DA COMPETÊNCIA
O Conceito de Competência de acordo com Sérgio Pinto Martins10 é:
“uma parcela da jurisdição, dada a cada juiz. É a parte da jurisdição atribuída a cada juiz, ou seja, a área geográfica e o setor do Direito em que vai atuar, podendo emitir suas decisões. Consiste na delimitação do poder jurisdicional. É, portanto, o limite da jurisdição, a medida da jurisdição, a quantidade da jurisdição”.
No sentido de delimitar, mais precisamente, a competência da Justiça do Trabalho, a jurisprudência desempenhou um importante papel, principalmente pelas Súmulas do STF e dos Tribunais Superiores, todavia a doutrina fez severas críticas, como a exposta pelo entendimento de Júlio Bernardo do Campo11:
“Ou a Justiça do Trabalho já ostenta pelo caput do art. 114. da Lex Legum competência ampla e irrestrita para processar e julgar toda e qualquer ação oriunda de relação de trabalho, pouco importando figure no pólo processual passivo seja uma pessoa física, uma pessoa jurídica de direito privado ou mesmo uma pessoa jurídica de direito público, sendo que a única exigência é a de que o prestador de serviços seja uma pessoa física inserido em um contrato de atividade realizado com quaisquer das pessoas jurídicas antes nominadas, que figurarão como rés, ou a competência da Justiça do Trabalho envolvendo ações oriundas de relação de trabalho está a depender de uma regulamentação legal, tratando-se a norma competencial de autêntica regra de eficácia contida”.
No que diz respeito a competência em razão das pessoas (ex ratione personae), entendamos que a Justiça Laboral tem competência para disciplinar as questões entre empregado e empregador, que são as abrangidas na maioria dos casos nas ações trabalhistas, incluídos nesse contexto os empregados domésticos e excluindo os funcionários públicos (estatutários), que tem relação de trabalho com a administração publica. Sérgio Pinto Martins12 discorre sobre esse tema dizendo que:
“A Justiça do Trabalho tem competência para dirimir as controvérsias entre trabalhadores e empregadores, que são as pessoas envolvidas diretamente nos polos ativo e passivo da ação trabalhista. Trata-se da competência em razão das pessoas (ex ratione personae)”.
Ainda sobre o tema “em razão das pessoas”, a Justiça laboral passou a ter competência, nas ações oriundas especificamente da relação de trabalho, quando em um dos polos estiver qualquer ente de direito público externo, que são estados estrangeiros, suas missões diplomáticas, agências consulares, missões especiais, organismos internacionais e suas agências, ressaltando que o novo art. 114. da CF/88 trata da regra da competência da Justiça do Trabalho e não de imunidade de jurisdição. Falou também que não há dúvida de que a Justiça do Trabalho tem competência para examinar a relação entre o atleta profissional de futebol e o respectivo clube e que somente nos casos de disciplina e de competições esportivas é que se deve esgotar a via administrativa, nos demais casos, o atleta pode socorrer-se diretamente da Justiça do Trabalho para fazer sua postulação, como nos casos de salários não pagos, FGTS etc.
E sobre a competência em razão da matéria (ex ratione materiae) deve-se entender que a relação de trabalho é gênero que abrange a relação de emprego, abarcando o trabalho humano. Sobre o tema diz Sérgio Pinto Martins13 que “Relação de trabalho é o gênero que abrange a relação de emprego como espécie. Tem sentido mais amplo. Compreende o trabalho humano” (MARTINS, 2012, p.107).
Sobre as novas competências, a Justiça do Trabalho pode processar e julgar ações oriundas da relação de trabalho (art. 114, I, da CF/1988). Renato Saraiva14 define “Relação de trabalho corresponde a qualquer vínculo jurídico por meio do qual uma pessoa natural executa obra ou serviços para outrem, mediante o pagamento de uma contraprestação” (SARAIVA, 2012, p.62).
Discute-se na doutrina se a competência material da Justiça do Trabalho para processar e julgar ações oriundas da relação de trabalho alcançaria também a relação contratual de consumo, reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990). Vale destacar os ensinamentos do Ministro do TST, João Oreste Dalazen15, que assim leciona:
“Entendo que a lide propriamente da relação de consumo, entre o consumidor, nesta condição, e o respectivo prestador do serviço, visando à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, escapa à competência da Justiça do Trabalho, pois aí não aflora disputa emanada de relação de trabalho. É lide cujo objetivo é a defesa de direitos do cidadão na condição de consumidor de um serviço e, não, como prestador de um serviço. Afora isso, em geral a relação de consumo traduz uma obrigação contratual de resultado, em que o que menos importa é o trabalho em si".
