A internação compulsória dos usuários de drogas e a dignidade da pessoa humana

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Abordar as consequências que as medidas de internação compulsória causa na vida dos usuários de drogas e de toda a sociedade.

        

RESUMO: Esta pesquisa tem como tema a internação compulsória dos usuários de drogas e a dignidade da pessoa humana, uma vez que o cenário brasileiro contemporâneo possui uma ótica voltada para os limites que devem ser observados entre a ordem social e o respeito à pessoa humana como sujeito de direito. Os objetivos deste trabalho foram: a) apresentar a visão histórica da política nacional de drogas no Brasil; b) destacar a importância do principio da dignidade humana e sua influência para com todas as decisões judiciais do país; c)exteriorizar o prejuízo causado nas vidas dos usuários de drogas pela utilização desta lei; d) demonstrando a real origem da Lei de Internação Compulsória a fim de se constatar as razões para a sua aplicação aos dias de hoje. Esta pesquisa teve como método a revisão da doutrina, das Leis e da jurisprudência emanada de diferentes tribunais. Os resultados mostraram que a utilização das medidas de internação compulsória só causa mais danos, pois um sistema punitivo de forma exaustiva não alcança a reintegração desejada.

Palavras-chave: ser humano; criminalização das drogas; mínimo existencial; violação.

~¹Bacharelanda do Curso de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes [email protected]
             ²Pesquisadora no Mestrado em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e no Mestrado em Habitação doInstituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT-USP) e Dra. em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Líder do GRUPPU – Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas, CNPq [email protected]
 

1 INTRODUÇÃO
            A internação compulsória dos usuários de drogas é um assunto de suma importância nos dias atuais, porque o consumo de drogas cresce em números elevados.
A adoção dessa medida atende à vontade de parte da população, pois com a retirada dos usuários de drogas da vista da população tende – se a sensação de problema resolvido e caso encerrado. Porém, sabe – se que o tratamento de seres humanos vai além do confinamento em clínicas de forma forçada.
          O tratamento do ser humano de forma correta se inicia com respeito aos seus direitos fundamentais, ou seja, respeitando a dignidade da pessoa humana e sua liberdade de escolha.
          Este trabalho tem como objetivos mostrar a forma como as medidas de internação compulsória prejudica a vida dos seres humanos, contrariando, assim, as garantias constitucionais que assistem todo e qualquer ser humano.
         O método escolhido para este trabalho foi a revisão da doutrina, das Leis e das jurisprudências emanadas de diversos Tribunais.
          Abordado no presente trabalho o panorama histórico da política criminal de drogas no Brasil, a fim de se entender o porque da utilização desta medida nos dias de hoje e a demostração do prejuízo que a sua utilidade causa na vida dos usuários.

