Tutelas processuais de urgência como instrumento de eficácia da garantia constitucional da razoável duração do processo

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14/02/2018 às 13:22
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A celeridade processual, apresentada como razoável duração do processo, é garantia fundamental prevista expressamente no texto constitucional. Nesse sentido que o atual CPC, com as tutelas de urgência, pode auxiliar podem conferir eficácia ao texto da CF.

Introdução. 1. O DIREIRO PROCESSUAL CIVIL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL 1.1 Princípios constitucionais do direito processual civil 1.1.1 Acesso à justiça 1.1.2 Assistência jurídica integral e gratuita 1.1.3 Devido processo legal, ampla defesa e contraditório 1.1.4 Duração razoável do processo 2. TUTELA DE URGÊNCIA NA SISTEMÁTIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 2.1 Tutelas provisórias 2.2 Tutela de urgência 2.2.1 Antecipada 2.2.2 Cautelar 2.3  Tutela de evidência 3. TUTELAS DE URGÊNCIA E RAZOÁVEL DO DURAÇÃO DO PROCESSO Conclusão. Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO

Algumas das inovações mais relevantes no sistema do direito processual civil brasileiro com a edição da Lei 13.105, de 16 de março de 2015, são aquelas destacadas no Livro V do códex – DA TUTELA PROVISÓRIA – que destaca a tutela de urgência e a tutela de evidencia.

Embora a chamada tutela de evidência seja, de fato, a maior inovação legislativa, é a de urgência que mais chama a atenção pela sua capacidade de influenciar substancialmente nos ritos processuais, normalmente com o fim de acelerá-los ao ponto de garantir eficácia aos direitos postulados, sejam materiais ou processuais.

Nessa esteira, o presente trabalho pretende traçar pontos de convergência entre o que o novel diploma processual traz acerca das tutelar processuais de urgência e alguns dos chamados princípios constitucionais processuais, em especial o princípio da razoável duração do processo, também entendido como princípio da celeridade, e que fora positivado em nosso ordenamento constitucional através da Emenda Constitucional nº 45/2004.

Nessa sistemática é que dividimos nosso trabalho em 3 (três) seções distintas mas interligadas entre si.

Na primeira, exploramos o direito processual civil sob a ótica da Constituição Federal de 1988, tendo esta como norte daquele. Exploramos alguns dos principais princípios positivados na ordem constitucional e que se referem de modo especial ao processo civil vigente, princípios que são, na verdades, alçados à ordem de garantias fundamentais ao passo que mencionados no rol do artigo 5º, da CF/88.

Ordenamos tais garantias na seguinte sequência: acesso à justiça, assistência jurídica integral e gratuita, devido processo legal, ampla defesa e contraditório, e duração razoável do processo.

Já na segunda seção do trabalho, apresentamos breve síntese das inovações positivadas pelo Novo Código de Processo Civil, vigente desde março de 2016, no que concerne às chamadas “Tutelas Provisórias”, assim entendida como gênero, da qual são espécies as “tutelas de urgência” e as “tutelas de evidência”, previstas a partir do artigo 300, do CPC/2015.

Por fim, assegurando o escopo do presente trabalho, relacionamos tudo o que disposto nas seções anteriores de modo a informar que as tutelas de urgência também aparecem no ordenamento vigente como meios de conferir eficácia aos princípios/garantias constitucionais, mormente o da razoável duração do processo.

  1. O DIREITO PROCESSUAL CIVIL E A CONSTITUÇÃO FEDERAL

Primeiramente, importante ser relevado a impossibilidade de dissociação entre o Direito Processual Civil da ordem constitucional posta, mesmo porque trata-se aquele de direito público, assim considerado vez que voltado à atividade-fim do Poder Judiciário, e condicionado às normas constitucionais, que são fontes desse último.

Nesse sentido, podemos afirmar que o processo não é apenas regido pelas normas de processo civil propriamente ditas, mas também por toda uma sistemática constitucional que inclui o acesso à Justiça e a razoável duração do processo, entre outros, como direitos fundamentais, assim elencados pelo texto constitucional.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

(...)

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Assim, considerando que a própria Constituição, no §1º, do art. 5º, estipula que “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”, os princípios processuais constitucionais passam à categoria de normas jurídicas, integrando o direito processual independentemente de regulamentação.[1]

Ainda, no mesmo sentido o artigo 1º do novel códex processual:

Art. 1º. O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Nesse contexto, pois, é que se passa a falar em Processo Civil constitucionalizado, pelo qual todas as normas de direito processual devem estar em conformidade ao modelo dos direitos fundamentais expresso tanto na Constituição Federal quanto em tratados internacionais dos quais passe o Brasil a ser signatário.

