RESUMO - A corrida desenfreada pelo desenvolvimento, marcadamente forjado a preço de sangue e degradação, tem se revelado uma face obscura das nações. A indústria petrolífera como um todo, nos moldes e princípios em que é gerida, é fator de intensas preocupações, pois os incidentes ocorridos na sua execução não são raros e as conseqüências assomam vulto, em sua maioria, irreversíveis. Neste particular, merecem destaque as atividades de distribuição e revenda de combustíveis, cujo potencial degradador não é subestimável. Oportuno, portanto, o enfrentamento dessa questão, sob o enfoque da proteção ambiental possível e esperada nesses empreendimentos, o que possibilitará além, e no esteio da preservação do ambiente, a manutenção da vida com dignidade e qualidade.
Palavras-chave: Meio ambiente. Indústria petrolífera. Proteção ambiental. Licenciamento ambiental. Gerenciamento ambiental.
ABSTRACT - The uncontrolled run for development, forged by the price of blood and degradation, has revealed an obscure face of the nations. The oil industry as a whole, in the patterns and principles that it is managed, is a source of intense preoccupation, because the incidents occured in its production are not rare and its negative enviromental impacts are important and, most of the time, irreversible. In this particular matter, deserves special attention the activities of distribution and sale of fuel, that have potential enviromental impact which is under evaluated. Therefore, it is relevant to confront this problem and promote enviromental protection and the maintainace of the dignity and quality of life.
Key words: Enviroment. Oil industry. Enviromental protection. Enviromental licence. Enviromental administration.
Sumário:I. Introdução - II. Panorama histórico das atividades de distribuição e revenda de combustíveis no Brasil - III. Princípio do Desenvolvimento Sustentável - IV. Natureza jurídica da indústria petrolífera - V. Análise da proteção ambiental à luz das Portarias da Agência Nacional do Petróleo e legislação ordinária - VI. Licenciamento ambiental nas atividades de revenda de combustíveis - VII. Gerenciamento ambiental nas atividades de distribuição e revenda de combustíveis - VIII. Conclusão - IX. Referências.
I. Introdução
Os gravames causados pelos combustíveis fósseis ao planeta, notadamente o petróleo, corroborados em ocorrências nefastas como o efeito estufa e a chuva ácida; nos derrames de grande ou pequena monta, que de todo causam prejuízos ao planeta, em sua expressiva maioria, insanáveis; nas guerras pelo domínio de campos petrolíferos, as quais têm dilacerado a mocidade de muitos e estampado na velhice de outros as marcas da humilhação e dor; nas dívidas cobradas em petrodólares que condicionam à miséria países já tão empobrecidos e nos embates que a sua escassez acabará por acirrar, são ocorrências com as quais já temos convivido há algumas décadas.
A despeito de propósitos outros, que não a perpetuidade da vida em bases sustentáveis, já se observam condutas preservacionistas, resultantes da consciência de que qualquer sorte de agressão ao meio redunda em direta agressão ao homem. O Brasil, a exemplo, já tem avançado degraus na escalada da proteção do ambiente. A Constituição Federal de 1988 reservou-lhe um capítulo, e legou-nos, a todos, Poder Público e coletividade, o dever de defendê-lo e preservá-lo, com vistas não apenas à garantia da sobrevivência da geração presente, mas também às que nos sucederem.
Não obstante, tem-se observado que acidentes envolvendo as etapas de distribuição e revenda de combustíveis não são figuras raras no cenário nacional e as resultantes, tão pouco, menosprezáveis. Incêndios têm ceifado a vida de muitos, corpos d’água têm sido contaminados, o ar poluído, a fauna e a flora comprometidas.
É sob esta perspectiva que elegemos como objeto do presente estudo a proteção ambiental nas atividades de distribuição e revenda de combustíveis, indagando, para tanto, quais instrumentos de proteção ambiental podem ser identificados como fundamentais a tais atividades.
Para o encaminhamento dessa questão, faz-se imprescindível o delineamento de uma breve evolução histórica das atividades de distribuição e revenda de combustíveis no Brasil, a análise do Princípio do Desenvolvimento Sustentável, da natureza jurídica da indústria petrolífera e da proteção do ambiente consubstanciada na legislação que regulamenta essas atividades, bem como nas Portarias expedidas pela Agência Nacional do Petróleo – ANP.
