A CARTA POLÍTICA DE 1988

02/06/2018 às 18:13
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Algumas interfaces com a vida comum do homem médio.

Em 2018 completamos três décadas de Constituição. Além de indagar o que comemorar e o que lastimar, em termos de perdas de direitos fundamentais que abalaram sintomaticamente a Carta Política, é oportuno revisitarmos alguns tópicos específicos – mais ou menos resguardados.
 O texto a seguir não é exaustivo quanto à captura dos temas constitucionais, até porque isto seria obra de um manual dos mais completos. Portanto, preferimos citar apenas alguns itens ou critérios do Texto Constitucional, mas valorizamos o embasamento de cada um deles.
Assim, a seguir veremos algumas partes da Constituição Federal de 1988, destacadas de acordo com o perfil conceitual dos autores. Infelizmente, não pudemos reunir autores em número suficiente para que todas as grandes áreas da CF/88 pudessem ser apresentadas com o mesmo nível de profundidade. Preferimos, então, priorizar a qualidade à quantidade.

1. A BASE PRINCIPIOLÓGICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os direitos fundamentais não se exaurem no Texto Constitucional, tanto que tratados internacionais recebidos pelo ordenamento normativo nos termos do artigo 5º, § 3º da Constituição Federal , têm status supralegal e são, ao mesmo tempo, uma extensão constitucional em um corpo jurídico infraconstitucional.
Os direitos fundamentais são autogenerativos (ARAUJO e NUNES JUNIOR, 2016, p. 162), pois de certa forma transcendem e convivem com uma intertemporariedade que força a aplicação das normas que melhor se adequam ao objeto tutelado por esta categoria jurídica: “a nossa Constituição foi mais além, uma vez que, ao referir os direitos ‘decorrentes do regime e dos princípios’, evidentemente consagrou a existência de direitos fundamentais não escritos, que podem ser deduzidos por via de ato interpretativo” (SARLET, 2015a, p. 86). Assim sendo, é necessária a abordagem, primeiramente, acerca dos princípios aplicáveis aos direitos fundamentais, uma vez que o regime, ou seja, o Estado Democrático e Social de Direito, ocupa o pano de fundo deste trabalho.
Gustavo Zagrebelsky (2011, p. 110-111) apresenta diferenças entre regras e princípios, a partir da construção de que as regras são mais objetivas e os princípios podem direcionar as decisões diante de situações indefinidas ou de difícil resolução, quando concretamente é possível de se medir sua incidência e alcance:
Las reglas nos proporcionan el criterio de nuestras acciones, nos dicen cómo debemos, no debemos, podemos actuar en determinadas situaciones específicas previstas por las reglas mismas; los principios, directamente, no nos dicen nada a este respecto, pero nos proporcionan criterios para tomar posición ante situaciones concretas pero que a priori aparecen indeterminadas. Los principios generan actitudes favorables o contrarias, de adhesión y apoyo o de disenso y repulsa hacia todo lo que puede estar implicado en su salvaguarda en cada caso concreto. Puesto que carecen de supuesto de hecho, a los principios, a diferencia de lo que se sucede con las reglas, solo se les puede dar algún significado operativo haciéndoles ‘reaccionar’ ante algún caso concreto. Su significado no puede determinarse en abstracto, sine solo en los casos concretos, y solo en los casos concretos se puede entender su alcance.

