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A fiscalização do trabalho frente à flexibilização das normas trabalhistas

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13/04/2005 às 00:00
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SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. ABORDAGEM GENÉRICA SOBRE A FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO; 2.1. Histórico Geral; 2.2. A inspeção do trabalho no Direito Internacional; 2.3. Evolução da Inspeção do Trabalho no Brasil; 2.4. A Posição Enciclopédica da Inspeção do Trabalho; 2.5. Natureza Jurídica da Inspeção do Trabalho; 2.6. Conceito de Inspeção do Trabalho; 2.7. Posição Institucional da Inspeção do Trabalho; 2.8. Modalidades de Fiscalização; 2.9. Poderes e Funções dos Auditores-Fiscais do Trabalho; 3. A INSPEÇÃO DO TRABALHO NO PANORAMA DA FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS; 3.1. Histórico da flexibilização; 3.2. A fiscalização do trabalho e a Lei do FGTS; 3.3. A fiscalização do trabalho e a Lei 6.019/74 - Trabalho Temporário; 3.4. A fiscalização do Trabalho e a Lei nº 6.494/77 - Estágios; 3.5. A fiscalização do trabalho e o parágrafo único do art. 442 CLT - Cooperativa; 3.6. A fiscalização do trabalho e a Lei nº 9.601/98 - Contrato de Trabalho por Prazo Determinado e o Banco de Horas; 3.7. A fiscalização do trabalho e a Lei nº 9.608/98 - Serviço Voluntário; 3.8.A fiscalização do trabalho e a Lei nº 9.841/99 - Microempresa e Empresa de Pequeno Porte; 3.9. A fiscalização do trabalho e a Medida Provisória nº 1.952 - Suspensão do Contrato de Trabalho para Qualificação Profissional; 3.10. A fiscalização do trabalho e o artigo 627-A da CLT - Novo Perfil da Inspeção Estatal; 3.11. A fiscalização do trabalho e a Lei nº 9.958/00 - Comissão de Conciliação Prévia; 3.12.A fiscalização do trabalho e A REFORMA TRABALHISTA - o Projeto de Lei nº 5.483/01 - Supremacia do Negociado sobre o Legislado; 4. A INSPEÇÃO SOCIAL ANTE A FLEXIBILIZAÇÃO; 4.1. Inspeção Social e Sanção; 4.2. Inspeção Social e o Modelo Sindical Brasileiro; 4.3. Inspeção Social e os instrumentos de proteção contra atos anti-sindicais; 4. 4. Inspeção Social e ampliação de competência da Inspeção Estatal; 5. APLICAÇÃO DA TÉCNICA DA PONDERAÇÃO DE INTERESSES PELA INSPEÇÃO ESTATAL; 5.1. O Princípio Protetor no Direito do Trabalho e a Evidência do Princípio da Autonomia Privada Coletiva no Ordenamento Jurídico, sob o Prisma Constitucional; 5.2. O Tratamento do Princípio Protetor no Direito do Trabalho, Ante a Onda da Flexibilização; 5.3. Aplicaçãodo Princípio Protetor pela Técnica da Ponderação de Interesses sob a Chancela do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; 6. A NOVA DIMENSÃO DO CAMPO DE ATUAÇÃO DA INSPEÇÃO ESTATAL; 6.1. A Nova Dimensão do Campo de Atuação da Inspeção Estatal e a Integração Econômica; 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 8. NOTAS; 9. BIBLIOGRAFIA.


1 - INTRODUÇÃO

Nosso propósito na elaboração desta singela monografia partiu do interesse em verificar se os dados e a realidade confirmam, fundamentadamente, a afirmação de certos setores da sociedade de que grande parte dos profissionais que atuam na área trabalhista são contrários a flexibilização apenas por receio de perda de poder.

A flexibilização das normas trabalhistas, ao lado da desregulamentação, tem sido apontada como uma boa alternativa ao enfrentamento da crise por que passa o Direito do Trabalho no Brasil, por consoante com a valorização da negociação coletiva subjacente no princípio da autonomia privada coletiva, que juntamente com o princípio protetor possui envergadura constitucional. Decorre dessa possibilidade a indagação de ser ou não a flexibilização limitadora da atuação do Estado na promoção da defesa dos direitos dos trabalhadores.

Considerando que a primeira forma de atuação do Estado em prol do cumprimento da legislação trabalhista se dá pela prevenção, através do órgão encarregado da fiscalização, busca-se nesta monografia exatamente conhecer as implicações da flexibilização das normas trabalhistas na área da inspeção do trabalho, no que diz respeito ao aspecto substancial e procedimental das atividades dos Auditores-Fiscais do Trabalho.

Primeiramente, procura-se desenvolver uma abordagem genérica da inspeção do trabalho, onde se conhece o histórico geral desde o seu surgimento, sua posição no Direito Internacional, sua evolução no Brasil, sua posição enciclopédica quanto ao assentamento jurídico, sua natureza jurídica, sua conceituação, sua posição institucional no aparelho estatal, o modo de operacionalização da fiscalização e os poderes e funções dos Auditores-Fiscais do Trabalho.

