedade de forma geral.

Ao ser comunicado à sociedade a informação da diminuição da maioridade penal, cita-se de maneira incisiva que só assim, os menores infratores oportunistas serão punidos e diminuirá a impunidade diminuindo o envolvimento do menor na criminalidade, como se fosse à falta dessa punição que ocasionasse o envolvimento deles no crime.

            Em seu relevante artigo, TERRA, Sylvia Helena (P.9), cita como descreve Michel Foucault:

“O sistema prisional, em sua realidade e efeitos concretos, foi denunciado como fracasso desde 1820; denúncias estas, que, aliás, se fixavam em formulações que se repetem até hoje, conforme descreve Michel Foucault:

“- As prisões não diminuem a taxa de criminalidade: pode-se aumentá-las, multiplicá-las ou transformá-las, a quantidade de crimes e de criminosos permanece estável, ou, ainda, aumenta;

- A detenção provoca a reincidência; depois de sair da prisão se tem mais chance que antes de voltar para ela;

- A prisão não pode deixar de fabricar delinqüentes. Fabrica-os pelo tipo de existência que faz os detentos levarem(...). A prisão, também, fabrica delinqüentes, impondo aos detentos limitações violentas; ela se destina a aplicar as leis, e a ensinar o respeito por elas, ora todo o seu funcionamento se desenrola no sentido contrário, do abuso de poder arbitrário da administração;”

Conforme exposto, a diminuição da maioridade penal com vistas a aumentar a punição aos menores não será solução, podendo ocasionar a confecção de delinquentes menores especializados no crime precocemente.

Esse problema de aumento de criminalidade na fase da adolescência se dá na maioria dos casos pela falta de estrutura familiar e social, a adolescência é uma fase de mudança hormonal drástica, até nas melhores famílias é tida como uma fase delicada em que o jovem quer se auto afirmar com a sua nova fase e identidade.

 Porém, a grande diferença se encontra justamente nesse foco, observa-se o grande número de adolescentes e crianças vítimas e autoras da criminalidade, mas, é necessário salientar a classe social onde estão inclusas, classe mais desfavorecida.

  O que esperar de um adolescente abandonado pelo pai, criado a mercê da vida porque a mãe precisa batalhar pelo pão de cada dia? Quais medidas afirmativas estatais amparam essas famílias? Escolas públicas que vivem em estado de greve? Que medidas favorecem ao adolescente pobre para estruturá-lo, proporcionar-lhes sonhos? Em qual momento o adolescente se vê amparado?  Em qual figura heróica ele idealiza seu futuro? Em um super herói de desenhos animados? Não seria preocupante o contato e a importância que os líderes de facções criminosas representam nas favelas, tendo em vista que muita das vezes ajudam mais a comunidade que o próprio Estado?

O Estado cada vez mais se corrompe, representado por políticos corruptos que desviam verbas e acumulam riquezas em mandatos eleitorais e além de haver repercussão se tornam cada dia mais omissos em seu papel de preservar a dignidade da pessoa humana e investirem em políticas afirmativas de valor, portanto, diante desse quadro pintado, os principais valores não subsistem, porém, a esperteza e o jeitinho brasileiro de querer se dar bem em tudo, independente de que para isso eu deva oprimir e extorquir o próximo, levando-o até a morte. Esse tem sido o exemplo. E quem melhor favorece o adolescente pobre nessa hora? Quem mais parece lhe favorecer o sonho de se tornar rico com facilidade? De ter poder nas favelas e impor medo e respeito? O mundo do crime.

Quanto menor for à maioridade penal estabelecida se o problema não for tratado na raiz, mais cedo chegarão às más oportunidades e indução ao crime nessa camada social vulnerável e em fase de transição psicossocial.

DISCUSSÃO

Conforme citações de autores neste artigo não existem fórmulas mágicas, nem tampouco uma única solução aplicável para o fim da criminalidade no meio dos menores, há de convir, que a mudança da nova maioridade penal não ocasionará a solução para o problema da ordem e segurança social.