2 Política Criminal de Drogas no Brasil

No Brasil a criminalização das drogas presente desde a instituição das Ordenações Filipinas, promulgadas em 1603, classificada como o mais bem feito e duradouro Código legal português (CARVALHO, 2016).
             Com o aumento do consumo de substâncias psicotrópicas,as leis que regiam na época como, a Consolidação das Leis Penais de 1932, passam a regular a questão do uso dessas substâncias no capítulo reservado para os crimes contra a saúde pública.
              Foi a partir da década de 1940 que Carvalho (2016) verifica o surgimento da política proibicionista sistematizada, podendo notar que as políticas para o controle de drogas têm uma estruturação criada sob sistemas punitivos autônomos.
             Incorporada a Consolidação dessas diversas Leis Penais no Código Penal de 1940 (BRASIL, 1940), vigente até os dias de hoje, espelho das leis da década de 1930, que proíbe inúmeras substâncias consideradas entorpecentes. Sendo, porém, apenas na década de 1950 o surgimento do primeiro discurso relativamente coeso sobre as drogas ilegais e a necessidade de um controle repressivo.
             Em decorrência das políticas belicistas e armamentistas na década de 1960, observa – se juntamente com isso movimentos a popularização do consumo da maconha e do LSD, utilizadas como forma de protesto e elementos da cultura como música, literatura, vestuário, sexualidade etc. Compondo, assim, o quadro de manifestações estéticas das políticas de ruptura (CARVALHO,2016).
             Neste momento vê – se a criação de instrumentos de repressão no sentido da ideologia de diferenciação, traçando detalhadamente a figura do consumidor e do traficante, sendo vistos como o doente e o delinquente.
            Sendo mantido esse discurso médico – jurídico da década de 1960, com a identificação do usuário como dependente e o traficante como delinquente, nos dias atuais.
             A Lei nº 11.343 de 2006, atual lei de drogas, possibilitou o desencadeamento de política de repressão integrada, empregando técnicas do projeto global de guerra às drogas (BRASIL,2006).
            Sustentando – se no Brasil o sistema proibicionista no tripé ideológico representado pelos Movimentos de Lei e Ordem (MLD), pela Ideologia da Defesa Social (IDS) e de forma subsidiaria pela Ideologia da Segurança Nacional (ISN). Leis essas que surgem em meados de 1960, como resistência a contracultura, na busca de salvar e guardar os princípios éticos e morais, pelo fato dos movimentos e liberalidades estarem fortes na época (CARVALHO, 2016).
            Construindo o direito penal e as bases para combate ao narcotráfico, sob a ótica da punição. Estando sempre opostos a segurança e garantias penais.
             Destarte, a base para o tratamento dos usuários de entorpecentes é sobre o critério da punição.Pois, a violência empregada para os tratamentos é utilizada de forma exagerada e cruel, pela busca da limpeza rápida e não pensando na regeneração de fato do ser humano.
            Os discursos criminalizadores, segundo Carvalho (2016), dividem – se em três aspectos, os Movimentos de Lei de Ordem, Tolerância Zero e Esquerda Punitiva.
a) Movimentos de Lei e Ordem: emanados do discurso autoritário, reivindicando alta punibilidade as ofensas ligadas aos bens jurídicos de grupos de indivíduos sobre os delitos contra a pessoa e contra o patrimônio.
b) Tolerância Zero: salientada pela repressão à criminalidade de rua e bagatela, através de processos de higienização social a partir de normas penais sancionadoras de comportamentos individuais.
c) Esquerda Punitiva é caracterizada por ter forte potencialização do discurso repressivo, pois sua integração é baseada nos horizontes da punitividade.
            Embasado nos Movimentos de Lei e Ordem e nas políticas de Tolerância Zero, de forma paralela aos movimentos de direita punitiva, que tem seu programa de atuação no estreitamento do aparato penal carcerário, surge uma nova perspectiva criminalizadora, nomeada de Esquerda Punitiva.

Diante disso, permite – se o entendimento as políticas atuais utilizadas, com o enfoque na limpeza e punição sobre os dependentes, pois o sistema punitivo desmantela gradualmente a estrutura garantidora do direito penal e processual penal no Brasil, sendo consequentemente reduzido as ferramentas de tutela dos direitos fundamentais.
            Fatores esses que vêm aumentando há décadas notavelmenteem um estudo realizado com enfoque no Poder e Contrapoder destaca que ao fim da década de 1990, têm – se um crescimento significativo em relação aos moradores de ruas (GIORGETTI, 2007).
            Com o aumento entre os anos de 1980 e 1990 de moradores de rua e por ser efetivada a necessidade de um controle repressivo em 1950, erguendo – se uma repressão autoritária de diferenciação, surgindo uma separação de pessoas, que fica conhecida como a divisão de classes sociais dividindo – se as classes (GIORGETTI, 2007).
             Consequentemente com a divisão de classes têm – se um sobrestamento de uma classe sobre a outra, por condições sociais mais abastadas e julgadas melhores. Que de fato, sendo mais assistidos os resultados são diferentes em relação aos que menos têm para sobreviver.
             Esta separação de classes é a forma distorcida empregada na busca de uma solução efetiva para o problemado uso de drogas.
              As políticas utilizadas para solucionar o problema das drogas são focadas na higienização de locais e na exclusão de pessoas, fugindo totalmente da base principiológica dos direitos fundamentais.
             Permitindo, assim, entender a base da legislação vigente no Brasil e a postura adotada pelos governantes atualmente.
             A incorporação de uma política criminalizadora irracional e desumana, que ao invés de resolver o problema, causa prejuízos terríveis e por muitas vezes irreparáveis, para toda a sociedade, em flagrante violação aos princípios constitucionais, denegrindo os Direitos Humanos.
             Os princípios têm função estruturante em qualquer tipo de sistema, pois é a base. E espera – se que com a evolução de todo o sistema sua base seja conservada e cada vez mais lapidada para que não se perca frente aos problemas.
             Problemas esses que a cada tempo se amplia e dificulta mais, pelo simples fato do crescimento da população e dificuldades sociais que enfrenta – se, por falta de planeamento e políticas públicas que sejam capazes de resolver de fato a problemática e não apenas maquiar.
             Entretanto não se nota essa busca e conservação em relação ao respeito que se espera junto aos seres humanos.
            No Brasil existe o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, foi instituído no dia 23 de Agosto de 2006. É formado por um Conselho Nacional de Drogas vinculado ao Ministério da Justiça, pela Secretária Nacional Antidrogas (SENAD) e por outros órgãos e entidades que exercem atividades com o enfoque na preservação do uso indevido de drogas, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas (RAMOS, 2016).
             Prevê em sua integralidade a reinserção social do usuário de entorpecentes, visa o ser humano sob a ótica dos direitos fundamentais realmente.

