INTRODUÇÃO
É sabido e indiscutível que encontramo-nos vivendo em um Estado Democrático de Direito, a teor da disposição principiológica trazida à baila pelo Preâmbulo de nossa Carta Constitucional.
Estado de Direito esse que está fundado na estrita observância, por todos, inclusive pelo Poder Público, das regras estabelecidas pela Constituição e demais normas infraconstitucionais (princípio da legalidade)_ herança de um passado recente em que suportamos um Estado de Exceção_ as quais, indubitavelmente, possuem seu fundamento de validade na Carta de Outubro.
Outro princípio basilar de nosso ordenamento constitucional e gravado de forte conteúdo axiológico, é a "tripartição" do Poder, ou como preferimos denominar, a divisão dos Órgãos do Poder - em face da indivisibilidade e unidade do Poder -, sendo este dividido em: Executivo, Legislativo e Judiciário, conforme denotamos pela regra do art. 3º, do Texto Máximo.
Contudo, a repartição dos Poderes, como assim denominaremos por uma questão de facilitação didática, por vezes, recebe exceções constitucionalmente previstas, de modo a assegurar a prestação dos fins do Estado, assim como uma espécie de controle externos entre os mesmos. Assim, em determinadas circunstâncias os Órgãos do Poder tem a faculdade de praticar "ingerência" constitucionalmente prevista na atividade daquele outrem.
Em razão da complexidade que o tema abrange, a tripartição dos Órgãos do Poder e a unidade do mesmo, criada a séculos atrás por Montesquieu, não será objeto para tecermos maiores comentários, visando não distanciarmo-nos do tema a que nos propomos a estudar.
O referido tema tange de forma considerável a matéria, vez que o cerne desse estudo será o cabimento das medidas provisórias em matéria tributária, a qual, como se perceberá a diante, está limitada à esfera da legalidade.
Relevante é a idéia de que em ocasiões de omissão do Legislativo, no que concerne a sua função típica, qual seja, criar leis, não pode o Estado ficar engessado à sua disposição, razão pela qual o Constituinte, estendeu a faculdade do Chefe do Poder Executivo legiferar, por meio das chamadas medidas provisórias.
Tal visão do Constituinte Originário fora, até certo ponto, admirável, visando afastar limitações legislativas nos casos de existência de relevância e urgência, entretanto o instrumento normativo em comento, teve sua finalidade distorcida pelos detentores do Executivo pátrio, os quais passaram a utilizar-se indiscriminadamente do mesmo, causando, a bem da verdade, verdadeira instabilidade jurídica.
Neste diapasão é que entendemos de valia o presente estudo, com o objetivo de debruçarmos sobre as peculiaridades das medidas provisórias e de seu aproveitamento na seara tributária, campo esse regido às duras rédeas do princípio da estrita legalidade, haja vista a forma contundente com que a exação atinge os direitos individuais do contribuinte, como patrimônio, liberdade e renda.
1. CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DA MEDIDA PROVISÓRIA
As medidas provisórias possuem tratamento notório em nosso sistema constitucional nos moldes fixados pelo art. 59, inciso V e art. 62, da Carta da República, o qual submeteu-se a rigorosa modificação após a promulgação da Emenda Constitucional nº 32, de 11, de setembro de 2001.
Inicialmente, insta lembrarmos que a utilização de instrumentos legiferantes pelo Executivo brasileiro iniciou-se por meio do denominado decreto-lei, importado da legislação italiana, amparado no decreti-legge, previsto no art. 77, da Constituição daquele país.
O grande ponto diferenciador existente entre a medida provisória e seu antecessor antes mencionado, consiste na idéia de que este, caso não fosse apreciado pelo Legislativo, tornar-se-ia, imediatamente, lei propriamente dita, o que não ocorre na primeira, como mais a frente se explicará. Outro ponto que também serve de distinção entre esses instrumentos é a matéria abrangida por cada qual, conforme art. 55, da Emenda Constitucional nº 01, de 1969.
Observando a regra supra podemos mencionar que a medida provisória é mais negativa em se tratando de segurança jurídica do que o famigerado decreto-lei do militarismo, tendo em vista que deve ser imediatamente aplicada, no entanto se não convertida em lei ou convertida com modificações, gera uma lacuna legislativa a ser regulada pelo Congresso Nacional, o que nem sempre se percebe.
