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Os crimes falimentares na nova Lei de Falências

(Lei nº 11.101/05)

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26/04/2005 às 00:00
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9. FALÊNCIA DE SOCIEDADES

            É sabido e é polêmico que a lei 9.605/98, que trata dos crimes ambientais, previu a possibilidade da punição de pessoa jurídica. Na nova lei, no caso das sociedades, o legislador equiparou ao devedor falido, os sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros, de fato ou de direito, bem como o administrador judicial, para os efeitos penais, na medida de sua culpabildade. Ou seja, havendo fraude falencial em uma sociedade, os responsáveis acima, é quem responderão criminalmente, na medida de sua culpabilidade, senão vejamos: "Na falência, na recuperação judicial e na recuperação extrajudicial de sociedades, os seus sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros, de fato ou de direito, bem como o administrador judicial, equiparam-se ao devedor ou falido para todos os efeitos penais decorrentes desta Lei, na medida de sua culpabilidade" (art. 179).

            Essa desconsideração da pessoa jurídica, já estava prevista, na legislação anterior em seu Art. 191, da seguinte forma: "na falência das sociedades, os seus diretores, administradores, gerentes ou liquidantes são equiparados ao devedor ou falido, para todos os efeitos penais previstos nesta lei".


10. DOS CRIMES EM ESPÉCIE

            Passaremos agora a analisar os tipos penais, utilizando como parâmetros o posicionamento doutrinário e jurisprudencial da antiga lei, face a inexistência de trabalho nesse sentido, bem como faremos um comparativo dos novos crimes com os revogados.

            10.1. FALENCIA FRAUDULENTA

            O Art. 168, da nova lex, praticamente repete a figura do crime de falência fraudulenta, tipificado na lei anterior no art. 187, entretanto com a pena exasperada, pois enquanto a lei anterior estabelecia uma pena de reclusão de 01(um) a 04 (quatro) anos, na nova lei, a sanção é de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão e multa.

            O delito de falencia fraudulenta, consiste em "praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem" (Art. 168).

            Sujeito ativo deste delito, é o empresário falido ou em recuperação judicial ou extra judicial, tratando então de delito próprio, podendo ainda outras pessoas responder, na medida de sua culpabilidade, pelo mesmo crime, conforme disciplina o § 3° do artigo em comento quando trata do concurso de pessoas: "Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas neste artigo, na medida de sua culpabilidade".

            No caso das sociedades, os sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros, de fato ou de direito, bem como o administrador judicial, também poderão responder pelo delito do Art. 168, por força do teor do art. 179.

            O elemento subjetivo do crime é o dolo, havendo ainda o elemento subjetivo específico (" com o fim de"), não existindo então a figura do delito culposo para esse crime.

            A conduta é comissiva e consiste na prática de ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial.

            Se não houver a decretação da falência ou a concessão da recuperação judicial ou extrajudicial, a fraude poderá caracterizar qualquer dos delitos de estelionato previsto no art. 171 do CP.

            10.1.1 Causas de aumento de pena

            O legislador trouxe ainda a previsão de causa de aumento de pena em duas hipóteses nos casos de fraude, senão vejamos:

            a) No parágrafo § 1º do Art. 168, estabeleceu um aumento de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se o agente:

            I - elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos;

            II - omite, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanço verdadeiros;

            III - destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em computador ou sistema informatizado;

            IV - simula a composição do capital social;

            V - destrói, oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.

            b) No parágrafo § 2º, sob nomem iuris contabilidade paralela, dispôs que a pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação.

            Essa última hipótese de causa de aumento de pena, não encontra correspondência na lei anterior, sendo que as condutas previstas no § 1° do Art. 168, algumas delas, correspondem às prevista anteriormente no Art. 188, cuja pena prevista era a mesma do art. 187, ou seja, de 1 (um) a 4(quatro) anos de reclusão. Veja que nessas hipóteses o legislador foi mais rígido, pois com um só aumento, a pena poderia chegar a 8 (oito) anos.