  1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Não buscaremos nesse título esgotar todos os princípios explícitos e implícitos na Constituição Federal correlatos ao direito processual civil vigente, mas destacaremos alguns que encontram maior relevância para o estudo ora proposto, conforme o tema deste trabalho: acesso à justiça, assistência judiciária integral e gratuita, devido processo legal, ampla defesa, contraditório e duração razoável do processo.

  1. Acesso à Justiça

Também conhecida por “inafastabilidade da jurisdição”, a garantia do acesso à Justiça está consagrada no inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Também encontramos tal garantia na 1º Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos de São José da Costa Rica, o chamado “Pacto de San José”, que em seu artigo 8º assim dispõe:

Art. 8º. Toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer natureza.

Dessa forma, o acesso à Justiça supera o status de garantia constitucional para figurar como verdadeira prerrogativa de Direitos Humanos, no sentido que independentemente de cor, raça, credo, condição econômica, posição política, sexo, todos tem direito de levar seus conflitos à apreciação dos Poder Judiciário, sempre independente e imparcial.[2]

Importante salientar que qualquer pretensão, seja ele justa ou não, poderá ser levada ao Poder Judiciário, vez que, uma vez provocado, o Estado-Juiz tem do dever de fornecer uma solução jurídica àquele que o provocou, ainda que contra os interesses deste.

Nesse contexto é que Cássio Scarpinella Bueno assim entende pelo princípio do acesso à Justiça:

Ele quer significar o grau de abertura imposto pela CF para o direito processual civil. Grau de abertura no sentido de ser amplamente desejável, no plano constitucional, o acesso ao Poder Judiciário. É o que se lê, com todas as letras, do inciso XXXV do art. 5º da CF: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.[3]

Não se deve, porém, entender esse princípio como limitador, no sentido de que as controvérsias apenas podem ser dirimidas pelo Poder Judiciário. Ao contrário, outras formas extrajudiciais de resolução de conflitos são plenamente aceitas e não afrontam a ordem constitucional vigente[4].

Ademais, outras matérias devem ser analisadas conforme previsão de outros regulamentos, e nem por isso confrontam o texto constitucional, como exposto por Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:

Não é correto, porém, com fundamento nesse princípio, afirmar que toda controvérsia, que qualquer matéria possa ser submetida ao Poder Judiciário. Com efeito, existem situações que fogem à apreciação judicial, tais como a prática de atos interna corporis (de competência privativa das Casas Legislativas), o mérito administrativo (valoração administrativa, nos limites da lei, quanto à oportunidade e conveniência para a prática de um ato administrativo, no que respeita aos elementos "motivo" e "objeto" do ato) - dentre outras.[5]

Desse modo, é assegurado a todos os cidadãos, independentemente do assunto ou certeza de suas alegações, procurar o Estado, pelo Poder Judiciário, para ver sua controvérsia dirimida, não havendo que se falar em qualquer obstáculo que impeça seu acesso pelo à Justiça.

  1. Assistência judiciária integral e gratuita

Guardando relação com o princípio anterior, a assistência judiciária integral e gratuita está prevista no inciso LXXIV, da CF, dispondo que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Sobre sua relação com o amplo acesso à Justiça, leciona Flavia Bahia:

Ao garantir a assistência judiciária gratuita no inciso LXXIV aos que comprovarem insuficiência de recursos, a Constituição reforça o amplo acesso à justiça, permitindo que não apenas a elite brasileira tenha direito à prestação jurisdicional.[6]

Por esse princípio, todo aquele que demonstrar não possuir condições suficientes para arcar com o pagamento de honorários advocatícios e custas processuais terá assegurado, pelo Estado, seu direito de acesso à Justiça, que será exercido, por regra, pela Defensoria Pública, instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, à qual incumbe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, nos moldes do artigo 134, da CF.

Flávia Bahia complementa assim complementa o entendimento sobre a gratuidade:

A garantia constitucional em debate não protege apenas o acesso formal e material à justiça, como também o direito a sentenças justas, coerentes com o arcabouço probatório colimado nos autos, sob pena de responsabilidade objetiva do Estado por erro judiciário (LXXV) e ainda à responsabilidade pessoal do agente estatal, na forma do art. 37, § 6, da CRFB/88. Da mesma forma, os danos morais e materiais sofridos em decorrência do excesso de prisão também poderão ser reivindicados pela vítima dessa negligência estatal.[7]

Vale mencionar, por fim, que também às pessoas jurídicas é assegurada a gratuidade de justiça. Porém, diferentemente da pessoa natural, que apenas declarará sua hipossuficiência, a pessoa jurídica deverá comprovar não possuir recursos financeiros suficientes para custear o processo. É o entendimento do E. Supremo Tribunal Federal e sumulado pelo E. Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS. 1. A pessoa jurídica necessita comprovar a insuficiência de recursos para arcar com as despesas inerentes ao exercício da jurisdição. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido (STF – Segunda Turma, AI 652954 AgR/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJ 18/08/2009)

Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais.