II. Panorama histórico das atividades de distribuição e revenda de combustíveis no Brasil
As atividades de distribuição e revenda de combustíveis estão intrinsecamente relacionadas às atividades de exploração e produção de petróleo, consistindo nas últimas fases desse ciclo, cuja efetivação consubstancia-se na entrega dos produtos aos consumidores finais.
No Brasil, a distribuição, atividade comercial responsável pela colocação, no mercado, dos derivados de petróleo produzidos nas refinarias, remonta ao ano de 1912, quando era realizada em latas e tambores carregados no lombo de burros.
É do segundo reinado que datam os primeiros documentos acerca do petróleo. E em 1864, na Bahia, tem início os primeiros estudos voltados para a sondagem da possibilidade de existência de recursos petrolíferos no País.
Em 1907, após seguidos anos de buscas por petróleo, promovidas com o auxílio de profissionais estrangeiros, criou-se o Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil – SGMB, vinculado ao Ministério da Agricultura.
A empresa Shell, sob o nome de The Anglo Mexican Petroleum Products Company, recebeu, em 1913, autorização do então Presidente Hermes da Fonseca, para começar a operar no País (SHELL, 2004, on line). Produtos como querosene, preponderante em volume de vendas, gasolina, óleo diesel e lubrificantes eram produzidos no México pela companhia El Aguila, e em chegando ao Brasil eram encaminhados ao depósito de óleos daquela empresa, o primeiro instalado no País, localizado na Ilha do Governador, Rio de Janeiro.
Em 15 de setembro de 1915, autorizada pelo Decreto nº 11.702, assinado pelo Presidente Wenceslau Brás, passou a funcionar The Texas Company (South América) Ltd., a Texaco, cujos produtos, todavia, já eram distribuídos no País desde 1913 pela empresa de representação Fry Youle e Cia., instalada em Salvador, Bahia (TEXACO, 2004, on line).
Com o advento da primeira guerra mundial e a elevada importância como combustível alcançada pelo petróleo, intensificou-se em todo o mundo a busca por jazidas, inclusive no Brasil.
A experiência mostra que os fatos atinentes ao petróleo estão amplamente vinculados à conjugação de fatores políticos e econômicos, o que explica, na década de trinta, o ingresso do Governo na atuação direta das questões de planejamento estratégico, as quais, a priori, teriam ficado, desde 1933, a cargo do Departamento Nacional da Produção Mineral – DNPM, instituído no esteio da criação e alteração da estrutura dos órgãos encarregados do petróleo. Tendo restado a esta autarquia, por conseguinte, tão somente a função executiva, fundada na implantação de políticas minerais.
Nesse esteio, assistiu-se, em 29 de abril de 1938, ao nascedouro da primeira regulamentação da indústria do petróleo, o Decreto-lei nº 395, pelo qual foram declaradas de utilidade pública as atividades de exploração, refino, importação, distribuição e comercialização de petróleo bruto e seus derivados [1]. Aludida norma federal passou a disciplinar todas as etapas da indústria do petróleo à época existentes no país, inclusive aquela relativa à distribuição, conceituada no art. 1º, no gênero abastecimento nacional.
Datada de 1941 está a criação da Associação Profissional do Comércio Atacadista de Minérios e Combustíveis, que hoje, ostenta a condição de Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes – SINDICOM, após ter passado por um processo evolutivo, o qual originou, em 1960, o Sindicato do Comércio Atacadista de Minérios e Combustíveis Minerais do Estado da Guanabara e, em 1964, passou a representação nacional, na condição de Sindicato Nacional do Comércio Atacadista de Minérios e Combustíveis Minerais.
A Constituição de 1946 inovou ao permitir aos estrangeiros a exploração do petróleo sob a única exigência de que essas empresas fossem organizadas em conformidade com a lei nacional. Todavia, os movimentos políticos nacionalistas imprimiam seu descontentamento com essa política, fundando suas críticas na evidência de que as empresas estrangeiras concentravam suas atividades no refino e distribuição, olvidando as atividades de pesquisa e produção. [2]
Dessa forma, engendrados na bandeira deflagrada pelo General Horta Barbosa, a qual galhardeava o monopólio integral do Estado, encimando o slogan "o petróleo é nosso", encaminhou-se ao Poder legislativo o Projeto de Lei nº 1.561/51, o qual redundou na aprovação da Lei nº 2004, de 03 de outubro de 1953, que estabeleceu o monopólio da União sobre a lavra, refinação e transporte marítimo do petróleo e seus derivados, criando-se, para tanto, a Petróleo Brasileiro S. A. – Petrobrás. [3]
A Resolução CNP 8/63, de 06 de dezembro de 1963, é considerada o mais efetivo e completo título de autorização à Petrobrás para o exercício da atividade de distribuição de derivados de petróleo em grosso em todo o território nacional, haja vista o incremento constatado no fornecimento aos órgãos estatais, considerado como imperativo da defesa nacional. Iniciou-se, a partir desse fato, a distribuição desses produtos, através dos postos revendedores, com a inauguração do primeiro posto da estatal, localizado na capital federal.