            10.1.2 Causa de diminuição ou substituição de pena

            A nova lei no § 4° do art. 168, ao tratar da causa de diminuíção de pena, o fez sob o título de "redução", prevendo a hipótese de redução de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terço), quando se tratar de falência de microempresa ou de empresa de pequeno porte, exigindo ainda a não existencia da prática habitual de condutas fraudulentas por parte do falido. Neste caso poderá ainda o juiz substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, por perda de bens e valores ou prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas, seguindo assim a mesma orientação da Lei 9.714/98, que alterou o Código Penal quando aumentou as hipóteses de penas restritivas de direitos, que são penas autônomas e substitutivas, conforme Art. 44, caput do CP.

            Veja que por força do art. 68 do Código Penal, essas causas de aumento ou diminuição de pena, serão analisadas na terceira fase da fixação da pena (Sistema trifásico de Nelson Hungria).

            Já na hipótese da substituição da pena, faz-se necessário que o juiz do feito, conclua a fixação da pena privativa de liberdade, para em seguida substituí-la, caso esteja presentes os requisitos exigidos pela lei (diferente dos requisitos do código penal), não sendo uma mera faculdade judicial e sim um direito subjetivo do réu a exemplo do que ocorre com as penas restritivas de direito previstas no Código Penal, cujo entendimento jurisprudencial e doutrinário é pela obrigatóriedade da substituição estando presentes os requisitos.

            "Torna-se obrigatória a substituição de penas privativas de liberdade por uma das restritivas de direito, quando o juiz reconhece na sentença as circunstâncias favoráveis do art. 59, bem como as condições dos inc. Ie II do art. 44 c/c o seu parágrafo único, todos do CP, caracterizando direito subjetivo do réu" -RSTJ 92/388 – (grifo nosso).

            O professor Damásio E. de Jesus, ensina que: "A substituição é obrigatória, se presentes as condições de admissibilidade. Não se trata de simples faculdade judicial". (5)

            Encontramos posição diferente com Cezar Roberto Bitencourt, quando diz que: "Na verdade, aqui, como na suspensão condicional, o risco a assumir da substituição deve ser, na expressão de Jescheck, prudencial, e diante de sérias dúvidas sobre a suficiência da substituição esta não deve ocorrer, sob pena de o Estado renunciar ao seu dever constitucional de garantir a ordem pública e a proteção de bens jurídicos tutelados". (6) (negritei)

            Vejamos o dispositivo legal do § 4º do Art. 168 da Lei n° 11.101/05: "Tratando-se de falência de microempresa ou de empresa de pequeno porte, e não se constatando prática habitual de condutas fraudulentas por parte do falido, poderá o juiz reduzir a pena de reclusão de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) ou substituí-la pelas penas restritivas de direitos, pelas de perda de bens e valores ou pelas de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas".

            No caso da substituição por prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, o juiz da execução penal é quem designará o local ou entidade da prestação do serviço, consoante art. 149, inc. I da Lei n° 7.210/84 – Lei de Execuções Penais – LEP, sendo que as demais disposições referente à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, aplicar-se-ão, as regras gerais estabelecidas no Código Penal, sendo que como a lei foi omissa quanto ao descumprimento da pena substitutiva, deverá o juiz proceder a conversão em pena privativa de liberdade, seguindo a mesma regra do art. 44, § 4° do CP, com o fundamento no teor do art. 12 do Código Penal.

            10.2. VIOLAÇÃO DE SIGILO EMPRESARIAL

            Dispõe a lei, em seu art. 169, que aquele que violar, explorar ou divulgar, sem justa causa, sigilo empresarial ou dados confidenciais sobre operações ou serviços, contribuindo para a condução do devedor a estado de inviabilidade econômica ou financeira, responderá por uma pena de 2(dois) a 4(quatro) anos de reclusão, e multa.

            Este delito não encontra correspondência em nenhum dos delitos revogados, na antiga lei de falência, tratando-se então de novatio legis incriminadora, que não pode atingir àqueles que praticaram tal conduta na vigência da lei anterior. Entretanto caso não haja a decretação da falência ou a concessão da recuperação judicial ou extrajudicial, pode caracterizar algum dos delitos previsto no código penal, entre eles podemos citar os crimes previstos nos arts. 153 e 154, do CP, respectivamente os crimes de violação de segredo ou violação do segredo profissional, conforme o caso concreto.

