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Limitações constitucionais intangíveis ao foro privilegiado

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29/03/2005 às 00:00
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7 Alcance das cláusulas pétreas

A tese defendida no presente artigo suscita o problema do alcance das cláusulas pétreas, uma vaexata quaestio na Teoria da Constituição [48].

A principal objeção aos limites materiais de reforma constitucional é a de que "um povo tem sempre o direito de rever, reformar e modificar a sua constituição. Uma geração não pode sujeitar a suas leis as gerações futuras" [49]; outrossim, argumenta-se que as cláusulas pétreas não podem conter o evolver dos valores sociais, sob pena de fomentar "o seu descumprimento ou adulteração mediante uma interpretação mutativa contra constitutionem, e até a sua derrogação pelo direito constitucional consuetudinário (desuetudo)" [50], bem como ensejar a ocorrência de golpe revolucionário, como último recurso à sua superação.

Sem perder de vista a relevância dessas objeções, cumpre ressaltar que, do ponto de vista normativo, não há como negar eficácia a cláusulas que prevêem expressamente limitações materiais ao poder de reforma constitucional: como qualquer outra norma constitucional, ostentam força normativa [51]; tanto maior quanto se verifica que esses limites constituem o cerne de juridicidade da ordem constitucional, que não pode ficar ao sabor de oscilações das maiorias legislativas [52]. Sob outro prisma, tendo em vista a concepção moderna de poder constituinte, de nada adianta postular a participação direta do povo no estabelecimento da constituição, se os princípios fundamentais que a informam puderem ser livremente alterado pela via democrática indireta – que nem sempre traduz as legítimas aspirações populares. Por essa razão, o jurista alemão Friedrich Müller assinala que, além de "procedimentos democráticos de elaboração e/ou entrada em vigor da Constituição", "[...] os textos de norma sobre o poder constituinte do povo exigem também que todo o poder do Estado e seu sistema jurídico nunca se afastem do cerne material do ordenamento democrático", identificando no art. 79, III, da Lei Fundamental alemã – referente aos limites do poder de reforma constitucional naquele país – o "efeito jusmaterial do poder constituinte do povo" [53].

Nessa linha de raciocínio, sustentamos que a interpretação conjugada dos arts. 1º, parágrafo único ("todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição" [54]), e 60, § 4º, da Constituição ("não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir [...]") leva à conclusão de que qualquer restrição a normas pétreas reclama a participação direta do povo, de acordo com procedimentos os mais democráticos possíveis [55]. Dessa forma, concordamos com a assertiva de que uma geração não pode submeter as gerações posteriores aos seus valores de vida; porém, entendemos que somente o titular do poder constituinte originário pode dispor do cerne material da Constituição [56].

Diante do exposto, conclui-se que, em respeito ao princípio democrático, a eficácia das cláusulas pétreas deve ser ampla, de modo a possibilitar o controle popular das propostas de reforma constitucional que possam restringir o âmbito normativo de dispositivos constitucionais petrificados [57].


8. Conclusão

Não são desprezíveis as preocupações daqueles que defendem o foro privilegiado em ações cíveis, especialmente ações de improbidade. Impressiona, cumpre admitir, o argumento de que o exercício de elevadas funções públicas pressupõe um grau de estabilidade que não se compadece com a permanente sujeição a acusações temerárias. À primeira vista, também, parece realmente absurda a possibilidade de um juiz de 1º grau decretar, a pedido de um procurador da República, a perda do cargo de um ministro do Supremo Tribunal Federal.

Um exame mais acurado da questão, entretanto, revela que o Constituinte Originário, sopesando essas preocupações com o clamor da sociedade por um combate efetivo ao mal da corrupção [58] – que tanto aflige o Brasil –, optou nitidamente, como visto, por resguardar o processo e julgamento dos atos de improbidade das indesejadas injunções políticas, ao mesmo tempo em que assegurou aos acusados todas as garantias inerentes ao processo judicial. Ora, como é cediço, descabe, nesse âmbito, falar em relação hierárquica entre tribunais superiores e juízes, o que só seria apropriado caso se tratasse de processo administrativo disciplinar.

Desse modo, nada recomenda substituir, nessas ações, o Poder Judiciário de primeira instância – integrado por magistrados de carreira, concursados, e por isso menos suscetíveis a vinculações políticas –, por órgãos jurisdicionais de cúpula, como o Supremo Tribunal Federal, cujos membros são todos nomeados pelo Presidente da República, predominantemente com base em critérios políticos. Muito pior, ainda, é concentrar em uma única pessoa, o Procurador-Geral da República, o poder soberano de decidir pelo exercício ou não da acusação contra as elevadas autoridades da República. Note-se que, de acordo com o art. 128 da Constituição, o senhor absoluto da acusação no Estado brasileiro é de livre nomeação do Presidente da República, dentre integrantes da carreira do Ministério Público da União, após aprovação de seu nome pelo Senado Federal; depende, ainda, do mesmo procedimento para a sua recondução ao cargo; e, o que é mais grave, pode ser destituído a qualquer momento, também mediante indicação do Presidente da República e autorização do Senado Federal. Diante dessa disciplina constitucional, o que esperar da independência funcional do Procurador-Geral da República? No mínimo, uma certa afinidade ideológica com o Governo.