Na tentativa de resolução do impasse, grupos de se divergem entre a diminuição da maioridade penal e outros na manutenção da mesma, tendo em vista os enfoques a que dão os noticiários e aos riscos inerentes as mudanças. Assim de um lado está a população cansada de ser massacrada pela falta de segurança pública e investimentos na ordem social, enquanto outros ficam na defensiva pela garantia da ordem pública. Há ainda aqueles que estudam mais apuradamente as mudanças e apresentam os riscos inerentes aos fatos. Sem deixar de citar o grupo de políticos que tentam ao máximo se aproveitarem da situação para aumentarem sua popularidade.

É notório o descaso com que os legisladores se encontram diante da concreta situação em que se apresentam esses adolescentes e crianças, estatísticas são noticiadas em rede nacional, onde apresentam o grande e crescente número de menores envolvidos na criminalidade, ora, como partícipes, autores ou vítimas. Mais vítimas em questão.

Perguntas e respostas surgem no cenário brasileiro, alguns intitulam de verdadeira justiça, o encarceramento de menores em formação, junto com outros criminosos experientes, equivocados de que não haja punição para os praticantes de crimes, mas, como conscientizar a população se ignorantemente se imbui dos seus pré-julgamentos?

Na verdade o que se apresenta é bem complexo, foca-se nas consequências mais do que na causa e origem do problema. Vivemos numa sociedade carente de apoio nas bases, afinal, se a família é a base da sociedade, não se justificaria tamanho descaso político. Pois, quais políticas afirmativas se destacam como apoio e prevenção na solidificação dessa base? O crescente número de crianças que desconhecem seus pais? O aumento número de divórcios e violência doméstica? Crianças nas ruas? Onde está o alento estatal?

Atualmente surgem tantos defensores dos Direitos Humanos, mas, onde está o grito dos tais pela preservação da instituição familiar? Apenas nas instituições? São poucos os que de fato se envolvem com a dor dos miseráveis. E se for feita uma observação apurada dos fatos, diminuir a maioridade penal, não irá surtir grande efeito se a raiz do mal não for aniquilada. Só aumentará a criminalidade e antecipará a idade da entrada no crime.

Diante do quadro atual, novas mudanças precisam ser impostas na tela da vida dos brasileiros, povo esse, oprimido e transgredido em seus direitos, massacrados pela corrupção evidenciada no cotidiano político e administrativo. Parece fácil criar mudanças nas leis sem aferir a intensidade que elas produzirão, urge salientar ser bem mais simples mascarar um problema sem de fato resolvê-lo.

 Dessa forma, o Brasil já possui boas leis, o que ainda falta realmente é a existência de políticas eficazes que visem a preservação da cidadania, dignidade ocasionando o amparo às famílias desses vulneráveis, com pouquíssimo ou quase nenhum poder aquisitivo. Assim, nossas crianças e adolescentes estão sendo vítimadas pela desatenção e falta de assistência e proteção Estatal. Em frente dessa realidade, os sonhos que brotam nessa classe é sair de casa, por acreditarem que talvez assim irão escapar da fome e miséria que os cerca. Portanto, a rua e a criminalidade são a aparente solução nos seus limitados sonhos e horizontes, sendo ainda as opções mais “atrativas”.

Na seara da vida dessas crianças e adolescentes fica evidenciado que a forma ainda mais fácil e acessível para a sobrevivência ou para possuir bens materiais, drasticamente é o mundo do crime, amparados pelos exemplos em sua comunidade e possuidores de desejos consumeristas de qualquer adolescente facilmente influenciado são infiltrados na jornada do crime.

 É evidente que sempre existirão exceções, aqueles que foram educados na luta acirrada das más oportunidades, os que vencem as limitações e adversidades conseguindo romperem o ciclo hostil da pobreza familiar e coletiva em que estão integrados. Porém, a reação humana depende de complexos fatores, psicossociais, pessoais de cada indivíduo. Convém salientar, que grande maioria desses adolescentes sofrem violência doméstica, exploração e diversas formas de abusos em seus próprios lares. Observa-se que quando um indivíduo se desenvolve dentro de um ambiente familiar em desagregação, sem o norteamento de valores e regras, cresce sem referencial orientador a ser copiado, consequentemente não haverá boas expectativas em sua maioridade.