O atual modelo previsto para a utilização das medidas provisórias, conforme já mencionado, sofreu significantes modificações com a vigência da EC nº 32/01, a qual, em seu bojo, trouxe algumas limitações materiais e de reedição do instrumento legislativo estudado, de forma a coibir o seu aproveitamento indiscriminado e distorcido.
A regra do art. 62, da Carta Constitucional, anteriormente vigente previa a adoção de medidas provisórias, pelo Chefe do Poder Executivo, em caso de relevância e urgência, encaminhando-se, a mesma, imediatamente ao Congresso Nacional para apreciação e caso assim no o fosse feito em trinta dias, contados da data de publicação, a mesma perderia sua eficácia.
Ocorre que, no mais das vezes, essas MP´s não eram apreciadas pelo Órgão Legiferante, dando espaço para que o Executivo reeditasse sucessiva e incansavelmente a mesma medida provisória, atribuindo feição não desejada pelo Constituinte a esse instrumento.
Com relação ao tema, a jurisprudência também agiu de modo diverso ao esperado pelos inúmeros doutrinadores que relutavam conta esse vício do Executivo de editar e reeditar, sem maiores restrições, essas medidas provisórias.
Com esse pensar sábias são as palavras do Prof. Roque Antônio Carrazza, o qual assim leciona:
"O Poder Judiciário, de seu turno, nem sempre correspondeu às expectativas dos cientistas do Direito e, por uma série de motivos_ entre os quais figura o da governabilidade_, acabou aceitando medidas provisórias que, vênia concessa, não se encaixavam nos moldes constitucionais. A questão no plano jurisprudencial foi resolvida em sentido oposto ao preconizado pela doutrina.
Essa postura animou o Governo Federal a vôos mais altos. Com efeito, valendo-se de estratégias políticas que não vêm agora ao caso, pelejou para que o Congresso Nacional ‘convalidasse’, de uma vez por todas, os abusos cometidos. Afinal, o ‘incômodo’ art. 62 da Carta Magna sempre poderia suscitar reviravoltas, inclusive na jurisprudência." [1]
Ainda, comentando acerca da reedição das Mp´s merecem destaque os dizeres de Eduardo Marcial Ferreira Jardim:
"...a reedição implica afronta ao postulado da tripartição dos Poderes da República, pois usurpa prerrogativa ínsita do Congresso Nacional,. a quem comete o mister de legislar. Ademais, fere o primado republicano na proporção em que a representação do povo encontra-se nas mãos dos deputados e senadores, e não apenas na pessoa do Chefe do Executivo, que, mesmo eleito pela vontade popular, não detém com exclusivismo a titularidade da função legislativa. A bem ver, o exercício da função legislativa pelo Governo representa peculiaridade de monarquia absolutista, portanto incompatível, por todas as luzes, com o Estado de Direito Constitucional, sobretudo com as cores plasmadas na organização do Estado brasileiro, nos termos da Carta de 1988." [2]
Diante da notoriedade do fato, principalmente no período do Governo Fernando Henrique Cardoso, onde estávamos apreciando um aproveitamento incontrolável de medidas provisórias, as quais passaram a "regular" de tudo, sem qualquer discriminação, foi que o Congresso Nacional resolveu emendar pela trigésima segunda vez a Carta Magna e modificando a redação do art. 62, trouxe consideráveis alterações no regime das MP´s.
Desde já salientamos que, muito embora tenha sido pertinente a reforma constitucional suso mencionada, não fora a mesma suficiente para frear a sede do Executivo em legislar, de maneira que ainda nos dias atuais, no dito popular Governo Petista, nos deparamos com notórias abusividades, arbitrariedades e interesse na concentração do Poder, como por exemplo, a edição das medidas provisórias para fechamento das casas de bingo_ rechaçada pelo Senado Federal_ e para criação de status de Ministro de Estado para presidente do Banco Central do Brasil_ objeto de ADIN perante o Supremo Tribunal Federal [3]_. Ora, indaga-se: existe relevância e urgência nessas matérias? Parece-nos ato administrativo de desconsideração da vontade do povo, que elegeu aqueles que gostariam que fosse os responsáveis pelo Legislativo Federal, quais sejam, Deputados Federais e Senadores.