Por óbvio, não se afasta a atuação ideológica de um membro do Ministério Público com atuação na primeira instância; todavia, esta é meramente eventual; não decorre do sistema em si mesmo. Nesse caso, os "abusos" e "arroubos" da acusação serão prontamente corrigidos pelo Judiciário, seja de primeira instância ou de instâncias superiores, incluindo o próprio Supremo Tribunal Federal. Enfim, a própria evolução da jurisprudência dará a maturidade necessária ao manejo dessas ações. Nesse sentido, já se reconhece a aplicação do princípio da proporcionalidade às ações de improbidade, o que permite ao aplicador dosar as sanções previstas em lei, até mesmo para deixar de decretar a sanção de perda do cargo, que deve ficar reservada aos casos mais graves.

Em remate, constitui máxima de hermenêutica não omitir os efeito sociais da interpretação. As ações de improbidade, bem como as ações populares e ações civis públicas, quase sempre envolvem aspectos fáticos de alta complexidade. Por isso, não parece viável substituir a atuação de centenas de procuradores da República, promotores de Justiça e magistrados nessas ações, pela luta quixotesca de doze homens: um Procurador-Geral da República e onze ministros do Supremo Tribunal Federal.


Notas

1 Quanto ao foro para ação popular e ação civil pública, as alterações propostas, segundo o texto da Proposta de Emenda à Constituição nº 358/05, em trâmite na Câmara dos Deputados, são as seguintes: 1) "julgamento do Prefeito, por atos praticados no exercício da função ou a pretexto de exercê-la, perante o Tribunal de Justiça" (art. 29, X); 2) competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar, originariamente, "[...] a ação popular e a ação civil pública contra atos do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal" (art. 102, I, d ); 3) competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar, originariamente, "[...] as ações populares e as ações civis públicas contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal" (art. 105 I b). No que concerne à ação de improbidade, propugna-se pela inclusão no texto constitucional do art. 97-A, cujo parágrafo único estatui que "A ação de improbidade de que trata o art. 37, § 4º, referente a crime de responsabilidade dos agentes políticos, será proposta, se for o caso, perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de função, observado o disposto no caput deste artigo" (Cf. BRASIL. Câmara dos Deputados. Consulta Tramitação das Proposições. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005).

2 Somente é apropriado falar em foro privilegiado no tocante a ação de que possa resultar aplicação de sanção ao acusado; por conseguinte, não se deve incluir nessa categoria a previsão de competência originária dos tribunais para o processo e julgamento dos seguintes remédios constitucionais: habeas corpus, habeas data, mandado de segurança e mandado de injunção.

3 Parte da Reforma do Judiciário, aprovada em segundo turno pelo Senado Federal sem modificações ao texto aprovado pela Câmara dos Deputados, foi promulgada como Emenda Constitucional nº 45, em 8 de dezembro de 2004.

4 Entendemos que a competência hierárquica ou funcional no fundo resulta em uma competência pessoal, sobretudo quando protege a autoridade beneficiária contra qualquer tipo de acusação, ainda que fundada em fatos estranhos ao exercício da função púbica.

5 cf. nota 1 supra.

6 Desenvolvimento singular apresenta o privilégio de foro para deputados federais e senadores, contemplado no art. 102, I, b, da vigente Constituição. Instituído em 1824, pela Constituição do regime monárquico, fora extinto pela primeira Constituição da República, de 1891, somente voltando a obter consagração constitucional em 1969, com a publicação da Emenda Constitucional nº 01 à Constituição de 1967.

Em voto-vista proferido no julgamento do Inquérito nº 687-SP, o Ministro Sepúlveda Pertence anotou, após pesquisa de Direito Constitucional Comparado, que somente encontrara regra semelhante à que estipula privilégio de foro para membros do Congresso Nacional nas Constituições da Espanha (art. 71, 4) e da Venezuela (art. 215, 1º e 2º). Com relação à Constituição da Venezuela, assentou o Ministro que "a competência da Suprema Corte é restrita a ‘declarar se há procedência ou não para o julgamento’ e, em caso afirmativo, remeter o caso ao tribunal comum competente, onde, no entanto, a instauração do processo contra membro do Congresso dependerá da licença da sua Câmara (Const., art. 144)" (Revista Trimestral de Jurisprudência, v. 179, p. 934, jan/mar 2002).

