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Imunidades tributárias

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21/04/2005 às 00:00
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3. A EXTENSÃO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA AOS LIVROS, JORNAIS E PERIÓDICOS ELETRÔNICOS

           3.1. O Conceito de Livro

           Devido ao crescente e constante desenvolvimento tecnológico, diminuta é a distância entre o livro tradicional, feito de papel e os livros informatizados, pois as tecnologias de informação e da comunicação suscitam o aparecimento de condições inteiramente novas na vida pessoal, profissional, social e cultural dos cidadãos, criando desafios importantes porque, de regra, a evolução tecnológica não é acompanhada por uma evolução e uma adaptação em termos de organização da sociedade.

           O ilustre Ricardo Lobo Torres, num primeiro momento, conceitua o livro como sendo o resultado da impressão, em papel, de idéias, doutrinas ou informações com finalidade cultural. Aproxima-se, em acepção ampla do conceito que o senso comum admite e os dicionários registram (TORRES, 1999, p. 199).

           A noção clássica que se tem de livro é a de uma reunião de folhas de papel, impressos, presas a uma capa que pode ser flexível ou rígida, cujo conteúdo varia, podendo ser de caráter didático, científico, como também destinado ao lazer: romances e estórias infantis.

           Ainda, complementando a idéia de conceito de livro, Ângela Maria da Mota Pacheco, preceitua que o livro é um veículo que divulga informações, ciência, ficção, arte, idéias e cultura, no vasto domínio do conhecimento humano. A matéria, na qual o livro se impregna, se identifica, completa-o, mas não o define. (PACHECO, 2001, p. 388).

           Logo, na realidade, o conceito necessário e suficiente de livro, diz respeito ao seu conteúdo, finalidade e publicidade.

           Ressalta-se que, nem tudo que está escrito é livro, na acepção traduzida no artigo 150, inciso VI, letra "d", da Constituição, pois há os anúncios, notícias, grafites, cartazes, informações, periódicos e revistas.

           Neste sentido, Ricardo Lobo Torres acrescenta que a Constituição não distingue, nem pode o intérprete distinguir, os processos tecnológicos de elaboração dos livros, jornais e periódicos, embora vincule ao papel como elemento material de seu fabrico, excluindo, de igual forma, outros processos de comunicações do pensamento, como radiodifusão, a TV, os aparelhos de som e a cinematografia que não tem por veículo o papel. (TORRES, 1999, p. 199).

           3.2. Cultura Tipográfica e Cultura Eletrônica

           Várias são as discussões acerca da aplicação da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra "d" da Constituição Federal, no que tange à sua vinculação ao papel.

           Ricardo Lobo Torres traça algumas observações, afirmando que a fronteira centra-se na existência ou não, de texto impresso em papel, característica essencial para a fruição da imunidade. A garantia constitucional se insere na "cultura impressa" ou na "cultura tipográfica" e não na "cultura eletrônica", isto é, a vedação de incidência de impostos visa a proteger a expressão de idéias em papel (este também imune) e não aquele que aparece em programa de computador ou no espaço cibernético (TORRES, 1999, p. 286).

           Logo, infere-se que, na interpretação do sentido e alcance da imunidade é necessário que se evitem a banalização do seu conceito, o comprometimento do futuro da fiscalidade na informática e a analogia ingênua entre a cultura tipográfica e a eletrônica, não podendo comprometer o futuro da fiscalidade, fechando-se a possibilidade de incidências tributárias pela extrapolação da vedação constitucional para os produtos da cultura eletrônica; tanto mais que a nova tecnologia pode digitalizar tudo o que antes aparecia impresso no papel, sendo a recíproca verdadeira em boa parte (TORRES, 1999, p. 316).

           3.3. Entendimento Doutrinário

           Preceitua Francisco de Assis Alves que, através de uma interpretação puramente literal, poder-se-á chegar à conclusão errônea de que os livros eletrônicos não são alcançados pela imunidade. Errônea porque tal ilação estaria em desconformidade com os valores que o texto constitucional quis proteger (ALVES, 2001, p. 272).

           O tema referente à extensão da imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, letra "d" da Constituição, aos livros e periódicos eletrônicos não é assunto pacífico na doutrina, como quase todas as teorias jurídicas.

           José Eduardo Soares Mello dispõe que os processos tecnológicos para a elaboração dos livros, jornais e periódicos são totalmente irrelevantes, como é o caso de programas de computador (CD-Rom), disquetes, fitas cassete e demais elementos de informática, que também se encaixam no âmbito imunitório, uma vez que atendem às mesmas finalidades dos apontados veículos de comunicação. Trata-se de novos instrumentos que também transmitem idéias e conhecimentos e que, numa interpretação tecnológica, inserem-se na mesma moldura cultural veiculada aos livros (MELO, 1997, p. 96).

