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Responsabilização civil do assédio moral no trabalho

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2 Assédio Moral no Trabalho

O assédio moral é um tema que tem despertado grande interesse social em razão das enormes repercussões originadas pela sua ocorrência.

O terror psicológico no ambiente de trabalho constitui-se numa espécie de violência cruel e desumana, ocorrendo de forma repetitiva e sistemática, com escopo específico de desestabilizar a vítima psicologicamente, por meio de agressões verbais, constrangimentos, humilhações, maus tratos, entre formas.

O assédio moral é caracterizado por uma conduta abusiva, de forma repetitiva e prolongada, de natureza psicológica, que atordoe a saúde do empregado, com situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica seja do empregador, que se utiliza de sua superioridade hierárquica para constranger seus subalternos, ou seja, dos empregados entre si, com a finalidade de excluir alguém indesejado do grupo, o que pode se dar, aliás muito comumente, por motivos de competição ou de discriminação pura e simples. Não se configura assédio moral a determinação para repetição de tarefas malfeitas, e nem a repreensão efetuada pelo mestre de obras ao pedreiro que não cumpriu a contento sua tarefa, sem comprovação de extrapolação dos limites do razoável (DETRT14 n.214, de 21/11/2011 - RO 885 RO 0000885).

A vitimóloga e psicanalista francesa Hirigoyen (2007, p. 65) assevera que por assédio moral em um local de trabalho temos que entender qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego, ou degradar o ambiente de trabalho.

Segundo Barreto (2003, p.107), assédio moral é “a violência sutil – explicitada por situações de humilhação, intimidações, ameaças, discriminações, ironias, desvalorizações, desqualificações, assédio sexual e colonização da afetividade, as quais reafirmam a condição de submissão”.

Barros (2004, p.138) entende que o assédio moral está diretamente ligado à nossa estrutura emocional, ou seja, ao nosso caráter. Dentre suas causas estão a exibição de valores, o relato do brilho e da glória de uns com ostracismo do outro, o que gera ciúmes, inveja, rivalidade, e, por conseguinte, competitividade.

Para Guedes (2003, p. 63), no assédio moral no ambiente do trabalho:

 “[...] a vítima do terror psicológico no trabalho não é o empregado desidioso, negligente. Ao contrário, os pesquisadores encontraram como vítimas justamente os empregados com um senso de responsabilidade quase patológico, são ingênuas no sentido de que acreditam nos outros e naquilo que fazem, são geralmente pessoas bem-educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais.”

Diversas são as jurisprudências resultantes do julgamento de ações relacionadas ao dano moral pelo assédio. São decisões fundamentadas quase que exclusivamente no que se refere à dignidade da pessoa humana, à cidadania, a vida privada, aos valores sociais do trabalho.

Um dos princípios embasadores de constituição do dano moral por assédio está prescrito no art. 5º, inc. X, da CRFB, que dispõe:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Da mesma forma que o texto constitucional assegura o direito à vida, a dignidade da pessoa humana, entre outros, a nossa Constituição Federal também assegura a prevalência do interesse social em detrimento do interesse particular, conforme preceitua o art. 193, CRFB: ”A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais“.

O assédio moral no trabalho é um dos problemas mais sérios enfrentados pela sociedade atual. Ele é fruto de um conjunto de fatores, como a globalização econômica predatória, que vislumbra somente o lucro, e a atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores através do medo e da ameaça (BARRETO, 2007, p. 16).

Será apresentado abaixo alguns julgados em forma de jurisprudência, para abrilhantar o nosso entendimento quanto a reparação dos danos causados pelo assédio moral:

ASSÉDIO MORAL-“A violência ocorre minuto a minuto, enquanto o empregador, está violando não só o que contratado, mas, também, o disposto no § 2º, do art. 461 consolidado - preceito imperativo - coloca-se na insustentável posição de exigir trabalho de maior valia, considerando o enquadramento do empregado, e observa contraprestação inferior, o que conflita com a natureza onerosa, sinalagmático e comutativa do contrato de trabalho e com os princípios de proteção, da realidade, da razoabilidade e da boa-fé, norteadores do direito do trabalho. Conscientizem-se os empregadores de que a busca do lucro não se sobrepõe, juridicamente, à dignidade do trabalhador como pessoa humana e partícipe da obra que encerra o empreendimento econômico” (TST, 1ª T, Ac. 3.879, RR 7.642/86, 9.11.1987, Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Faria Mello). Juíza Sônia, das Dores Dionísio, do TRT da 17ª Região-Espírito Santo. O Acórdão de nº 7660/2002, foi publicado em 9.09.2002.