Nesse ponto, tenho que abrir um parêntese para falar exclusivamente sobre o ECA, já que existem muitos preconceitos em torno deste, gerando inclusive controvérsias em sua interpretação, entre os próprios juristas. O diferencial do ECA é a referência à criança e ao adolescente como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento. Em primeiro lugar, a inimputabilidade penal do adolescente, não o isenta de responsabilização e sancionamento. Esse tipo de tratamento específico não quer dizer que ficarão impunes, mas que têm direito à condições favoráveis para sua ressocialização. Assim como o Estatuto os define como sujeito de direitos, também lhes delega obrigações para com a sociedade, destacando claramente a importância dos "direitos e deveres individuais e coletivos". Sendo assim, o mais coerente seria exigir do Estado a aplicação correta da lei já existente, ao invés de buscar alternativas meramente punitivas.

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Segundo conceitos de diversos autores, até mesmo de filósofos antigos como Beccaria, a violência não se origina pela ausência das medidas repressoras, porém, pela má constituição das políticas de inserção, pois, a privação da liberdade não causaria a finalidade ideal, enfim, o fim da criminalidade juvenil é complexo e amplo, bem mais do que aparenta ser, motivo por qual cumpre observar inclusive nossas atitudes, modo de pensar, pois devemos estar livres de pensamentos discriminatórios e opiniões pré-estabelecidas acerca da situação.

As estatísticas comprovam diariamente a superlotação nas celas, revelando a total incapacidade para recepção de mais presos. Não precisa ser um especialista em política criminal para perceber que este sistema é ineficiente e falido. De que adianta reduzir a maioridade penal se sabemos que o sistema carcerário no Brasil não cumpre seu papel de ressocialização?Aliás, muito pelo contrário. Então voltamos ao nosso principal questionamento: A diminuição da idade penal iria solucionar o problema da violência? E da concentração de renda, desemprego, fracasso escolar e desestruturação familiar também?

Acreditar que a nova maioridade mudará o cenário atual da criminalidade e o envolvimento dos menores seria acolher o descomprometimento dos governantes corruptos no amparo aos excluídos, punindo a camada social pobre e sem oportunidades, furtando-lhes um futuro digno.

A maior urgência do momento é que o Estado faça a sua parte, criando com probidade programas eficientes e inclusivos direcionados ao fim da miséria e pobreza, assegurando aos lares carentes: saúde, inclusão social, cultura e trabalhos decentes.

 

1-    As diferentes idades penais adotadas e seus efeitos

 

 Na observação de organizações internacionais, com o avanço da defesa dos direitos humanos, a tendência evolutiva é a de ampliarem a proteção às crianças e os adolescentes. Pessoas especializadas salientam que as nações em que a maioridade penal é baixa, exemplo disso, os Estados Unidos, onde chega a idade de 12(doze) anos em alguns estados, não houve significativa diminuição da criminalidade e violência. Outros exemplos como: Colômbia e Costa Rica houve o retrocesso na redução do limite penal, por não causar nenhum efeito positivo.

Como disse o ministro do Supremo, Marcos Aurélio Mello, em rede nacional televisiva: “Cadeia não conserta ninguém e não resolve os problemas do país, que são outros”.

 A Unicef tem feito diversas pesquisas e estatísticas em diferentes países, bem como a ONU e as conclusões que chegam é a de não haver benefícios a redução da idade penal, podendo ocasionar até males irreparáveis, conforme a adoção a que fizeram alguns países, argumentando enfim que a redução da maioridade penal representaria uma ameaça para os direitos de crianças e adolescentes.

Diante da perspectiva das mudanças propostas, os leigos e populares que se veem ameaçados em sua segurança defendem sem conhecimento de causa essa redução, sem, no entanto, imaginarem ou conhecerem de fato as consequências de tais mudanças, pois, se observadas em outros países desenvolvidos, a tal mudança trouxe maiores transtornos que os fazem reavaliarem questões sem terem soluções imediatas.

A população brasileira diante do caos vivido busca atitudes mais coercivas que amenizem o medo e a insegurança social, porém, não visualizam de fato o real problema, não buscam conhecer a situação concreta, mas, são convencidas pelos casos apresentados em questão que favorecem a nova maioridade penal, porém, conforme o filósofo Beccaria já argumentava: a punição nunca será o remédio e sim a prevenção, prevenção essa na luta contra a miséria e desigualdade social, bem como o estabelecimento real de medidas socioeducativas que previnam o crime e a reincidência nessa faixa etária.