Considera-se que a flexibilização das normas trabalhistas não é fenômeno recente, que diversas providências legislativas já a promove há algum tempo. Na persecução dessa compreensão, no terceiro capítulo, demonstra-se todo o processo de modificação da legislação trabalhista no Brasil, desde as origens até a fase atual, destacando-se a posição da inspeção do trabalho no panorama da flexibilização, que de fato surge ainda no início do período de governo militar, com a instituição do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço -FGTS pela Lei nº 5.107/66.

Embora iniciada ainda no governo militar, é no governo Fernando Henrique Cardoso que a flexibilização das normas trabalhistas é projetada com maior ênfase, consubstanciada no discurso da necessidade de modernidade e de liberação dos atores sociais para negociação dos direitos trabalhistas, posto que os próprios trabalhadores, através de suas organizações sindicais, melhor promoverão a defesa de seus direitos. A par dessa questão, necessita-se conhecer areal possibilidade dos Sindicatos de trabalhadores atuarem efetivamente na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista, fato que se demonstra no quarto capítulo, destacando-se a posição da inspeção social em face da flexibilização, do modelo sindical brasileiro e dos instrumentos de proteção contra atos anti-sindicais.

No capítulo V, aborda-se a questão da possibilidade de conflito entre os interesses protegidos por princípios constitucionais, em especial o princípio protetor, lastreado no valor da dignidade humana que fundamenta nossa República (art. 1º C.F/ 88), e o princípio da autonomia privada coletiva (art. 7º, VI, 8º, 9º, 10º CF),onde aponta-se a técnica que melhor atende a inspeção do trabalho na tomada de decisão nos casos de colisão desses princípios, dada a realidade que cerca o seu campo de atuação dentro de um sistema normativo caracterizado pela flexibilização. Para tal mister demonstra-se a viabilidade da aplicação da técnica da ponderação de interesses.

No sexto capítulo descreve-se a nova dimensão do campo de atuação da inspeção estatal. Mostra-se que a globalização e a integração econômica e comercial, a flexibilização e o crescimento da atividade informal trouxeram uma nova conformação para a inspeção do trabalho, que passa a ter que atender a uma crescente demanda de reclamações de trabalhadores, recebe incumbências de atuar estrategicamente no combate ao trabalho infantil, ao trabalho forçado, à discriminação no trabalho etc., e é guindada a se revestir num novo perfil mediante a alteração do artigo 627 da CLT e da edição da Medida Provisória nº 2.175, que prescreveu novas atribuições para a Auditoria-Fiscal do Trabalho.

Por fim, faz-se uma conclusão acerca das constatações percebidas ao longo do trabalho empreendido, de modo que as indagações que o motivou são esclarecidas com base em doutrinas firmes e específicas sobre o assunto e em observações fidedignas das questões que se aponta. Nesse passo, registramos as dificuldades que encontramos para pesquisar o assunto, dada a escassez de publicações sobre do tema, o que nos fez relatar muito de nossa própria experiência de militante na área da inspeção do trabalho, mas sempre mantendo-nos fiel à realidade dos fatos.


2 - ABORDAGEM GENÉRICA SOBRE A FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO

2.1 - Histórico Geral

A Inspeção do Trabalho vincula-se diretamente ao Direito do Trabalho, vez que é uma criação decorrente da própria natureza desse direito que figura, no plano histórico das relações de trabalho, como um sistema de normas de proteção ao trabalhador concernente com o desenvolvimento organizado da sociedade e com a afirmação do estado moderno.

De acordo com a consensada posição doutrinária, o Direito do Trabalho, sob sua concepção disciplinadora das relações do trabalho, aparece com advento da revolução industrial.E este mesmo acontecimento histórico é o marco original no surgimento da Inspeção do Trabalho, eis que até o século XIX, antes do despontar dessa luz da modernidade, inexistia norma de proteção ao trabalhador.

Sem embargo dessa constatação, fala-se em certos acontecimentos que indicariam o germinar da Inspeção do Trabalho. Alguns citam as Corporações de Artes e Ofícios, ainda na idade média, onde teriam surgido "os veedores, que eram autorizados pelo grêmio para fiscalizar o cumprimento de seus estatutos. Eram verdadeiros inspetores da produção que garantiam, para os consumidores, tanto o preço, quanto a qualidade". [1]

Acredita-se ainda que a origem da Inspeção do Trabalho "estaria nas leis das Índias, que protegiam os autóctones na prestação de seus serviços". [2]

Ainda buscando explicação, aponta-se o ano de 1204 para tal origem, quando foram nomeados por Phillippe-Augusto, da França, 4 (quatro) gardes-jurés, junto aos tecelões. Com a organização do trabalho, era necessário controlar a produção no que se refere a qualidade e quantidade da matéria-prima, o que impunha uma vigilância econômica. Assim, esses inspetores controlavam os grupos de artesãos, podendo fazer-lhes visitas a qualquer hora do dia ou da noite para verificação da aplicação do regulamento referente a dias e horas de trabalho, bem como a quantidade de produto; podiam também requisitar a força policial. [3]