7 "EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. PROCESSO CRIMINAL CONTRA EX-DEPUTADO FEDERAL. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA. INEXISTÊNCIA DE FORO PRIVILEGIADO. COMPETÊNCIA DE JUÍZO DE 1º GRAU. NÃO MAIS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CANCELAMENTO DA SÚMULA 394. 1. Interpretando ampliativamente normas da Constituição Federal de 1946 e das Leis nºs 1.079/50 e 3.528/59, o Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência, consolidada na Súmula 394, segunda a qual, ‘cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício’. 2. A tese consubstanciada nessa Súmula não se refletiu na Constituição de 1988, ao menos às expressas, pois, no art. 102, I, ‘b’, estabeleceu competência originária do Supremo Tribunal Federal, para processar e julgar ‘os membros do Congresso Nacional’, nos crimes comuns. Continua a norma constitucional não contemplando os ex-membros do Congresso Nacional, assim como não contempla o ex-Presidente, o ex-Vice-Presidente, o ex-Procurador-Geral da República, nem os ex-Ministros de Estado (art. 102, I, ‘b’ e ‘c’). Em outras palavras, a Constituição não é explícita em atribuir tal prerrogativa de foro às autoridades e mandatários, que, por qualquer razão, deixaram o exercício do cargo ou do mandato. Dir-se-á que a tese da Súmula 394 permanece válida, pois, com ela, ao menos de forma indireta, também se protege o exercício do cargo ou do mandato, se durante ele o delito foi praticado e o acusado não mais o exerce. Não se pode negar a relevância dessa argumentação, que, por tantos anos, foi aceita pelo Tribunal. Mas também não se pode, por outro lado, deixar de admitir que a prerrogativa de foro visa a garantir o exercício do cargo ou do mandato, e não a proteger quem o exerce. Menos ainda quem deixa de exercê-lo. Aliás, a prerrogativa de foro perante a Corte Suprema, como expressa na Constituição brasileira, mesmo para os que se encontram no exercício do cargo ou mandato, não é encontradiça no Direito Constitucional Comparado. Menos, ainda, para ex-exercentes de cargos ou mandatos. Ademais, as prerrogativas de foro, pelo privilégio, que, de certa forma, conferem, não devem ser interpretadas ampliativamente, numa Constituição que pretende tratar igualmente os cidadãos comuns, como são, também, os ex-exercentes de tais cargos ou mandatos. 3. Questão de Ordem suscitada pelo Relator, propondo cancelamento da Súmula 394 e o reconhecimento, no caso, da competência do Juízo de 1º grau para o processo e julgamento de ação penal contra ex-Deputado Federal. Acolhimento de ambas as propostas, por decisão unânime do Plenário [...]" (RT J, v. 179, p. 912 e ss.).

8 "Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

§ 1º - A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

[...]".

9Informativo STF, nº 286, 14 a 18 out. 2002. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005.

10 Considerou-se, nos termos dos fundamentos do voto do Min. Gilmar Mendes, a necessidade de se garantir a determinadas categorias de agentes públicos, como a dos advogados públicos, maior independência e capacidade para resistir a eventuais pressões políticas, e, ainda, o disposto no § 1º do art. 125 da CF, que reservou às constituições estaduais a definição da competência dos respectivos tribunais (Informativo STF, nº 372, 29 nov. a 3 dez. 2004. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005).

11 O Tribunal, em questão de ordem no Inquérito 1.660-DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, reconheceu a sua competência para conhecer e julgar queixa-crime contra o Advogado-Geral da União, tendo em vista a edição da Medida Provisória 2.049-22, de 28.8.2000, que transformou o cargo de Advogado-Geral da União, anteriormente de natureza especial, em cargo de ministro de Estado, atraindo a incidência do art. 102, I, c, da CF, de acordo com o qual compete ao STF processar e julgar, originariamente, nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os ministros de Estado (cf. Informativo STF, nº 201, 4 a 8 set. 2000. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005). Posteriormente, no Inq. 2.044 QO/SC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, o Tribunal reafirmou a dicotomia entre os cargos de Ministro de Estado, atualmente fixados pelo art. 25, parágrafo único, da Lei nº 10.863/2003 ("São Ministros de Estado os titulares dos Ministérios, o Chefe da Casa Civil, o Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, o Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, o Chefe da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais da Presidência da República, o Advogado-Geral da União, o Ministro de Estado do Controle e da Transparência e o Presidente do Banco Central do Brasil"), e os de natureza especial que conferem prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos primeiros, constantes no art. 38, § 1º, da mesma lei ("Art. 38. São criados os cargos de natureza especial de Secretário Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, de Secretário Especial de Agricultura e Pesca, de Secretário Especial dos Direitos Humanos e de Secretário Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. § 1º. Os cargos referidos no caput terão prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos de Ministro de Estado"). Entendeu-se, no caso, que o secretário especial de agricultura e pesca, por não ser ministro de Estado, não possui a prerrogativa de foro estabelecida no parágrafo único do art. 25, da Lei 10.683/2003, e que a extensão de prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos ministros de Estado a que alude o §1º do art. 38 da referida lei repercute somente nas esferas administrativa, financeira e protocolar, mas não na estritamente constitucional (cf. Informativo STF, nº 374, 13 a 17 dez. 2004. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005).

12 O caso mais recente, a espelhar fraude manifesta à Constituição Federal, foi o reconhecimento, por Medida Provisória (Medida Provisória nº 207/2004 – a "MP do Meireles", como ficou conhecida, em alusão ao beneficiário direto da medida –, convertida na Lei nº 11.036/2004), do "status" de ministro de Estado a presidentes e ex-presidentes do Banco Central, com o objetivo confesso de "blindar" – conforme amplamente noticiado pela imprensa – o atual presidente da autarquia, Henrique Meireles, de investigação promovida pelo Procuradoria da República no Distrito Federal. Ressalta-se de pitoresco no caso, além da espécie legislativa empregada, o fato de o Banco Central, cujo presidente foi agraciado com o "status" de ministro de Estado, estar vinculado a um ministério, qual seja, o Ministério da Fazenda (Decreto nº 5.136/2004, art. 2º, IV, a).

