A aplicação das medidas descarcerizantes, em especial do instituto da transação penal, no âmbito da Justiça Militar estadual

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3 O INSTITUTO DA TRANSAÇÃO PENAL COMO MEDIDA DESCARCERIZANTE

Com base no artigo 76 da referida lei, “Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta”.

As penas restritivas de direitos estão previstas no artigo 43 do Código Penal, conforme exposto:

Art. 43. As penas restritivas de direitos são:

I - prestação pecuniária;

II - perda de bens e valores;

III - (VETADO)

IV - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;

V - interdição temporária de direitos;

VI - limitação de fim de semana (BRASIL, 1940).

Em contrapartida, caso o beneficiado não aceite a transação penal, será instaurada a ação penal sendo que esta poderá incidir em uma possível condenação, a qual certamente lhe causará prejuízos, como por exemplo, a suspensão de direitos políticos, enquanto não cumprir a pena; registro de maus antecedentes e reincidência; desgaste processual devido à demanda processual. Contudo, o acordo fica registrado para que o acusado não receba o benefício no prazo de cinco anos, conforme previsto o art. 76, parágrafo 4º da lei nº 9.099/95.

Assim, o Ministério Público (MP) propõe o acordo com o acusado para que ele não enfrente um processo e com isso não corra o risco de ser condenado ao final. Aceito, o MP deixa de oferecer a denúncia e lhe impõe penas restritivas de direito, ao invés de penas restritivas de liberdade, que de certa forma colabora na desobstrução do judiciário, como também contribui para esvaziar os presídios que a cada dia encontram-se superlotados.

O instituto da transação penal é considerado a medida descarcerizante mais importante concedida ao autor de crimes de menor potencial ofensivo.  Baseado nessa premissa, é pactuado um acordo entre o Ministério Público e o acusado nas ações penais pública condicionada à representação ou incondicionada, que permite a aplicação imediata de uma pena restritiva de direito ou multa.

Preconiza o art. 61 da lei nº 9.099/95, o qual entende-se por crimes de menor potencial ofensivo “as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa” (BRASIL, 1995). A mencionada lei permite ao Ministério Público, titular da ação penal pública, não sendo caso de arquivamento, ou havendo representação, propor o instituto da transação penal antes do oferecimento da denúncia, nos casos em que ocorrer o cometimento de crime em que a pena seja igual ou inferior a dois anos.

Acontece que no Código de Processo Penal Militar (CPPM), artigo 29, a “Ação Penal é Pública e somente pode ser promovida por denúncia do Ministério Publico” (BRASIL, 1969). Portanto, a ação penal pública incondicionada é regra geral para os delitos castrenses[4], exceto nos casos de cometimento de crimes contra a segurança externa do país, previstos nos artigos 136 a 141 do Código Penal Militar (CPM), em que a ação penal dependerá de requisição dos Ministros Militares, atualmente Ministro da Defesa, ou do Ministro da Justiça, previsto no art. 31 do CPPM.

Portanto, o bem jurídico tutelado pelo Direito Penal Militar é a hierarquia e a disciplina, pilares e valores mais importantes das instituições militares. Por isso quando há a prática de um crime contra a honra, o que se aprecia não é só a dignidade da vítima, como também a disciplina militar.

Aplica-se por analogia, o artigo 29 do Código Penal Militar, que regula a Ação Penal Privada Subsidiária da Pública, conforme esclarece Assis (2014) que:

A ação penal militar é sempre pública (CPPM, art. 29). Somente pode ser intentada pelo Ministério Público Militar (CF, art. 129, inc. I), ressalvada a hipótese da ação privada subsidiária da pública, nos termos do art. 5º, inc. LIX, da Carta Magna, em uma aplicação analógica do art.28 do Código de Processo Penal Comum, permitido pelo art. 3º, “e”, do Código Processual castrense (ASSIS, 2014, p. 397).

Dessa forma, o CPPM não prevê nenhuma espécie de ação penal privada.  No entanto, a Ação Penal Privada Subsidiária da Pública, que permite ao ofendido ou seu representante legal promovê-la por meio da queixa, por se tratar de um direito fundamental, previsto na Constituição, é aplicável na Justiça Militar.