A seguir, surge na França, em 13.08.1669, um "serviço de inspeção", realizado pelos chamados Commis Inspecteurs, posteriormente denominados inspetores de manufaturas ou de fábricas.A finalidade dessa regulamentação era mais a riqueza nacional do que a sorte dos operários, à medida que se buscava o progresso,pouco importando a condição dos trabalhadores. [4]

Logo após, foram instituídos os inspetores gerais e os inspetores ambulantes. Podiam eles ingressar nos estabelecimentos, inclusive à noite, mediante arrombamento, caso tivessem suas ações obstruídas. Na ocorrência de infração aos regulamentos, lavravam os chamados procès-verbaux. Deviam apresentar relatórios, fazer estatísticas e levantamentos a respeito das condições de trabalho. [5]

Assim foi até 1788, quando então institui-se a função de inspetor geral das manufaturas e do comércio, cuja extinção se deu por ser considerada inútil e atrofiada.

Finalmente, em 1833, surgiu a inspeção governamental, com a nomeação de quatro inspetores, com autonomia para entrar nas fábricas, resolver conflitos decorrentes da aplicação das leis e impor sanções, e que tinham o estatuto de juiz de paz. [6] Essa inspeção teve grande apoio da população, dada sua efetividade na atuação, marcando historicamente o surgimento da Inspeção do Trabalho no seu aspecto mais consentâneo com a realidade das relações de trabalho.

Somente em 1844, as funções administrativas e judiciais dos inspetores ingleses foram separadas, cabendo-lhes as funções administrativas e, aos juizes as judiciais. [7] Seguindo essa experiência, diversos países passaram a adotar uma inspeção do trabalho.

2.2 - A inspeção do trabalho no Direito Internacional

No plano internacional, a inspeção do trabalho passou a ter significativa importância a partir do surgimento da Organização Internacional do Trabalho - OIT. Esta Organização foi estabelecida no Tratado de Versailles, aprovado pela Conferência da Paz de 1919, cujo art. 427, nº 9, prescreveu sobre a inspeção do trabalho nestes termos: "cada Estado deverá organizar um serviço de inspeção que compreenderá mulheres, a fim de assegurar a aplicação das leis e regulamentos para a proteção dos trabalhadores".

O fim da primeira guerra mundial fez surgir grandes preocupações pela busca da manutenção da paz, o que motivou a que as nações vencedoras da grande batalha, ao elaborarem o referido tratado, nele incluísse os enunciados que contemplassem também a orientação pela pacificação das sociedades no campo das relações de trabalho. Assim, no preâmbulo da parte XIII, que cuidou da criação da OIT [8], foi enunciado:

"a sociedade das Nações tem por objetivo estabelecer a paz universal, que não pode ser fundada senão sobre a base da justiça social";

"existem condições de trabalho que implicam para um grande número de pessoas em injustiça, miséria e privações";

"a não adoção por uma nação qualquer de um regime de trabalho realmente humanitário é um obstáculo aos esforços dos demais, desejosos de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios países".

Eis aí a tríplice fundamentação para que uma legislação trabalhista fosse adotada mundialmente e que traduzisse em garantias de condições de trabalho mais humanizadas, objetivando a melhoria das condições sociais dos indivíduos.

Uma vez consolidada internacionalmente a importância de uma legislação trabalhista e a necessidade da intervenção estatal nas relações de trabalho, de modo a acompanhar a efetiva aplicação das leis e regulamentos disciplinadores das condições de trabalho, a OIT, atuando ante a preocupação com as tensões mundiais que ameaçassem a paz mundial, adotou em sua primeira reunião a Recomendação nº 5, que tratou da criação de um serviço público de higiene.

Quanto a Inspeção do Trabalho especificamente, a OIT dela cuidou em sua quinta reunião, em 1923, quando adotou a Recomendação nº 20. Nesta recomendação a Conferência traçou os "Princípios Gerais para a Organização da Inspeção do Trabalho". Esta foi a pedra fundamental para a futura convenção que viria a se constituir no principal instrumento internacional que trata da questão da inspeção.

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Passados mais de 20 anos do lançamento dos contornos da inspeção estatal que deveria ser criada, tempo esse motivado por diversos fatores, entre eles a segunda grande guerra, em 1947 a OIT adotou a Convenção nº 81, por ocasião de sua 30ª Reunião. Essa foi então a convenção que se constituiria no ordenamento internacional de maior importância para o controle estatal das relações de trabalho. Cuidou ele da Inspeção do Trabalho na Indústria e no Comércio, disciplinando a atuação dos inspetores do trabalho quanto aos seus direitos e deveres, as obrigações a serem cumpridas pelos empregadores, as medidas a serem observadas pelos Membros da Organização Internacional, etc.

Outra importante Convenção para a Inspeção do Trabalho foi a de nº 129, adotada na 53ª Reunião da OIT, em 1969. Esta Convenção tratou da Inspeção do Trabalho na Agricultura [9].

Com esses instrumentos normativos internacionais, a Inspeção do Trabalho passou a ter grande importância nos países membros da OIT, pois hoje um país é avaliado internacionalmente quanto ao seu comprometimento com a causa dos trabalhadores também em razão da seriedade com que trata a inspeção estatal.