No ano de 1971, a Petrobrás contava com oitocentos e quarenta postos de serviço e um mil, oitocentos e oitenta e oito clientes consumidores, aí incluídos, exemplificativamente, os consumidores industriais e as Forças Armadas.
Esses fatores reclamavam o incremento da atividade, através da expansão do setor, acompanhada de descentralização técnica e operacional, o que resultou, em 29 de janeiro de 1971, na criação, pelo Conselho de Administração da companhia, da subsidiária Petrobrás Distribuidora S.A., dotada de autonomia administrativa, contando com seus próprios órgãos de apoio administrativo, exclusivamente direcionados para as questões atinentes à distribuição. [4] Em 12 de novembro de 1971, realizou-se a Assembléia de Constituição da Petrobrás Distribuidora S.A. – BR, como também é conhecida.
No ano de 1990, com a abertura dos mercados brasileiros aos produtos estrangeiros e o incremento das importações, em face das modificações produzidas ao nível de planejamento econômico decorrentes das eleições presidenciais, é que se observa o aumento da competitividade entre os produtos nacionais e os estrangeiros.
No esteio dessas mudanças introduzidas no quadro institucional brasileiro, o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional o texto daquela que seria a Emenda Constitucional nº 9/95, a qual possibilitava à iniciativa privada, desde que fosse a empresa constituída sob o império das leis brasileiras, o direito de, por sua conta e risco, executar as atividades que constituíam domínio da Petrobrás. [5] O Estado Brasileiro passaria de produtor exclusivo a incentivador das atividades econômicas, possibilitando, além disso, uma maior fiscalização, pela sociedade, das práticas estatais, até então realizadas de modo segregado, obscuro.
Nesse cenário de mudanças observadas na indústria petrolífera, ganha relevo a partir da Emenda Constitucional nº 5/95, a edição da Lei nº 9.478, de 06 de agosto de 1997, denominada Lei do Petróleo, que estabeleceu a política energética nacional, disciplinou as atividades da indústria do petróleo [6], criou o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo – ANP, cabendo a esta, conforme Art. 8º, inciso I, a implementação da política traçada por aquele conselho.
Observe-se, entretanto, que, apesar de a distribuição de derivados de petróleo jamais ter figurado entre as atividades previstas como monopólio da União, após a abertura do mercado, a competição encontra-se cada vez mais acirrada, com a introdução de um elevado contingente de novas empresas, somando hoje um total de duzentas e cinqüenta e três distribuidoras autorizadas a operar, das quais cerca de setenta já se encontram em plena atividade. [7]
Quanto aos postos revendedores de combustíveis, somam hoje, segundo dados [8] da ANP, o total de vinte e nove mil, oitocentos e quatro, dos quais 18% estão sob a bandeira da Petrobrás Distribuidora S.A. - BR; 13,9% ostentam a bandeira da Distribuidora de Produtos de Petróleo Ipiranga; 8,9% da Texaco Brasil Ltda.; 7,6% da Esso Brasileira de Petróleo Ltda.; 7,5% da Shell Brasil Ltda.; 3,6% da Agip do Brasil S.A.; 13,7% ostentam as bandeiras das demais distribuidoras operantes no mercado, e os 26,8% restantes são postos bandeira branca [9].
Ressalte-se que, no contexto atual, revela-se insustentável qualquer tentativa de obnublar o caráter marcadamente econômico perseguido por grandes corporações que atuam em atividades ligadas à indústria petrolífera. Por conseguinte, os acidentes ocorridos tanto no âmbito das distribuidoras, como dos postos revendedores de combustíveis, e até mesmo as implicações quotidianas que essas atividades impõem ao meio em que estão inseridas, reclamam a análise da proteção ambiental pretendida no seu processo de desenvolvimento, à luz dos princípios fundamentais ao ambiente, consagrados na Constituição Federal, com o fim de se ter assegurado, concretamente, o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado.