            O bem jurídico tutelado é a inviolabilidade do sigilo empresarial que não pode ser revelado sem justa causa.

            O sujeito ativo é qualquer pessoa e o passivo pode ser o empresário ou a sociedade.

            O elemento subjetivo do tipo é o dolo, inexistindo a forma culposa, pois a culpa é normativa. O delito não exige um fim específico (elemento subjetivo específico), basta que essa divulgação dolosa contribuía para levar o devedor ao estado de inviabilidade econômica ou financeira.

            Já o elemento normativo do tipo é a expressão "sem justa causa", indicando que não é qualquer revelação de sigilo empresarial ou confidencial que irá caracterizar o delito ex: uma pessoa acusada de crime que entrega uma carta à Autoridade Policial, cujo conteúdo venha revelar o verdadeiro autor que é o empresário, ou diretor de sociedade, bem como algum sigilo empresarial que possa levá-lo à falência. Tal pessoa não está divulgando sem justa causa. Aliás, o art. 233, Parágrafo único do Código de Processo Penal, expressamente prevê essa hipótese, quando dispõe que: "as cartas poderão ser exibidas em juízo pelo respectivo destinatário, para a defesa de seu direito, ainda que não haja consentimento do signatário".

            10.3. INDUÇÃO A ERRO

            O delito de indução a erro, previsto no art. 171 da nova lei, cuja pena em abstrato é de 2(dois) a 4 (quatro) anos, também se trata de novatio legis incriminadora, pois não era previsto na lei anterior, vejamos o seu teor: "Sonegar ou omitir informações ou prestar informações falsas no processo de falência, de recuperação judicial ou de recuperação extrajudicial, com o fim de induzir a erro o juiz, o Ministério Público, os credores, a assembléia-geral de credores, o Comitê ou o administrador judicial".

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            Referido delito é parente próximo do delito de Fraude Processual, previsto no art. 347 do CP, cuja pena é de 3(três) meses a 2(dois) anos e multa, o qual proíbe a inovação artificiosa, na pendência de processo civil ou administrativo, ou estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir o juiz ou o perito a erro. Tratando-se de crime contra a Administração da justiça.

            Trata-se de crime comum, podendo qualquer pessoa envolvida no processo de falência, de recuperação judicial ou extrajudicial, com exceção do réu (ver explicação abaixo), ser sujeito ativo do crime de indução a erro, previsto no art. 171 da nova lei, sendo que como sujeito passivo, podem figurar o Juiz, o Ministério Público, o Administrador Judicial (crime contra a Administração da Justiça), os credores, a assembléia-geral de credores, o Comitê de Credores.

            O elemento normativo do tipo seria sonegar ou omitir informações (se calar) ou prestar informações falsas (mentir), exigindo-se como elemento subjetivo, o dolo específico de induzir o juiz, o promotor e as demais vítimas em erro, motivo pelo qual o réu foi excepcionado no parágrafo anterior com sujeito ativo, pois tem a seu favor o Art. 5°, inc. II, da CF, que garante o direito de não ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei, ou seja, poderia o réu fazer uso do seu direito constitucional de permanecer em silêncio, sonegando ou omitindo informações do juiz ou das demais vítimas relacionadas tipo penal, bem como mentir em seu favor, prestando informações falsas.

            A conduta sonegar ou omitir (omissivas) ou prestar (comissiva) devem ocorrer durante o processo falimentar, processo de recuperação judicial ou extrajudicial.

            10. 4. FAVORECIMENTO DE CREDORES

            A legislador visando proteger os credores de boa-fé, de atos praticados pelo empresário devedor, em prol de um ou mais credores, inovou com o crime de Favorecimento de credores, através do art. 172, cuja pena é de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão e multa, para aquele que " praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais".

            No parágrafo único, previu a possibilidade do credor de má-fe, beneficiário dessa disposição ou oneração patrimonial, também ser apenado em co-autoria no delito em comento.