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13 Em despacho prolatado na Petição nº 1.199-6/SP, o Min. Celso de Mello, em percuciente análise, salientou os preceitos constitucionais que compõem o estatuto jurídico concernente ao ministro de Estado: (a) competência para referendar atos e decretos do presidente da República (art. 87, parágrafo único, I); (b) definição do órgão judiciário competente para apreciar mandados de segurança e habeas corpus (art. 105, I, b e c); (c) prerrogativa de foro ratione numeris perante o STF, nas infrações penais comuns (CF, art. 102, I, c), ou perante o Senado Federal, na hipótese de crime de responsabilidade conexo com ilícito da mesma natureza praticado pelo presidente da República (art. 52, I); (d) regramento pertinente à remuneração funcional (CF, art. 49, VIII); e (e) direito de comparecer, por sua iniciativa, perante as casas do Congresso ou qualquer de suas comissões (art. 50, § 1º) (apud Moraes, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 1273-1274). A natureza específica do estatuto constitucional do ministro de Estado não passou despercebida ao Min. Carlos Brito, que, após sublinhá-la, em decisão proferida na Rcl. 2.417/SC, pontificou: "V- Esse vínculo funcional que a Magna Carta estabelece entre ministro e ministério não pode sofrer desfazimento por conduto de lei. A lei menor não pode desenlaçar os dois termos. São coisas inapartáveis, por definição, pois o regime jurídico de uma e de outra figura, à semelhança do enlace operacional entre Presidência e Presidente, decorre é do Texto Magno mesmo. [...] VI - É nessa constitucional condição de titular de um ministério – unidade mais importante de toda a Administração Pública Federal – que o Ministro de Estado desfruta de foro especial. Foro especial por prerrogativa de função... ministerial. Tudo resultante de comando ainda uma vez emitido pela Constituição Republicana, diretamente. Insuscetível de remodelagem por outro cinzel legislativo que não seja daquela mesma estirpe constitucional. 16. Este encadeado raciocínio não recusa à lei menor a força de conferir ‘status’ de ministro, para certos efeitos, a quem ministro não é. São os contraídos efeitos a que se refere o percuciente Ministro Celso de Mello, já mencionados linhas atrás. Modo criativo e pragmático de sobrevalorizar determinadas funções e autoridades, mas sem aquela plenitude eficacial que implicaria até mesmo ampliar o rol das competências do Supremo Tribunal Federal. 17. Esclareça-se que esta mesma lucubração não importa desconhecer que é próprio da lei menor criar ministérios e os cargos de Ministros de Estado. Evidente. O que se está a negar é a possibilidade de a lei infraconstitucional separar o que a Constituição uniu. Tal como se diz na liturgia católica dos casamentos, com a frase altissonante: ‘O que Deus uniu, o homem não separe’" (Informativo STF, nº 376, 14 a 18 fev. 2005. Disponível em: . Acesso em: 2 mar 2005).

14 De acordo com a notícia da proposta, publicada no sítio Consultor Jurídico (), em 26 de novembro de 2004, "o anteprojeto prevê que, nos crimes comuns, praticados no desempenho da profissão perante juízos federais de primeira instância, o advogado será processado e julgado pelos Tribunais Regionais Federais. Quando o crime comum for praticado no desempenho profissional, perante juízes de primeira instância estadual, o advogado será processado e julgado pelos tribunais de justiça".

Consta das justificativas da proposta:

"[...] a Constituição Federal, secundada pelas constituições estaduais e por leis infra-constitucionais, dentre essas as leis e códigos de organização judiciária dos diversos Tribunais de Justiça do país, consagra aos magistrados e membros do Ministério Público o foro especial por prerrogativa de função, sendo que a esses dois órgãos fica garantido o postulado do juiz natural ‘diferenciado’ (CF, art. 5º, LIII), na forma dos diplomas legais mencionados.

Por outro lado, o arcabouço legal pátrio não deu o mesmo tratamento aos advogados, não obstante tenha preceituado o artigo 133 da Constituição da República que ‘O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei’.

Na mesma linha de entendimento, o artigo 2º da Lei n. 8.906/94 estabelece que ‘O advogado é indispensável à administração da justiça’ e em seu Parágrafo 1º acentua que ‘no seu ministério privado, o advogado contribui na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem munus público’.

[...]

Pois bem, sendo o advogado ‘indispensável à administração da justiça’; prevendo a lei que mesmo ‘no seu ministério privado’ ‘seus atos constituem munus público’, portanto exercente de função pública, nada há a impedir que aos advogados seja atribuído o mesmo privilégio de foro decorrente da prerrogativa de função dispensado aos magistrados e membros do Ministério Público".

15 Cf. a decisão proferida no Agravo Reg. em Reclamação nº. 1.110-1/DF, Relator Min. Celso de Mello, na qual se mencionam vários precedentes da Suprema Corte (In: Informativo STF, nº 172, 22 a 26 nov. 1999. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005).

16Cf. Informativo STF, nº 291, 18 a 22 nov. 2002. Disponível em: . Acesso em: 2 mar 2005. Na sessão de julgamento da reclamação, acompanharam o relator os Ministros Gilmar Mendes, Ellen Gracie, Maurício Corrêa e Ilmar Galvão. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Velloso, não havendo reiniciado até o presente momento.

17 O foro especial para as Ações de Improbidade Administrativa e a Lei 10.62/02. In: BUENO, Cassio Scarpinella; PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Coords.). Improbidade Administrativa – questões polêmicas e atuais. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 457.

18 BUENO, C. S. Idem, p.440.

19 Cf. Informativo STF, nº 362, 20 a 24 set. 2004. Disponível em: . Acesso em: 2 mar 2005.

20 Op. cit., p. 2681-2682. Nessa esteira, lembra Fábio Konder Comparato que "a vedação de prerrogativa de foro costuma, com muito boa razão, vir expressa juntamente com a proibição de se criarem tribunais de exceção. E a razão é intuitiva. A livre instituição de privilégios jurisdicionais, se levada às suas últimas e naturais conseqüências, acabaria por revogar todo o ordenamento da competência judiciária e, por eliminar, em conseqüência, juntamente com a submissão de todos, sem discriminações, aos mesmos juízes e tribunais, a regra de que os órgãos do Poder Judiciário devem ser, pela sua própria natureza, permanentes e não circunstanciais" (Ação de Improbidade: Lei 8.429/92. Competência ao Juízo do 1º grau. Boletim dos Procuradores da República, ano 1, n. 9, p. 6, jan. 1999).