Existem casos que mesmo em se tratando de cometimento de crimes de menor potencial ofensivo, não será possível a aplicação da transação penal. Esses impedimentos são classificados em objetivos e subjetivos (refere-se à condição pessoal do acusado). Os impedimentos objetivos estão previstos nos incisos I e II, constantes do parágrafo segundo do artigo 76, no qual preceitua que “não se admitirá a proposta se ficar comprovado”:

1- Ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;

2- Ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo.

Já os impedimentos subjetivos são mencionados no inciso III do parágrafo segundo do artigo 76, no qual consta que a proposta não será admitida se “Não indicarem os antecedentes, a conduta e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente à adoção da medida” (BRASIL, 1995).

Baseado nessa premissa, desde que preenchidos os requisitos previstos em lei, se a parte aceitar o acordo da transação penal, o Ministério Público deixará de instaurar a ação penal em seu desfavor, o qual cumprirá penas alternativas, como a prestação de serviços à sociedade. No entanto, se aceitar a transação não presume o reconhecimento de culpa, pois o mérito da ação penal não é analisado, e não é feita a verificação de culpabilidade, não havendo no caso, ofensa ao princípio do contraditório, da ampla defesa, devido processo legal e presunção de inocência. (BRASIL, 1988).


4 ARTIGO 90-A: VEDAÇÃO DO INSTITUTO DA TRANSAÇÃO PENAL NO ÂMBITO DA JUSTIÇA MILITAR

Com o surgimento da lei que estabelece os Juizados Especiais Cíveis e Criminais em 1995, seus institutos foram aplicados na Justiça Militar Estadual e Federal nos casos de cometimento de crimes militares de menor potencial ofensivo. No entanto, em 26 de setembro de 1999, foi promulgada a lei nº 9.839 que acrescentou o artigo 90-A à lei nº 9.099/95, a qual passou a proibir expressamente a aplicabilidade da lei e de seus institutos no âmbito da Justiça Militar.

No artigo 1º da lei 9.839/99 consta que “A Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, passa a vigorar acrescida do seguinte artigo”: "Art. 90-A. As disposições desta Lei não se aplicam no âmbito da Justiça Militar" (BRASIL, 1999). Ressalta-se que são inaplicáveis os institutos da lei nº 9.099/1995, em face do disposto no seu art. 90-A, que afasta sua aplicabilidade na Justiça Militar.

O afastamento da aplicabilidade aos militares afronta claramente o princípio da igualdade, o qual tem previsão no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, onde diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Dessa forma, em contrapartida à lei suprema do Estado, demonstra, em tese, a inconstitucionalidade em relação à redação do Artigo 90-A da lei 9.099/95, que proibiu expressamente a aplicação da lei dos Juizados Especiais no âmbito da Justiça Militar.

Alguns doutrinadores, como por exemplo, Damásio de Jesus (2002), entendem que os institutos despenalizadores devem ser aplicados nos casos de crimes impropriamente militares e afirma que:

A inovação contrasta com a tranqüila jurisprudência do STF e do STJ, que sempre entenderam perfeitamente aplicáveis as disposições da Lei 9.099 aos crimes militares. No que tange aos delitos militares próprios, ainda poderia ser defensável a lei nova, uma vez que são regidos pelas regras da hierarquia e da disciplina. [...] No que diz respeito aos delitos militares impróprios, contudo, é de flagrante inconstitucionalidade, ferindo os princípios da isonomia e da proporcionalidade (JESUS, 2002, p. 119).

Rocha (2010), também entende que a lei deve ser aplicada somente em caso de cometimento de crimes impropriamente militares.  Nesse contexto, aborda:

Diante da constatação de que a pena privativa de liberdade, em especial a pena de curta duração, não atende aos objetivos socialmente esperados, por que razão a Justiça Militar não poderia conciliar sua operação com a política criminal adotada pelo Estado brasileiro, em especial em relação aos condenados pela prática de crimes impropriamente militares? (ROCHA, 2010).

Segundo Grinover et al (2002, p. 217) “[...] O tema, entretanto, não é e nunca será tranquilo, porque, no que diz respeito aos crimes militares impróprios, não há razão para se impedir a incidência da Lei 9.099/95. O que justifica tratamento jurídico distinto só é o crime militar próprio”.

Já o magistrado Paulo Tadeu Rosa (1999), Juiz Militar, nas Auditorias Militares do Estado de Minas Gerais, defende ainda a aplicabilidade da lei na Justiça Militar com base no princípio da isonomia. Neste sentido, o magistrado destaca que “[...] Deve-se observar que o militar encontra-se amparado pela Constituição Federal, estando diferenciado apenas pela atividade desenvolvida, mas a sua liberdade é a mesma que assegurada pelo Estado ao funcionário civil ou aos demais cidadãos” (ROSA, 1999).