A partir de uma leitura de que os princípios são “mandamentos de otimização” (ALEXY, 2015, p. 90), ou seja, normas que determinam que algo seja realizado dentro das possibilidades fáticas e jurídicas de modo a se extrair a maior medida possível, os princípios aplicáveis aos direitos fundamentais são uma espécie de ordem de otimização que serve para o melhor aproveitamento da concretização do postulado e da garantia.
No espaço que se destina a investigar os princípios que possam incidir sobre os direitos fundamentais, ocupa lugar de grande importância o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. A Constituição de 1988 preferiu tratar da dignidade da pessoa humana como um princípio e valor fundamental, quando a incluiu no Título I, dos Princípios Fundamentais, mais precisamente no artigo 1º, III e, dada a essa forma de visualização enquanto princípio jurídico-constitucional fundamental, a dignidade da pessoa humana é mais que um direito (SARLET, 2015b, p 79-80). Daí que serve para nortear e contornar os direitos fundamentais, como se fosse possível de se afirmar que não há direito fundamental que não contenha em seu escorço a dignidade da pessoa humana e que a dignidade não pode ser considerada um direito fundamental (SARLET, 2015b, p.82) – pelo fato de que não pode ser objeto de concessão ou, muito menos, retirada do ser humano.
Assim, a dignidade da pessoa humana, enquanto princípio e valor, tem a função de guiar não só os direitos fundamentais, mas para além disso, imbuir conteúdo e eficácia ao ordenamento jurídico fundado em um Estado Democrático de Direito Social.
Toda a problemática do poder, toda a porfia de legitimação da autoridade e do Estado no caminho da redenção social há de passar, de necessidade, pelo exame do papel normativo do princípio da dignidade da pessoa humana. Sua densidade jurídica no sistema constitucional há de ser, portanto, máxima, e se houver reconhecidamente um princípio supremo no trono da hierarquia das normas, esse princípio não deve ser outro senão aquele em que todos os ângulos éticos da personalidade se acham consubstanciados. Demais disso, nenhum princípio e mais valioso para compendiar a unidade material da Constituição que o princípio da dignidade da pessoa humana. (BONAVIDES, 2001, p. 233)

A partir da compreensão das características intrínsecas dos direitos fundamentais (ARAUJO e NUNES JUNIOR, 2016, p. 159-167), em especial a historicidade, a autogeneratividade, universalidade, limitabilidade, irrenunciabilidade e concorrência – bem como pelo seu enfoque jurídico-positivo, que são uma categoria de direitos inafastáveis e de permanente acesso a todos os indivíduos, e partindo-se dessa ideia de que os direitos fundamentais são destinados a todas as pessoas –, abre-se espaço para o princípio da universalidade. É importante ter em conta que, a característica de universalidade é decorrência de uma preocupação humanitária que torna incompatível com os direitos fundamentais a sua restrição a categorias de pessoas, ou seja, não se pode afastar do indivíduo o direito fundamental. E, nesse ponto, a abrangência principiológica da universalidade torna harmônica a compreensão:
De acordo com o princípio da universalidade, todas as pessoas, pelo fato de serem pessoas são titulares de direitos e deveres fundamentais, o que, por sua vez, não significa que não possa haver diferenças a serem consideradas, inclusive, em alguns casos, por força do princípio da igualdade, além de exceções expressamente estabelecidas pela Constituição, como dá conta a distinção entre brasileiro nato e naturalizado, algumas distinções relativas aos estrangeiros, entre outras. (SARLET, 2015a, p. 217)