21RTJ, v. 179, p. 943.

22 Despacho proferido na Pet-3270/SC, em 18 de novembro de 2004 (In: Informativo STF, nº 370, 15 a 19 nov. 2004. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2005).

23 "A vedação de privilégio pessoal não decorre apenas do princípio da isonomia, mas também da natureza republicana do regime adotado. Na República, como ninguém ignora, nenhum particular é dono do poder, mas todos os que o exercem devem ser considerados meros funcionários ou servidores do bem comum (res publica)" (Ação de Improbidade..., cit., p. 7).

24 "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte" (Constituição Federal, art. 5º, § 2º).

25 A Lei nº 10.628/2002, fonte de inspiração da Reforma do Judiciário, no que concerne às inovações sob análise, modificou a redação do art. 84 do Código de Processo Penal, para conferir foro privilegiado a ex-autoridades – que são cidadãos comuns –, em relação a atos administrativos praticados durante o exercício da função pública.

26 MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. 2. ed. rev. e atual. por Eduardo Reale Ferrari. Campinas: Millennium, 2000. v. 1, p. 220-224; MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 5 ed. São Paulo: Editora Atlas, 1997, p. 161; TOJAL, Sebastião Botto de Barros; CAETANO, Flávio Crocce. In: BUENO, Cassio Scarpinella; PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Coords.). Improbidade Administrativa – questões polêmicas e atuais. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 393 e ss; TOURINHO FILHO, Fernando. Da competência pela prerrogativa de função. Revista dos Tribunais, ano 92, vol. 809, p. 397 e ss., mar. 2003; WALD, Arnold; MENDES, Gilmar. Ação de improbidade administrativa – competência. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, ano I, n. 5, maio 1997.

27 No julgamento do Inquérito nº 687-SP, acima referido, foi citado trecho do voto do Ministro Victor Nunes Leal, proferido na Reclamação nº 473, que sintetiza bem o entendimento da Corte: "A jurisdição especial, como prerrogativa de certas funções públicas é, realmente, instituída não no interesse pessoal do ocupante do cargo, mas no interesse público do seu bom exercício, isto é, do seu exercício com o alto grau de independência que resulta da certeza de que seus atos venham a ser julgados com plenas garantias e completa imparcialidade. Presume o legislador que os tribunais de maior categoria tenham mais isenção para julgar os ocupantes de determinadas funções públicas, por sua capacidade de resistir, seja à eventual influência do próprio acusado, seja às influências que atuam contra ele. A presumida independência do tribunal de superior hierarquia é, pois, uma garantia bilateral, garantia contra e a favor do acusado" (RTJ, v. 179, p. 927-928).

28 Nas palavras do Min. Carlos Velloso: "O foro por prerrogativa de função constitui, na verdade, um privilégio, que não se coaduna com os princípios republicanos e democráticos. O princípio da igualdade é inerente à República e ao regime democrático" (Inquérito nº 687-SP. RTJ, v. 179, p. 946). Digno de menção é o desabafo do Min. Celso de Mello na citada Pet. 3270/SC: "A evolução histórica do constitucionalismo brasileiro, analisada na perspectiva da outorga da prerrogativa de foro, demonstra que as sucessivas Constituições de nosso País, notadamente a partir de 1891, têm se distanciado, no plano institucional, de um modelo verdadeiramente republicano. Na realidade, as Constituições republicanas do Brasil não têm sido capazes de refletir, em plenitude, as premissas que dão consistência doutrinária, que imprimem significação ética e que conferem substância política ao princípio republicano, que se revela essencialmente incompatível com tratamentos diferenciados, fundados em ideações e em práticas de poder que exaltam, sem razão e sem qualquer suporte constitucional legitimador, privilégios de ordem pessoal ou de caráter funcional, culminando por afetar a integridade de um valor fundamental à própria configuração da idéia republicana, que se orienta pelo vetor axiológico da igualdade" (Informativo STF, nº 370).

29 Em sentido contrário, João Barbalho, em seu clássico Constituição Federal Brasileira, reputa a inviolabilidade por opiniões palavras e votos um privilégio, e não uma prerrogativa, chegando a afirmar: "Liberdade e responsabilidade são termos correlatos; e pode-se discutir muito livremente sem abusar da palavra" (Apud FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Comentários à Constituição Brasileira de 1988. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1997, v. 1, p. 320).

30 Fábio Konder Comparato, após ressaltar que os privilégios de foro representam uma exceção ao princípio constitucional da igualdade de todos perante a lei, assevera: "Em conseqüência, tais prerrogativas devem ser entendidas à justa, sem a mais mínima ampliação do sentido literal da norma. Se o constituinte não se achar autorizado a conceder a alguém mais do que a consideração de utilidade pública lhe pareceu justificar, na hipótese, seria intolerável usurpação do intérprete pretender ampliar esse benefício excepcional" (Ação de Improbidade..., cit., p. 9).

