Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Dolo. Culpa. Dano.
1. INTRODUÇÃO
1.1. Conceito e História
Conforme preleciona Gustavo Tepedino, “a noção de Direito encontra-se intimamente vinculada à noção de composição dos conflitos de interesses, visando o atendimento das funções essenciais da justiça e segurança”. (Tepedino, 1999, p.173). Neste sentido, segundo o autor, tem a norma jurídica um duplo escopo: dissipar as divergências das relações intersubjetivas e regrar a conduta humana, constituindo-se em parâmetro para o comportamento. Ademais, as regras, critérios e pressupostos adotados pelo Direito para a composição das lides, de forma a obrigar o devedor a indenizar a quem sofre o dano injusto, dão-nos a ideia sobre o desenvolvimento da responsabilidade civil no tempo (Tepedino, p. 173).
As concepções de justiça que, tradicionalmente, regeram as sociedades antigas, embasavam o pensamento de que o dano injusto, decorrente do descumprimento de um dever contratual ou pela desobediência a um preceito legal, deveria acarretar ao devedor o dever de indenizar o ofendido. Embora sejam estas as mesmas ideias que perpassam o Direito atual, nem sempre o dever de indenizar recaiu sobre o patrimônio do devedor. Nesse sentido, a Lei de Talião – olho por olho, dente por dente – transmitiu ao Direito Romano clássico a concepção de que o credor tinha direito de exigir corporalmente do devedor a satisfação da ofensa à obrigação contratual ou a lesão a preceito legal. (Tepedino, 1999, pp. 174, 175).
Num primeiro momento, prevaleceu no Direito Romano a responsabilidade civil objetiva, pois não havia a exigência de comprovação do elemento subjetivo para a exigência das cruéis penas impostas. No entanto, a partir da percepção de que as penas corporais constituíam meio impróprio de satisfação do direito lesado e percebendo-se que a não exigência do requisito culpa acarretava situações injustas, surge a necessidade de comprovação desta (Tartuce, 2011, p. 394). Destarte, a responsabilidade civil subjetiva passou a figurar como regra nas codificações privadas influenciadas pelo direito de Roma, como bem se observa a partir das leituras dos Códigos de 1916 e 2002 brasileiros.
Segundo o magistério de Flávio Tartuce, a responsabilidade civil subdivide-se em (i) responsabilidade civil negocial ou contratual – prevista nos arts. 389, 390 e 391 do Código Civil de 2002; e (ii) responsabilidade civil extratracontrual ou aquiliana – fundada no art. 186, que dispõe sobre o ato ilícito, e no art. 187. que disciplina o abuso de direito ( Tartuce, 2011, p.394). No entanto, de acordo com o civilista, inobstante ter sido mantido o modelo dualista de responsabilidade civil no atual Código, o pensamento majoritário é o de unificar as responsabilidades, o que se observa no Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078 de 11 de Setembro de 1990.
2. A TEORIA SUBJETIVA DA RESPONSABILIDADE CIVIL.
A ideia de responsabilidade civil está intimamente relacionada à origem da palavra, do latim respondere; decorre da necessidade de que alguém, que tenha violado regras sociais, responda por seus atos e consequências.
A teoria subjetiva preconiza que o elemento culpa constitui, em regra, um dos pressupostos necessários para a responsabilidade civil. Em nosso Código Civil, podemos depreendê-la da leitura do artigo 186:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
Conforme lições de Maria Helena Diniz, o ato ilícito, insculpido nos artigos supracitados, compreende a conduta humana contrária às normas jurídicas e que viola direito subjetivo de outrem, causando dano patrimonial e/ou moral, estabelecendo-se o dever de repará-lo, nos termos dos arts. 927. e 944 do Código Civil (Diniz, 2009, p.207).
Como se disse alhures, conforme a teoria subjetiva – doutrina tradicionalmente majoritária –, a culpa genérica ou lato sensu constitui, em regra, elemento necessário da conduta humana para que se crie a obrigação de reparar o dano causado (Tartuce, 2011, p.411). Em contrario sensu, os doutrinadores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho preconizam que a culpa genérica constitui apenas elemento acidental da responsabilidade, elegendo três requisitos: a) conduta humana; b) dano; e c) nexo de causalidade (Tartuce, 2011, p.411).
Para Tartuce, a culpa genérica ou lato sensu compreende o dolo e a culpa em sentido estrito (Tartuce, 2011, p. 413).
O dolo refere-se à ação ou omissão voluntária disciplinada no art. 186, CC. Em outros termos, significa dizer que a pessoa viola intencionalmente um dever jurídico na intenção de prejudicar a outrem.
Nas lições de Sérgio Cavalieri Filho, citado por Tartuce, a culpa é caracterizado por três elementos: “a) a conduta voluntária, com resultado involuntário; b) a previsão ou previsibilidade; e c) a falta de cuidado, cautela, diligência e atenção” (Tartuce, 2011, p. 414). Nesta esteira, conclui-se que enquanto no dolo o agente pratica o ato na intencionalidade de alcançar determinado resultado, isto é, a pessoa deseja a conduta e o resultado; na culpa quer a conduta, porém, não deseja o resultado.
3. TEORIA OBJETIVA DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Enquanto que na teoria subjetiva a culpa genérica ou lato sensu – que engloba o dolo e a culpa em sentido estrito – é o fio-condutor, em regra, necessário para a exigência de reparação, na teoria objetiva da responsabilidade civil a conduta humana somada à previsão legal de responsabilização sem culpa ou pela atividade de risco constituem o nexo causal que exigem a reparação, nos termos do parágrafo único do art. 927, CC. Conforme Tepedino, a expansão da teoria objetiva na Codificação e na Jurisprudência ocorreu quando “percebeu-se a insuficiência da técnica subjetivista, também chamada aquiliana, para atender a todas as hipóteses em que os danos deveriam ser reparados” (Tepedino, 1999 p.175).
Destarte, percebe-se que o nosso ordenamento jurídico utiliza-se de ambas as teorias, haja vista insculpir a responsabilidade subjetiva no art. 186, CC, ao passo que adota a responsabilidade objetiva no artigo seguinte que disciplina o abuso de direito e, também, adota-a, na Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), art. 12, quando prescreve que “o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador, respondem independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores [...]” (grifo nosso).
Para Limongi França, citado por Diniz, “o abuso de direito consiste em um ato jurídico de objeto lícito, mas cujo exercício, levado a efeito sem a devida regularidade acarreta um resultado que se considera ilícito” (Dinis, 2009, p.208).
Em relação ao abuso de direito, o entendimento jurisprudencial e doutrinário majoritários é no sentido de que a responsabilidade civil, neste caso, é aferível independentemente de culpa do agente, haja vista fundamentar-se “somente no critério objetivo-finalístico” (Enunciado 37 da I Jornada de Direito Civil, promovida pelo CJF, em 2002).
Há que se destacar, também, que o Código Civil admite a teoria objetiva da responsabilidade civil por atos praticados por terceiros, por danos causados por animal etc., conforme previsão do art. 932. e seguintes.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, entendemos que as teorias subjetiva e objetiva foram adotadas pelo Código Civil de 2002, adotando, assim, a técnica legislativa o modelo dual de responsabilidade civil, prevalecendo, no entanto, as concepções jurisprudenciais e doutrinárias pela necessidade de demonstração, em regra, da culpa genérica.
REFERÊNCIAS
DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado / Maria Helena Diniz – 14. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2009.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único / Flávio Tartuce. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.
TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil / Gustavo Tepedino. – 1. ed. –Rio de Janeiro: Renovar, 1999.