Segundo Rosa (2002), o art. 90-A da lei nº 9.099/95 não impossibilita a aplicação dos seus institutos despenalizantes no âmbito da Justiça Militar Estadual e afirma que “uma leitura atenta do novo dispositivo da lei evidencia que esta não fez qualquer menção a Justiça Militar Estadual, utilizando-se de uma expressão genérica, que deve ser interpretada pelo julgador quando da efetiva aplicação da lei ao caso concreto”.

O legislador não pode deixar de beneficiar o militar com a lei, simplesmente pelo fato de exercerem atividade diferenciada. Portanto, conforme o art. 5º da Constituição brasileira, os militares não podem sofrer tratamento diferenciado em relação ao civil. Logo, a aplicação dos institutos da lei não viola os princípios da hierarquia e disciplina.  Assim, os militares quando cometem crimes também estão sujeitos a serem punidos na esfera administrativa, pois além do Código Penal Militar estão submetidos a regulamentos internos.

O direito penal tem por objetivo não apenas reprimir o infrator ou aplicar penas privativas de liberdade. A pena não é mais um castigo pelo ato praticado, mas um instrumento de reeducação do cidadão, que não perde o seu status de dignidade. O militar que não consegue se reeducar com base na pena que lhe foi aplicada em sede de processo penal poderá ser afastado das fileiras de sua Corporação com base nas disposições administrativas que permitem inclusive a demissão sem qualquer benefício, que equivale a uma expulsão sem qualquer honra para o infrator (ROSA, 2002).

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Rocha (2010), também se manifesta no mesmo sentido ao comentar a lei nº 9.099/95:

Os aspectos práticos desta premissa podem ser ressaltados na seguinte indagação: se houvesse um policial civil atuando conjuntamente com um policial militar, no caso concreto, haveria razões para permitir a aplicação da pena restritiva de direitos em benefício do policial civil e não permitir que o militar tivesse o mesmo tratamento? A condição de militar constitui causa idônea para que o Poder Público ofereça uma resposta repressiva diferenciada? A resposta, certamente, é negativa (ROCHA, 2010).

Rocha (2010) entende que viola o princípio da isonomia tratar de forma desigual os militares estaduais.  Nesse sentido, afirma que:

A condição de militar e a violação aos deveres que são inerentes às suas funções já foram devidamente considerados pelo legislador para o estabelecimento da cominação da pena reservada ao crime militar. Se a pena cominada ao crime militar é compatível com a aplicação dos institutos da Lei n. 9.099, não se pode impedir a concessão do benefício pelo simples fato de se tratar de militar. A condição de militar impõe suportar alguns ônus que são inerentes às especificidades de suas funções, mas não reduzem os direitos fundamentais do cidadão que ostenta tal qualidade” (ROCHA, 2010).

Ressalta-se que as polícias e bombeiros militares são órgãos responsáveis pela segurança pública, previsto constitucionalmente. Portanto, fazem parte do sistema de Defesa Social, que é composto por diversos órgãos que tem civis em seu quadro de profissionais.

Assim, existem casos em que policiais militares trabalham em conjunto com funcionários desses órgãos, de forma integrada. Logo, não há em que se dar um tratamento diferenciado para os militares em casos semelhantes.

Para Rosa (2002), o princípio da igualdade é que legitima a aplicação dos institutos da lei n. 9.099/95 aos militares, e afirma que:

O militar que integra os quadros das forças armadas ou forças auxiliares em respeito ao princípio da igualdade previsto no art. 5.º, caput, da CF, também faz jus aos institutos criados pela Lei 9099/95. O Código Penal Militar prevê infrações que são apenadas com pena máxima igual ou inferior a um ano, o que em tese autorizaria a aplicação da Lei 9099/95 aos militares estaduais ou federais acusados em tese da prática desses ilícitos considerados de menor potencial ofensivo (ROSA, 2002).