2.3 - Evolução da Inspeção do Trabalho no Brasil

Data de 1891 o surgimento da Inspeção do Trabalho no Brasil. Veio com o Decreto nº 1.313, de 17 de janeiro, pelo qual foi estabelecida a obrigatoriedade de fiscalização de "todos os estabelecimentos fabris em que trabalhassem menores". Porém, tal fiscalização abrangia apenas o Distrito Federal, dado que a Constituição de 1891 estabelecia a competência dos Estados para legislar sobre trabalho. Desse modo, o referido Decreto do governo federal não trazia qualquer obrigação para os Estados, ficando limitado ao Rio de Janeiro, capital do Brasil à época [10].

Além dessa limitação territorial, a fiscalização alcançava apenas atividades industriais, ficando excluído o trabalho no comércio, serviço e agricultura, o que a tornou ineficaz.

Em 1918 foi criado o Departamento Nacional do Trabalho, que também não alcançou êxito em razão da limitação constitucional do governo federal para legislar sobre trabalho, o que dificultava o cumprimento pela República do Brasil das obrigações contidas no Tratado de Versailles, ou seja, a de "organizar um serviço de inspeção do trabalho". Essa dificuldade só começou a ser superada com a reforma constitucional de 1926, quando a competência para legislar sobre a organização do trabalho passa dos Estados para a União. A partir dessa reforma é que começa a edição de um conjunto de normas de proteção ao trabalho na esfera federal.

Com efeito, em 1931 veio o Decreto nº 19.671-A, pelo qual foi criado o Departamento Nacional do Trabalho, que tinha como atribuição básica"promover medidas de previdência social e melhorar as condições de trabalho". No que tange a fiscalização, ficou como competência desse Departamento a verificação do cumprimento de determinadas leis, como as de acidente de trabalho, férias, trabalho das crianças e das mulheres e ainda, o estudo e fiscalização da aplicação dos convênios e tratados internacionais ratificados pelo Brasil.

Já no ano de 1932 são criadas as Inspetorias Regionais nos Estados da Federação, conforme Decreto nº 21.690, de 01.08.32, ficando assim descentralizados os trabalhos de fiscalização da aplicação das leis de proteção ao trabalho. Em 1940 o Decreto nº 2.168 transformou as Inspetorias em Delegacias Regionais do Trabalho. O trabalho nos portos, na navegação e na pesca por sua vez ficou sob encargo da Delegacia do Trabalho Marítimo.

Em 01.05.43, através do Decreto-Lei nº 5.452, toda a legislação sobre trabalho até então em vigor foi reunida, surgindo a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Nesta consolidação a Inspeção do Trabalho teve uma disciplina própria, sendo tratada no Título VII, sob a denominação "processo de multas administrativas", com prescrição das prerrogativas, deveres e obrigações dos inspetores do trabalho, encarregados da fiscalização do cumprimento das normas de proteção ao trabalho [11].

Embora essa série de medidas legislativas tratando da inspeção do trabalho, eram tímidas as ações efetivas de controle do cumprimento da legislação trabalhista, o que colocava o país em posição desconfortável no cenário internacional. Foi então que o Brasil ratificou a Convenção nº 81 da OIT, através do Decreto Legislativo nº 24, de 29.05.56. A par dessa ratificação, o governo federal editou o Decreto nº 55.841, de 15.03.65, regulamentando a Inspeção do Trabalho.

Mas bem o país acabara de dar sinais de compromisso com a causa da proteção ao trabalhador, vieram os "anos-de-chumbo" e em 1971 o Brasil promove a denúncia da Convenção 81, sob o argumento de que dois problemas fundamentais o impossibilitavam de cumpri-la: o art. 6º, que cuidava do estatuto do pessoal e o parágrafo 2º do art. 11, que trata do reembolso dos gastos efetuados pelos inspetores.

Mas os anos nevoentos passaram, pela sua insustentabilidade, e finalmente no ano de 1987 o Brasil rerratificou a Convenção 81 com efeito repristinatório [12]. Assim entramos numa nova era, em que a inspeção do trabalho entrou num crescente desenvolvimento e aperfeiçoamento, ante a própria conjuntura econômica, política e social que demandava a intervenção estatal para viabilizar a melhoria das condições de trabalho.

Na Constituição da República de 1988, é atribuída à União competência para "organizar, manter e executar a inspeção do trabalho" (art. 21, XXIV), competência esta que não era contemplada nas cartas anteriores. Com isso, o governo federal começa um processo de reestruturação da inspeção do trabalho e diversas medidas legislativas são adotadas nesse sentido, tais como a reorganização do Ministério do Trabalho, que pela lei nº 8.028 detém a competência para fiscalização do trabalho (art. 19, VII, alínea a). Também a carreira de Inspetor do Trabalho criada pela Lei nº 6.479, de 09.04.44 passou por grandes transformações, entre as quais a mudança da denominação para "Fiscal do Trabalho" e atualmente para "Auditor-Fiscal do Trabalho", passando a integrar as "carreiras do fisco federal", juntamente com os Auditores-Fiscais da Receita Federal e INSS, nos termos da Medida Provisória nº 2.175, de 30.08.99, bem como a redefinição de sua competência, onde foi contemplada a possibilidade de fiscalização das relações de trabalho e o acesso aos livros contábeis dos empregadores.