Fato é que a Constituição conferiu igualdade a todos, como igualdade formal, e que assim precisa ser entendida para que os direitos fundamentais se efetivem e se tornem a igualdade materializada. Todavia, o princípio da igualdade em nada se relaciona com o princípio da universalidade, pois, “se o enunciado geral de igualdade se limitasse ao postulado de uma práxis decisória universalizante, o legislador poderia, sem violá-lo, realizar qualquer discriminação, desde que sob a forma de uma norma universal, o que é sempre possível” (ALEXY, 2015, p. 398).
Assim o que importa para a universalização é reconhecer em toda e qualquer pessoa, de acordo com a sua categoria – assim entendidas as condições individuais –, o status permanente de titular de direitos. E isso implica em dar às pessoas uma condição de inafastabilidade dos direitos fundamentais, dando ênfase ao seu objetivo protetivo.
Canotilho (2003) esclarece que a questão da universalidade pode ser reduzida ou ampliada de acordo com a postura que o constituinte adota, respeitado sempre o núcleo intangível dos direitos fundamentais, uma vez que não é alcançado pela discricionariedade do legislador e do governante e pode ser alargado pela atuação e efetivação judicial. O contorno do princípio da universalidade é importante aqui, justamente, para investigar a decisão política frente aos direitos fundamentais.
Outro princípio de incidência no campo dos direitos fundamentais é o da isonomia. O caput do artigo 5º da Constituição Federal, dispondo que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, quer dizer que ninguém pode ser discriminado ou ter aviltado qualquer direito ou garantia em razão do que é, ou da “categoria” em que se encontra. O princípio da isonomia busca, observando-se os direitos fundamentais, a integração da existência do “homem-membro” com o “homem-indivíduo” (SIQUEIRA JR e OLIVEIRA, 2016, p. 197) que se consubstancia na observância sistemática dos objetivos republicanos do artigo 3º e que se irradiam pelo Texto Constitucional. Com isso, o princípio da isonomia não é simplesmente “igualdade”.
Classificações dos direitos fundamentais
Diante do objeto que os direitos fundamentais tutelam, pelo enfoque conteudístico (ARAUJO e NUNES JUNIOR, 2016, p. 153-154), são classificados em três categorias: os protetivos da liberdade, protetivos do indivíduo diante das necessidades materiais e protetivos da preservação do ser humano. Já sob o aspecto evolutivo-cumulativo a doutrina convencionou classificar os direitos fundamentais em dimensões, neste sentido Zulmar Fachin (2006), Paulo Bonavides (2004), Dimitri Dimoulis (2014), ou gerações, como se tem em Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1999), Celso Lafer (1988).
Assim, a primeira dimensão ou geração é a que trata dos direitos individuais, tais como a liberdade e a propriedade, como expressão de um pensamento liberal-burguês e por isso pressupõem, a princípio, uma não-intervenção do Estado: podendo ser concebidos como direitos predominantemente de defesa.
Na segunda dimensão ou geração têm-se os direitos de matiz social e econômica, que foram percebidos diante dos impactos da industrialização e das desigualdades que se tornaram mais marcantes pelos processos de produção e de acesso aos bens de consumo. Ao contrário dos direitos de primeira dimensão, a segunda geração de direitos fundamentais reclama uma predominante ação do Estado no sentido de viabilizar as liberdades materiais pelo viés social: assistência social, saúde e trabalho, passam a ser objeto de uma atuação estatal, numa noção de responsabilidade pela solução dos problemas. Pelo que erigidos à categoria de direitos fundamentais, passam a ter maior grau de obrigação do Estado diante das questões sociais.
Na terceira dimensão ou geração dos direitos fundamentais, os direitos têm o contorno da solidariedade e destinam-se à proteção dos grupos, ou seja, da figura do gênero humano e, por isso, são de titularidade coletiva ou difusa. Na terceira dimensão situam-se direitos relacionados à autodeterminação dos povos, ao meio ambiente equilibrado, à paz, à utilização e conservação de patrimônios históricos, naturais e culturais e à família. São direitos que muitas vezes têm a titularidade indefinida e ou indeterminável e por isso exigem ações coletivas e colaborativas, que envolvem os Estados, as comunidades e os indivíduos para sua efetivação.