A justiça denota respeito e igualdade, não vingança. Ela retrata a defesa dos direitos e deveres do homem, numa visão Hans Kelseniana é um conjunto normativo de valores, formados por regras primárias e secundárias, representada em sua famosa pirâmide. Demonstra que cada componente agregado tem sua fundamental importância. Mas, os leigos e desconhecedores ainda acreditam que apenas a lei de Talião surta efeitos favoráveis.

Há de se convir que a vingança só crie um círculo vicioso de atos violentos que se estabelecerão ao longo dos anos anulando o verdadeiro sentido da justiça. E no caso em tela, tentar copiar alguns países na diminuição da maioridade que se diferem do nosso, na cultura, no desenvolvimento e em diversas outras coisas, seria regredir e perder a verdadeira identidade patriota. Já não basta vivermos de reflexos e cópias americanizadas de programas televisivos e da dependência por produtos importados e empréstimos infindáveis?

A atual sociedade brasileira precisa aprender que o jeitinho popular brasileiro precisa se preocupar um pouco mais com a ética, dignidade humana e com os valores sociais impregnados pela educação, saúde e segurança eficaz.

2-    O Sistema Prisional Brasileiro e a nova maioridade penal

 

Segundo informações do Depen- Departamento Penitenciário Nacional, atualmente a população carcerária brasileira é de 361.402 detentos, diante de um número de vagas de 206.347, havendo um déficit de 155.055 vagas. Desses presos, pesquisas realizadas apontam que a maioria tem menos de trinta anos, 95% são de classe social baixa, 95% são homens e 2/3 não possuem nem o primeiro grau, totalizando aproximadamente 10,4% analfabetos.

Ainda de relevante reflexão deve ser a reincidência a que sofrem os ex-presidiários, pois, 90% deles, buscam emprego ao saírem e quando identificados como ex-presidiários passam a não obterem sucesso e nem oportunidades, assim, 70% rescindem nas práticas delituosas.

A conclusão é que o atual sistema está fadado e falido, mas, o que se noticia com grande ênfase é que a diminuição da maioridade penal poderia punir de fato os adolescentes para ocasionar neles boas mudanças. Que tipo de mudanças? Sejamos racionais, as condições precárias e subumanas que os presidiários são submetidos só tem aumentado a revolta, muita violência e um caminho sem volta.

Os presídios que deveriam ser de caráter sócio reeducadores e preparadores de novos homens se tornaram depósitos de humanos, onde as superlotações têm acarretado violências de toda espécie, inclusive sexual entre os presos, fazendo com que doenças se proliferem, a presença das drogas como fuga são crescentes, e dentro das celas o mais forte, subordina e escraviza o mais fraco. O que será dos adolescentes dentro dessa hostil realidade?

Apesar do artigo 5º, XLIX, da Constituição Federal, citar: “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, o Estado não consegue garantir a execução concreta da lei. Não se sabe ao certo se é por descaso ou incapacidade estatal, ou ainda quem sabe seja por causa da sociedade prisioneira das falsas promessas de mudanças que se sente aprisionada pela falsa expectativa de melhorias diante da insegurança e do medo.

A coisa mais certa é que transformações radicais devem ser realizadas, não na diminuição da maioridade penal, mas neste sistema falido e nas políticas afirmativas de amparo as classes sociais baixas, oportunizando melhor educação e oportunidades de emprego. Pois, Já nos ensinava Foucault que as penitenciárias desestruturadas são como "usinas de revolta humana", fabricantes de pequenos monstros. E além do mais, vale frisar suas palavras:

“Retirando tempo do condenado, a prisão parece traduzir concretamente a ideia de que a infração lesou, mais além da vitima a sociedade inteira” (Foucault, 1987, p. 196).

            A sociedade brasileira não consegue perceber que o sistema prisional demanda gastos e verbas públicas e com essa mudança as tais, deverão ser destinadas ao acolhimento desses menores, verbas essas que se originam da própria sociedade e na maioria das vezes sofrem descaminho e só aprimoram a evolução de alguns criminosos políticos.

            Assim, portanto, cada indivíduo e ser social politicamente ativo como um verdadeiro cidadão deve estar imbuído nos cuidados do orçamento público, sem esse cuidado onera-se ainda mais a nação que a passos lentos busca desenvolvimento social antagônico, pois, se a família é a base da sociedade, cada componente dela deve ser amparado com uma boa educação e amparo social, incluindo a saúde e a segurança de todos os indivíduos com qualidade.