Roth (2008, p. 39), ao tratar da lei n. 9.099/95, e de seus institutos despenalizantes, afirma que estes “podem ser aplicados no Direito Penal Militar com base na analogia in bonam partem[5]”. Em seguida explana sobre a desatualização do Código Penal Militar, proferindo os seguintes dizeres:

Note-se que essa realidade constitucional deveria levar o legislador infraconstitucional a igualar o tratamento dos crimes comuns com o dos crimes militares correlatos (impropriamente militares), todavia, tal fato não ocorreu, por omissão, causando reflexos negativos obviamente e deixando o Direito Penal Militar defasado. Assim, enquanto para os crimes comuns temos tratamento diferenciado e moderno acompanhando às tendências mundiais de política criminal, para os crimes militares o tratamento ficou estagnado à realidade de 1969, quando da entrada em vigor do Codex Penal Militar, com a incidência da pena privativa de liberdade. Em conseqüência disso, considerando o grau de lesividade, enquanto aos crimes militares o legislador previu a pena privativa de liberdade, sem exceção, distinguindo, diante do tratamento do Código de Processo Penal Militar (CPPM) (art. 270) e do tratamento aos tipos penais” (ROTH, 2008, p. 31).

Destaca-se que o Código Penal Militar é de 21 de outubro de 1969, e foi elaborado no regime de exceção, durante o governo de Artur da Costa e Silva, segundo presidente do regime militar. Portanto, sofreu poucas mudanças. Por esse motivo é importante evidenciar a relevância de se interpretar e aplicar a lei observando os valores e princípios constitucionais para que direitos fundamentais não sejam desrespeitados.

Desta forma, segue o Entendimento de Veiga (2006):

Há de ser destacado que o Código Penal Militar é uma norma de 1969, outorgado em plena ditadura militar. Hoje, como muitos dos seus comandos não foram recepcionados pela CF/88, urge a necessidade de se modificá-lo a fim de que possa se adequar à nova concepção social-política-jurídica (VEIGA, 2006).

Percebe-se que vários artigos do Código Penal Militar não foram recepcionados pela Constituição e alguns já caíram em desuso, por não serem eficazes. Ainda nesse mesmo sentido, Rocha (2010) diz que:

Pode-se constatar, lamentavelmente, que, ao longo dos últimos anos, as políticas públicas implementadas para o melhor enfrentamento da criminalidade têm centrado atenções na Justiça comum e esquecido os conflitos sociais que envolvem os militares. Diversas foram as alterações introduzidas no Código Penal comum e no Código de Processo Penal comum que visaram qualificar a intervenção punitiva, bem como obter maior efetividade na relação processual penal. Tais intervenções político-criminais, formalmente, não atingiram a Justiça Militar (ROCHA, 2010).

Salienta-se que os operadores do Direito Mônica Caggiano e Capano (2011) entendem que qualquer ato que afete direitos fundamentais, ou que trate o cidadão, militar ou civil, de forma desigual é considerado inconstitucional.

Dessa forma, qualquer ato que ofenda garantias fundamentais do cidadão, militar ou civil, retirando-lhe o direito material de não ser turbado em seus direitos, especialmente o ius eundi (direito de ir e vir), ou que o coloque em uma situação de tratamento desigual frente aos demais membros do corpo social, estará tal ato fadado ao decreto de ilegalidade senão a pecha de inconstitucional, que, no dizer de Jorge Miranda, trata-se de uma “relação de desconformidade, e não apenas de incompatibilidade; um relação de descorrespondência, de inadequação, de inidoneidade perante a norma constitucional, e não mera contradição (CAGGIANO e CAPANO, 2011, p. 117-118).

Maciel (2001) considera a Lei nº 9.839/99 inconstitucional por violar direitos fundamentais e entende que a Lei nº 9.099/95 é aplicável na Justiça Militar Estadual nos crimes militares, próprios e impróprios, por ser uma norma geral. Veja-se que:

Não se defende a aplicação de privilégios aos agentes de polícia, mas, também, não se podem admitir prejuízos instituídos em nome de uma falsa e injustificável necessidade de maior rigorismo. [...] Assim, entendemos que

é possível a aplicação da lei ao Código Penal Militar, porque a vedação se nos apresenta com um forte colorido de inconstitucionalidade. [...] E defendemos tal postura desde antes, desde o início de vigência da lei original, porque ela não vedava e, ao intérprete era vedado vedar a sua aplicação. E agora, mais veementemente, porque a lei de 1999 fere a princípios fundamentais estampados nos incisos II, III e IV do artigo 1º da

Constituição; ou o destinatário da norma por usar farda em seu trabalho não é cidadão, não é humano, e portanto indigno do alcance dos benefícios da lei, e o seu trabalho, em lugar de valorizá-lo socialmente, o exclui e o excepciona do alcance do que poderia, legalmente e sem privilégio, beneficiá-lo (MACIEL, 2001, p. 25).