            O sujeito ativo então é o empresário devedor ou no caso de sociedade, os seus sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros, de fato ou de direito, bem como o administrador judicial, cuja conduta (comissiva) será a de dispor ou onerar o patrimonio ou gerar obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo do sujeito passivo que são os demais credores.

            O tipo penal exige a ocorrencia do prejuízo ou a possibilidade de prejuízo, no caso da tentativa, pois o empresário falido, poderia ser flagrado durante o ato de disposição ou oneração do patrimonio, interrompendo então o iter criminis, sendo que a conduta flagrada, deverá demonstrar nitidamente a hipótese de prejuízo.

            10.5. DESVIO, OCULTAÇÃO OU APROPRIAÇÃO DE BENS

            O crime de desvio, ocultação ou apropriação de bens, previsto no art. 173, com pena de 2(dois) a 4(quatro) anos de reclusão e multa, encontra conrespondência com o delito revogado, que estava previsto no art. 189, inc. I da antiga lei de falencias, cuja pena era de 1(um) a 3(três) anos de reclusão, ocorrendo então a novatio legis in pejus, que não pode retroagir para atingir àqueles que praticou o delito na vigencia da lei anterior.

            O delito consiste em "apropriar-se, desviar ou ocultar bens pertencentes ao devedor sob recuperação judicial ou à massa falida, inclusive por meio da aquisição por interposta pessoa".

            No código penal, os delitos de apropriação indébita (art. 168) e a receptação na modalidade de ocultar (Art.180), prevêem condutas correspondentes ao crime em estudo, motivo pelo qual, se não houver a decretação da falencia, ou a concessão de recuperação judicial, poderá o agente responder pelos delitos de apropriação indébita ou receptação, conforme o caso concreto apurado.

            A norma protege o patrimônio do devedor ou da massa falida, visando resgardar os direitos dos credores, entretanto por se tratar de bens da massa falida e bens sob recuperação judicial (os quais encontram-se sub judice ), pode-se dizer que também proteje a administração da justiça.

            Na lei anterior, havia a previsão expressa, do devedor responder pela prática do desvio e da ocultação dos bens da massa falida. Neste novo crime, o legislador não incluiu o devedor, como sujeito ativo, entretanto como é possível o empresário em falência ter em depósito ou ter a guarda dos bens da massa, durante o processo falimentar ou a processo de recuperação judicial, entendo que poderia também responder pelo delito, sendo certo que não faltará opiniões contrárias a esse entendimento.

            O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que tenha a posse ( guarda, depósito, penhor ou retenção) dos bens do devedor sob recuperação judicial, ou bens da massa falida. Veja que o legislador excluiu do tipo penal os bens do devedor sob recuperação extrajudicial por ter pressumido que o empresário nesta situação deverá zelar com segurança do seu patrimônio. Ademais o Estado não tem responsabilidade sobre os bens do empresário em recuperação extrajudicial, como ocorre nos casos da falencia ou recuperação judicial.

            A apropriação significa apossar-se ou tomar como sua os bens do empresário falido ou em recuperação judicial, enquanto o desvio significa dar outro destino aos bens e a ocultação é esconder os bens do empresário falido ou em recuperação judicial. A ocultação é delito permanente, que perdura enquanto os bens estiverem escondidos, cabendo nessa situação a entrada a noite na residência do agente, mesmo sem ordem judicial, hipótese prevista no Art. 5°, inc. XI da Constituição Federal, pois trata-se de situação flagrancial.

            O elemento subjetivo, das condutas alternativas, é o dolo que visa auferir alguma vantagem dos bens do falido, sendo que tais condutas poderá inclusive ser maquiada através de aquisição por terceira pessoa (interposta pessoa), a qual se não estiver de boa-fé, poderá responder pelo mesmo crime, como partícipe, na medida de sua culpabilidade (art. 29 do CP).