Antes à emenda constitucional inexistia qualquer autorização expressa para a reedição das medidas provisórias, as quais acabavam tratando da mesma matéria, via reedição, por meio de artimanhas políticas. Hoje, após a completa reestruturação desse instrumento, "surgiram acanhadas peias, que, na real, dilargaram, sensilvelmente, o campo de ação destes atos normativos". [4] (5)
Por ser tópico que não consiste o centro de nossas atenções no presente estudo, somente algumas considerações mais notórias serão feitas no que concerne ao processo legislativo das medidas provisórias, com vasta explanação na nova redação do art. 62, do Diploma Maior.
O primeiro ponto a ser destacado é que, em havendo relevância e urgência_ requisitos cumulativos_ poderá o Chefe do Executivo editar medida provisória, a qual restará em vigor durante sessenta dias, prorrogáveis, uma única vez, por igual período, caso não tenha sido votada pelo Congresso Nacional. O referido período de vigência das MP´s fica suspenso durante o período de recesso parlamentar, voltando a correr no primeiro dia findo o recesso.
A medida provisória será, imediatamente, levada ao Congresso Nacional, iniciando-se na Câmara dos Deputados, onde será apreciada por uma comissão que avaliará que, antes do mérito, avaliará seus aspectos constitucionais (relevância e urgência).
Por maioria simples, a medida provisória analisada e votada em ambas as Casas do Congresso, uma de cada vez, será convertida em lei ordinária, através da publicação da lei de conversão, a qual pode consistir na MP integral ou com restrições criadas pelo Parlamento. Ainda, podem as Casas Legislativas proporem emendas aditivas ou supressivas, contudo, essa possibilidade é alvo de divergência doutrinária, de modo que parte dela entende que o Legislativo está restrito à vontade inicial do Executivo, o que não nos parece o mais acertado, desde que, é lógico, as emendas aditivas não extrapolem a matéria abarcada pela MP, ou seja, não se distancie de seu objeto.
Uma vez rejeitada a medida provisória, por qualquer das Casas, ela não poderá ser reapresentada, sob pena de configuração de crime de responsabilidade (art. 85, III, CF), bem como perderá seus efeitos de forma retroativa, cabendo ao Congresso regular as situações ocorridas no período de vigência da mesma.
Poderá, ainda, ocorrer a denominada rejeição tácita, o que quer dizer, que a medida provisória não fora apreciada no período de sessenta dias, impedindo seu reedição, caso já tenha sido sua segunda publicação.
Ponto que merece abordagem no presente instante diz respeito às vedações materiais trazidas no bojo do artigo 62, do § 1º, da Lex Legum, destacando-se, dentre outras restrições, a que concerne à impossibilidade de fixação dos tipos penais através de MP.
Na seara tributária, as medidas provisórias receberam tratamento no § 2º, do artigo mencionado, contudo, não houve nenhuma restrição material nesse sentido, mas sim, uma restrição temporal, decorrente do princípio da anterioridade tributária (art. 150, inciso III, alíneas a e c), segundo a qual a MP que crie ou institua tributos, ressalvadas as exceções ali previstas, somente entrarão em vigor no exercício financeiro seguinte. Aliás, insta transcrevermos a regra supra, in verbis:
"Art. 62:.. .
...
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada."
Duas relevantes considerações devem ser feitas no que alude a regra supra:_ a anterioridade qualificada prevista pela EC nº 42/03 e; _ a relevância e urgência das medidas provisórias no âmbito tributário.
O segundo dos pontos supra citados, por ser parte do próprio centro desse estudo, será estudado de forma separada e pouco mais detalhada em tópico particular, passando à análise da primeira problemática suso.
Mas, inicialmente, desde já adiantamos, que se a medida provisória deve aguardar até o início do exercício financeiro seguinte ao da sua edição, cadê a relevância e a urgência? Não poderia a mesma matéria tributária ser ventilada por lei propriamente dita. Parece-nos que aqui estamos diante de uma evidente e lastimável inconstitucionalidade perpetrada pela EC nº 32/01.
Outro problema constitucional que encontra alçada na referida redação acima consiste que após a promulgação da EC nº 32/01, outras tantas vieram, em especial, a EC nº 42/03, que veio no centro da chamada reforma tributária.