2.4 - A Posição Enciclopédica da Inspeção do Trabalho

Não é pacífica a doutrina quanto ao assentamento jurídico da Inspeção do Trabalho, sendo por alguns autores colocada como integrante do Direito Administrativo do Trabalho enquanto por outros é considerada como inserida num dos ramos do Direito do Trabalho.

Consoante ao que levantamos nessa questão, quem melhor orienta sobre ela é Nelson Mannrich [13], eis que apontando a fundamentação das correntes que se esgrimam alcança a sustentação convincente para o estabelecimento e fixação da Inspeção do Trabalho na circunscrição do Direito. Argumenta o insigne doutrinador que a ação do Estado objetiva prioritariamente promover a justiça social, buscando o desenvolvimento da pessoa humana, mediante o engajamento de todos na organização política, econômica e social do País. E, ante esse objetivo, a legislação social não mais pode ser vista numa posição estática de tutela do trabalhador, mas sim deve representar uma intervenção do Estado que vai além da simples proteção, de modo a afastar os entraves provocados pelas desigualdades, onde entra a inspeção do trabalho como instrumento de efetivação desse objetivo do Direito do Trabalho.

A par dessa constatação da real proposta do direito do trabalho,inconcebível a colocação da Inspeção do Trabalho em outra ciência que não a do próprio Direito do Trabalho. Reforça, assim, o autor a sua posição de que a inspeção do trabalho não constitui ramo autônomo da ciência jurídica. Ainda por mais abundantes que sejam os seus estudos, por mais abrangente que seja o objeto de sua incidência e por mais vasto que seja o campo de sua observação, nada lhe retira o aspecto instrumental, constituindo parte de um grande conjunto. Não se pode dizer que haja "uma categoria diferenciada de sujeitos, de relações ou de objeto", para justificar sua separação do Direito do Trabalho. Ainda que o Estado integre a relação jurídica, o que pode, quando muito, é surgir um elemento adicional na discussão da natureza do próprio Direito do Trabalho, hoje já ultrapassada, dada que a argumentação de ser ele público ou privado é de caráter muito mais didático do que científico.

Quanto ao enquadramento da Inspeção no âmbito do Direito do Trabalho, primeiro há que se definir pela viabilidade da divisão deste Direito como ciência jurídica. Como é quase pacífica entre os doutrinadores essa divisão: Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho, além de outras como faz Amauri Mascaro Nascimento; Direito Público do Trabalho, como sendo "o conjunto de princípios que disciplinam as relações entre o trabalhador e o Estado e o empregador e o Estado" [14]. Nesta parte o ilustre professor insere a Inspeção do Trabalho. Já Octavio Bueno Magano denomina esta parte da divisão a que estaria a inspeção como "Direito Tutelar do Trabalho", onde estriam também a disciplina da jornada, segurança e medicina do trabalho, entre outras [15].

No compasso desta gama de normas de ordem públicas estabelecidas de modo imperativo pelo Estado: registro, duração do trabalho, descanso, segurança e saúde, entre outras, de modo que as partes não podem delas dispor, é que aparece o poder público para impor o seu interesse que no fundo é o interesse da sociedade. Com efeito, o conjunto de normas que disciplinam o interesse do Estado no controle das relações de trabalho é o que se convencionou chamar de Direito Público do Trabalho ou Direito Tutelar do Trabalho.

Por outro lado, em face da presença do Estado na promoção do controle dessas relações de trabalho, alguns autores adotaram a divisão chamada "Direito Administrativo do Trabalho" [16], na qual está inserida a Inspeção do Trabalho. Contudo, os expert que adotam esta denominação esclarecem não ser ela uma divisão do Direito Administrativo. Ao contrário, é ela integrante do Direito do Trabalho, constituindo-se no conjunto de órgãos estatais que tem por função a elaboração, aplicação e controle das normas que têm por objetivo proteger os trabalhadores.

Pelo exposto, conclui-se que não há uma autonomia do denominado "Direito Administrativo do Trabalho", embora seja ele imantado por certos princípios que disciplinam o Direito Administrativo. Como a Inspeção do Trabalho tem por proposta dar alcance objetivo ao sistema de proteção criado pelo Estado, na busca da dignidade humana do trabalhador, cujo aparato legislativo em que opera está afeto ao Direito do Trabalho e sua estrutura ser estatal, é sustentável que fique inserida no denominado Direito Público do Trabalho.

2.5 - Natureza Jurídica da Inspeção do Trabalho

O Estado na promoção da aplicação do Direito do Trabalho atua em duas atividades distintas: uma jurisdicional, em que o Estado-Juiz diz o direito no caso concreto e, a outra, administrativa pela qual desempenha as funções de fiscalização da aplicação das normas trabalhistas.