(Súmula 481, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/06/2012, DJe 01/08/2012)

Ainda, mas palavras de Cassio Scarpinella, a gratuidade garantida pela Constituição vai além da materializada em acesso à Justiça através das ações judiciais, mas a toda assistência jurídica necessária:

O princípio vai além, contudo, do acesso à justiça no sentido “jurisdicional” do termo, ao estabelecer como obrigação do Estado não só assistência judiciária integral e gratuita mas, muito mais do que isto, assistência jurídica integral e gratuita. Isto quer significar, portanto, que também “fora” do plano do processo, o Estado tem o dever de atuar em prol da conscientização jurídica da sociedade como um todo, levando em conta também os hipossuficientes, orientando-os com relação aos seus direitos. Este é, com efeito, um passo decisivo para desenvolvimento e fortalecimento do sentimento de cidadania de um povo. É fundamental que se saiba que se tem direitos até como pressuposto lógico e indispensável para pretender exercê-los, se for o caso, inclusive jurisdicionalmente.[8]

E é assim, pois, que a Constituição visa garantir acesso irrestrito ao Poder Judiciário, não sendo a insuficiência de recursos financeiros um limitador ao acesso à Justiça, seja para pessoas naturais ou jurídicas.

  1. Devido processo legal, ampla defesa e contraditório

Apoiado no norte-americano due processo of law, o devido processo legal está consagrado nos incisos LIV e LV, do artigo 5º, da CF, e deve ser analisado sob dois prismas, o material e o processual.

Do ponto de vista material, podemos mencionar o princípio da razoabilidade, que revela que o intérprete da norma deverá buscar sua aplicação segundo noções de justiça e bom senso, no equilíbrio, na inteligência do homem médio, somente subjugando um direito quando necessário a resguardar um bem de maior valor.[9]

Já sob o ótica processual, o devido processo legal é importante, senão a principal, garantia constitucional do processo, assegurando paridade de armas do indivíduo em relação ao Estado-persecutor.

Sobre o assunto, vale transcrever lição do Ministro Celso de Melo:

O exame da garantia constitucional do due process of law permite nela identificar alguns elementos essenciais à sua própria configuração, destacando-se, dentre eles, por sua inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: (a) direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); (b) direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação; (c) direito a um julgamento público e célere, sem dilações indevidas; (d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa (direito à autodefesa e à defesa técnica); (e) direito de não ser processado e julgado com base em leis ex post facto; (f) direito à igualdade entre as partes; (g) direito de não ser processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; (h) direito ao beneficio da gratuidade; (i) direito à observância do princípio do juiz natural; (j) direito ao silêncio (privilégio contra a autoincríminação); (l) direito à prova; e (m) direito de presença e de "participação ativa" nos atos de interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando existentes. ((HC 94016, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 16/09/2008, DJe-038 DIVULG 26-02-2009 PUBLIC 27-02-2009 EMENT VOL-02350-02 PP-00266 RTJ VOL-00209-02 PP-00702)

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 Nessa sistemática, temos que o devido processo legal possui como corolários a ampla defesa e o contraditório, assim dispostos no incido LV, art. 5º, do texto constitucional: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Mais ligada àquele que ocupa o polo passivo de uma relação processual, a ampla defesa pode ser entendida como o direito que tal indivíduo possui de juntar ao procedimento, seja administrativo ou judicial, todos os elementos probatórios suficientes à defesa de sua versão dos fatos. Também pode decidir por omitir-se ou calar-se, visto a não obrigatoriedade da autoincriminação.[10]

O contraditório, por sua vez, pode ser entendido como um desdobramento da ampla defesa, de forma a impor uma condução dialética do processo, no sentido de que a todo ato praticado pela acusação caberá uma manifestação daquele que é acusado para se opor, negar ou apresentar sua versão.[11]

Ainda, nas palavras de Nelson Nery Júnior:

o princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se em manifestação do princípio do Estado de Direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e o do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa,384 quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de defesa são manifestação do princípio do contraditório

À exceção desses princípios, porém, é o procedimento do inquérito policial, pois possui natureza notadamente inquisitorial. No entanto, tal entendimento parece estar sendo mitigada pelo STF, no sentido de assegurar também aos investigados os direitos e garantias fundamentais, notadamente da ampla defesa e do contraditório, o que pode ser observado após a edição da Súmula Vinculante nº 14, que dispõe:

É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

Assim, talvez os princípios constitucionais que mais possuem relevância para o processo sejam, de fato, o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, posto que determinam os limites e as garantias à disposição das partes.

  1. Duração razoável do processo

Expressamente introduzido no ordenamento constitucional pátrio em 2004, com a edição da EC nº 45, assim passou a Constituição Federal a tratar sobre a celeridade processual:

Art. 5º - ...

LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Mas não bastava apenas garantir em letra fria da constituição a razoável duração do processo, por isso a EC nº 45 tratou, ainda, de incorporar mecanismos que se prestam a conferir maios celeridade processual, transparência e eficiência. Sobre o assunto, assim dispõem o atual ministro do STF, Alexandre de Moraes:

Como mecanismos de celeridade e desburocratização podem ser citados: a vedação de férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, a proporcionalidade do número de juízes à efetiva demanda judicial e à respectiva população, a distribuição imediata dos processos, em todos os graus de jurisdição, a possibilidade de delegação aos servidores do Judiciário, para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório, a necessidade de demonstração de repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para fins de conhecimento do recurso extraordinário, a instalação da justiça itinerante, as súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal.

Saliente-se que já o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em vigor no Brasil a partir da edição do Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992, determinava o direito a todos os acusado de terem um julgamento sem dilações desnecessárias, conforme Artigo 14, 3, “c”, do referido pacto, que assim dispõe:

Artigo 14.

3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as seguintes garantias:

(...)

c) De ser julgado sem dilações indevidas;

Tal garantia pode ser considerada como mais um dos diversos desdobramentos do já comentado devido processo legal, agora conferindo a todos os jurisdicionados a garantia de que os processos não se arrastem por anos a fio sem solução jurídica, sendo certo que o controle dos órgãos de corregedoria em muito auxiliam na eficácia dessa garantia.

  1. TUTELA DE URGÊNCIA NA SISTEMÁTIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O novo Código de Processo Civil, em vigor desde março de 2016, inovou em sua sistemática relacionada às tutelas processuais provisórias, ao passo que desconsiderou o processo cautelar, até então vigente pelo revogado código Buzaid, pelo que nosso estudo passará a explorar cada um dos tipos de tutela trazidos pelo novel diploma processual.

  1. TUTELAS PROVISÓRIAS

Expostas no Livro V da Parte Geral do vigente Código de Processo Civil, o termo “tutelas provisórias” passou a indicar um rol de tutelas específicas, que tanto podem ser buscadas em processos de conhecimento quanto nos de execução, aparecendo, pois, como gênero, do qual são espécies a tutela de urgência e tutela de evidência.

Por regra, a tutela provisória é concedida mediante cognição sumária, o quer dizer que, ao concedê-la, o magistrado ainda não tem acesso a todos os elementos de convicção a respeito da controvérsia jurídica. Excepcionalmente, porém, poderá ser concedida mediante cognição exauriente, ou seja, quando o juiz a concede em sentença.[12]

Quanto ao momento em que são requeridas, a tutela de urgência pode ser pleiteada em caráter antecedente ou incidente. Já a tutela de evidência, por sua vez, apenas poderá ser requerida de forma incidental.

A tutela de urgência antecipada assegura a efetividade do direito material. O autor deve demonstrar para o juiz que, além da urgência, o direito material estará em risco se não obtiver a concessão da medida. O autor, ao receber a concessão da medida, precisará apenas de sua confirmação posteriormente, pois a tutela antecipada já o satisfaz (e garante o direito material). Ex: necessidade de urgente internação. A concessão da tutela de urgência antecipada garante o direito à internação.

Já a tutela de urgência cautelar assegura o direito processual, pois está em risco a efetividade do processo futuro e não o direito material em si. A parte precisa demonstrar, além da emergência, que a efetividade do futuro processo estará em risco se não se obtiver a medida de imediato. Ex: autor que descobre que o réu está dilapidando o patrimônio para não pagar as dívidas; deve apresentar uma tutela de urgência cautelar para indisponibilidade do patrimônio, com vistas a garantir o processo de cobrança da dívida.[13]

Se a urgência ocorrer no curso de algum processo, o autor deve informar ao juízo a emergência surgida, pleiteando, em caráter incidente, a tutela cautelar.

A tutela de evidência, porém, apenas ocorre em caráter incidente (no curso de um processo que já esteja em andamento), porque, pela sua própria natureza, a pretensão está relacionada com a antecipação da sentença. Até porque, desde o início do processo, a pretensão já foi elaborada com fins à obtenção de uma sentença de mérito e sem urgência.

  1. TUTELA DE URGÊNCIA

De início, importante destacar que o novel diploma processual civil estabelece como tutelas de urgência tanto a satisfativa (tutela antecipada), como a cautelar, sendo que a tutela da evidência, que constitui novidade em termos de Direito Positivo, não é considerada tutela de urgência. Todas elas, contudo, são consideradas tutelas provisórias, como alhures explanado.

Para que magistrado conceda a tutela de urgência, deverá fazê-lo em nível de cognição sumária, bem como já ocorria quando apreciava tal pedido com base no revogado código Buzaid. No entanto, quer se trate de tutela antecipada, quer de cautelar, os requisitos para a concessão delas são agora os mesmos: juízo de probabilidade e perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300, caput).[14]

Já o §1º, do artigo 300, estipula a possibilidade do juiz fixar caução, como condição para que seja efetivada a tutela de urgência concedida, o que pode ser estendido às duas modalidades de tutelas de urgência: a satisfativa e a cautelar. Por óbvio que, caso a parte esteja respaldada pela gratuidade de justiça, demonstrando sua hipossuficiência financeira, não estará obrigada a prestar a fiança, o juiz poderá conceder essa tutela, dispensando a caução (art. 300, § 1º).

