3. DISTINÇÃO ENTRE AGENTE INFILTRADO E AGENTE PROVOCADOR:
Mostra-se importante, ainda, trazer à baila a diferenciação feita pela doutrina entre o agente infiltrado e o agente provocador.
O agente infiltrado é o funcionário estatal que, utilizando-se de uma identidade fictícia, penetra no seio de uma organização criminosa com o fito de reunir os elementos probatórios necessários para a identificação e prisão dos integrantes de um cartel do crime organizado. Este, portanto, atua de forma passiva, somente praticando ações delituosas quando estritamente imprescindível.
Tal figura não se confunde com o agente provocador, que é aquele indivíduo, agente de polícia, o qual inserido em uma organização criminosa estimula o cometimento de delitos por parte de outrem. Como esperado, o agente provocador é totalmente repudiado pela doutrina, jurisprudência e legislação nacionais, sendo as provas derivadas de sua atuação consideradas ilícitas, pois eivadas de vício.
Nessa mesma linha de raciocínio Damásio de Jesus e Fábio Ramazzini Bechara:
(...) assim, considerando os diversos tipos de comportamento que o agente infiltrado pode ter em uma organização criminosa, é possível concluir que a prova somente poderá ser considerada ilícita nos casos nos quais o agente induz o sujeito provocado a praticar a infração penal, ou seja, quando o seduz enganosamente para o cometimento do delito. A violação de direitos fundamentais nesse caso não constitui restrição legítima como antes afirmado, mas implica, sim, total esvaziamento do seu conteúdo essencial, mostrando-se absolutamente desproporcional e igualmente intolerável qualquer aceitação[15].
CONCLUSÃO:
O crime organizado transnacional é um dos maiores problemas enfrentados atualmente no mundo todo, provocando consequências nefastas na vida das pessoas. Com o advento da globalização, as organizações criminosas ganharam bastante notoriedade, já que se valem dos variados meios tecnológicos para camuflar as suas nocivas atividades e dificultar o combate pelos órgãos de persecução penal.
Em decorrência da ineficiência dos tradicionais meios de investigação na luta contra o crime organizado, é de bastante relevância o surgimento de técnicas que sejam úteis e aptas para o desmantelamento da criminalidade organizada, como a infiltração policial.
No presente artigo, aborda-se a infiltração de agentes como um meio de investigação e obtenção de prova essencial para o desbaratamento das organizações criminosas.
Destarte, este estudo tratou, primeiramente, dos aspectos genéricos da infiltração, trazendo a sua gênese, conceito, natureza jurídica, questões éticas, finalidades e espécies, de forma a propiciar a propagação de conhecimentos básicos atinentes ao instituto em análise.
Na sequência, procedeu-se a uma análise da infiltração de agentes à luz da Lei 12.850/13, trazendo à baila os principais requisitos legais da operação de infiltração, bem como a superação da polêmica concernente à responsabilidade penal do agente infiltrado.
Finalmente, foi exposta sucintamente a distinção entre o agente infiltrado e o agente provocador.
Portanto, pode-se concluir que a infiltração policial, apesar de toda a polêmica que a envolve, é uma técnica investigativa importantíssima no combate ao crime organizado, já que permite a quebra da clandestinidade e, consequentemente, o desmantelamento das organizações delinquenciais. Sem ela mostra-se praticamente impossível combater o crime organizado de forma satisfatória em meio a um mundo totalmente globalizado.
REFERÊNCIAS:
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Notas
[1] PEREIRA, Flávio Cardoso. A investigação criminal realizada por agentes infiltrados. Disponível em http://flaviocardosopereira.com.br/pdf/Artigo%20infiltra%C3%A7%C3%A3o%20criminal%20-%20Revista%20do%20MP-MT.pdf. Acesso em 26/04/2018.
[2] MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime organizado: aspectos gerais e mecanismos legais. São Paulo: Atlas, 2015. Pág. 184.
[3] CONSERINO, Cassio Roberto. Crime organizado e institutos correlatos. São Paulo: Atlas, 2011. Pág. 98.
[4] ZIEGLER, Jean. Senhores do crime: as novas máfias contra a democracia. Rio de Janeiro: Record, 2003. Pág. 284. O autor demonstra a importância do agente infiltrado no desmantelamento das organizações criminosas ao dar o exemplo de Kathleen C. Erickson e Robert Mussella, dois agentes especiais da alfândega americana que, infiltrados há três anos no Cartel de Medellín, propiciaram a prisão de altos dirigentes do BCCI (Banco de Crédito e Comércio Internacional), o maior banco criminoso de todos os tempos comandado pelo paquistanês Agha Hasan Abedi. A operação foi realizada no dia do suposto casamento dos dois agentes infiltrados e foi possível devido ao papel por eles desenvolvido: eles eram “brilhantes financistas americanos”, sendo que Mussella era o responsável por realizar as mais variadas formas de lavagem de dinheiro para os chefes dos cartéis colombianos, bolivianos e peruanos, que, por sua vez, eram clientes do BCCI. Nas palavras do sociólogo suíço: “o império criminoso de Agha Hasan Abedi continuaria tranquilamente a acumular, proteger e fazer frutificar os butins de Saddam Hussein, de Abu Nidal, do general Noriega e dos traficantes de cocaína de Medellín; suas ‘unidades negras’ continuariam a assassinar clientes recalcitrantes e seus dirigentes a fraudar os bancos centrais da Nigéria, do Peru e do Paquistão, não fosse a extrema coragem dos dois jovens undercover agents americanos Kathleen C. Erickson e Robert Mussella, codinome Robert Mazur”
[5] CARLOS, André; FRIEDE, Reis. Apud FRANCO, Alberto Silva. Aspectos jurídico-operacionais do agente infiltrado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2014. Pág. 08.
[6] SOUSA, Marllon. Crime organizado e infiltração policial: parâmetros para a validação da prova colhida no combate às organizações criminosas. São Paulo: Atlas, 2015. Pág. 81.
[7] CARLOS, André; FRIEDE, Reis. Aspectos jurídico-operacionais do agente infiltrado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2014. Pág. 49.
[8] CONSERINO, Cassio Roberto. Crime organizado e institutos correlatos. São Paulo: Atlas, 2011. Pág. 85.
[9] ZIEGLER, Jean. Senhores do crime: as novas máfias contra a democracia. Rio de Janeiro: Record, 2003. Pág. 236. O autor, objetivando demonstrar o alto grau de periculosidade da infiltração de agentes, traz o caso de “Enrique Camarena Salazar, funcionário do governo de Washington, infiltrado numa rede de traficantes mexicanos. Descoberto, ele foi torturado até a morte pelos guarda-costas dos chefões. Morreu sem revelar o nome das outras toupeiras que atuavam na rede. Os torturadores seriam detidos e condenados”.
[10] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 624.
[11] MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime organizado: aspectos gerais e mecanismos legais. São Paulo: Atlas, 2015. Pág. 189.
[12] CARLOS, André; FRIEDE, Reis. Aspectos jurídico-operacionais do agente infiltrado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2014. Pág. 58.
[13] MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime organizado: aspectos gerais e mecanismos legais. São Paulo: Atlas, 2015. Pág. 200.
[14] PACHECO, Rafael. Crime organizado: medidas de controle e infiltração policial. Curitiba: Juruá, 2009. Pág. 130.
[15] JESUS, Damásio de; BECHARA, Fábio Ramazzini. Agente infiltrado: reflexos penais e processuais. Disponível em http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/12110-12110-1-PB.htm. Acesso em 26/04/2018.