III. Princípio do Desenvolvimento Sustentáve
lA Constituição Federal de 1988 dedicou capítulo exclusivo ao meio ambiente, materializado no artigo 225. E o fez de forma a acentuar o caráter social desse bem jurídico, inserindo-o no Título Da Ordem Social, o que resulta na constatação de que o complexo de direitos albergados sob o aludido título, dentre estes a seguridade social - neste particular, com destaque para a seção II, relativa à saúde - a educação e a família, estão intrinsecamente relacionados, gerando o homem social, que já não deve, justamente fundado nesse entendimento extraído da inteligência do texto constitucional, enxergar o ambiente como algo exterior a si ou distante de sua realidade, alegando, para tanto, que os reflexos dos demais dispositivos, anteriormente citados, fazem-se sentir com maior ênfase na sua vivência, do que aqueles respeitantes ao ambiente. O homem social, apregoado pela Carta Magna, é aquele que se reconhece como elemento integrante e modificador do meio e que apreende do conceito de bem-estar, estampado no preâmbulo da Carta, a inter-relação de todos os aspectos albergados sob a tutela da ordem social.
Embora não olvidemos o caráter solidário dos princípios, no sentido de que não podem ser vistos isoladamente, senão sob uma visão global, pois todos são dotados de conteúdo valioso, constituindo-se em verdadeiros alicerces para o estudo do Direito Ambiental, decidimo-nos por tratar em específico do Princípio do Desenvolvimento Sustentável.
Apesar de o conceito de desenvolvimento sustentável ter sido introduzido no Brasil, apenas no início da década de oitenta, com a edição da Lei nº 6.803, de 03 de julho de 1980 [10], que lançou diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição, as discussões acerca do desenvolvimento socioeconômico e a preservação da qualidade ambiental já ocupavam destaque no cenário brasileiro, o que na década de setenta redundou no afloramento de diversas organizações não-governamentais e inúmeros protestos contra medidas irresponsáveis tomadas sob a cortina da ditadura militar, como o acordo nuclear Brasil/Alemanha.
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, no ano de 1972, resultou da percepção, pelas nações industrializadas, do patamar degradatório alcançado no mundo, em função do seu processo de crescimento econômico e da exploração desordenada dos recursos naturais, esta última causadora da crescente escassez desses mesmos recursos.
Chegou-se a apontar, quando da conferência, como medida necessária à contenção da poluição, uma política de crescimento zero, para que não se perdesse o que ainda estava a salvo. Todavia, se levada a cabo, tal política contribuiria para o recrudescimento das desigualdades sociais em âmbito mundial, posto que os países pobres estariam irremediavelmente confinados a sua precária situação.
Engendrados no juízo de que "a pior poluição é a miséria" [11], os governantes ditatoriais brasileiros esforçaram-se para afastar o ambiente e seus consectários, do rol de preocupações da sociedade, anestesiando a consciência da nação com ações e discursos de cunho paternalista, que ansiavam por incutir nas mentes o entendimento de que a necessidade de desenvolvimento suplantava a da conservação do meio e, ainda, mitigava qualquer possibilidade de discussão e planejamento concernente à conciliação entre desenvolvimento e "melhora da qualidade de vida humana dentro dos limites da capacidade de suporte dos ecossistemas" (MILARÉ, 2000, p. 107).
A despeito dessa visão do governo, então vigente, setores da sociedade já despertavam para a urgência da tomada de posturas pela nação, relativamente à proteção ambiental, sob o risco do entrave futuro à manutenção da vida, entendimentos estes frutos já da ampliação da consciência e do conhecimento científico. Foi assim que, nas eleições estaduais de 1982, alguns vereadores e deputados estaduais chamados "verdes", de distintas correntes ideológicas e partidos, foram eleitos. Processo que teve continuidade e em 1986 redundou na eleição, pelo Estado de São Paulo, de um único deputado constituinte "verde", a saber Fernando Gabeira, que tendo coordenado a formação de uma frente suprapartidária, intitulada Frente Nacional de Ação Ecológica na Constituinte, encarregada de funcionar como canal das aspirações da sociedade, contribuiu para a conquista da introdução de um capítulo sobre meio ambiente na Constituição de 1988, além de diversos dispositivos de cunho marcadamente ambiental, dispostos por todo o texto constitucional.