Dentre outras assertivas a referida emenda constitucional trouxe o denominado princípio da anterioridade qualificada, encravando a alínea c, no inciso III, do art. 150, da Lei Suprema, segundo o qual, não basta que a lei tributária aguarde o exercício financeiro seguinte ao da sua edição, assim como, o lapso de noventa dias contados de sua publicação para passar a ter exigibilidade.
Com isso, findou-se a atitude infelizmente comum na cultura fiscal brasileira de aprovar-se uma lei majoradora ou instituidora de tributo no último ou penúltimo dia do exercício, passando a exigi-lo dois dias depois, logo, já em outro exercício, consagrando, assim, sua constitucionalidade, contudo, negando-se à segurança jurídica.
Hoje, não basta que a lei tributária aguarde o primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao de sua publicação para ser exigível, mas também, os noventa dias determinados pela nova redação do art. 150, inciso III, da CF. Por exemplo, tributo criado em 30 de dezembro, somente será exigido ao final de março e não mais em primeiro de janeiro, como no costume antes vigente.
Ultimando a matéria em comento, acerca de noções básicas sobre as medidas provisórias, indagamos sobre a possibilidade de edição de medidas provisórias por outros Chefes do Executivo que não o Presidente da República, são eles: os Governadores dos Estados-membros e do Distrito Federal e os Prefeitos municipais.
A nossa resposta, embora singela, é centro de acirrada discussão doutrinária, a qual encontra-se dividida quanto a essa possibilidade. Parece-nos que o mais acertado é admitir essa edição pelos demais membros do Executivo do Estado Federativo Brasileiro, desde que expressa previsão e autorização constitucional dos Estados ou da Lei Orgânica do Município exista nesse sentido [6].
Através disso, consagra-se a autonomia e igualdade existente entre todos os entes da federação e não corremos o risco de infringirmos o pacto federativo em que vivemos, consagrando-se a constitucionalidade dessa nossa posição.
Feitas essas considerações somente aclaradoras e introdutórias, passemos a dispender maiores esforços quanto à própria inconstitucionalidade da EC nº 32/01 no que se refere aos aspectos da medida provisória no âmbito tributário, principalmente, por afronta aos princípios constitucionais da anterioridade, aqui já debatido e demonstrado e o da estrita legalidade tributária, centro de estudo em separado [7], abordando-se, também, em apartado as considerações sobre a natureza jurídica do instrumento em tela.
2. O PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
A idéia da estrita legalidade decorre do próprio Estado de Direito, segundo máxime vige a recomendação de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei expressa que assim determine.
A lei, como ato normativo dotado de generalidade e abstração, provindo do Poder Legislativo, composto por membros eleitos pelo povo, constitui, ao menos em tese, a forma de externar a vontade deste, de modo a regular a vida em sociedade em vista do alcance ou, pelo menos, a busca do bem comum.
Ademais isso, a lei também serve como parâmetro de atuação do próprio Poder Público, que em um Estado de Direito encontra-se vinculado à estrita observância das disposições legais, as quais, noutra banda, de forma inarredável, devem seguir os ditames norteadores estabelecidos pela Carta Política, aonde encontra o seu fundamento de validade.
Consideração interessante de ser lembrada é que o controle da legalidade, bem como da constitucionalidade dessas mesmas leis, está centrado nos Órgãos Judiciários, a quem é dada a incumbência de "dizer o direito".
Neste trilhar, ao indivíduo no Estado de Direito brasileiro é dada a força de fazer ou deixar de fazer alguma coisa, tão somente, em virtude de lei, conforme borcardo jurídico cuique facere licet nisi quid iure prohibitur, nos moldes estabelecidos pelo art. 5º, inciso II, da Constituição de 1988. De outro ver, a Administração Pública somente fará algo se a lei assim estabelecer, sendo vedada a esta a atuação sem a expressa previsão legal.
O referido princípio teve necessário reforço no direito tributário pátrio, tratado como estrita legalidade tributária, de acordo com o art. 150, inciso I, da Carta Republicana, em face de se prestar como restrição ao Estado em relação aos direitos fundamentais da propriedade, patrimônio e da liberdade do indivíduo. Regramento direcionado ao próprio Estado (direito de 1ª geração), consistente em deixar de fazer, valendo novamente a menção da assertiva nullum tributum sine lege.