 

3-    O ECA(Estatuto da Criança e do Adolescente) e a eficácia das medidas sócio educativas atuais.

 

O atual sistema que visa proteger a criança e o adolescente prevê no art.104: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta lei.”

Assim observa-se que o menor de 18 anos (dezoito) anos considera-se inimputável, todavia, capaz do cometimento de ato infracional, passível de aplicação das medidas sócio-educativas previstas em lei, a saber: a advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços a comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade; internação em estabelecimento educacional e, qualquer uma previstas no art. 101, I a VI, conforme  reza o art. 105 do Estatuto(ECA). Sendo avaliada a capacidade do cumprimento da medida cabível, dentro das condições e capacidades pessoais.

Cumpre salientar que não há sustentação de que haja veracidade nas informações de que as crianças e adolescentes ficam impunes, porém o que pode ocorrer de fato é a falta de um acompanhamento aprimorado, de infra-estrutura para que se cumpra bem a teoria elencada na lei afim de ser cumprida com eficácia.

Os estabelecimentos referentes à aplicação de algumas medidas ainda não possuem de fato condições favoráveis à implantação que se almeja. Geralmente a equipe multidisciplinar encontra-se incompleta ou insatisfeita com a falta de apoio do Estado em dar boas condições de trabalho e uma remuneração digna, sem falar na estrutura e capacidade do abrigo quase sempre possui condições precárias e ambientes lotados de forma irregular.

Nos tempos atuais com o avanço da tecnologia vem se produzindo e alimentando mentes de adultos, crianças e adolescentes vulneráveis ao consumismo a uma nova conduta de insatisfação crescente numa busca egoísta e rápida de resultados individualizados. O que esperar de positivo na vida de uma criança pobre, abandonada inclusive pela sociedade em meio a uma geração que se corrompe facilmente? E ainda, que efeito surtirá a aplicação dessas medidas se não houver de fato acompanhamento e apoio estatal que lhe deem novas perspectivas de vida?

Nesse sentido, afirmar que o Eca e as medidas impostas não funcionam devido a falta de coerção eficaz, devendo assim ser mudada a maioridade penal, afim de que respondam como criminosos adultos seja a solução, é uma ignorância total. Pois, conforme visto anteriormente o problema está no sistema e não nas leis existentes. Há de se convir que o problema seja político social e resolver o problema na raiz, requer mais Igualdade e fraternidade, o que pouco se tem visto nas câmaras legislativas no momento em questão. Afinal, tirar proveito do pobre é fácil, porém, modificar o conforto e o comodismo dos verdadeiros responsáveis, é uma questão mais complexa. Requerem maiores esforços e cuidados, em vista da corrupção estar impregnada e oculta no meio da maioria deles.

4-    Alguns preceitos fundamentais ao tema em questão

 

Partindo de uma verdade inconteste a Constituição de 1988 nos artigos 226 e 227, explicita notórios preceitos de fundamental importância ao estudo em questão:

Art.226- a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

Assim a família, como base, torna-se alicerce basilar da sociedade onde requer atenção especial Estatal. Mas, o que se vê? Se observado desde os primórdios grandes mudanças foram feitas nessa base, alargando assim a visão do que se considera família, algumas com bons efeitos e outras de efeito bipolar. Porém, o que importa de fato ao estudo em questão não é o tipo de família, mas, a preservação do elemento basilar. É perceptível o aumento crescente de desajustes familiares, divórcios, violências domésticas, crianças sem paternidade reconhecida e etc., e cada um desses itens possui no mínimo uma condição de desamparo Estatal.

Vale frisar o parágrafo 8° do art. 226:§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Apesar das conquistas já realizadas a assistência a família de forma individualizada tem sido teórica e amplamente divulgada, mas, pouco visualizada em prática, pois a coibição da violência encontra-se também nas medidas favoráveis ao bom convívio e estrutura familiar. Qual família se encontrará transbordante de amor num contexto miserável de desemprego, fome e miséria? Não que isso seja o essencial, mas, faz parte do conteúdo básico existencial humano.