ASSÉDIO MORAL - CONTRATO DE INAÇÃO - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - A tortura psicológica, destinada a golpear a autoestima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar a sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua autoestima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por consequência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer o trabalho, fonte de dignidade do empregado”. (TRT 17ª R, RO 1315.2000.00.17.00.1, Ac. 2276/2001, Relª. Juíza Sônia, das Dores Dionízio, 20.08.02, na Revista LTr 66-10/1237).

Para se caracterizar o Assédio Moral é preciso qualquer conduta agressiva ou vexatória, com o objetivo de constranger a vítima, humilhá-la, fazendo-a se sentir inferior. É exatamente por isso que o Assédio Moral também é conhecido como terror psicológico, psicoterror, violência psicológica.

2.1 Formas de como o assédio moral pode ocorrer no trabalho

As formas como o agente pode praticar o assédio moral ocorre de diversas maneiras e a psiquiatra e psicóloga Marie-France Hirigoyen (2002, p.108) traz uma lista de atitudes hostis. Ela classifica em quatro categorias, a saber: deterioração proposital das condições de trabalho; isolamento e recusa de comunicação; atentado contra a dignidade e violência verbal, física ou sexual.

Veja a lista de atitudes hostis, trazida pela autora Hirigoyen:

 1) Deterioração proposital das condições de trabalho

  • Retirar da vítima a autonomia.
  • Não lhe transmitir mais as informações úteis para realização de tarefas.
  • Contestar sistematicamente todas as suas decisões.
  • Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada.
  • Privá-la do acesso aos instrumentos de trabalho: telefone, fax, computador...
  • Retirar o trabalho que normalmente lhe compete.
  • Dar-lhe permanentemente novas tarefas.
  • Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores às suas competências.
  • Pressioná-la para que não faça valer seus direitos (férias, horários, prêmios).
  • Agir de modo a impedir que obtenha promoção.
  • Atribuir à vítima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos.
  • Atribuir à vítima tarefas incompatíveis com sua saúde.
  • Causar danos em seu local de trabalho.
  • Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de executar.
  • Não levar em conta recomendações de ordem médica indicadas pelo médico do trabalho.
  • Induzir a vítima ao erro. 

2) Isolamento e recusa de comunicação 

  • A vítima é interrompida constantemente.
  • Superiores hierárquicos ou colegas não dialogam com a vítima.
  • A comunicação com ela é unicamente por escrito.
  • Recusam todo contato com ela, mesmo visual.
  • É posta separada dos outros.
  • Ignoram sua presença, dirigindo-se apenas aos outros.
  • Proíbem os colegas de lhe falar.
  • Já não a deixam falar com ninguém.
  • A direção recusa qualquer pedido de entrevista.

3) Atentado contra a dignidade

  • Utilizam insinuações desdenhosas para qualifica-la.
  • Espalham rumores a seu respeito.
  • Atribuem-lhe problemas psicológicos (dizem que é doente mental).
  • Zombam de suas deficiências físicas ou de seu aspecto físico; é imitada ou caricaturada. 
  • Criticam sua vida privada.
  • Zombam de suas origens ou de sua nacionalidade.
  • Implicam com suas crenças religiosas ou convicções políticas.
  • Atribuem-lhe tarefas humilhantes.
  • É injuriada com termos obscenos ou degradantes.

4) violência verbal, física ou sexual

  • Ameaças de violência física.
  • Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve, é empurrada, fecham-lhe a porta na cara.
  • Falam com ela aos gritos.
  • Invadem sua vida privada com ligações telefônicas ou cartas.
  • Seguem-na na rua, é espionada diante do domicílio.
  • Fazem estragos em seu automóvel.
  • É assediada ou agredida sexualmente (gestos ou propostas).
  • Não levam em conta seus problemas de saúde.