Em obediência ao princípio da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF), é recomendável que, aquele que pede a tutela, e por ser de urgência, já o faça na petição inicial, evitando a postulação de dispensa de caução depois de já imposta, pois com isso estará retardando o cumprimento dessa tutela provisória deferida e dando causa, quiçá, a incidentes processuais desnecessários.

Quanto ao momento de concessão da tutela de urgência, embora o novo CPC fale que ela poderá ser concedida liminarmente ou após a audiência de justificação (art. 300, § 2º), não significa que o juiz não possa concedê-la após esses dois marcos cronológicos, mais adiante, ou até mesmo em sentença, consoante se infere do que dispõe o art. 1.012, § 1º, V, desse Código, que, ao tratar dos casos em que a apelação será recebida no efeito devolutivo, está a hipótese em que a sentença confirma, concede ou revoga a tutela provisória. Logo, a tutela de urgência pode ser concedida também em sentença. A jurisprudência já vinha sufragando essa linha de entendimento trazida pelo novo CPC, a despeito de o CPC de 1973, dizer que a apelação será recebida somente no efeito devolutivo, quando confirmar a antecipação dos efeitos da tutela (art. 520, VII), ignorando as situações em que ela é concedida ou revogada nesse provimento final.

Tratando-se, ainda, de direitos indisponíveis, há o entendimento que a concessão da medida poderá se dar ex officio pelo magistrado, que verificando haver risco de prejuízo irreparável ou de difícil reparação, poderá concedê-la.[15]

O novo Estatuto processual estabelece um comando normativo somente aplicável à tutela antecipada, que não se aplica à cautelar, no sentido de que ela não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (art. 300, § 3º). Essa disposição não constitui novidade, pois semelhante regramento consta do CPC de 1973, em seu art. 273, § 2º, que estatui: “não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado”.

Importa ressaltar, ainda, que a parte beneficiada com a tutela de urgência (cautelar ou satisfativa), responderá pelo eventual prejuízo que causar à parte contrária, conforme art. 302, I, II, III e IV. Esse dispositivo legal é semelhante ao art. 811, incisos I a IV, do CPC de 1973 que, no entanto, diz respeito à normatização específica para o processo cautelar. Agora, a novidade é que, pelo novo regime normativo do CPC de 2015, essa postulação indenizatória também é estendida para os casos em que concedida a tutela antecipada (satisfativa) e não somente para as cautelares, como o faz aquele Estatuto.[16]

Por economia processual, essa pretensão indenizatória deve ser liquidada nos próprios autos do processo em que a tutela de urgência tiver sido concedida, como regra, não obstante isso possa ser feito, excepcionalmente, em autos apartados, quando impossível fazê-lo naqueles, por circunstâncias que devem ser sopesadas caso a caso, segundo prudente critério judicial. É o que se depreende do disposto no art. 302, parágrafo único, do novo CPC, que segue aqui também normatização semelhante à adotada pelo art. 811, parágrafo único, do CPC de 1973, mas aqui neste artigo referente à tutela cautelar.[17]

Passaremos, agora, à análise das espécies de tutelas de urgência, quais seja, a antecipada e a cautelar. Por ora, as distinguiremos da seguinte maneira, as antecipadas asseguram a efetividade do direito material, enquanto as cautelares do direito processual.

  1. Tutela antecipada

Assim, dispõe o artigo 303, caput, do CPC/15:

Art. 303.  Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

Nessa esteira, pois deverá o postulante demonstrar já em sua petição inicial a ação que pretende ajuizar, veiculando o pedido de tutela antecipada. Não há necessidade, porém, de já na petição inicial, exaurir os fundamentos para a procedência da ação, sendo necessária somente a demonstração da probabilidade do direito. Após, deverá aditar a petição inicial, complementando sua argumentação. A indicação do pedido de tutela final na petição inicial se revela fundamental, de modo a que o magistrado tenha condições de verificar os efeitos da sentença que o autor pretende antecipar.[18]

A decisão que conceder a tutela antecipada não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que vier a revê-la, reforma-la ou invalidá-la, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º do art. 304, § 6º.