Cumpre lembrarmos também, quando tratamos de estrita legalidade, que não basta que o tributo seja criado ou instituído por lei, mas que todos os aspectos deste esteja presente em diploma legal. Assim, a norma tributária devem estar identificados todos elementos da mesma como hipótese de incidência, fato jurídico tributário imponível, sujeitos ativo e passivo, fatores aritméticos (base de cálculo e alíquota), forma de lançamento e extinção, creditamentos, etc, sob pena de ilegalidade por omissão ou, ainda, a inconstitucionalidade de portarias, resoluções, instruções normativas ou qualquer outro ato administrativo que verse sobre matéria de estrita observância legal, aspectos da norma tributária.
Assim, o tributo deve nascer de lei, que pormenorize todos os aspectos da regra tributária, bem como seja esta lei, decorrente do Órgão Legislativo e que este seja competente para tanto.
Devemos, por fim, salientarmos que existem algumas exceções constitucionais ao princípio da legalidade. São elas: II, IE, IPI, IOF, em face da extrafiscalidade desses impostos e da necessidade de rápida manipulação do mesmo, principalmente, como meio de controle econômico, entretanto, ainda assim, essa atuação é restrita nos moldes de lei anterior que determina certos limites.
Última consideração interessante a ser lembrada nesse tópico encontra guarida na extrema semelhança existente entre o direito tributário e o direito penal, decorrentes da idéia de tipo fechado, é o denominado princípio da tipicidade cerrada.
Corolário do princípio da estrita legalidade, não basta que o ente tributante atue dentro dos ditames da lei, mas também, que o fato jurígeno esteja estritamente subsumido na disposição legal.
A tipicidade cerrada é a necessidade de precisa subsunção entre o fato ocorrido e a expressa determinação legal como sendo aquele fato ser juridicamente hábil a produzir o nascimento de uma obrigação tributária, assim como, mutatis mutantis, ocorre no direito penal.
Com a maestria que lhe é peculiar Geraldo Ataliba nos esclarece mencionando:
"A figura típica penal constitui-se num conceito legal, da mesma forma que a hipótese de incidência. A figura legal do crime é a mera descrição legal, simples conceito legal hipotético, Há crime in concretu, se e quando alguém pratica ao descrio abstratamente na lei.
A h.i. (hipótese de incidência) tributária é a hipótese da lei tributária. É a descrição genérica e abstrata de um fato. É a conceituação (conceito legal) de um fato: mero desenho contido num ato legislativo." [8]
Com saber não menos ofuscado temos a lição de Misabel de Abreu Machado Derzi:
"A legalidade estrita, a segurança jurídica, a uniformidade e a praticidade determinam a tendência conceitual prevalente no Direito Tributário".
Além desses princípios citados, a repartição constitucional do poder tributário, assentada, sobretudo, na competência privativa tem como pressuposto antes a forma de racionar por conceitos fechados do que por tipos.
Os tributos são objeto de uma enumeração exaustiva de modo que aquilo que não está na lei, inexiste juridicamente.
...
Não se admitem as ordens de estrutura flexível, graduável e de características renunciáveis que são os tipos. Esses, por sua vez, levariam, à aceitação das formas mistas ou novas, deduzidas e descobertas, implicitamente, no ordenamento ou criadas, no tráfego jurídico, pela prática administrativa, segundo as necessidades do Tesouro, o que se chocaria com os princípios vigorantes no sistema tributário." [9]
Neste diapasão, a outra conclusão não nos podemos ater, senão a de que, em direito tributário, por haver notória afronta aos direitos individuais do contribuinte, é inafastável a aplicabilidade da estrita legalidade, ao ponto de que ao Fisco nenhuma prerrogativa lhe deve aproveitar, salvo as previstas em lei.
A bem da verdade, poderíamos mencionar aqui que o princípio da legalidade tributária constitui instituto protetor da própria segurança, contudo, sua atuação isolada, sem observância dos demais princípios constitucionais balizadores do direito tributário, não é o bastante para coibir o Fisco de atitudes aterradoras em face do contribuinte, sendo indiscutível que, nos dias em que vivemos, os tributos_ fonte de riqueza e manutenção do Estado e esgotamento dos valores pertencentes aos contribuintes_, legalmente instituídos, são notoriamente inconstitucionais, vez que afrontam gritantemente princípios como o da capacidade contributiva.