Os nossos tribunais têm se manifestados quanto ao assédio moral no ambiente de trabalho, sendo destacados alguns casos concretos conforme se vê abaixo:

a) Empregado que sofre exposição humilhante e vexatória, colocado em ociosidade, em local inadequado apelidado pejorativamente de "aquário" pelos colegas, além da alcunha de "javali" (já vali alguma coisa) atribuída aos componentes da equipe dos "encostados". (TRT 15ª R. - RO 2229-2003-092-15-00-6 - (53171/05) - 11ª C. - Rel. Juiz Edison dos Santos Pelegrini - DOESP 04.11.2005 - p. 129).

b) Empregado que é colocado em indisponibilidade indefinidamente por mais de ano, embora remunerada; sofre tortura psicológica pela forma reiterada e prolongada a que esteve exposto a situações constrangedoras e humilhantes, minando a sua autoestima e competência funcional, depreciando a sua imagem e causando sofrimento psicológico. (TRT 15ª R. - RO 2142-2003-032-15-00-5 - (42274/05) - 11ª C. - Rel. Juiz Edison dos Santos Pelegrini - DOESP 09.09.2005 - p. 62).

c) Empregado que era submetido, rotineiramente e na presença dos demais colegas de trabalho, por ato do superior hierárquico, por não ter atingido a meta de produção, a usar vestes do sexo oposto, inclusive desfilar com roupas íntimas, além de sofrer a pecha de "irresponsável", "incompetente", "fracassado", dentre outros. (TRT 6ª R. - Proc. 00776-2002-006-06-00-5 - 1ª T. - Rel. Juiz Valdir José Silva de Carvalho - DOEPE 03.04.2004).

d) A dispensa de comparecimento à empresa, ainda que sem prejuízos de salário, constitui degradação das condições de trabalho e faz com que o trabalhador sinta-se humilhado perante os colegas, a família e o grupo social. Esse ataque à dignidade profissional é grave e não permite sequer cogitar de que os salários do período de inação compensem os sentimentos negativos experimentados.(TRT 9ª R. - Proc. 03179-2002-513-09-00-5 (RO 10473-2003) - (06727-2004) - Relª Juíza Marlene T. Fuverki Suguimatsu - DJPR 16.04.2004).

e) Empregado que é confinado em uma sala, sem ser-lhe atribuída qualquer tarefa, por longo período, existindo grande repercussão em sua saúde, tendo em vista os danos psíquicos por que passou. (TRT 17ª R. - RO 1142.2001.006.17.00.9 - Rel. Juiz José Carlos Rizk - DOES 15.09.2002).

f) Empregado submetido a dinâmica de grupo na qual se impõe ‘pagamentos’ de ‘prendas’ publicamente, tais como, ‘dançar a dança da boquinha da garrafa’, àqueles que não cumprem sua tarefa a tempo e modo. (TRT 17ª Região - RO 01294.2002.007.17.00.9, Relª Juíza Sônia Das Dores Dionísio – DOES 19.11.2003).

g) Empregada que é chamada de burra idiota e incompetente pelo seu chefe, sofre assédio moral porque tem sua dignidade atingida (TRT 2a. Região – RO  01163.2004.015.02.00-0, rel. Juiz Valdir Florindo in Consultor Jurídico de 04/04/2006).

h) Vendedor que recebe correspondências da empresa de teor intimidatório e agressivos tais como: "Semana retrasada demitimos o vendedor da Zona 51, semana passada demitimos o vendedor da Zona 02, quem será o próximo?" e; "Com tantas promoções, ofertas e oportunidades, sair do cliente sem vender nada é o mais absoluto atestado de incompetência", ou ainda; "Você pode ser tudo na vida, menos vendedor, é melhor procurar outra profissão" e, finalmente, "Não entendo!!! Entendo menos ainda que ainda contínuo encontrando vendedor ´barata tonta` (observem que nossa equipe está mudando algumas ´caras` e não é por acaso)", sofre assédio moral. (TRT 4a. Região – RO n° 01005-2004-662-04-00-5, Rel. Juiz João Ghisleni Filho, fonte site do TRT-RS, 24/01/2005).