31 Isso não impede, evidentemente, a tarefa de mera concretização de reservas legais pelo próprio poder de reforma, pois, nesse caso, cuida-se apenas de disciplinar exceção já prevista expressamente no texto constitucional. Cabe frisar, também, que as exceções a direitos e garantias constitucionais podem vir expressas no mesmo preceito que os assegura ou em outro dispositivo da Constituição. A leitura do art. 5º da Constituição fornece vários exemplos da primeira hipótese, contribuindo ainda para a compreensão do regime de restrição de direitos e garantias individuais: "VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei"; "XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial"; "XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal"; "XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição"; "XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado"; "XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu"; "XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX... "; "LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei"; "LX - a lei poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem"; "LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei"; "LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

32 Na visão do autor, as cláusulas pétreas podem ser revistas pelo poder constituinte derivado, o que permite, em um subseqüente processo de revisão, a modificação das relações por elas protegidas (teoria da dupla revisão); contudo, adverte Jorge Miranda, essas cláusulas, enquanto não forem revistas, vinculam o poder reformador (MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 418). No Brasil, comunga da mesma tese FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Significação e Alcance das Cláusulas Pétreas. Revista de Direito Administrativo, v. 202, p. 14-15, out./dez. 1995.

33 MIRANDA, J. Idem, p. 426. Vale rememorar, também, a clássica lição de José Afonso da Silva: "É claro que o texto não proíbe apenas emendas que expressamente declarem: ‘fica abolida a Federação ou a forma federativa de Estado’, ‘fica abolido o voto direto... ’, ‘passa a vigorar a concentração de Poderes’, ou ainda ‘fica extinta a liberdade religiosa, ou de comunicação...’, ou o habeas corpus, o mandado de segurança... ’. A vedação atinge a pretensão de mofificar qualquer elemento conceitual da Federação, ou o voto direto, ou indiretamente restringir a liberdade religiosa, ou de comunicação ou outro direito e garantia individual; basta que a proposta de emenda se encaminhe ainda que remotamente, ‘tenda’ (emendas tendente, diz o texto) para a sua abolição" (Curso de Direito Constitucional Positivo, 13 ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1997, p. 69).

34 "Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e Lei Complementar. IPMF. Imposto Provisório sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – IPMF. Artigos 5º, § 2º, 60, § 4º, incisos I e IV, 150, incisos III, b, e VI, a, b, c e d, da Constituição Federal.

I – Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é de guarda da Constituição (art. 102, I, a, da CF).

II – A Emenda Constitucional nº 3, de 17-3-1993, que, no art. 2º, autorizou a União a instituir o IPMF, incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no § 2o desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica ‘o art. 150, III, b e VI’, da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros):

1º – o princípio da anterioridade, que é garantia individual do contribuinte (art. 5º, § 2º, art. 60, § 4º, inciso IV, e art. 150, III, b, da Constituição);

2º – o princípio da imunidade tributária recíproca (que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que é garantia da Federação (art. 60, § 4º, inciso I, e art. 150, VI, a, da CF);

3º – a norma que, estabelecendo outras imunidades, impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre:

b) templos de qualquer culto;

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e

d) livros, jornais, periódicos e o papel destinados a sua impressão..." (Revista Trimestral de Jurisprudência, v. 151, p. 755-756, out. 1996).

35RT J, v. 151, p.812.

36 Idem, p.823.

37 Idem, p.827.

38 Idem, p.830-831.

39 Francisco Campos já defendia a interpretação restritiva dos privilégios, nestes termos: "As Assembléias democráticas tem uma tendência muito pronunciada a exagerar o sentimento de sua própria importância, o que as conduz, muitas vezes, a estender, além do limite razoável, as prerrogativas e privilégios que elas julgam essenciais à garantia e defesa de sua independência. Tanto quanto, porém, matéria tão plástica e difusa, própria a ser afeiçoada ao capricho das oportunidades e ao sabor do sentimento e emoções, a que se acham tão expostas as Assembléias Legislativas, comporta regras e princípios, o princípio que dever presidir à interpretação ou construção dos privilégios parlamentares é o de que devem ser entendidos nos seus termos estritos, como toda exceção às regras gerais de imputabilidade e de responsabilidades, particurlamente em regimes democráticos, em que o postulado da igualdade perante a lei só deve declinar em casos absolutamente excepcionais e por motivo de rigorosa necessidade ou utilidade pública" (Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1956, vol. II, p. 107. Apud FIGUEIREDO, Marcelo. Improbidade Administriva – Comentários à Lei 8.429/92 e legislação complementar. 5 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 20).

40 Aspectos procedimentais do instituto jurídico do "impeachment" e conformação da figura da improbidade administrativa. Revista dos Tribunais, ano 81, vol. 685, p. 286-289, novembro de 1992.

41 Idem, p. 292.

42 Ação de improbidade administrativa – competência. Revista Jurídica Consulex, ano I, n. 5, maio 1997.

43 Sobre a natureza penal do crime de responsabilidade na jurisprudência do STF, cf. MORAES, op. cit., p. 1245.

44 Ação de Improbidade..., cit., p. 7. No mesmo sentido, MORAES. A. de, op. cit., p. 2648. Acrescenta, ainda, Marcelo Figueiredo: "Do mesmo modo é a exegese do art. 15, III e V, da CF, onde se vê que ‘é vedada a casssação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: (...) III – condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos’. A hipótese de improbidade está alojada em outro dispositivo, no inciso V desse mesmo artigo, tudo a indicar que se trata de um instituto e de uma ação, de uma categoria (improbidade) autônoma, que não se confunde com a outra, o crime, ou com os meios de combate à imoralidade administrativa, tais como a indisponibilidade de bens etc." (Op. cit., p. 25). Conforme verberou Renato Flávio Marcão, confundir improbidade administrativa com ilícito penal "constitui erro grosseiro" (Foro Especial por Prerrogativa de Função: o novo artigo 4 do Código de Processo Penal. Revista Jurídica, Ano 51, n. 306, p. 71, Abril de 2003).