O inciso II do novo art. 114. da CF/1988 assegurou à Justiça do Trabalho competência para processar e julgar ações que envolvam exercício do direito de greve, bem como as ações possessórias em face do direito de greve. Neste sentido manifestou-se o STF em decisão do Agravo de instrumento 598.457/SP e sumulou o entendimento através da súmula 23 que seguem:
“Agravo de instrumento de decisão que inadmitiu RE, a, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim do (f. 186):"COMPETÊNCIA - Declinação 'ex officio' - Interdito proibitório - Agravado em campanha salarial vem turbando ilicitamente a posse sobre as agências bancárias locais - Litígio entre empregador e empregado - Competência da Justiça do Trabalho - Recurso não provido". Alega o RE violação do art. 114, da Constituição Federal.Aduz, em suma, que o interdito proibitório discute tão-somente matéria de natureza possessória, ou seja, trata de questão de direito civil, razão pela qual deve ser apreciada pela Justiça Comum.Decido.O acórdão recorrido se ajusta ao entendimento do STF: originando-se da relação de emprego, a presente controvérsia deve ser julgada pela Justiça do Trabalho, não importando a circunstância de fundar-se o pedido em regra de direito comum.Assim se decidiu, com efeito, no julgamento plenário do CJ 6.959 , de que fui relator para o acórdão... Nego provimento ao agravo.
(STF - AI: 598457 SP , Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 26/10/2006, Data de Publicação: DJ 10/11/2006 PP-00077)
Súmula 23 do STF:
“A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada”.
A emenda 45 atribuiu competência a Justiça do Trabalho para processar e julgar ações sobre representação sindical, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores, é o que dispões o inciso III do novo art. 114. da CF/1988. As lides intersindicais envolvendo disputa de base territorial passaram a ser julgadas na Justiça do Trabalho, e não mais pela Justiça Estadual, como era anteriormente à referida emenda. Após a emenda a Oj n° 4 da SDC do TST in verbis, deixou de ser aplicada:
OJ nº 4. Disputa por titularidade de representação. Incompetência da Justiça do Trabalho. Inserida em 27.03.1998. A disputa intersindical pela representatividade de certa categoria refoge ao âmbito da competência material da Justiça do Trabalho.
A ampliação da competência atualmente se estende a qualquer controvérsia entre sindicatos e seus integrantes, de acordo com o entendimento de José Cairo Jr.16:
“Atualmente, qualquer controvérsia existente entre sindicatos e seus representantes, sejam eles empregados ou empregadores, de sindicatos entre si e no que se refere à representação sindical, são de competência da Justiça Laboral”. (p. 145).
A nova redação do art. 114, IV, da CF/1988 deu competência a Justiça do Trabalho para processar e julgar os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data em matéria de sua jurisdição. De acordo com José Cairo Júnior:
“Antes da emenda havia muitas contradições nas decisões judiciais, autoridade coatora nos casos de mandado de segurança eram apenas o juiz ou Tribunal, depois da emenda verificou-se que seriam alvos de Mandado de Segurança também os fiscais, auditores e delegados do Ministério do Trabalho, e membros do Ministério Público do Trabalho, dentre outras autoridades administrativas”. (p. 148).
No que diz respeito ao Habeas Corpus, a Justiça do Trabalho não tem competência criminal, só tem competência para analisar habeas corpus decorrente da relação de trabalho, entendimento esse do STF, no julgamento da ADI 3684 MC/DF, consubstanciado na decisão do Tribunal Pleno do TST, no julgamento do ROAG-891/2005-000-12-00.1, que bem resume o tema:
“RECURSO ORDINÁRIO EM AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO PENAL PÚBLICA - INCOMPETÊNCIA - DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Em recente pronunciamento, o Excelso Supremo Tribunal Federal, quando do exame do pedido de liminar formulado em ação direta de inconstitucionalidade (ADI 3684 MC/DF) ajuizada pelo Procurador-Geral da República, deferiu a liminar para, com efeito ex tunc , dar interpretação, conforme a Constituição Federal, aos incisos I, IV e IX do seu art. 114, no sentido de que neles a Constituição não atribuiu, por si só, competência criminal genérica à Justiça do Trabalho. Concluiu a Suprema Corte que seria incompatível com as garantias constitucionais da legalidade e do juiz natural inferir-se, por meio de interpretação arbitrária e expansiva, competência criminal genérica da Justiça do Trabalho, aos termos do art. 114, incisos I, IV e IX, da Constituição da República.