Em situações como as acima exemplificadas, o dever indenizatório emerge da necessidade de proteção à dignidade da pessoa humana (CRFB, art. 1°, III), de tal sorte a afirmar que a punição pelo assédio moral se impõe através da condenação do empregador por danos morais.

Ainda são enumerados como espécie de assédio moral: o mobbing combinado e o mobbing ascendente. Aquele se daria com a união, tanto do chefe, quanto dos colegas, no objetivo de excluir um funcionário, enquanto o último seria o assédio praticado por um subalterno que se julga merecedor do cargo do chefe, bem como por um grupo de funcionários que quer sabotar o novo chefe, pois não o julgam tão tolerante quanto o antigo ou tão capacitado para tal cargo (SCHMIDT, 2002, p. 177-226).

2.2 Assédio moral como violação da dignidade do trabalhador

O princípio da dignidade da pessoa humana, como será visto, está fincado no ordenamento jurídico brasileiro através da CRFB e, tanto é a sua importância que a sua proteção, por parte da ordem jurídica, se faz mesmo quando não há uma norma onde este princípio esteja contido. 

A CRFB, traz no seu artigo 1º, inciso III, do Título I - “Dos Princípios Fundamentais”:

 Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como Fundamentos:

  1. – a soberania;
  2. – a cidadania;
  3. – a dignidade da pessoa humana;

Glöckner (2004, p. 32), menciona dois momentos em que os princípios gerais de direito são aplicados. Primeiro na Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942), que em seu artigo 4º determina ao juiz que, havendo omissão na lei, decida o caso conforme analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Há também uma segunda disposição que determina a aplicação dos princípios é a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 01 de maio de 1943, que em seu artigo 8º diz que na ausência de disposições legais ou contratuais, as autoridades administrativas e judiciárias podem fazer uso dos princípios gerais de direito.

Silva (1967, p.526) consigna o que vem a ser a dignidade:

[...] dignidade é a palavra derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio respeito em que é tida: compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa pelo qual se faz merecedor do conceito público; em sentido jurídico, também se estende como a dignidade a distinção ou a honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta graduação; no Direito Canônico, indica-se o benefício ou prerrogativa de um cargo eclesiástico.

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Em uma valoração entre o princípio da isonomia e o da dignidade, na concepção do professor Nunes (2002, p. 45) tem-se que: 

 É ela, a dignidade, o primeiro fundamento de todo sistema constitucional posto e o último arcabouço da guarida dos direitos individuais. A isonomia serve, é verdade, para gerar equilíbrio real, porém visando concretizar o direito à dignidade. É a dignidade que dá a direção, o comando a ser considerado primeiramente pelo intérprete.

 Dispõe o art. 1º, III da CRFB:

“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana. ”

Ainda nesse contexto de conferir à dignidade da pessoa humana um status de princípio fundamental, essencial, fonte de todo ordenamento jurídico brasileiro, manifesta-se o STF:

(...) o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo (...). (HC 95464, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/02/2009, DJe-048 DIVULG 12-03-2009 PUBLIC 13-03-2009 EMENT VOL-02352-03 PP-00466)

Logo, a dignidade da pessoa humana, se tomada como fundamento da República, princípio fundamental do ordenamento pátrio, norte constitucional, mínimo de direitos que garantem uma existência digna, não pode ser relativizada por constituir valor absoluto, vez que, nessa hipótese, o indivíduo é protegido por ser colocado em contraposição à sociedade ou ao Poder Público, portanto, em situação de vulnerabilidade.[1]

No mesmo sentido, Clève (2003, p. 152-153) demonstra que o princípio da dignidade da pessoa humana é considerado a base essencial de todo o ordenamento jurídico e de todo o sistema de direitos fundamentais, constituindo-se como valor supremo:

“Verifica-se, dessa maneira, que os direitos fundamentais sociais devem ser compreendidos por uma dogmática constitucional singular, emancipatória, marcada pelo compromisso com a dignidade da pessoa humana e, pois, com a plena efetividade dos comandos constitucionais”.