A classificação em dimensões, na forma como é atualmente proposta, e englobando estes três “marcos didáticos” , encontra-se em constante construção, de modo que autores como Paulo Bonavides (2004) e Norberto Bobbio (1992) admitem uma quarta dimensão; cada um com suas classificações peculiaridades, também são objeto de deliberação outras dimensões para abranger o acesso à internet, o direto a água, dentre outros. Enfim, como afirma Sarlet (2015a, p. 53): “as diversas dimensões que marcam a evolução do processo de reconhecimento e afirmação dos direitos fundamentais revelam que estes constituem categoria materialmente aberta e mutável, ainda que seja possível observar certa permanência e uniformidade neste campo”.
Dessa proposta histórica de se ver os direitos fundamentais, não se desprende que estão incursos num processo de reconhecimento progressivo de novos direitos e que são dotados de cumulatividade, de complementariedade e de interdependência (BREGA FILHO, 2002). Então, tem-se que os direitos fundamentais têm um aspecto dinâmico que não permite sua redução a uma dimensão ou geração particular: “as chamadas gerações [ou dimensões] são complementáveis, são o apoio teórico que comprova a historicidade, mas não atende à expectativa de caracterizar cada direito” (ALARCÓN, 2014, p. 389).
Os direitos fundamentais são o legado que as gerações passadas, especialmente os que participaram da construção da Carta Política de 1988, nos deixaram. Diante disso, a nossa tarefa é passar à frente esses direitos, garantindo que sejam efetivos e que sejam ampliados de acordo com as conquistas sociais e com a Força Normativa Constitucional e Democrática que, política e juridicamente, impõe o Estado Democrático de Direito Social.
2. CIDADES INTELIGENTES E O DIREITO
O conceito recente de cidades inteligentes e sustentáveis tem por objetivo principal unir novas tecnologias - em principal a internet das coisas e as tecnologias de informação e comunicação (TIC) - com o planejamento e os projetos instituídos no ambiente urbano. Assim como alterar os paradigmas existentes nos modelos de desenvolvimento, procurando então em essência o aumento da qualidade de vida dos cidadãos em um movimento de cooperação, onde Estado e coletividade retêm responsabilidades e capacidades de gerência e iniciativa. Portanto, ainda está em construção. Afinal, essa definição é de longe unanimidade entre os pesquisadores e principais atores dessa área (ALBINO; BERARDI e DANGELICO, 2015).
Muitos ainda defendem as definições e práticas tidas como ultrapassadas, se comparadas a esta onde existe uma multiplicidade de fatores e atores a serem observados e respeitados, bem como um senso de “accountability". As cidades inteligentes em sua origem eram entendidas apenas como centros de alta tecnologia, podendo estas suprir quase todas as necessidades de uma cidade, da gestão pública aos interesses do mercado. No entanto, nesse entendimento inicial, os cidadãos eram - apesar dos defensores desse modelo dizerem o contrário - relegados a condição de capital a ser utilizado pelo mercado e pelo Estado (HOLLANDS, 2015).
É inegável que mesmo nesse modelo existia um benefício para a coletividade, mas esse método atendia à lógica do mercado. Ou seja, quem podia pagar ou ter condições de utilizar serviços inteligentes teria sua qualidade de vida alterada. No entanto, aqueles já marginalizados e os que mais poderiam se beneficiar continuavam assim, inalcançados pelos serviços urbanos inteligentes. Nesse modelo predomina a lógica da oferta guiada pela tecnologia, como um produto puro (HOLLANDS, 2008).
Outra prática ainda identificável, em teoria menos predatória que a anterior, é gestada pela demanda. Esta é criada pelos gestores públicos fornecendo um problema a ser solucionado através de uma prática inteligente, podendo estar inteiramente em novas tecnologias e técnicas desenvolvidas sob medida, ou adequada a tecnologias e experiências já existentes. Nesse modelo, existe um maior controle do Poder Público, mas isso não garante o sucesso das ações realizadas. Diante desses limites, surge então uma nova prática onde a co-criação e a participação dos cidadãos é incentivada, promovendo-se um papel mais ativo por parte destes. Desenvolvendo-se, daí em diante, um tripé, onde sociedade, Estado e mercado devem equivaler-se na medida do possível.
Antes mesmo desse último tipo de prática surgir, uma das exigências dos conceitos e dos modelos de desenvolvimento das cidades inteligentes existentes era a necessidade de cidadãos conscientes e participativos. Sendo inclusive - até o momento e com tendência a aumentar em importância - um dos principais indicadores do quão inteligente é uma cidade e qual o seu potencial de aceitação ou de aplicabilidade de um modelo de desenvolvimento pautado pelos preceitos das cidades inteligentes.