Faz-se mister ressaltar nesse iter, a edição da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que no esteio da já citada Lei nº 6.803, de 03 de julho de 1980 e em consonância com as mudanças, a despeito de incipientes, já detectáveis, trouxe disseminado, sob o assento de uma Política Nacional do Meio Ambiente, o conceito ainda mais aprimorado de desenvolvimento sustentável, inclusive com a adoção no inciso III, do artigo 9º, da avaliação de impactos ambientais [12], como instrumento para a manutenção do equilíbrio ecológico.
Entretanto, apesar da ampliação à proteção dos processos ecológicos essenciais, a Lei nº 6.938/81, no contexto em que foi produzida e segundo o fim a que deveria atender, qual seja, tornar o País "apto" ao aportamento de capitais estrangeiros, para o que a elaboração de uma lei federal que disciplinasse a matéria ambiental era fator basilar, acabou por retirar da sociedade a oportunidade de inteirar-se da questão ambiental e tornar-se agente participativo da formação e implementação da política ambiental.
Contudo, embora a terminologia que conhecemos hoje e da qual vimos nos utilizando no decorrer deste tópico, a saber, desenvolvimento sustentável, tenha surgido inicialmente na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, em 1972, foi especialmente empregada na Conferência da Terra, realizada na Cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1992, mais conhecida no Brasil sob a denominação de Rio-92 ou Conferência do Rio, tendo-se difundido também a expressão Eco-92, conferência esta que reuniu representantes de 113 países e cerca de 250 organizações não-governamentais – ONG’s.
Na Conferência do Rio, temas como a responsabilidade dos países desenvolvidos no combate à poluição global, a responsabilidade das grandes empresas industriais pelos ônus dos impactos ambientais que provocam, e, ainda, a urgência na discussão e encontro de soluções para sanar o problema da dívida externa dos países subdesenvolvidos, problema este que tem representado verdadeiro entrave à proteção ambiental, foram considerados de caráter fundamental, recebendo tratamento enfático.
Os princípios [13] consagrados na Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, encerram a verdade de que os recursos ambientais não são inesgotáveis e que por isso a compatibilização entre meio ambiente e desenvolvimento [14] é uma necessidade, não havendo, portanto, como olvidar a sua urgência, sob pena de sofrermos severas e funestas conseqüências em um futuro bem próximo, mais sérias ainda porque seu caráter se revelará irremediável.
O diferencial consiste, por conseguinte, em crescer de maneira planejada e sustentável, para que, no dizer de Celso Fiorillo, "os recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos" (2003, p. 25).
O artigo 225 da Constituição Federal de 1988 trouxe no caput a previsão do princípio do desenvolvimento sustentável, ao afirmar que "é dever do Poder Público e da coletividade defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações". O preceito constitucional não contraria a livre iniciativa, apenas afirma que para a perpetuação dos recursos essenciais à continuidade da vida e, por conseguinte, da capacidade produtiva [15], que enseja o desenvolvimento, faz-se necessária a convergência de objetivos comuns, orientada pela produção e consumo em padrões sustentáveis, através do incentivo ao uso de tecnologias limpas [16] e da coibição à criação de necessidades desnecessárias, alcançando o adequado usufruto dos recursos ambientais, de maneira que se garanta o equilíbrio ecológico.
Nesse sentido, é que o desenvolvimento harmonizado se diferencia do mero crescimento econômico, pois o primeiro visa garantir o atendimento às necessidades do presente, da geração atual, sem que isso consista em obstáculo ou comprometa a possibilidade de as gerações futuras atenderem às necessidades que lhes forem inerentes, ou seja, não é uma visão curta e incongruente com o preceito constitucional, no que se diferencia do segundo, pois este lança suas bases sobre o presente apenas, de modo a extrair o máximo que puder, mutilando o meio a qualquer custo, ceifando a possibilidade de imaginarmos alguma existência digna no futuro.
Desta feita, pode-se afirmar que o desenvolvimento sustentável consiste no objetivo da cidadania ambiental. O cidadão tanto tem direito a que se promova o desenvolvimento em bases sustentáveis, como também de ser parcela contributiva para o alcance desse fim, resultando em ambos os casos observância da proteção do bem jurídico, meio ambiente, com a conseqüente garantia da qualidade de vida para as atual e futura gerações.