45 Acerca da distinção entre ato de improbidade administrativa e crime de responsabilidade, é bastante esclarecedor o artigo de Jonas Sidnei Santiago de Medeiros Lima, intitulado "Ato de improbidade administrativa não é de competência originária do STF nem do STJ" (In: Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 61, jan. 2003. Disponível em: jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3633>. Acesso em: 10 dez. 2004).

Observa o autor que na justificação do projeto de Lei nº 23/1948, que deu origem à Lei nº 1.079/1950 (Lei dos Crimes de Responsabilidade), já constava o entendimento de que o "impeachment" é um instituto de direito constitucional, de natureza "eminentemente política", cujo objetivo histórico é o afastamento definitivo de determinados agentes políticos acusados de crime de responsabilidade. Tendo em vista a finalidade do instituto, dispôs o art. 42 da mencionada lei que a denúncia por crime de responsabilidade "só poderá ser recebida se o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo". Outrossim, a Lei nº 1.079/1950 ressalvou, em seu art. 3º, que o processo por crime de responsabilidade, a cargo especialmente do Senado Federal e das Assembléias Legislativas, não excluiria o processo e julgamento do acusado por crime comum, na justiça ordinária, nos termos das leis de processo penal.

Prosseguindo a análise, registra Jonas Lima que a idéia de estatuir um procedimento judicial para punição dos agentes públicos em geral – com desdobramentos não apenas funcionais, mas também cíveis, conforme requerido pelo artigo 37, § 4º, da Constituição Federal – somente veio com a Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa). Instituiu-se, assim, em consonância com a Constituição Federal – que não previu foro privilegiado em ação de improbidade – "um procedimento judicial, de natureza cível, a tramitar na Justiça Comum ou Federal de Primeira Instância, independente da autoridade envolvida, seguindo o rito ordinário do Código de Processo Civil". Nesse contexto, estabeleceu a referida lei: "Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, [...] serão punidos na forma desta lei" (art. 1°, caput); "Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior" (art. 2°); "Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos" (art. 4°).

Segundo o autor, portanto, o julgamento político de um agente, por crime de responsabilidade, não exclui o julgamento do mesmo na esfera judicial, por ato de improbidade administrativa; além disso, entende, não há razão para qualquer distinção, nem na Constituição, nem na Lei de Improbidade, entre ato de improbidade administrativa cometido por agente político e por agente público comum.

No mesmo sentido, esclarece Mônica Nicida Garcia que, em relação aos agentes políticos, a responsabilização puramente administrativa, apurada mediante processo disciplinar, é substituída pela político-administrativa, relativa aos crimes de responsabilidade. A sujeição a essa esfera, todavia, não exclui a incidência das demais esferas a que estão sujeitos todos os agentes públicos: a penal, a civil e a da improbidade administrativa (Agente Político, Crime de Responsabilidade e Ato de Improbidade, in Boletim dos Procuradores da República, Ano V, nº 56, p. 15, dez. 2002).

46 Consoante sublinhado por Jonas Lima, enquanto a lei antiga, dos crimes de responsabilidade, permite a perda do cargo pelo julgamento político, sem maiores desdobramentos, a lei nova, que criou um procedimento judicial para apuração de atos de improbidade, somente permite a perda do cargo após o trânsito em julgado da sentença condenatória (Ato de improbidade administrativa não é..., cit.). Discordamos, portanto, de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para quem a aplicação da Lei de Improbidade, apenas com relação a alguns agentes políticos, deve limitar-se às sanções de caráter indenizatório, já que a perda do mandato desses agentes estaria disciplinada por dispositivos constitucionais específicos (Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2001, p. 663).

47A prevalecer a tese da equiparação entre improbidade administrativa e crime de responsabilidade, pois, resta admitir que os agentes políticos sujeitos a processo e julgamento perante o Senado Federal, por crime de responsabilidade, estão imunes a tais medidas – as quais, em virtude de sua própria natureza, sequer constam da Lei nº 1.079/50.

48 MIRANDA, Jorge. Op. cit., p. 413.

49 Constituição Francesa de 1793, art. 28. Apud FERREIRA FILHO, M. G. Significação e Alcance..., cit., p.12.

50 SAGÜÉS, Néstor Pedro. Teoría de la Constitución. Buenos Aires: Editorial Astrea, 2004, p.311.

51 Não é por outra razão que alguns autores, embora céticos quanto ao alcance das cláusulas pétreas, reconhecem que elas são eficazes enquanto vigorarem. Cf. nota 32, supra.