Nessa esteira, o conceito de pessoas inteligentes pode ser entendido como capital humano e social, sendo este medido pelo nível médio de educação e afinidade com o aprendizado ao longo da vida sob a pluralidade social e étnica, bem como essa diversidade se comporta em termos de flexibilidade social, econômica e cultural, ou seja, como capacidade de interagir ou de transitar entre classes e grupos sociais. Além da capacidade criativa dedicada a identificar e solucionar problemas da comunidade, agregada a um sentimento cosmopolita, aceitando-se não apenas o cidadão da mesma localidade como os de outras e até estrangeiros. E, finalmente, mas não menos importante, a participação na vida pública (GIFFINGER, 2007 e 2010).
Defende-se que as características são interdependentes, tendo-se como base a educação. Não apenas a tradicional e especializada, mas uma educação com incentivo ao engajamento social e político. Para isso, uma educação política e no direito deve ser feita. Isto implica que cada cidadão tenha conhecimentos básicos das leis e do funcionamento do Estado para ter a capacidade de exercer sua vontade política, isto é, sua cidadania. Ainda que não implique no direcionamento a uma ou outra ideologia política, mas sim um estudo imparcial e politizado visando que cada um tenha as ferramentas para, de posse de conhecimentos básicos do direito, participar efetivamente da vida pública.
Para a já citada cooperação entre Estado, mercado e sociedade existir, o conceito de pessoas inteligentes é essencial, afinal, tais pessoas inteligentes preenchem os requisitos para o tripé ser equilibrado sem uma perna social extremamente curta. Mas em principal, ele quebra o paradigma atual de uma sociedade carente de entendimento político e do direito, forçando automaticamente a uma maior responsabilidade estatal.
Cidades Inteligentes e sustentáveis ainda são um horizonte a ser alcançado, a teoria ainda avança e as práticas também, talvez em ritmo mais lento. Mas é fácil notar as conexões com os princípios básicos que fundamentam a Constituição Federal de 1988 e em específico aos direitos urbanos e ao Estatuto da Cidade. Dando assim respaldo legal e principiológico no que se fundamenta a República brasileira, bem como toda e qualquer democracia.
Para o Estado Democrático, referenciado desde o preâmbulo da Constituição, é de consenso haver uma população consciente e capaz de expressar sua cidadania, a par de sua existência política perante a sociedade. Para tal, é essencial um nível de educação básica de qualidade e cujo foco seja justamente o exercício da cidadania. Pois, obedecendo-se a isso, fica mais fácil “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional com a solução pacífica das controvérsias”.
É preciso lembrar que o poder emana do povo, e não apenas de forma indireta através de seus representantes, mas de forma direta através da participação social. Inclusive, a capacidade cidadã é vinculada ao também princípio fundamental da dignidade da pessoa humana. Então promover alguma intervenção na vida pública, ou em como ela opera, fornecendo-se novas ferramentas e possibilidades de expressão da cidadania e enaltecimento disto, é garantir dignidade de um individuo perante a sociedade e o Estado que o representa.
A Ágora agora também é digital, negar isso ou tentar dissociar do real é governar metade de um todo. Mas, mais importante que governar o digital, tarefa quase impossível, a referência está em incorporá-lo às formas de governo. Um sistema de governança que faz uso extensivo de recursos associados às TIC’s, e da internet das cosias, pode tomar proveito da celeridade e automaticidade destes processos, promovendo uma gestão pública mais precisa e efetiva (SCHAFFERS, 2017).
Ainda se discute formas de incrementar a participação social de forma direta com o uso de tecnologias, mas os avanços são poucos. Talvez por falta de interesse dos Estados e dos sistemas de governança instituídos, ou ainda pelo caráter incipiente e quase prematuro dos estudos e das tecnologias desenvolvidos para tal (FERREIRA, 2017). Mexer na governança, na máquina política de uma sociedade e nesta mesma sociedade, é algo delicado e deve ser feito com cautela, afinal todos são organismos vivos e delicados. Intervenções tecnológicas potencialmente disruptivas de todo um sistema de governo, mercado e sociedade podem tanto beneficiar todos, promovendo o salto em civilidade e desenvolvimento, como também podem causar um retrocesso rumo aos tempos onde a democracia e os direitos humanos eram reprimidos (de forma mais explicita), deixando a sociedade global mais próxima de uma distopia tecnológica.