A Inspeção do Trabalho apresenta um tríplice vínculo jurídico: o empregado, o empregador e a sociedade. O empregado vincula-se ao empregador, mediante o contrato e ambos se vinculam ao Estado, na medida em que lhes são impostas obrigações e deveres de ordem pública. A presença deste último justifica-se pelo interesse social no cumprimento das normas trabalhistas de natureza cogente, por tratar-se de uma atividade irrenunciável do Estado [17].

A atividade administrativa desempenhada pelo Estado, através da Inspeção do Trabalho, caracteriza-se como atividade de conservação ou atividade social, visando o bem-estar geral. Assim, para o exercício destas atividades o Estado é dotado de mecanismos que possibilitam coibir os abusos e determinar correções necessárias ao alcance do objetivo pelo qual age. Essa faculdade utilizada pela Inspeção do Trabalho no desempenho de sua atividade de conservação ou social é o que se denomina poder de polícia. O Código Tributário Nacional coloca como conceito de polícia, verbis:

"Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos." [18]

Na doutrina de MELLO encontra-se esta definição:

[...] pode-se definir a polícia administrativa como a atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de abstenção ("non facere") a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo. [19]

Por sua vez, dada a multiplicidade das formas de atuação da Inspeção do Trabalho, ora desempenhando ações preventivas, ora repressivas, a ação de polícia atribuída à inspeção é um tanto variável, sendo classificada de polícia judiciária e polícia administrativa, conforme a forma como são desenvolvidas as ações fiscais. Há contudo quem defenda não estar caracterizada em nenhuma dessas espécies de polícia, embora contrariem a quase unanimidade da doutrina.Tenta-se explicar que a classificação somente deve ser estabelecida ao cabo da ação fiscal, de modo que se possa conhecer sob que modo fora desenvolvida a atividade em cada caso concreto.

Com efeito, se a conduta de determinado empregador ensejou a sua denúncia à autoridade judiciária, em razão de caracterização de crime, estaria configurada a classificação da atividade da inspeção como polícia judiciária. Por outro lado, se a ação fiscal alcançou o êxito a que determinada infração fosse corrigida, restabelecendo a normalidade no meio em que o trabalho é desenvolvido, estaria a atividade de inspeção classificada como polícia administrativa.

Ressalta-se que a função de Inspeção do Trabalho constitui um meio de autuação no caso concreto da legislação social, implicando ações que vão além da simples forma de polícia de segurança ou prevenção. É um meio de integração da lei para atingir seus fins específicos. Decorre disso que os poderes de autorização ou derrogação vão além daqueles da polícia, eis que o agente da inspeção, no uso do seu poder discricionário, pode promover a adequação da norma ao caso concreto, de modo que possa promover a efetivação dos fins buscados pela lei. Essa possibilidade já não se vê na simples autorização de polícia, que se coloca apenas para sustentar o afastamento de um limite a ser obedecido pelo particular.

De modo geral, as normas trabalhistas são de caráter imperativo e cobradas de modo repressivo, ante a "ordem pública" que as ensejam, mas nem por isso a aplicação delas afasta de plano a possibilidade de flexibilização, dado o princípio da norma mais favorável. E é na busca da mais adequada efetivação das leis trabalhistas que deve atuar o Auditor-Fiscal do Trabalho, utilizando o seu poder discricionário para melhor identificar a norma aplicável e modo de traduzi-la em benefício para o trabalhador.Adverte-se, porém, que o poder discricionário aqui levantado não é sinônimo de livre apreciação e interpretação da lei pelo Auditor. Apenas nos limites legais deve afastar-se da rigidez da norma para melhor alcance de sua finalidade.

Nesse sentido, para um bom termo do uso do poder discricionário, colacionamos a lição de MELLO:

Não se confundem discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que lhe permite a lei. Seu ato, em conseqüência, é ilícito e por isso mesmo corrigível judicialmente. Ao agir discricionariamente o agente estará, quando a lei lhe outorga tal faculdade (que é simultaneamente um dever), cumprindo a determinação normativa de ajuizar sobre o melhor meio de dar satisfação ao interesse público por força da indeterminação legal quanto ao comportamento adequado à satisfação do interesse público no caso concreto. [20]

Segundo leciona MANNRICH, citando Mário Pinto,

quando analisamos a natureza jurídica da Inspeção do Trabalho,a partir dos atos por ela praticados através de seus agentes, no sentido de garantir o cumprimento daquelas normas de ordem pública social, segundo determinadas limitações jurídicas e contratuais, podem-se apontar dois sistemas: o completamente liberal ou o laissez-faire, como acontece na Inglaterra e o regulador, cujo exemplo é a França. Em cada um deles a Inspeção terá uma atuação específica. [21]

Para melhor compreensão, deve-se ressaltar que a função de vigilância não é a única em que atua a Inspeção para alcançar a efetivação da legislação trabalhista. Por assim ser, as atividades de prevenção e orientação devem nortear o planejamento das ações fiscais, o que não descaracteriza a obrigação de vigilância do Estado, ao contrário, a torna mais legítima.

Conclui-se que a Inspeção do Trabalho é uma atividade estatal, desempenhada por agentes revestidos de poderes especiais para exercerem atividades preventivas ou repressivas, com vistas à garantir a efetiva obediência às normas trabalhistas e, por conseqüência, a melhoria da condição social do trabalhador.