           Considera-se que o CD-Rom e o disquete, desde que sejam permeados com o mesmo conteúdo dos livros feito de papel, devem ser protegidos pelo instituto da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra "d", da Constituição, pois, desnecessário citar a importância da educação, da instrução, do aperfeiçoamento, da cultura, mormente no mundo cada vez mais globalizado, onde a tecnologia de produção é elemento desempatador na prática do comércio internacional, e pela qual a própria pessoa pode desfrutar da cidadania, contribuindo decididamente com seu saber.

           Adotando a mesma linha de pesquisa, Ives Gandra da Silva Martins aduz que a extensão da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra "d", da Magna Carta, deverá ser estendida aos livros e periódicos eletrônicos pelo fato da evolução da tecnologia mundial tornar os meios de informação, formação e cultura antiquados, substituindo-os por meios mais modernos e eletrônicos, à nitidez, pois o princípio que agasalha esta proteção da cidadania deve ser alargado, em sua exegese, às novas formas de comunicação. Logo, o livro eletrônico está protegido pela imunidade tributária como o estão os livros impressos em papel, que, em duas ou três gerações, deverão ter desaparecido ou estar reduzida sua edição aos colecionadores e bibliógrafos (MARTINS, 2001, p. 38).

           O entendimento consagrado na doutrina, acerca da extensão das imunidades tributárias aos livros eletrônicos, abarca-se no princípio da liberdade de pensamento que abrange todas as formas de comunicação entre as pessoas e, como é assegurada amplamente na Constituição, pode ser transmitida por qualquer meio que se revele idôneo à sua divulgação.

           Neste sentido, José Augusto Delgado preceitua que, na época atual, não pode entender como livro, apenas o editado em papel, pois, ao ser elaborada a Constituição de 1988, o mundo contemporâneo já conhecia uma realidade imposta pela ciência da informática e consistente na transmissão de idéias por vias eletrônicas, no caso o CD-Rom e o disquete. Logo, se a vontade do constituinte fosse de restringir a imunidade, apenas ao livro tradicional, isto é, ao livro lançado ao conhecimento do público pelo método tradicional, teria ele, explicitamente, declarado que a vedação de instituir impostos se limitava a livros formados pela reunião de folhas ou cadernos de papel, soltos, cosidos ou por qualquer outra forma, presos por um dos lados, e enfaixados ou montados em capa flexível ou rígida (DELGADO, 2001, p. 58).

           A doutrina tem entendido que a imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, alínea "d", da Constituição não só é estendida aos livros eletrônicos, como também aos CDs e disquetes virgens.

           Neste sentido, José Augusto Delgado dispõe que o livro de qualquer espécie é também uma forma de educar gerações. A educação, em termos constitucionais, é um direito de todos e um dever do Estado e da família, que deverá incentivá-la por várias formas (artigo 205 da Constituição Federal), logo, a imunidade alcança todas as operações, tanto com os disquetes virgens, como com os conteúdos destes. Os disquetes virgens equivalem, para todos os efeitos ao papel destinado à impressão dos livros, jornais e periódicos (DELGADO, 2001, p. 59).

           Entende-se que tal tese defendida pelo referido doutrinador citado no parágrafo anterior, no que tange à extensão da imunidade ao disquete e CD virgens, não nos parece viável, pois, não se sabe qual o conteúdo poderá vir a ser gravado no corpo destes.

           Sábias as lições trazidas por Celso Ribeiro de Bastos acerca do tema, quando preceitua que o CD-Rom e o disquete constituem-se em instrumentos de divulgação e exteriorização de informações, cultura e educação, e, como tais, devem ser abrangidos pela imunidade tributária, pois eles são o reflexo da evolução tecnológica dos meios de comunicação. O livro a que faz alusão a Carta Magna de 1988 é o meio através do qual se comunicam as idéias, as informações e os conhecimentos, não importando se o processo tecnológico, em vez de ser a impressão de caracteres de papel, seja a fixação dos mesmos em CD-Rom ou disquete. O que tem de ser levado em conta nesse caso, é o conteúdo do livro, usa as informações, e não o meio pelo qual se exterioriza. O fenômeno da evolução da informática vem tomando tamanhas proporções que não é exagero dizer que num futuro próximo, os livros, os jornais e periódicos serão editados em papel. Ademais, a referência ao papel destinado a sua impressão, outro sentido não tem senão de exemplificar um dos itens que entram na produção de revistas, jornais e periódicos (BASTOS, 2001, p. 243).

           Complementando a idéia do citado doutrinador no parágrafo acima, Luciano Amaro e Maria Tereza de Carvalho acrescentam que, se, por longo estágio da ciência, o papel foi o mais importante meio físico para registro, preservação e divulgação de obras literárias, artísticas e científicas, e nesse contexto histórico, se firmou a expressão da imunidade constitucional. Não se pode esvaziar o conteúdo deste, diante da evolução tecnológica, que leva o mesmo bem protegido pela imunidade (a obra) a expressar-se através de outra estrutura física. A imunidade, portanto, deve ser referida à obra e não ao meio físico que a contenha. Em síntese, no conceito de livro, jornal e periódico tem necessariamente, que abranger todas as formas de expressão de informações e informações de comunicação decorrentes das modernas tecnologias e não, apenas, obviamente, as que se apresentam fisicamente sob a forma de "paper print" (AMARO, 2001, p. 146; CARVALHO, 2001, p. 98).