Destarte, a dignidade é garantida pelo princípio constitucional, logo não pode ser minimizada ou colocada em um relativismo, devido a sua clara importância.

Este princípio simboliza a base do próprio Estado Brasileiro. Mostra que as pessoas devem ser respeitadas, resguardadas em sua integridade física, mental e moral.

Nas palavras de Delgado (2006, p. 205):

[...] para se ter dignidade não é preciso necessariamente se ter direitos positivados, visto ser a dignidade uma intrínseca condição humana. De toda a forma, quanto à sua proteção, reconhece-se que o Estado, pela via normativa, desempenha função singular para a manutenção da dignidade do homem.

O assédio moral fere a dignidade, a autoestima e o respeito ao trabalhador. O princípio da dignidade deve reger as relações de trabalho. Se o trabalho dignifica o ser humano, e se a dignidade é inerente à pessoa, o trabalhador merece tal proteção.

Para a identificação precisa do assédio moral nas relações de trabalho, é necessária a violação da dignidade do profissional por condutas abusivas dentro do contexto profissional. O clima psicológico determinado pelo que acontece à volta do empregado enquanto ele trabalha é de suma importância para constatação de assédio. Desta forma, o assédio moral não se restringe ao ambiente físico de trabalho. Todavia, é imprescindível que o processo assediador seja praticado durante o exercício do trabalho, não se confundindo com questões pessoais que possam aparecer dentro do ambiente de trabalho (DOLORES, 2004, p. 43).

Assim, se a dignidade é intrínseca à pessoa, inalienável e irrenunciável, cabe ao Estado a sua proteção e a sua promoção.

Devem ser respeitados, acima de tudo, os direitos da personalidade, ou melhor, a dignidade da pessoa humana que é um princípio constitucional, consagrado no artigo 1º, inciso III e artigo 5º, incisos VI e X, da Constituição Federal. Estabelece este que são invioláveis os direitos à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança, assim como são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, prevendo que, se qualquer um desses direitos for violado, a pessoa tem o direito de resposta, bem como indenização por danos morais e materiais. Assim, entende o TRT de Roraima:

ASSÉDIO MORAL. O empregador que exige dos seus empregados resultados que extrapolem as metas previamente estabelecidas, ameaçando-os, com intimidações e xingamentos, e impondo "castigos" (como trabalhar de pé, proibindo-os de ir ao banheiro, tomar água ou lanchar), excede manifestamente os limites traçados pela boa-fé e pelos costumes e ainda vulnera o primado social do trabalho, ultrapassando os limites de atuação do poder diretivo, para atingir a dignidade e a integridade física e psíquica desses empregados, praticando ato abusivo, ilícito, que ensejará justa reparação dos danos causados aos ofendidos. Não se pretende defender que a produção estimulada e a busca por resultados cada vez maiores sejam um exercício maléfico nas relações de trabalho vigentes num mercado de trabalho, como o atual, que labora em constante transformação e adaptação às práticas comerciais que vão surgindo a cada momento. Mas há várias formas de estimular o empregado na conquista de resultados mais favoráveis ao empreendimento econômico do empregador, como, por exemplo, através da oferta de cursos de capacitação e liderança ou da conhecida vantagem econômica, prática muito embora controvertida, mas largamente adotada, de remunerar os trabalhadores por produção, desde que respeitados, naturalmente, os seus limites físicos e psíquicos, tudo se fazendo sem atingir, todavia, a sua dignidade ou integridade física e psíquica (ACÓRDÃO TRT3 01245-2005-012-03-00-0. RO).

2.3 A prova no Assédio moral

É de grande importância a análise da prova da ocorrência do assédio moral e do dano, tendo em vista que a agressão decorrente deste ato ilícito, na maioria das vezes, é oculta e atinge a esfera íntima e subjetiva da vítima.

Afirma Alkimin (2005, p. 117) que:

Para a reparação do dano moral, é imprescindível a prova dos fatos que dão causa ao dano moral, entretanto, é prescindível a prova da dor, sofrimento e perturbação interior causada pela conduta ilícita, pois a doutrina e jurisprudência admitem a teoria do danun in re ipsa, para a qual o dano se prova por si mesmo, ou seja, provando o ilícito, dispensa-se a prova do prejuízo moral in concreto, pois ferir os direitos de personalidade e afetar o mais íntimo sentimento humano, é de difícil constatação.