2.6 - Conceito de Inspeção do Trabalho

Não ocorrem relevantes divergências entre os doutrinadores [22] quanto ao conceito de Inspeção do Trabalho. De maneira geral afirmam que se trata de uma atividade do Estado e não um órgão do Estado, eis que não há um órgão devidamente estruturado sob a denominação "Inspeção do Trabalho", esta é uma atividade a que um ministério: o Ministério do Trabalho tem por competência desempenhar. Afirmam ainda que essa atividade existe em razão do interesse público na promoção do bem estar social, ensejando que esteja dotada de um poder de polícia para possibilitar a que cuide da prevenção e promova a punição dos infratores.

Dadas essas premissas, conceitua-se a Inspeção do Trabalho como a atividade desempenhada pelo Estado para tornar efetivo o cumprimento da legislação do trabalho.

2.7 - Posição Institucional da Inspeção do Trabalho

A Inspeção do Trabalho está inserida na esfera de competência do Ministério do Trabalho e Emprego, conforme disposto no art.14, Inciso XIX, alínea b, da Lei nº 9.649, de 27.05.98, que criou a estrutura administrativa do Poder Executivo Federal. Essa providência legislativa de disciplinamento da fiscalização do trabalho decorre da competência da União fixada na Constituição Federal (art. 21, XXIV), que por sua vez estabeleceu ser ela atividade institucional do Ministério do Trabalho e Emprego (Lei nº 8.028, art. 19, VII, alínea a).

No âmbito interno do Ministério do Trabalho e Emprego, a atividade de fiscalização está afeta à Secretaria de Fiscalização do Trabalho - SEFIT, órgão técnico de cúpula, com sede na capital federal, que se encarrega do planejamento e normatização das ações fiscais do Estado brasileiro para acompanhamento do cumprimento da legislação trabalhista, tanto no que concerne as normas legais quanto as convencionais.

As atividades planejadas e normatizadas pela SEFIT são executadas nos Estados pelas Delegacias Regionais do Trabalho - DRT, que são órgãos descentralizados e sediados nas capitais. Nestas Delegacias estão lotados os Auditores-Fiscais do Trabalho que se encarregam de promoverem as atividadesde auditoria e fiscalização junto aos empregadores, além de outras atividades pertinentes às relações de trabalho.

2.8 - Modalidades de Fiscalização

O modo de operacionalização das fiscalizações é disciplinado pela Instrução Normativa Intersecretarial nº 08, de 15.05.95, quais sejam:

a) fiscalização dirigida - é a que resulta de prévio planejamento da Secretaria em Brasília em conjunto com a Delegacia Regional, com a participação, sempre que possível, das entidades sindicais de trabalhadores, outros órgãos ou instituições;

b) fiscalização indireta: a resultante do programa especial de fiscalização, realizada através de Sistema de Notificação para a Apresentação de Documentos nas Delegacias Regionais;

c) fiscalização imediata: ocorre independentemente de designação prévia, nos casos em que o Auditor-Fiscal do Trabalho deparar com situações que submetam o trabalhador a perigos iminentes ou constate infração que possa tornar difícil a sua comprovação futura;

d) fiscalização por denúncia: é a decorrente de Ordem de Serviço emitida em razão de reclamação do trabalhador ou entidade sindical e que, pela natureza, demanda prioridade no atendimento;

e) plantão: é a atividade interna de fiscalização para orientação ao público, homologação de rescisões de contratos e instrução de processos de anotação de Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS;

f) atividade especial: é a destinada à mediação de conflitos coletivos entre trabalhadores e empregadores, à coordenação de mesas de entendimento com vistas a que empregadores infratores firmem termo de compromissos no sentido de efetivo cumprimento da legislação trabalhista e ainda à análise de processos.

2.9 - Poderes e Funções dos Auditores-Fiscais do Trabalho

A Convenção nº 81 da OIT, que se encontra incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com hierarquia de lei, eis que fora ratificada pelo Brasil, indica em linhas gerais os objetivos a serem atendidos pela Inspeção do Trabalho. Vejamos:

a) assegurar o cumprimento das disposições legais relativas às condições de trabalho e à proteção dos trabalhadores no exercício de sua profissão;

b) fornecer informações e conselhos técnicos aos empregadores e trabalhadores sobre os meios mais eficazes de observar as disposições legais;

c) levar ao conhecimento da autoridade competente as deficiências ou os abusos que não estão especificamente compreendidos nas disposições legais existentes;

Prescreve ainda a Convenção 81 da OIT que os Auditores-Fiscais do Trabalho estão autorizados:

a) a penetrar livremente e sem aviso prévio, a qualquer hora do dia ou da noite, em qualquer estabelecimento submetido à fiscalização;

b) a penetrar durante o dia em todos os locais que eles possam ter motivo razoável para supor estarem sujeitos ao controle da fiscalização;

c) a proceder a todos os exames, controles e inquéritos julgados necessários para assegurar que as disposições legais são efetivamente observadas, podendo interrogar, seja só ou em presença de testemunhas, o empregador ou o pessoal do estabelecimento sobre quaisquer matérias relativas à aplicação das disposições legais, pedir vistas de todos os livros, registros e documentos prescritos pela legislação relativa às condições de trabalho, retirar ou levar para análise, amostras de materiais e substâncias utilizadas ou manipuladas, contando que o empregador ou seu preposto seja advertido dessa retirada.