3. A ECO-LÓGICA CONSTITUCIONAL
É importante ressaltar que, na forma de capítulo em destaque na Ordem social – direito social do homem –, o art. 225 referenda-se em conjunto; pois, em si, condiz com um sistema jurídico unitário e harmônico que condiciona o poder, de forma geral, e o Poder Político de maneira substanciosa quanto à Hermenêutica Constitucional, enquanto Estado de Direito Democrático de Terceira Geração. Em acepção semelhante, antropocêntrica, destaca-se que:
A aceitação dessa concepção jurídica vai conduzir o Poder Público a melhor informar, a alargar a participação da sociedade civil na gestão dos bens ambientais e a ter que prestar contas sobre a utilização dos bens “de uso comum do povo”, concretizando um “Estado Democrático e Ecológico de Direito” (arts. 1º, 170 e 225) (Machado, 2016, p. 153).

De todo modo, nesta “nova” forma-Estado, a soberania estatal se submete aos desígnios do Direito Internacional – que, por sua vez, respondem aos interesses da Humanidade. É, com efeito, a realidade prática do Princípio U – de Rousseau  e de Kant (1990)  –, mas com o relevo da defesa e da preservação dos direitos das gerações futuras. Este maximin da teleologia jurídica – que se socorre do discrímen –, universalizante e unificador, é a principal característica do Estado de Direito Democrático de Terceira Geração. Do que se espera o advento de uma outra racionalidade impeditiva aos que possam ameaçar o meio ambiente e a Humanidade.
Neste curso, Eco-lógica é um conceito de Guattari (1991) e especifica a ideia de que devemos criar uma consciência profunda, uma racionalidade, portanto, dirigida ao meio ambiente. Um tipo de racionalidade arraigada que nenhum fator irracional - como a ânsia por exploração e lucro - seria capaz de remover dos indivíduos. Talvez mais do que princípio, uma razão sem a qual o indivíduo não se percebe como efetivamente humano e racional. (Por exemplo, pode-se duvidar que o homem foi à lua, mas quem duvida da lei da gravidade ou de que os humanos são potencialmente racionais?).
Na verdade, nós já concordamos, pois admitimos como não-razoável, irracional - em suma, sem nexo, lógica válida –, a violação desproposital do meio ambiente. Porque, em síntese, a irracionalidade do capital ameaça a Humanidade como um todo. Neste sentido, também precisamos de um novo Neolítico (Lévi-Strauss, 1989) - que redescubra o humano, sua essência (arte, política e técnica) e não apenas o lucro acima da vida de todos. Ou quem sabe de um Iluminismo Ambiental.
O ordenamento jurídico utiliza a expressão meio ambiente para assegurar a maior precisão técnica, jurídica, possível. O ambiente, por sua vez, é encarregado de elementos naturais e culturais – numa interação que condiciona o meio. O meio ambiente, além disso, condiz com uma conjunção de valores, um conjunto de elementos e não apenas a conexão entre esses elementos (ambiente).
Então, o conceito de meio ambiente é globalizante e abrange a natureza original e artificial, incorporando os bens culturais, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico: “o meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas” (Silva, 2003, p. 20).
 O meio ambiente artificial é integrado pelo espaço urbano construído ou fechado (edificações) e pelos equipamentos públicos: ruas, praças (espaço urbano aberto) . O meio ambiente cultural é caracterizado pelo valor especial que adquiriu e (re)produz, consoante ao patrimônio histórico, arqueológico, paisagístico, turístico. O meio ambiente natural (físico) constitui-se do solo, água, ar atmosférico, flora e fauna; com a interação dos seres vivos em seu meio. Esta diferenciação impõe um tratamento em regimes jurídicos diversos para sujeitos igualmente diferenciados, ainda que a Natureza constitua um valor por si só (Silva, 2003, p. 23).
 A Constituição Federal de 1988 trata do meio ambiente de forma direta e preferencial no art. 225, no entanto, condiciona-se como se fora uma carta de direitos públicos e societais. (Perspectiva semelhante é encontrada no art. 5º da CF/88 e que, em si, pode ser considerado como uma Constituição enxuta de direitos fundamentais).
 Por seu turno, no rol dos direitos fundamentais, uma vez que vem prescrito como Ordem Social (Título VIII – Capítulo VI), o art. 225 da CF/88 é um direito social do homem:
O que o direito visa a proteger é a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida. Pode-se dizer que há dois objetos de tutela, no caso: um imediato, que é a qualidade do meio ambiente; e outro mediato, que é a saúde, o bem-estar e a segurança da população, que se vem sintetizando na expressão “qualidade de vida” [...] porpõe-se a tutela da qualidade de elementos setoriais constitutivos do meio ambiente, como a qualidade do solo, do patrimônio florestal, da fauna, do ar atmosférico, da água, do sossego auditivo e da paisagem visual (Silva, 2003, p. 81).