O atendimento da função social na família exige amparo governamental, pois o contexto coletivo de vida exige uma boa vivência, assim os bons costumes, princípios morais são solidificados pela dignidade e igualdade. Assim fica fácil visualizar a educação como dever do Estado e da família, sendo que na família se introduz a base educacional em que todos os indivíduos, aplicarão nas suas relações interpessoais, como consequência do aprendizado assimilado no conteúdo moral assistido, cívico praticado, individual e coletivo organizado ao longo da vida.

No entanto, apesar de estar em nossa carta magna, sua prática tem sido pouco expressiva, tendo em vista ser apenas um preceito normativo com poderes sugestivos na implantação de sua adequação social concreta. E o que fazer diante desse quadro com cenários de grande desigualdade e pouca fraternidade? O que esperar de uma criança ou adolescente que cresceram sofrendo tratamentos desumanos dentro de seus lares e ainda numa sociedade desigual, preconceituosa e pouco solidária?

O art. 227 da Constituição Federal preceitua com grande valia:

Art. 227- É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta propriedade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão(emenda65 de 2010).

Assim, observa-se que no cenário da preservação familiar, a criança e o adolescente são figuras prioritárias de absoluta propriedade a serem defendidas pelo Estado, sociedade e famílias. O que ocorre em questão então é um dever também social, fraterno e solidário, se ocorre o número crescente de adolescentes envolvidos na criminalidade, ora como vítimas e ora como autores também é responsabilidade nossa, de cada um brasileiro, patriota, que em vez de querer apenas atribuir culpa deveria se envolver na prevenção desses fatores, na medida e proporção adequada a condição social de cada um. Além dos cuidados e aparatos necessários na escolha dos líderes governantes e legisladores.

O Código Civil Brasileiro, também imbuído de preservar os direitos e deveres das famílias, preceitua normas e uma organização sistemática de conceitos próprios, direitos, deveres e especificações das famílias, bem como o resguardo de toda estrutura desde a concepção aos efeitos de interferências naturais ou provocados. Porém, os que mais sofrem e não adquirem seus direitos são sempre os mais necessitados e desinformados perante sua condição social e formação educacional. E assim, a justiça para essas famílias pobres parece distante e revoltante, onde se acham desamparados e oprimidos pela desinformação, tarefa facilmente de ser cumprida se a sociedade se propuser a ajudar na conquista desses valores basilares a serem preservados.

Observa-se cada vez mais que as boas perspectivas com a nova maioridade proposta se tornam agora mais distantes, parece que o real problema está longe de ser apenas uma idade penal estatuída, mas a atual conjectura política sócia Jurídica é que aparenta necessitar de mudanças emergentes. Mudanças tais, que advenham de cima para baixo, da base para a extensão, com uma evolução gradativa e proporcional aos esforços envolvidos e realizados.

A Nação Brasileira é uma grande família, composta por grandes e pequenos, pobres e ricos, brancos, amarelos, negros e índios. Em diferentes faixas etárias, surgida pela exploração de alguns, escravismos de outros, rodeada da tão grande nuvem de desigualdade social e moradora de uma terra vasta e com ricas belezas naturais. Essa família, no entanto tem que acordar para preservar sua essência, as crianças de hoje são o futuro de amanhã, já dizia os grandes eruditos e poetas. As novas mudanças devem ser benéficas para o desenvolvimento dessas crianças e adolescentes, deve-se objetivar o futuro da nação, cada componente da família nacional que se perde, desconfigura ou se mantém detido sem boa evolução, retardando o sucesso da nação.

No atual quadro o que mais se necessita é de uma reforma no sistema político e social, repercutindo enfim no sistema jurídico penal com a diminuição do caos social e ocasionando um sistema penal equilibrado que proporcione segurança ao cidadão.

         CONCLUSÃO

Com base no que foi apresentado nesse estudo pode-se concluir que, no cenário atual do sistema penal, não há necessidade de mudanças legais na carta magna, querer mudar a maioridade penal proposta por ela não ocasionaria soluções. Diante até mesmo da nova realidade a ONU e os organismos internacionais possuem fortes tendências não para uma diminuição e sim o aumento da faixa etária da idade penal.

O presente trabalho buscou refletir o que a nova maioridade penal proposta pode representar à sociedade, norteando perspectivas e possíveis consequências.