            10.6. AQUISIÇÃO, RECEBIMENTO OU USO ILEGAL DE BENS

            No Art. 174, o legislador estabeleceu pena de 2(dois) a 4(quatro) anos de reclusão e multa, para aquele que "adquirir, receber, usar, ilicitamente, bem que sabe pertencer à massa falida ou influir para que terceiro, de boa-fé, o adquira, receba ou use".

            Esse crime não encontra identidade nos crimes da antiga lei, portando novatio legis incriminadora.

            Não podem praticar esse delito, o juiz, o representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, tendo em vista que o legislador estabeleceu um delito específico, com a mesma pena, para essas pessoas no art. 177: "Adquirir o juiz, o representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, por si ou por interposta pessoa, bens de massa falida ou de devedor em recuperação judicial, ou, em relação a estes, entrar em alguma especulação de lucro, quando tenham atuado nos respectivos processos".

            As condutas (adquirir, receber, usar) incriminadas de forma alternativas, devem ser praticadas ilicitamente (não lícito; proibido pela lei, injurídico, ilegítimo, contrário à moral e/ou ao direito (7)), devendo o sujeito ativo, ter conhecimento que o(s) bem(s) pertence(m) à massa falida. No caso do(s) bem(s) pertencer ao empresário em recuperação judicial ou extrajudicial, não caracteriza o crime, pois não houve previsão legal, não se podendo falar em analogia in mallan partem.

            É possível a figura da tentativa e não existe a modalidade culposa, sendo que tais condutas somente serão consideradas como crime falencial, se houver a decretação da quebra da falência, pois caso contrário, poderá o agente responder por receptação, caso tenha conhecimento que os bens adquiridos, sejam de origem criminosa.

            10.7 HABILITAÇÃO ILEGAL DE CRÉDITO

            O delito de habilitação ilegal de crédito, previsto no art. 175, da Lei n° 11.101/2005, punido com pena de 2(dois) a 4(quatro) anos, e multa é identico ao previsto no art. 189, inc. II do Decreto-lei 7.661/1945, antiga lei de falência.

            O crime consiste em: " apresentar, em falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, relação de créditos, habilitação de créditos ou reclamação falsas, ou juntar a elas título falso ou simulado".

            O sujeito ativo do delito poderá ser qualquer pessoa (credor, procurador do credor com conhecimento da falsidade), salvo o devedor, o falido ou as pessoas equiparadas pelo art. 179.

            A falsidade dos títulos, deve ser convicente e idônea para enganar, pois caso contrário, se for grosseira, não configura o delito. Aliás, tratar-se-ia de crime impossível (objeto absolutamente impróprio), previsto no art. 17 do CP.

            O legislador quis punir, além dos credores de má-fé, o expertalhão (o estelionatário) que percebendo a situação do falido, se apresenta como credor, para auferir vantagem patrimonial.

            10.8 EXERCÍCIO ILEGAL DE ATIVIDADE

            O exercício ilegal de atividade, punido com pena de 1 (um) a 4(quatro) anos de reclusão está previsto no Art. 176, também trata-se de novatio legis incriminadora, pois na antiga lei de falência não havia previsão desse crime.

            A conduta criminosa consiste em: "exercer atividade para a qual foi inabilitado ou incapacitado por decisão judicial, nos termos desta Lei", ou seja, apenas àqueles que foram inabilitados por decisão judicial, com transito em julgado é que poderão praticá-lo, podendo aqui ser citado, o falido (ou equiparados), administrador judicial ou membros do comitê de credores.

            O delito comporta suspensão do processo, conforme art. 89 da lei 9.099/95, apesar da lei ser omissa nesse sentido, sendo que a doutrina já pregava a aplicação da Lei n° 9.099/95, nos delitos falimentares da antiga lei de Falências e Concordatas.

            10.9. VIOLAÇÃO DE IMPEDIMENTO

            O delito de violação de impedimento, previsto no art. 177, consiste em "adquirir o juiz, o representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, por si ou por interposta pessoa, bens de massa falida ou de devedor em recuperação judicial, ou, em relação a estes, entrar em alguma especulação de lucro, quando tenham atuado nos respectivos processos"

            Referido crime é punido com pena de 2(dois) a 4(quatro) anos, e multa, não sendo novidade no ordenamento jurídico, visto que já estava contemplado na antiga lei de falência, em seu art. 190, com pena inferior, ou seja, detenção de 1(um) a 2(dois) anos.