3  Dignidade da Pessoa Humana Frente à Internação Compulsória

Muito presente em legislações de países que se autodenominam democráticos e nas declarações internacionais de direitos humanos, a dignidade da pessoa humana vem expressa, e por vezes implícita, é aceita como noção autoevidente não precisando ser demonstrada, sendo efetivamente presumida (WEYNE,2013).
              No Brasil está prevista na Constituição Federal de 1988, já em seu Título I – Dos Princípios Fundamentais, art. 1º, inciso III, sendo escolhida a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
              Segundo Weyne (2013) a real definição decorre de muitos debates e defendida pelos juristas e todos os cidadãos, caracterizada como a base de diversos atos e conquistas. Porém, não consiste na existência de uma definição sobre o que é a dignidade humana, seu conceito é muito amplo é ambíguo.
              O princípio da dignidade da pessoa humana, surge como base para o regimento das relações sociais e as condutas humanas, regendo todas as decisões e questionamentos arguidos no mundo jurídico, sua importância é significativa para todos. Entretanto, é muito discutido se trata – se de um princípio absoluto ou relativo (SANTOS, 2015).
              Constitui como o princípio mais básico para ser entendido no Direito, tendo uma clara prioridade hierárquica frente a todas as normas jurídicas, pois as norteiam.
              Não existindo a possibilidade de ser excluído do ordenamento, pois é considerado a maior conquista da modernidade.
               Ao falar sobre este princípio primordial não se pode deixar de tratar do mínimo existencial, tema que é subentendido dentro do próprio princípio e é deverás muito debatido também, pois é a linha que vincula o Estado e o particular (GUERRA, EMERIQUE,2006).
               Levantada a questão do mínimo existencial surgem inúmeras controvérsias, pois entre as garantias que é dever do Estado fornecer para todas as pessoas, a segurança e o direito a vida, o limite exigido para com os cidadãos fazer suas escolhas em razão de sua liberdade assegurada pelo princípio da liberdade.
               As garantias previstas no texto da Constituição Federal em seu art. 5º, incisos II e III, por exemplo, que garante a todas as pessoas a liberdade de não ser obrigado a nada, a não ser em virtude de lei e a garantia ao direito a vida e a integridade física e psíquica, sendo vedada a condução de pessoas a tratamentos de tortura ou degradante ou desumano (BRASIL,2017).
               Apesar dessas controvérsias suscitadas, chega – se àconclusão de que as defesas das liberdades e demais direitos fundamentais teriam prioridade total, sendo assim, absolutos, mesmo com as relatividades do sistema.
               Pois, busca – se sempre o respeito às formas e diversidades dos seres humanos viventes em sociedade. Linha esta de difícil determinação, perante a sociedade e grupos diversos buscando cada um os direitos fundamentais para proteger a sua “classe”. Comportamento este já comum entra a sociedade, que busca a proteção apenas dos seus semelhantes.
               Concentrando-se neste ponto a atuação do Estado, entre garantir os direitos igualitários para todos, respeitando suas vontades e mantendo a ordem social.
                Atuação esta falha em alguns aspectos, sendo um deles e talvez o mais problemático nos últimos anos, as medidas de internação compulsória dos usuários de drogas das ruas de todo o país.
               Medida que viola a vontade individual do ser humano e o leva a degradação de sua integridade, ferindo diversos aspectos em sua complexidade.
               Oportuno o estudo da Lei nº 10.216 de 2001, em sua real literalidade no capitulo 2.4 do presente trabalho.
               Focando o atual capítulo na demonstração deste supra princípio norteador de todo o sistema, enquadram – se todos os direitos garantidos pelas pessoas, como o direito à vida, à liberdade de ir e vir e o direito de tomar suas próprias escolhas, podendo ser colocado no mesmo degrau do direito a liberdade.
              Guerra e Emerique (2006) trazem a demonstração que o mínimo existencial está inserido no princípio da dignidade da pessoa humana, a fim de delimitar as garantias fundamentais para com essa sociedade que é fruto da época moderna e tão diversificada. Com a tamanha evolução e crescimento populacional, se têm mais litígios e, com isso, gera a necessidade de mais supervisão e respeito entre os integrantes da sociedade.
               Pois, um problema de décadas como o uso de drogas ilícitas em todo o país, principalmente na grande São Paulo, não será resolvido em dias ou meses, ainda mais quando que para isso utiliza – se medidas que ceifam vidas.