Ressalte-se que a Medida Provisória nº 2.175-29, de 27.08.2001, confere poderes aos Auditores-Fiscais do Trabalho para proceder exames nos livros contábeis dos empregadores com vistas à eficaz verificação do cumprimento da legislação trabalhista. Traz ainda esta norma competência para os Auditores apreciarem questões atinentes tanto à relações de emprego como também à relações de trabalho.

A ação fiscal deve ser precedida de prévia identificação do Auditor-Fiscal do Trabalho perante o empregador ou seu preposto, mediante a exibição de sua identificação profissional, exceto quando julgar que a identificação poderá prejudicar a eficiência da ação fiscal, caso em que se identificará ao final da ação. (art. 12-1 da Conv. 81 OIT).

Sob a ótica formal e simplista do sistema normativo as atividades desenvolvidas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho são basicamente as seguintes:

a) atividade de fiscalização - é a atividade exercida perante os estabelecimentos empregadores, onde são exercidas atividades laborativas sujeitas ao cumprimento da legislação trabalhista.As pessoas jurídicas de direito público apenas ficam sujeitas à fiscalização do trabalho no que concerne ao cumprimento da Lei do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. Nesta atividade os Auditores-Fiscais promovem o exame de livros e documentos, inclusive contábeis, que tenham pertinência com o sistema protetivo do trabalho a que se encarrega controlar: controle de registro dos empregados, controle de jornada de trabalho, concessão de férias, análise da locação de mão-de-obra (com vistas a apurar a regularidade da terceirização), controle das rescisões contratuais, controle do recolhimento da contribuição sindical tanto da categoria econômica quanto profissional, controle da contratação de aprendizes, controle da proteção especial das mulheres, menores e deficientes físicos, controle do pagamento de salários, concessão de vale-transporte, controle do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, controle do cumprimento dos Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho, controle do cumprimento das normas de saúde e segurança nos locais de trabalho, providências de embargos e interdições, entre outras.

b) atividade de vigilância e orientação – é considerada a mais importante atividade dos Auditores e está preconizada na Convenção nº 81 da OIT. Uma vez desempenhada a contento possibilita um maior cumprimento das normas de proteção aos trabalhadores, ante a promoção de informações e aconselhamentos técnicos aos empregadores que em muitos casos deixam de observar corretamente a legislação apenas por desconhecimento, não tendo a intenção de desrespeito às prescrições legais. Assim, se constatada essa realidade, sustenta-se que deve o Auditor-Fiscal preferir a orientação à punição.

c) atividade de investigação - esta atividade contempla diversas providências que o Auditor pode tomar em razão de determinadas ocorrências, compreendendo entre elas a de interrogação do empregador e empregados sobre questões relacionadas ao cumprimento de normas, a de colher amostras e documentos mediante termo de apreensão, investigação de acidentes de trabalho para análise de causas e atribuição de responsabilidade, etc..

d) atividade de notificação e autuação - a atividade de notificação compreende a notificação dos empregadores para que apresentem documentos à fiscalização do trabalho para serem auditados. Todo e qualquer documento que possa demonstrar fatos relacionados aos direitos trabalhistas são passíveis de exibição ao Auditor-Fiscal do Trabalho, tais como livros contábeis, comprovantes de registros de empregados, contratos de trabalho, folhas de pagamentos de salários, recibo de férias, controle de jornada de trabalho, guias de recolhimentos de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, contratos de estágios, etc.. A notificação tem ainda por finalidade a determinação para que o empregador cumpra efetivamente certas normas trabalhistas que não estejam sendo observadas.

Já a autuação é a atividade de apontamento das infrações cometidas pelos empregadores. Decorre de um comando imperativo, conforme disposto no artigo 628 da CLT, nestes termos "a toda verificação em que o Auditor-Fiscal do Trabalho concluir pela existência de violação de preceito legal deve corresponder, sob pena de responsabilidade administrativa, a lavratura de auto de infração". É assim o auto de infração o instrumento de acusação de que lança mão o Auditor para comunicar a autoridade competente o cometimento de determinada infração pelo empregador. Nele é descrita toda a caracterização do fato constatado, mediante a identificação do infrator, redação da ementa correspondente, relatório e capitulação da infração, elemento de convicção, etc., enfim, constitui-se um "verdadeiro libelo acusatório" [23], de modo a ensejar, após possibilitar-se a ampla oportunidade de defesa ao infrator, um julgamento seguro da autoridade competente para imposição ou não da penalidade correspondente.

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Sobre o autor
José Manoel Machado

bacharel em Direito e Administração de Empresas, auditor-fiscal do Trabalho no Espírito Santo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, José Manoel. A fiscalização do trabalho frente à flexibilização das normas trabalhistas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 644, 13 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6599. Acesso em: 26 abr. 2024.

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