52 "Nenhuma lei constitucional evita o ruir dos muros dos processos históricos, e, conseqüentemente, as alterações constitucionais, se ela já perdeu a sua força normativa. Os limites são limites do poder de revisão como poder constituído não são ‘limites para sempre’, vinculativos de toda e qualquer manifestação do próprio poder constituinte. Em sentido absoluto, nunca a ‘geração’ fundadora pode vincular eternamente as gerações futuras. Esta é uma das razões justificativas de previsão, em algumas constituições, de uma revisão total. Caso contrário, a falta de alternativa abriria o campo da Revolução Jurídica. Mas há também que assegurar a possibilidade de as constituições cumprirem a sua tarefa e esta não é compatível com a completa disponibilidade da constituição pelos órgãos de revisão, designadamente quando o órgão de revisão é o órgão legislativo ordinário. Não deve banalizar-se a sujeição da lei fundamental à disposição de maioria parlamentares ‘de dois terços’. Assegurar a continuidade da constituição implica, necessariamente, a proibição não só de uma revisão total (desde que isso não seja admitido pela própria constituição), mas também de alterações constitucionais aniquiladoras da identidade de uma ordem constitucional histórico-concreta. Se isso acontecer é provável que se esteja perante uma nova afirmação do poder constituinte mas não perante uma manifestação do poder de revisão. Mas se é de poder constituinte originário que se trata, então este tem de tornar transparente as novas pretensões legitimatórias de desencandeamento de um novo poder constituinte e a conseqüente instauração de uma nova ordem constitucional" (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2004, p. 1.065). Cf. a mesma lição em HESSE, Konrad, Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, Tradução da 20ª edição alemã por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1998, p. 511-512.

53Fragmentos (sobre) o Poder Constituinte do Povo. Tradução de Peter Naumann. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 128.

54 Sobre a necessidade de imprimir máxima eficácia jurídica à cláusula, destaca-se a advertência de Friedrich Müller: "As legitimações extramundanas (por conseguinte, supramundanas) das pessoas/dos grupos dominantes, por meio da afirmação de governar para o povo e no seu melhor interesse, foram formuladas a serviço da boa moral dos donos do poder diante de Deus. Desde que eles foram substituídos pela coação intramundana das pessoas/dos grupos dominantes, de invocar ‘o povo’ – agora, portanto, a serviço da posição real de poder dos donos do poder, diante dos por eles dominados –, desde então existem textos sobre um ‘poder constituinte’ [...] Com vista a uma sistemática das locuções ideológicas, ‘poder constituinte’ aparece como ponto inicial de uma deformação de Constituições, cujo ponto terminal pode ser reconhecido no discurso sobre a ‘unidade da constituição’. Na prática, os dois padrões de texto são utilizados como elementos exordiais e terminais de ideologia constitucional aplicada. Em vez disso, a expressão ‘poder constituinte’ interessa-nos aqui como texto jurídico (não como texto ideológico); e isso quer dizer, como parte integrante normal dos documentos constitucionais nos quais ela aparece. Por que essa opção? Conceitos não são usados gratuitamente. Diplomas constitucionais não falam impunemente do ‘poder constituinte’; e se o fazem, deveríamos puni-los por isso – tomando a expressão do poder constituinte ao pé da letra" (Idem, p. 19-20).

55 "En consecuencia, la manera de salvar el principio proclamado, de que el poder constituyente debe ejercerlo el pueblo de un modo directo, consiste en someter la sanción de las constituciones y de las reformas constitucionales al voto popular, es decir, al referéndum plebiscitario, que en realidad reemplaza práticamente y en la única forma posible a la apella espartanta, a la ecclesia ateniense, a los comicios romanos, al witenagemot teutón y al landsgemeinde suizo. Claro está que la celebración de tales consultas populares debe hacerse com tanta honradez y lealtad que no quepa duda alguna respecto a la autenticidad del resultado. De lo contrario, se convertiría en un arma muy peligrosa. En manos de gobernantes arbitrarios y despóticos, llegaría a ser un indsperable instrumento de opresión, com la ventaja de la irresponsabilidad" (SÁNCHEZ VIAMONTE, Carlos. El poder constituyente. Buenos Aires: Editora Omeba, p. 114. Apud VANOSSI, Jorge Reinaldo A. Teoría Constitucional. 2. ed. atual. Buenos Aires: Depalma, 2000, v. 1, p. 312, nota 45).

56 Certamente, essa posição levanta dificuldades no tocante aos direitos das minorias, que não podem ser olvidados; mas essas dificuldades, que invariavelmente confluem para as grandes questões do Estado e do Direito, não diferem das que se apresentam na elaboração de uma constituição.

57 Discordamos, pois, de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que defende a interpretação restritiva das cláusulas pétreas, ao argumento de que a limitação ao poder de reforma constitucional não é a regra, mas a exceção (Significação e Alcance..., cit., p. 17). Ora, sob outro ângulo de análise, vê-se que essas cláusulas compõem o núcleo material da constituição, ou seja, a própria essência desta, o que impede sejam as mesmas tratadas de forma meramente acidental.

58 "O regular funcionamento da economia exige transparência e estabilidade, características de todo incompatíveis com práticas corruptas. A ausência desses elementos serve de desestímulo a toda ordem de investimentos, que serão direcionados a territórios menos conturbados, o que, em conseqüência, comprometerá o crescimento, já que sensivelmente diminuído o fluxo de capitais" (GARCIA, Emerson. A corrupção – uma visão jurídico-sociológica. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 323, 26 maio 2004. Disponível em: http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=5268. Acesso em: 14 dez. 2004. p. 11).

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Sobre o autor
Luciano Rolim

Procurador da República no Distrito Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROLIM, Luciano. Limitações constitucionais intangíveis ao foro privilegiado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 629, 29 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6510. Acesso em: 24 nov. 2024.

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