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O caput do art. 225 da CF/88 o institui como “bem comum de uso do povo” e isto significa que é um direito republicano – como coisa pública – e está acima, como bem jurídico, de qualquer pretensão relativa ao direito à propriedade. Como obrigação pública, é um dever do Estado e da coletividade; contudo, a efetividade do direito compete ao Poder Público, chamado a restaurar e preservar indistintos processos ecológicos (além do devido manejo ecológico), neste sentido:
“Processos ecológicos essenciais (§ 1º, I) são aqueles que asseguram as condições necessárias para uma adequada interação biológica. Prover o manejo ecológico das espécies significa lidar com as espécies de modo a conservá-las, recuperá-las, quando for o caso. E prover o manejo dos ecossistemas quer dizer cuidar do equilíbrio das relações entre a comunidade biótica e o seu habitat” (SILVA, 2003, p. 55).

Portanto, é um dever-integrador de cuidar da diversidade e da integridade ecológica, do patrimônio genético, bem como operar a fiscalização dos que aí empreendem seus negócios. É, ainda, um direito-dever que deriva e carrega o Princípio Federativo, em todos os Estados-membros. Pois, a Federação é a união indissolúvel ou o conjunto unitário entre autonomias compartilhadas pela União, Estados-membros, distrito federal e municípios, conforme o art. 18: “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição”. Repele-se, aqui, o direito de sedição. Note-se que o constituinte reforçou a autonomia entre os membros da Federação, como autonomia residual, mas rebateu qualquer possibilidade de soberania que não pertença e se limite à concentração de poder erga omnes ao Estado e à Federação -  Cominado com a imposição de um Estado Laico que atue nos moldes da integralização do serviço público universal.
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
II - recusar fé aos documentos públicos;
III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

O meio regulatório decisivo à efetividade do próprio direito-dever é um Estudo Prévio de Impacto Ambiental – a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a inserir este marco de segurança ambiental –, o objetivo é antecipar-se ao “potencial de risco e dano”, relativamente presumido. Por outro lado, na outra ponta da interação, em que o direito é medium e não direito-fim (poder) – o meio jurídico é condicionador do fim político –, só haverá eficácia (legal) e efetividade (inclusão cultural) se houver educação ambiental em todos os níveis de ensino.
Numa leitura sistêmica e global o art. 225 da CF/88 protege a fauna e a flora, vedando práticas que ameacem a função ecológica ou promovam alguma forma de crueldade animal.
No todo, a exploração de recursos minerais será regulada por lei, impondo-se a recuperação do meio ambiente. As condutas lesivas praticadas por pessoas físicas e jurídicas impõem sanções penais e administrativas, bem como as terras devolutas ou arrecadadas em ações discriminatórias são indisponíveis. O uso da energia nuclear também será regulamentado por lei federal.
Vejamos, então, como se dispõe o artigo 225 da Constituição Federal de 1988:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; 
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
§ 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos.

Em que pese suprimidos da Constituição o Cerrado e a Caatinga (Dimoulis, 2012, p. 250), nos quais também seria o caso de se mencionar os manguezais e os pampas, hoje meio de desertificação, este conjunto de definições, preceitos normativos e diretrizes públicas, engloba três esferas ou níveis de normas jurídicas: o caput é a norma-matriz, a norma-princípio. O segundo tipo (§ 1º) recorta instrumentos de garantia de efetividade do próprio direito e não são meros recursos processuais: “São normas-instrumentos da eficácia do princípio, mas também são normas que outorgam direitos e impõem deveres...” (SILVA, 2003, p. 52 – grifo nosso). O terceiro aspecto (§§ 2º a 6º) traz determinações especiais quanto a objetos e setores dotados de elementos sensíveis que requerem imediata proteção constitucional.