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4 Internação Compulsória – Lei nº 10.216/01

A legislação brasileira acompanhou o padrão europeu no que tange a respeito a internação compulsória. Tendo inicio com os leprosos e passando depois para os portadores de doenças venéreas, atéchegar aos considerados loucos (SANTOS,2015).
            Com precedentes franceses no ano de 1903 foi implantada no Brasil o primeiro decreto a tratar dessa matéria sobre doentes mentais. O Decreto – Lei nº 1.132 tinha como título o nome de Reorganiza a Assistência e Alienados (SANTOS, 2015).
            Sendo certo que este decreto não se atentava para a condição do doente, mas sim para manter a ordem pública. Deixando, assim, a saúde desses doentes mentais para segundo plano.
            Tal decreto previa que a internação se dava por requisição do Poder Público ou por requerimento de qualquer pessoa que vislumbrasse que uma outra pessoa fosse portadora de doença mental.
             Notando – se o absurdo e a falta de garantias fundamentais expressas, pois quando coloca – se o termo “qualquer pessoa”, é utilizado seu entendimento em sentido literal, pois a pessoa autora do requerimento para a internação não importava ser parente ou não. Além de que, era através do achismo das pessoas que se requisitava a internação de outra (SANTOS,2015).
             O Decreto – Lei nº 1.132/1903 vigorou até o ano de 1934, quando o Decreto – Lei nº 24.559 entrou em vigor (BRASIL,1934).
             Este novo decreto guardou alguns procedimentos do interior, porém inovando em outros aspectos.Um deles sendo a inovação quanto que a internação deveria ser acompanhada por médico ou profissional de assistência social ao paciente, visando agora a prevenção da doença tratada e não apenas a ordem pública.
             Na década de 60, o Brasil enfrentava o regime militar, época que foram criados os hospitais particulares para internação de doentes, conhecidos como manicômios. Perdurando por todo o regime militar, que com sua queda na década de 80 esses lugares foram abertos para que a população pudesse observar como eram os dias lá dentro e como as condições eram péssimas, refletindo a situação em que o país se encontrava (SANTOS, 2015).
            Apesar da realidade que se passava dentro dos manicômios, vindo à tona com a queda do regime militar, continuou a mesma legislação para com os doentes mentais até o ano de 1989.
            Foi neste ano, 1989, que inspirado na Lei nº 180/1978 da Itália, chamada de Reforma Psiquiátrica Italiana, momento em que surge um Projeto de Lei nº 3.653, propôs uma nova organização para o tratamento, prevenção e proteção dos alienados e psicopatas.
            Esse projeto após seu trâmite foi aprovada e sancionada em 2001 a Lei nº 10.216, sendo chamada por todos de Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira (BRASIL,2001).
            Pelo fato de este projeto prever a extinção dos manicômios, atingindo por consequência interesses empresariais e econômicos, o processo de aprovação da lei sofreu um retardamento gigantesco, processando – se sua apresentação no ano de 1989 e aprovado apenas em 2001, 12 anos depois.
           Considerando a necessidade de tratamento legal para a questão e pela inexistência de lei federal em vigência para tratar essas pessoas, neste espaço de 12 anos que perdurou para a aprovação do projeto, vários Estados aprovaram leis próprias, vigorando estas leis até o ano de 2001.
          Com as inovações que esta Lei da Reforma Psiquiátrica trouxe para o Brasil, começa – se a abranger também por analogia as pessoas que praticam o uso abusivo de substâncias entorpecentes.
          Por sua vez, esta analogia utilizada para fazer com que a lei da Reforma Psiquiátrica, ou seja, a lei que trata de pessoas com transtornos mentais, seja aplicada nos casos de pessoas que fazem o uso de substâncias entorpecentes é caracterizada uma analogia in mala partem aos usuários de drogas (COELHO, 2014).
           Notando–se pelo cenário atual que ocorre os mesmos atos de anos individuais de cada um.
Esta situação se repete pelo fato de não se ter políticas públicas para o tratamento desses usuários forma a visar primeiramente a reabilitação para que ocorra a volta dessas pessoas a sociedade de forma saldável.
            Este equívoco sobre a aplicação da lei é notado desde logo, com a leitura do artigo 1º da Lei nº 10.216/2001, pois nota –se que o legislador não deixou aberto margem para a interpretação extensiva:

Art. 1º Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.(BRASIL, 2001)
Grifei

Tendo por finalidade a medida de internação a excepcionalidade de ser utilizada apenas em estado de perigo concreto para que ocorra, assim, a cessação daquele estado de perigo e consequência terá de ocorrer a reinserção social do paciente doente mental em meio a sociedade.
Podendo apenas ser indicada a medida de internação compulsória nos causos de dependentes químicos quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes, conforme já consolidado pela jurisprudência do Tribunal do Estado de Minas Gerais (Processo nº 10637150016698001, MG,2015).
 APELAÇÃO CÍVEL. DEPENDENTE QUÍMICO. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. LEI FEDERAL Nº 10.216/01. REQUISITOS. AUSÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA.
- A internação compulsória exige comprovação da insuficiência dos tratamentos extra-hospitalares, a teor do art. 4º da Lei Federal 10.216/01.
- Inexistindo nos autos laudo médico circunstanciado da necessidade de internação hospitalar para tratamento de dependente químico, não há como se determinar tal medida compulsoriamente. Decisão NEGARAM PROVIMENTO(TJMG. Apelação Cível. Processo nº 10637150016698001. 5ª Câmara Cível. Relator Moacyr Lobato. Julgamento 25/12/2015
            Linha esta de pensamento defendida por muitos juristas e estudiosos deste meio, sendo apesar de tudo notório em meio aos dias de hoje que esta excepcionalidade e reinserção social não ocorre entre os doentes mentais e muito menos quando aplicadas aos dependentes químicos.
            Portanto, usa – se a Lei da Reforma Psiquiátrica de forma analógica e deturpada em sua íntegra. Ocasionando uma aplicação equivocada quanto às pessoas atingidas pelo tratamento.
            Se mostrando ineficaz de forma notória aos olhos de qualquer pessoa. Pois, é a repetição das práticas utilizadas contra os usuários na década de 60, época do regime militar no país. Não se tendo amostras de qualquer progresso no sentido de diminuição dos usuários de entorpecentesdurante todos esses anos  (SANTOS, 2015).