            Esse delito só pode ser praticado pelas pessoas ali referidas quando tenham atuado nos respectivos processos de falência, ou recuperação judicial, ou seja: o Juiz (titular ou substituto da vara que tramita o processo, bem como o juízes de segundo grau, que tenham se manifestados nos recursos civis ou penais envolvendo a falencia ou a recuperação judicial); o Promotor de Justiça (titular ou adjunto, ainda que enventual, mas que tenha oficiado nos autos da falência ou da recuperação judicial); o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador (seja oficial ou nomeado pelo juiz), o escrivão (o responsável pelo Cartório onde tramita o processo falimentar ou a recuperação judicial); oficial de justiça ou o leiloeiro (idem), por si ou por terceira pessoa (interposta pessoa).

            Veja que a lei não contemplou no tipo penal a pessoa do síndico, como na lei anterior, tendo em vista a extinção da figura do sindico na nova lei, cujas funções serão desempenhadas pelo administrador ou gestor judicial, ou seja, para o síndico que praticou o referido delito, que também era previsto na lei anterior, ocorreu a abolitio criminis.

            Trata-se de crime próprio, pois, só pode ser praticados pelas pessoas indicadas na lei.

            O legislador, primeiramente, quis assegurar (dar maior garantia) aos direitos dos credores (futura satisfação de seus créditos), impedindo dessa forma que as pessoas relacionadas acima, adquiram por preso vil os bens da massa falida ou do devedor em recuperação judicial. Também são protegidos todos os interesses das demais pessoas envolvidos na falência ou recuperação judicial, especialmente a Administração da Justiça e a Fé Pública.

            10.10. OMISSÃO DOS DOCUMENTOS CONTÁBEIS OBRIGATÓRIOS

            A lei anterior, em seu art. 186, inc. IV, punia com pena de detenção, de seis meses a três anos, quando concorresse com a falência, a insexistência dos livros obrigatórios ou sua escrituração atrasada, lacunosa, defeituosa ou confusa.

            A nova lei não repetiu esse crime, mas trouxe um delito muito semelhante no seu art. 178, punindo com pena de 1(um) a 2(dois) anos de detenção a conduta (comissiva) do falito ou daquele que se encontrar em recuperação judicial ou extrajudicial que deixar de elaborar, escriturar ou autenticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.

            Veja que como a pena mínima é igual a um ano, é cabível a suspensão do processo, nos termos do Art. 89 da Lei nº 9.099/95.

            A nova Lei de Falência, em diversos trechos, faz menção aos livros obrigatórios e documentos contábeis sem definí-los, fazendo-se necessário, utilizar-se de outras áreas do direito, para se saber quais seriam esses livres.

            Luiz Carlos Betanho, quando trata do crime de inexistencia de livros obrigatórios, cita o ensinamento de Rubens Requião que: " Os livros obrigatórios, em suas espécies, depemdem da natureza da empresa ou de sua atividade. Atualmente, apenas um livro, o "Diário", é obrigatório para qualquer empresa. O livro de "Registro de Duplicata" só será obrigatório se a empresa operar na venda a crédito e pretender emitir duplicatas. As instituições financeiras, as sociedades anônimas, as companhias de seguros, têm livros especiais que as respectivas leis exigem" (8).

            No art. 2°, da nova lei de Falência, o legislador excluiu taxativamente algumas empresas ou instuição, da aplicação da lei, daí a impossibilidade da ocorrência desse crime, para tais empresas ou instituições, quais são elas:

            I - empresa pública e sociedade de economia mista;

            II - instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores.

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Sobre o autor
Valdinei Cordeiro Coimbra

delegado de Polícia Civil do Distrito Federal, professor de Direito Penal na UDF

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Os crimes falimentares na nova Lei de Falências: (Lei nº 11.101/05). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 658, 26 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6631. Acesso em: 25 abr. 2024.

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