Urge salientar, acerca do tema, a necessidade de um envolvimento maior com especialistas de diversas áreas com o fim de abrir os horizontes de todos os atores envolvidos, à saber, os leigos, políticos, legisladores, juristas, para chegar-se a um pleno conhecimento do que deva ser importante e essencial na luta contra a criminalidade, assim as novas decisões não serão pautadas em achismos, mas, em estudos apurados e livres de influências particulares ou midiáticas.

Nessa época em que a democracia parece estar predominando, parece contraditório a desordem e os tumultos nas votações dos projetos nas casas legislativas, onde está respeito a livre consciência e ao voto? A sociedade parece estar cansada mesmo é dos seus representantes e a todo preço busca novas formas de atrair à atenção. Essa guerra pelas novas mudanças parecem imbuídas de inconformismo com a corrupção, miséria e desigualdade social.

O Estatuto da criança e do adolescente possui bases e artigos de grande valia no combate a violência e criminalidade direcionada a essa classe etária, portanto, o problema não está na falta das normas regulamentadoras de punição, mas, na origem do problema e falta de condições necessárias à aplicação real do sistema.

Não obstante ser um tema de grande relevância social, por mais que a sociedade esteja cansada de tanto teatro, não se pode negar à necessidade de que cada brasileiro deve se tornar participante ativo nas mudanças, porém, a busca do conhecimento específico evitará que cada indivíduo se torne um ser ahistórico, acrítico e submisso aos desejos políticos de se locupletarem.

    Diante dos fatos ocorridos e da grande violência vivenciada todos os dias, a sociedade tem buscado soluções e medidas que apaziguem a situação de todas as maneiras, mesmo na insipiência e no desconhecimento real dos fatores a maioria das pessoas acreditam que a mudança na maioridade penal diminuirá a crescente onda de insegurança. Porém, nem nos países desenvolvidos essa saída surtiu bons efeitos.

    Enquanto isso, os jovens se encontram cada vez mais desprotegidos e ameaçados em seus direitos e deveres, o investimento na educação, esportes e cultura tem sido cada vez mais teórico, a saúde tem se tornado cada vez mais precária e a segurança pública cada vez mais defasada e sem estruturação correta. Quantas crianças nas ruas? E os projetos sociais para tais, não passam de um abrigo desestruturado e sem funcionários competentes que os acolham. E qual real motivo de estarem nas ruas? Qual amparo familiar e estatal para terem optado estarem nas ruas?  A diminuição da maioridade penal influirá em quê na prevenção desses casos?

    Há de se convir que continuem a tratarem apenas a superfície e de maneira rasa e artificial, sem de fato adentrarem no foco com a finalidade de mudanças eficazes, tudo parece ser apenas mais uma jogada política que de fato um interesse social coletivo.

       

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas: São Paulo: Martin Claret, 2001.

COELHO, Bernardo Leôncio Moura, A proteção à criança nas Constituições Brasileiras. 3ª Edição. Brasília: Editora Revista dos Tribunais, 1998.

FOLCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 28 ed. Petrópolis.: Vozes, 2004.

PRAGMATISMO POLÍTICO. Redação Pragmatismo. Todos os países que reduziram a maioridade penal não diminuíram a violência. 2014.Disponível em: <http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/04/todos-os-paises-que-reduziram-maioridade-penal-nao-diminuiram-violencia.html>. Acesso em: 10 de abril de 2015.

SPOSATO, Karyna Batista (Org.). UNICEF: MOTIVOS PARA DIZER NÃO À REDUÇÃO DA IDADE PENAL. 1. ed. [S.l.: s.n.], 2007. 20 p. v. 1.

TERRA, Sylvia Helena. Sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e a inimputabilidade penal. São Paulo: ABONG. Adolescência – Ato Infracional & Cidadania. (s.d)

http://www12.senado.gov.br/jornal/edicoes/2012/02/14/unicef-brasil-esta-em-sintonia-com-tendencia-mundial

 

 

 

 

 

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Sobre a autora
Erilania

Sou especialista em Direito Público, especializanda em Filosofia e Direitos Humanos e em Direito Constitucional. já atuei junto a Defensoria Pública no núcleo de PI. Sou servidora Pública e atuo como advogada particular e professora. Atuo na área Cível( família, sucessões e etc), Direito do consumidor, Trabalhista e Previdenciário.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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