Para Pereira (2001) não se pode aplicar os institutos despenalizadores da lei nº 9.099/95, devido aos princípios basilares da hierarquia e disciplina, pilares das instituições militares. Nesse contexto, o autor enfatiza que:

[...] a situação do policial militar que pratica um crime militar é distinta da situação de um civil, e da sua própria, quando comete um crime comum. É bom frisar que a hierarquia e a disciplina são princípios basilares de todos os crimes militares, porquanto basilares das instituições militares. Não deixam de estar presentes quando se trata de um crime impropriamente militar. O policial militar ainda está sujeito a eles e está no desempenho de uma função estatal (PEREIRA, 2001).

De acordo com o posicionamento do autor, a aplicação dos institutos despenalizantes abalaria os princípios basilares dessas instituições. Nota-se que esse é o principal argumento usado pela doutrina, que se posiciona contra a aplicabilidade da Lei. No mesmo sentido de não ser possível a aplicação da lei nº 9.099/95 na Justiça Militar, tem-se o entendimento de Assis (2006, p. 269), o qual aborda que:

A lei 9.09/95 instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, regulamentando assim o art. 98, inc. I da Carta Magna, fonte geradora dos referidos Juizados Especiais da Justiça do Distrito Federal e da Justiça Estadual. Dentre os vários aspectos do novo diploma legal, discute-se sua aplicabilidade na Justiça Militar. De nosso turno, consideramos a lei dos Juizados inteiramente incompatível com a Justiça Militar, seja federal ou estadual. É a própria lei que assim estabelece em seu art. 1º, ao dispor serem “os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária(...).

Justiça ordinária é Justiça comum. A Justiça Militar é Justiça Especial, onde se aplica um Direito Especial, o Direito Penal Militar (Assis, 2006, p. 269).

Soares (2002, p.44) segue o mesmo entendimento, sendo contrário à aplicação da lei nº 9.099/95 na Justiça Militar. De acordo com o autor:

O militar quando pratica crime militar não está na mesma situação de igualdade de quem pratica crime comum. Os bens jurídicos lesados são diversos. Além de ele estar investido do poder da autoridade pública – "potestas publica e auctoritatis" -, está ele submetido a um regime jurídico próprio e específico, conforme prescreve a Constituição da República.

Assim, a Lei 9.839/99 não é inconstitucional. Ela não ofende o princípio constitucional da igualdade, da isonomia ou da proporcionalidade. Os tribunais superiores, e o próprio Supremo Tribunal Federal, este como guardião da Constituição, vêm, reiterada e unanimemente, decidindo nesse sentido (SOARES, 2002, p. 44).

Os Doutrinadores, que se posicionam pela não aplicação dos institutos despenalizadores, argumentam que a inaplicabilidade da lei nº 9.099/95 não viola o princípio da isonomia, pois o militar exerce uma profissão em que tanto sua atividade, quanto sua situação jurídica são diferenciadas.

Segundo Pereira (2001), a expressa vedação legal da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais justifica-se em razão das especificidades da atividade militar, dos valores tutelados pela norma penal militar e de seus princípios basilares.

Portanto, a vedação abrange a jurisdição Militar, e não a condição dos sujeitos ativos que, perante ela, respondam por ilícitos praticados.

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Sobre os autores
Jânio Oliveira Donato

Advogado criminalista. Mestre em Direito Processual (2013) e Especialista em Ciências Penais (2007) pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Gestão de Instituições de Ensino Superior (2016) pela Faculdade Promove de Minas Gerais. Professor de Direito Processual Penal e Filosofia do Direito da graduação e pós-graduação das Faculdades Kennedy de Minas Gerais. Presidente da Comissão de Estudos Jurídicos da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas de Minas Gerais (ABRACRIM-MG).

William Ferreira Lima

Bacharel em Direito pela Faculdade Kennedy de Minas Gerais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O presente artigo foi elaborado pelo Bacharel William Ferreira Lima como trabalho de conclusão do curso de Direito da Faculdade Kennedy de Minas Gerais, tendo sido orientado, para tanto, pelo Prof. Jânio Oliveira Donato.

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