5 Prejuízo causado na vida dos usuários de drogas com a medida da internação compulsória

Em uma análise constitucional e aplicação dos princípios visando a proteção integral do homem, é atribuído expressamente ao Estado o dever de garantir políticas preventivas buscando garantir e ampliar a dignidade humana, pois é um direito fundamental, visando evitar que tal primazia sofra abalos, (TEIXEIRA, 2015).
            Teixeira (2015) coloca como sendo um meio de evitar e/ou minimizar os problemas com as drogas, o investimento em políticas públicas, aplicação efetiva de programas voltados a boa qualidade de vida do ser humano, que inclui os programas com atividade educativas e preventivas sobre as consequências das drogas na vida do viciado e de sua família.
             O problema com o uso de drogas faz vítimas por todos os lados, pois se têm o usuário de um lado que se submete a situações extremas para conseguir as porções de drogas ilícitas mortais e do outro uma sociedade inteira que se encontra na mira desses que buscam insanamente o sustento de seus vícios. Firmando – se uma guerra social e moral, pois o viciado têm direito de ter sua integridade física respeitada, mas por outro lado a sociedade inteira também faz jus aos direitos sociais e fundamentais, como o de ir e vir, segurança, saúde, entre outros (CAPEZ, 2011).
             Pela complexidade do assunto e por se tratar de vidas que estão desamparadas em situações degradantes, buscando – se uma análise por meio de uma visão sociopolítica, conforme Coelho e Oliveira (2014) analisam e afirmam que o uso da internação compulsória não é uma medida que irá sanar o problema dos dependentes químicos, pela forma intensa como já está instalado na sociedade atual.
             Não se podendo utilizar esta lei para os casos de pessoas envolvidas com drogas, pois são diferentes as situações. A Lei nº 10.216/01 – Reforma Psiquiátrica, ficou tramitando no Congresso por mais de dez anos, sendo fruto de movimentos dos trabalhadores da saúde mental, cujo tema era a retirada dos manicômios utilizados para o “tratamento” dos doentes mentais (COELHO e OLIVEIRA, 2014).
           Sendo, claro que a finalidade da referida lei não condiz com essas diversas internações que vem ocorrendo de forma forçada, pois não se têm a legítima adequação junto ao caso concreto,   além do prejuízo experimentado pelo usuário.
           Na Constituição Federal de 1988, pode – se extrair de forma clara que a saúde foi classificada como direito social e fundamental  para todos os cidadãos sem distinção nenhuma em relação a cor, orientação sexual, classe social ou ideologias políticas. Não cabendo a ninguém destituir a teoria dos direitos sociais ou fundamentais, sendo suficiente saber – se que a saúde foi tratada pela Carta de 1988 e está no rol de direitos e garantias fundamentais (COELHO e OLIVEIRA, 2014).
          Motta e Wurdig (2014) afirmam que um dos problemas que se enfrenta é o pouco espaço que se têm com uma finalidade real de atender e executar medidas para que possa o usuário se sentir assistido e amparado. Fruto do cenário em que o Brasil se encontra, pois a mídia impera e muito influi nos casos de grande repercussão, como na situação do uso inconsequente de drogas.
         O espaço destinado ao tratamento dos usuários é pequeno e sem suporte, não se tendo centros ou hospitais para atender esses usuários e, assim, tratá-los de forma digna a fim de que se possa alcançar resultados positivos em relação a retirada dessas vidas da situação de rua, lhes proporcionando uma nova chance (MOTTA e WURDIG, 2014).
        A política de drogas no Brasil como já especificada em capítulos anteriores, é voltada erroneamente para a punição do indivíduo e não para a sua reabilitação, ou seja, reintegração social (CARVALHO, 2016).
Causando, assim, um grave prejuízo para os usuários que sem um efetivo tratamento não conseguem se recolocar na sociedade. E não tratando este problema de forma efetiva, o crescimento do problema é aterrorizante em todo Brasil.

Considerações Finais

Com a realização desde trabalho buscou – se, através de estudos doutrinários e na legislação consolidada, a apresentação dos efeitos e equivocos que se têm com a utilização das medidas de internação compulsória para com os dependentes químicos.
Conseguindo demonstrar que as bases da legislação vigente é fruto de um sistema punitivo e violento.
            E o reflexo disso  nos dias de hoje, com a demonstração efetiva dos prejuízos causados na vida dessas pessoas e de toda a sociedade, que se encontra ao final no mesmo espaço.
           Ratificando como a falta de um sistema restaurador e políticas públicas, prejudica uma sociedade inteira. Tendo em vista, que tratar dependentes químicos como se tratam pessoas com problemas psiquiátricos é um retrocesso para com toda a sociedade. Posto, que fere todas as garantias constitucionais que são priorizadas em qualquer relação.
          Desta forma, atingindo os objetivos traçados com este estudo, qual seja, a demonstração de como todos sofrem com tais medidas de internação compulsória e como isso afeta a vida das pessoas atingidas diretamente por elas.

Referências

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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – 17. ed. VadeMecum compacto. São Paulo: Saraiva, 2017.
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BRASIL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 10637150016698001 MG. Minas Gerais, 26 de dezembro de 2016. Lex: Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://tjmg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/300533372/apelacao-civel-ac-10637150016698001-mg. Acesso em: 03 março 2018, 16:33.
BOKANY, Vilma. Drogas no Brasil entre a saúde e a justiça proximidades e opiniões. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2015.
CAPEZ, Fernando. Drogas: internação compulsória e educação. Folha de São Paulo, 2011. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1907201108.htm. Acesso em: 10 abril 2018, 14:30.
CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil. 8. Ed.. São Paulo: Saraiva, 2016.
COELHO, Isabel; OLIVEIRA, Maria Helena Barros de. Internação compulsória e crack: um desserviço à saúde pública. Saúde Debate, Rio de Janeiro, v.38, n.101, p. 359-367, abr-jun 2014. Disponível em: http://www.scielosp.org/article/sdeb/2014.v38n101/359-367/pt/Acesso em: 13 fevereiro 2018, 21:00.
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WEYNE, Bruno Cunha. O príncipio da dignidade humana reflexões a partir da filosofia de Kant. São Paulo: Saraiva, 2013

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Sobre as autoras
Luci Mendes de Melo Bonini

Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Professora de Filosofia e Pesquisadora no Mestrado em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes. Área de interesse: Direitos Humanos e Políticas Públicas.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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