O CPC/15 não permite a formação de coisa julgada e, razão da estabilização da tutela provisória, mas ao contrário do que sugere o texto, parece que a estabilização não pode resultar simplesmente da não interposição de recurso contra a liminar concessiva do provimento antecipatório, mas também do não oferecimento de contestação dentro do prazo referido. Não recorrendo da liminar, o réu, citado, se defende, o direito à tutela jurisdicional efetiva, e as garantas do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, incisos XXXV e LV da CF) lhe asseguram a possibilidade de que a revogação seja determinada, caso acolhida a sua defesa.[19]

Por estabilizada entende-se a tutela antecipada a partir do momento em que concedida, quando começará a produzir seus efeitos, e até que nova decisão a revogue. Ou seja, deferia a medida e não interposto recurso contra a decisão que a concedeu, torna-se a tutela estabilizada.[20]

Ainda, diferentemente da tutela antecipada do Código Buzáid (art. 273), em que era condicionada ao julgamento do pedido principal, não passando de um acessório, cujo destino fina sempre vinculado ao acertamento a ser realizado futuramente. No direito Frances, o procedimento do I e no common law as interlocutory injunction demonstram-se como sendo medidas completamente autônomas em relação ao processo subsidiário. Assim, a tutela de urgência se perfaz em um processo cognitivo sumário, provisório, mas que não depende de posterior julgamento do pedido principal para que se confirme o provimento satisfativo-emergencial.[21]

Assim, portanto, é que se apresenta, em suma, a tutela de urgência antecipada conforme a sistemática do vigente Código de Processo Civil.

  1. Tutela cautelar

Como já afirmado, a tutela de urgência cautelar visará a proteção do direito processual, protegendo, em verdade, a eficácia de futuro provimento jurisdicional de mérito, não o antecipando, mas apenas o assegurando.

O pedido deverá ser feito mediante petição inicial, em ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente, indicando a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. (art. 305, “caput”). Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303. (art. 305, “parágrafo único”), o que revela a fungibilidade das medidas de urgência.

Poderá, pois, ser requerida e concedida pelo magistrado em caráter liminar, ou seja, logo no início da demanda, inaudita altera parte, ou após a realização de audiência de justificação, sendo cabível a interposição de agravo de instrumento contra a decisão que a conceder ou não.[22]

Assim como na sistemática do revogado CPC/73, o autor terá o prazo de trinta dias para postular pelo pedido principal, o que, agora, poderá ser feito nos próprios autos em que requerida a tutela cautelar. É verdade que poderá, desde o início, já apresentar a lide juntamente como pedido cautelar (art. 308, §1º).

Apresentado, pois, o pedido principal, as partes serão intimadas para participarem de audiência de conciliação ou mediação, na forma do artigo 334, sem a necessidade de nova citação do réu (art. 308, §3º) e, não havendo composição, abrir-se-á prazo para apresentação de contestação.

Ressalte-se que a sentença que julga improcedente o pedido de tutela cautelar não impedirá a que a parte formule o pedido principal, nem influirá no julgamento deste, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição. (art. 310, “caput”). Importante mencionar, ainda, que a sentença que julga improcedente o pedido de tutela cautelar valora apenas a existência ou inexistência do direito à cautela, não se pronunciado sobre a existência do direito acautelado. Porém, sobre o direito à cautela, há sentença de improcedência capaz de formar coisa julgada, tanto é assim que torna-se impossível propor a mesma ação (conformidade com o art. 309, parágrafo único).[23]

Em suma, pois, assim se procede a tutela de urgência cautelar, com o fito de assegurar a eficácia de futuro provimento de mérito.

  1. TUTELA DE EVIDÊNCIA

Assim a tutela de evidência fora instituída no CPC/15:

Art. 311.  A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

Ainda, nas palavras de Pedro Lenza[24]:

A tutela de evidência é sempre deferida em cognição sumária e em caráter provisório. Portanto, precisará ser sempre substituída pelo provimento definitivo. Nas quatro hipóteses previstas nos incisos do art. 311 do CPC, há a possibilidade de que ela venha a ser revogada. Na primeira, o abuso do direito de defesa ou o manifesto intuito protelatório do réu pode justificar a medida, mas não é suficiente para demonstrar que, ao final, o autor será o vencedor. É possível que o réu abuse ou tente protelar o processo, e que o juiz, ao final, reconheça que o autor não tem razão, e julgue improcedente a pretensão. O mesmo pode ocorrer nos três outros incisos. É possível que o juiz defira a tutela de evidência quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e haja tese firmada em julgamento repetitivo ou súmula vinculante, e que, mais tarde, se verifique que os documentos que embasaram a decisão provisória eram falsos, ou até mesmo que haja alteração no julgamento repetitivo ou na súmula vinculante, ou que a questão sub judice não coincida exatamente com o objeto da súmula ou dó recurso repetitivo.

Em síntese: a tutela de evidência não é definitiva e pode ser revogada ou modificada a qualquer tempo.