(PROCESSO TST-ROAG-891/2005-000-12-00.1, PUBLICAÇÃO: DJ - 1º. 6.2007, Acórdão do Tribunal Pleno, Relator Ministro Vieira de Mello Filho)”.
Sobre o habeas data, insere-se no âmbito da competência da Justiça do Trabalho aquele que tiver como impetrante o empregado ou o trabalhador que mantenha relação de trabalho com o detentor das informações que tenham caráter público.
O art. 114, V da atual Norma Ápice, atribui competência à Justiça do Trabalho, para decidir conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado os que tiverem envolvido ao menos um Tribunal Superior. José Cairo Júnior17 diz que “conflitos de competência envolvendo Vara do Trabalho e Tribunal do Trabalho ou entre Tribunais do Trabalho são solucionados no próprio âmbito da Justiça Laboral” (CAIRO, 2012, p.149).
Não há que se falar em conflito de competência quando envolver um órgão superior e outro inferior hierarquicamente considerado, este entendimento se encontra disposto na súmula nº 420 do TST:
Súmula nº 420. COMPETÊNCIA FUNCIONAL. CONFLITO NEGATIVO. TRT E VARA DO TRABALHO DE IDÊNTICA REGIÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 115 da SBDI-2) - Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005.
A alteração advinda da emenda 45 veio a consolidar no texto constitucional a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho. O disposto no inciso VI do art. 114. da CF/1988 já era o entendimento adotado pelo STF, mesmo antes da referida emenda. Posteriormente o TST consubstanciou tal entendimento através da súmula 392:
Súmula 392 do TST - Dano Moral - Competência da Justiça do Trabalho. Nos termos do art. 114. da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho. (ex-OJ nº 327 - DJ 09.12.2003).
As ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho são de competência da Justiça do Trabalho de acordo com o novo art. 114, inciso VII, da CF/1988. Antes da emenda era de competência da Justiça Federal. Sobre esse assunto vale destacar a seguinte jurisprudência:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL E TRABALHISTA. EXECUÇÃO FISCAL MOVIDA PELA UNIÃO. MULTA TRABALHISTA APLICADA AO EMPREGADOR. EXEGESE DO ART. 114, VII, DA CARTA MAGNA DE 1988, ACRESCIDO PELA EMENTA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004.
1. O inciso VII do art. 114, da Carta Magna de 1988, prevê a competência da Justiça Trabalhista para processar e julgar as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.
2. Ressoa inequívoco que as alterações engendradas no texto constitucional foram no afã de transferir à justiça Trabalhista a competência para processar e julgar os litígios envolvendo multas trabalhistas, aplicadas por autoridade administrativa vinculada ao Poder Executivo (Ministério do Trabalho); de sorte que as execuções fiscais se incluem no termo "ação", utilizado pelo legislador de forma genérica.
Precedentes: CC 57.291 - SP, Relator Ministro CASTRO MEIRA, Primeira Seção, DJ de 01º de agosto de 2006; CC 57.291 - SP, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Seção, DJ de 15 de maio de 2006; CC 45.607 - SP, Relatora Ministra DENISE ARRUDA, Primeira Seção, DJ de 27 de março de 2006.
4. Conflito Negativo de Competência conhecido para declarar a competência do JUÍZO DA 82ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO - SP.
A competência prevista no novo art. 114, inciso VIII, da CF/1988 para que os juízes do trabalho executem de ofício as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir já haviam sido inseridas no texto constitucional através da emenda 20/1998, tendo sido confirmada através da emenda 45/2004.
Por fim, o disposto no inciso IX do novo art. 114. da CF/1998 dá a Justiça do Trabalho competência para processar e julgar outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, o que no entendimento de Renato Saraiva18 é totalmente desnecessário:
“Entendemos que o inciso IX do novo art. 114. da CF, estabelecendo a competência material da Justiça do Trabalho para processar e julgar outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, é totalmente desnecessário, uma vez que se trata de mera repetição do disposto no inciso I do mesmo art. 114, que já confere esta competência à Justiça Laboral”.
Anteriormente a Justiça do Trabalho só poderia conhecer outros litígios decorrentes da relação de trabalho mediante lei, após a emenda 45 é possível processar e julgar tais demandas por expressa previsão constitucional em seu art. 114, inciso I.