Em razão disto, a prova do dano moral no caso do assédio moral - diante das inúmeras dificuldades, dentre as quais, destacam-se as dificuldades em provar a dor interior, bem como a rejeição dos colegas de trabalho em testemunhar - não deve se sujeitar à disciplina geral em matéria de prova.

Para tanto, Alkimin (2005, p. 118) propõe, para tanto, a inversão do ônus da prova:

O juiz, valendo-se de sua persuasão racional e da presunção como meio de prova, poderá aferir ou até mesmo presumir a existência de dor, sofrimento, angústia, aflição, desespero, vergonha, humilhação, o descrédito perante os colegas, e admitir a existência do dano, determinando a inversão do ônus da prova, impondo ao agressor o ônus de provar a inexistência de conduta assediante e da possibilidade de nexo de causalidade; até porque, diante do desequilíbrio social e econômico entre empregado e empregador, perfeitamente justificável é a inversão do ônus da prova.

Neste mesmo sentido, valiosa contribuição foi dada pelo jurista Luiz de Pinho Pedreira da Silva (1998, p.83), ao dizer que:

No que diz respeito ao ônus da prova do dano moral, estou com Mosset Iturraspe quando sustenta que sobre a vítima desse dano pesa o ônus de prová-lo em sua existência e gravidade, mas acrescenta que essa prova pode ser produzida mediante presunções hominis extraídas de indícios, conforme as regras de experiência. Muitos autores, porém, acham que a prova do dano moral se faz in re ipsa.

Diante da subjetividade do assédio moral, em razão de sua natureza imaterial, as provas da demonstração ou verificação da verdade não podem ser exigidas nos mesmo moldes que o dano material, posto que se refere a uma ilicitude de ato ofensivo.

Nesse ínterim, o dano moral dispensa comprovação de sua existência, contudo cabe a vítima provar a conduta ofensiva do empregador, de modo a tornar clara a existência do dano.

A prova judicial acerca da prática do assédio moral é assunto que demanda bastante importância na seara do processo do trabalho, ante a dificuldade da vítima em provar sua existência, uma vez que, na maioria das vezes, a ocorrência do assédio se dá às escuras ou de forma camuflada.

Para Oliveira (2004, P.72), diante dos princípios que norteiam a temática probatória é relevante citarmos aqui o princípio in dubio pro misero em relação à valoração das provas, assim leciona:

A regra não se aplica na valoração da prova, estando restrita às interpretações de direito. Vale dizer: em se cuidando de matéria probatória, não haverá o julgador que aferir valoração favorável ao empregado. Se a prova produzida não permite convicção, cabe ao julgador decidir pelo ônus da prova.

Diante de todos os meios citados, vale ressaltar que tais provas são de difícil comprovação, em se tratando de casos de dano psicológico, este é um grande problema ainda existente na seara trabalhista, pois, neste universo, tudo é muito subjetivo, pois, as provas são as palavras, gestos, sinais, entre outros.

No assédio sexual, dificilmente existirão testemunhas, pois o assediador dificilmente expõe-se ao público. Além disso, a vítima nem sempre é lesionada de modo físico (LOPES, 2001, p. 29).

Segundo Mirabete, na busca da verdade real, não há limitação dos meios de prova, desde que obtidas licitamente. Desta forma, a vítima pode contar com o avanço tecnológico para provar o assédio:

Nada impede, portanto, que se utilizem provas com aplicação de meios técnicos ou científicos, como gravações em fita magnética, fotos, filmes, videofonogramas etc., desde que obtidas licitamente (MIRABETE, 1998, p. 259).

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Sobre o autor
Edvaldo do Carmo Silva

Advogado Civilista, atuante nas áreas de direito bancário, família, consumidor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Edvaldo Carmo. Responsabilização civil do assédio moral no trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5622, 22 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63882. Acesso em: 27 dez. 2024.

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