Ou seja, para a concessão da tutela de urgência dispensável a apresentação do chamado periculum in mora, isto é, desnecessária a demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, o que necessário no caso da tutela de urgência. Os pressupostos da evidência estão elencados no rol de incisos do próprio artigo 311. Porém, também é possível perceber que a sua concessão ocorre segundo dois critérios básicos: (1) quando o direito (material) da parte que pleiteia a tutela é evidente, daí o nome e (2) quando uma das partes está manifestamente protelando o processo ou abusando do exercício do direito de defesa, caso em que a tutela da evidência está vinculada não necessariamente à evidência do direito material pleiteado, mas à evidência de que é preciso pôr um fim ao processo.

É necessário, para a concessão das tutelas de evidência, demonstrar que, fora os casos de urgência, o direito pleiteado evidente, claro, transparente a ponto de possibilitar o encurtamento do iter processual. Ou, ainda, preciso demonstrar que o meu adversário processual está protelando tanto o processo, que a sua maior punição será adiantá-lo, apressando os atos processuais que ele está tentando retardar. Afinal, a maior sanção para quem obstaculiza o caminho do processo é justamente pegar atalhos que levem mais rápido à resolução da lide.[25]

E é assim que se apresenta, em síntese, a tutela de evidência em nosso novo ordenamento processual civil.

  1. TUTELAS DE URGÊNCIA E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

Conforme previsão constitucional positivada pela Emenda Constituicional nº 45/2004, consoante já delineado, a razoável duração do processo, consubstanciada na chamada “celeridade”, é a regra e a ordem a ser perseguida por todos que militam perante o Poder Judiciário, mas sendo dever deste o resguardo de tal princípio.

Sobre o assunto, assim dispôs Dinamarco[26]:

Os reformadores estiveram conscientes de que a maior debilidade do Poder Judiciário brasileiro em sua realidade atual reside e sua inaptidão a oferecer uma justiça em tempo razoável, sendo sumamente injusta e antidemocrática a outorga de decisões tardas, depois de angustiosas esperas e quando, em muitos casos, sua utilidade já se encontra reduzida ou mesmo neutralizada por inteiro. De nada tem valido a Convenção Americana de Direitos Humanos, em vigor neste país desde 1978, incorporada que foi à ordem jurídica brasileira em 1992 (Dec. 678, de 6.11.92); e foi talvez por isso que agora a Constituição quis, ela própria, reiterar essa promessa mal-cumprida, fazendo-o em primeiro lugar ao estabelecer que “a todos no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”(art. 5º, inc. LXXVIII, red. EC n. 45, de 8.12.04).

Assim, frisa-se a importância da Emenda Constitucional 45/2004 com a incorporação do art. 8 parágrafo 1º da Convenção Americana de Direitos Humanos, dotando o sistema processual de uma nova regra norteadora do processo no âmbito judicial e administrativo.

Nesse sentido, considerando a celeridade processual como direito/garantia fundamental, assim leciona Annoni[27]:

no entanto, não se pode reduzir o direito de acesso à justiça em um prazo razoável ao mero cumprimento dos prazos legais por parte do Poder Judiciário e das partes envolvidas no processo. É preciso ter-se claro que o direito de acesso à justiça em um prazo razoável é uma garantia do ser humano face ao Estado contemporâneo, e não um mero recurso do Poder Judiciário. Isso implica dizer que todos os Poderes estatais são responsáveis por sua efetivação, respondendo a União pelas reparações e indenizações oriundas de uma violação.

O Supremo Tribunal Federal ciente das limitações do Poder Judiciário, mas também estritamente comprometido com os ditames da Constituição Federal e o Estado Democrático de Direito, reconhece o “direito” à razoável duração do processo, inclusive com seus reflexos nos “meios que garantam a celeridade da tramitação, considerando este direito corolário natural do direito ao “acesso à Justiça”:

(...) de nada valeria a Constituição Federall declarar com tanta pompa e circunstância o direito à razoável duração do processo (e, no caso, o direito à brevidade e excepcionalidade da internação preventiva), se a ele não correspondesse o direito estatal de julgar com presteza. Dever que é uma das vertentes da altissonante regra constitucional de que a ‘lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’ (inciso XXXV do art. 5º). Dever, enfim, que, do ângulo do indivíduo, é constitutivo da tradicional garantia de acesso eficaz ao Poder Judiciário (‘universalização da Justiça’, também se diz).” (HC 94.000, voto do Min. Carlos Britto, julgamento em 17-6-08, 1ª Turma, DJE de 13-3-09)(grifo nosso)(BRASIL, 2009)

Matéria sobre a qual recai maior visualização sobre o tema é o processo penal, nos julgamentos de habeas corpus, que geralmente ressaltam o excesso de prazo como fundamento para a liberdade do acusado. Como o entendimento do Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 2009) colacionado a seguir:

Habeas corpus. Writ impetrado no Superior Tribunal de Justiça. Demora no julgamento. Direito à razoável duração do processo. Natureza mesma do habeas corpus. Primazia sobre qualquer outra ação. Ordem concedida. O habeas corpus é a via processual que tutela especificamente a liberdade de locomoção, bem jurídico mais fortemente protegido por uma dada ação constitucional. O direito a razoável duração do processo, do ângulo do indivíduo, transmuta-se em tradicional garantia de acesso eficaz ao Poder Judiciário. Direito, esse, a que corresponde o dever estatal de julgar. No habeas corpus, o dever de decidir se marca por um tônus de presteza máxima. Assiste ao Supremo Tribunal Federal determinar aos Tribunais Superiores o julgamento de mérito de habeas corpus, se entender irrazoável a demora no julgamento. Isso, é claro, sempre que o impetrante se desincumbir do seu dever processual de pré-constituir a prova de que se encontra padecente de ‘violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder’ (inciso LXVIII do art. 5º da Constituição Federal). Ordem concedida para que a autoridade impetrada apresente em mesa, na primeira sessão da Turma em que oficia, o writ ali ajuizado."(HC 91.041, Rel. p/ o ac. Min. Carlos Britto, julgamento em 5-6-07, 1ª Turma, DJ de 17-8-07). No mesmo sentido: HC 96.504, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 30-6-09, 1ª Turma, DJE de 23-10-09. (grifo nosso)(BRASIL, 2010)

Portanto reconhecido o direito à duração razoável pelo Poder Judiciário em sua Suprema Corte, refletindo em desdobramentos práticos dentro da atividade estatal. Observa-se, no entanto que a prática exacerbada destas ferramentas poderá ocasionar um “efeito reverso” e aliar-se à condição de morosidade tanto combatida. Não desconsiderando é claro a obrigatoriedade do Estado em manter condições estruturais adequadas para o cumprimentos dos preceitos constitucionais.

E é nesse contexto, de garantia do pleno acesso à Justiça e da razoável duração do processo que figuram as tutelas de urgência, como meios de abreviação das demandas, buscando a tutela jurisdicional de forma antecipada, seja concernente a direito material ou processual. E é nesse sentido que o magistrado deverá lançar mão de toda a técnica processual necessária à garantia da melhor prestação jurisdicional possível conforme cada caso.

Nessa esteira assim é a doutrina de Marinoni[28]:

a concretização da norma processual deve tomar em conta as necessidades de direito material reveladas no caso, mas a sua instituição decorre, evidentemente, do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. O legislador atua porque é ciente de que a jurisdição não pode dar conta das variadas situações concretas sem a outorga de maior poder e mobilidade, ficando o autor incumbido da identificação das necessidades concretas para modelar a ação processual, e o juiz investido do poder- dever de, mediante argumentação própria e expressa na fundamentação da sua decisão, individualizar a técnica processual capaz de lhe permitir a efetiva tutela do direito

As tutelas de urgência surgem como fator exteriorizador do direito em momento anterior à sentença, deixando a parte usufruir da tutela jurisdicional do Estado antes do exaurimento cognitivo do Juiz, trazendo a mencionada efetividade.

Portanto, as tutelas de urgência, conforme postas no novo ordenamento processual civil, vigoram sob a perspectiva de que podem garantir a efetividade de princípios processuais constitucionais de fundamental importância no atual cenário do Poder Judiciária brasileiro, que vive em meio a incredulidades em virtude, em suma, de seu aparente distanciamento das camadas mais populares da população e pela sua reconhecida morosidade.

CONCLUSÃO

Neste trabalho fora exposta uma singela abordagem sobre a relação do princípio da razoável duração do processo com o instituto de direito processual civil trazido pelo Código de Processo Civil de 2015 da Tutela de Urgência, de modo a indicar este como um importante instrumento de eficácia daquele princípio constitucional.

A constitucionalização do direito processual civil é nitidamente percebido na CF/88, que elenca em seu artigo 5º, como direitos e garantias fundamentais, diversos princípios inerentes ao processo civil, dentre os quais a celeridade processual, que deve ser perseguida por todos os que militam no Poder Judiciário, ao passo que, além de garantir que a prestação jurisdicional cumpra seu papel social de forma eficaz, transparece à sociedade um maios sendo de justiça e de transparência nas relações processuais.

E é nesse sentido que as chamadas “tutelas de urgência” passam a figurar no ordenamento jurídico pátrio, como meios de cristalização da justiça de forma célere, ainda que cobertas pelo manto da provisoriedade, de modo que a chancela judicial de determinada situação fática poderá ser adiantada em determinadas situações para que os efeitos jurídicos dos direitos perseguidos processualmente passem a ter seus efeitos devidamente assegurados.

Desse modo, forçoso concluir que o instituto da tutela de urgência figura hodiernamente como mais um meio processual de conferir eficácia a um das mais perseguidas garantias processuais previstas na Constituição Federal, qual seja, a razoável duração do processo.

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Sobre o autor
Filipe Lima Guedes

Advogado. Professor. Consultor UNESCO.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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