           Yoshiaki Ichihara traça considerações acerca do tema, preceituando que sendo o livro instrumento de expressão e de comunicação, não importa seja de caráter técnico, didático, informativo ou cultural, nesta última categoria não importa que sejam pornográficos, permeados por fotografias, figuras e desenhos. Logo, não reconhecer a imunidade tributária dos livros eletrônicos é o mesmo que parar no tempo e no espaço, preso a uma interpretação literal e retrógrada, sem enxergar a realidade atual e do futuro, pois em termos de conteúdo, função, objetividade, recursos para pesquisas, copiagem, transporte, divulgação, rapidez na localização dos textos, os CD-Roms superam em muito os tradicionais livros, jornais e periódicos (ICHIHARA, 2001, p. 326).

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           Os tributaristas Bernardo Ribeiro de Moraes e Sacha Calmon Navarro Coelho entendem que a imunidade tributária não deve ser estendida aos livros eletrônicos, ressaltando que embora se reconheça que "livros" no passado foram executados em barro, argila, pedra, papiro, cascas de árvore ou com embasamento em outros materiais; embora existam outros veículos essenciais de transmissão e difusão do pensamento, conhecimentos e informação, com a mesma natureza e essência quando em outra base que não o papel; para efeitos de imunidade tributária consagrada na letra "d" do inciso VI, do artigo 150 da Constituição, não se pode imunizar o denominado "livro eletrônico", com suporte em disquetes ou CD-Rom, ou disponível na internet por não ser livro, com base na escrita e no papel de impressão, pois é "livro eletrônico", seria um eufemismo. O CD-Rom, disquetes, "slides" e outros equipamentos eletrônicos (informática) são entes diversos do livro, pois esta imunidade é vetusta da era pré-liberal. Logo, seria objetiva, imuniza a coisa, abrangendo impostos de repercussão para barateá-la (MORAES, 2001, p. 138; NAVARRO, 2001, p. 223).

           Tal posicionamento contrário é também defendido por Ricardo Lobo Torres, preceituando que o chamado "livro eletrônico", comercializado sob a forma de CD-Rom, é um hipertexto que, lógica, operacional e finalisticamente, difere do texto do livro impresso em papel; há possibilidade de obtê-lo diretamente na rede de informática, eis que a publicação originariamente impressa em papel pode ser transportada diretamente para a "network", como acontece com outros dicionários disponíveis na Internet, que são os baixados para que funcionem como hipertexto; é produto de consumo conspícuo, que, não fica ao sabor do intervencionismo estatal. Motivo que não ensejaria à extensão da imunidade contida no artigo 150, inciso VI, alínea "d" da Constituição Federal aos livros eletrônicos (TORRES, 1999, p. 303).

           3.4. OS PROGRAMAS DE COMPUTADOR

           O programa de computador, geralmente expresso em CD-Rom ou disquete para ser lido por máquina, recebeu o mesmo tratamento legal reservado aos direitos autorais, conforme previsto no artigo 1°, da Lei n. 9609/98. Vejamos o dispositivo aludido:

           Art. 1°. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento de informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análogo, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.

           Art. 2°. O regime de proteção à propriedade intelectual de programas de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.

           Segundo o jurista Ricardo Lobo Torres, quanto à tributação, a doutrina e as legislações vêm admitindo a incidência do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre o programa de computador de prateleira ou fechado, que é produto acabado colocado no comércio, e o ISS (Imposto sobre Serviço) sobre a prestação de serviço consubstanciada na realização de encomenda ou contrato de cessão (TORRES, 1999, p. 299).

           Ricardo Lobo Torres entende que os programas de computador não são abrangidos pelo instituto da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra "d" da Magna Carta, pois não tem, a mesma natureza e finalidade dos livros (TORRES, 1999, p. 301).

           A nosso ver, não há que se falar em estender o benefício das imunidades aos programas de computador, pois seria uma forma de desoneração injusta para o Estado Brasileiro que tanto necessita de recursos, a serem revertidos em forma de justiça social para a população carente.

           3.5. REDES DE COMPUTADORES

           O doutrinador Ricardo Lobo Torres tece alguns comentários sobre as redes de computadores, aduzindo que a comunicação entre computadores ligados em redes por intermédio de telefones e satélites traz interessantíssimos problemas de fiscalidade. As compras efetuadas através da Internet caem no campo da incidência dos impostos sobre o valor acrescido. Mas, em contrapartida, afirma seu posicionamento contrário à extensão da imunidade às redes de computadores (TORRES, 1999, p. 302).

           No que concerne a este tópico, firma-se o entendimento de que não há o porquê aplicação das imunidades às redes de computadores.

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Sobre o autor
André Luiz Maranhão

Consultor Jurídico

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARANHÃO, André Luiz. Imunidades tributárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 652, 21 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6610. Acesso em: 23 dez. 2024.

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