4. A EDUCAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL
A constitucionalização do conhecimento científico
Para tratarmos juridicamente de ciência e tecnologia é imprescindível mencionar que a Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 3º, em seus objetivos fundamentais, destaca a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (inciso I) e a garantia do desenvolvimento nacional (inciso II). Ambos os incisos caracterizam o caráter cidadão da Constituição Brasileira, uma vez que muitos de seus artigos trazem o cidadão como principal beneficiário dos direitos e das garantias constitucionais. Tal afirmação foi endossada pelo iminente jurista Norberto Bobbio (2004).
O desdobramento desses objetivos fundamentais se traduz na tentativa do constituinte em abarcar interesses aparentemente antagônicos em um agir único da ordem econômica “fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo-se por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, tal qual expressado no art. 170 da CF/88.
A dimensão jurídica da ordem econômica, na forma como se deu na Constituição é, de certo ponto de vista, o “sopro de socialização” (SILVA, 2017) sobre o modo de produção capitalista que, de forma hegemônica, ocupa a ideia globalizada de vinculação da ciência e da tecnologia – enquanto pressupostos do progresso – ao processo de enriquecimento puramente monetário.
Neste sentido, importa frisar que a atuação do Estado “não é nada menos do que uma tentativa de por “nova” ordem na vida econômica e social, de arrumar a desordem que provinha do liberalismo” (SILVA, 2017). Pensamos, então, na independência de um Direito Constitucional Econômico com uma especial atenção, com estudo e interpretações próprias, mas sempre vinculadas aos objetivos primários da Constituição enquanto documento político – Carta Política.
É na perspectiva econômica da Carta Política que se afirma a liberdade nacional econômica, possibilitando um desenvolvimento plural – e sustentável – que tem nas pessoas o fim e não o meio para sair do jugo da burguesia nacional, a fim de se desprender das heranças feudais e da sobreposição do mercantilismo e do monopólio das técnicas.
Garantir uma sociedade livre, justa e solidária está intimamente relacionado com a ideia de que compete ao Estado brasileiro garantir o desenvolvimento nacional, propiciando a todos os cidadãos condições para que tenham uma vida digna. Aqui destaca-se o trabalho (art. 7º, CF), a liberdade de expressão científica (art. 5º, IX, CF) e a propriedade industrial (art. 5º, XXIX, CF). Essa liberdade de expressão científica se relaciona diretamente com a integridade intelectual do ser humano, pois a ciência representa uma das formas de visão racional de mundo. O intelecto se apresenta como um dos valores culturais criados a partir da posse da cultura racional.
Se não fosse imprescindível o desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação, no país, o Congresso Nacional não teria promulgado, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, a Emenda Constitucional nº 85 de 2015, que redefiniu as diretrizes básicas para o fomento e a propagação das atividades científicas no Brasil, atividades sem as quais será impossível garantir o desenvolvimento social da nação.
É incumbência do Estado promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica. A Constituição distingue a pesquisa em pesquisa científica básica, que receberá tratamento prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso da ciência, e pesquisa tecnológica, que deverá voltar-se preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional; para tanto o Estado apoiará e estimulará a formulação de recursos humanos nessas áreas do saber (SILVA, 2005, p. 844).

José Afonso da Silva (2017) entende que a EC-85/2015 acrescentou a função estatal de estimular a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, tanto na esfera pública quanto privada, devendo constituir e manter parques e polos tecnológicos em que inventores independentes possam criar, absorver, difundir e transferir conhecimentos tecnológicos (p. 863).
5. DOS DIREITOS SOCIAIS
 Na Carta Política de 1988, há referência a direitos (uma máxima ao coletivo) capaz de instituir não somente isonomia , como também equidade ; observando-se que o destaque a estas qualidades é majorado em seu Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo II – Dos Direitos Sociais.
 Na própria redação (Dos Direitos Sociais), é inferido o alvo objetivado com a criação deste dispositivo legal, a sociedade e os direitos que seguem/devem seguir a coletividade como um todo, sem distinção de qualquer tipo, como rege o seguinte artigo:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015).
(Saraiva, 2015)

 Este artigo da Constituição claramente representa uma importante dimensão dos Direitos Fundamentais, a segunda, que visa proporcionar ao indivíduo mais do que a simples sobrevivência, mas a vida digna no seu mínimo para todo o corpo social, de forma conexa e não-excludente.
Educação
 Na forma da lei, o Art. 6º é um direcionamento de direitos mais tarde descritos detalhadamente, de modo a serem instituídos ao corpo social. No caso da educação devem ser providos o ensino básico e de qualidade como uma obrigação do Estado e da família (arts. 205 a 214 CF88), deixando perceptível a ideia de prover o mínimo existencial, digno, ao ser humano, a começar por lhe dar subsídios intelectuais, tão logo, morais.
Saúde
 A saúde é mais do que um simples direito, é uma necessidade para que seja possível viver, ao menos, visando à ideia de qualidade de vida, para tanto, promovê-la vai além da simples existência do SUS (Sistema único de Saúde).
 Desta forma, pode-se dizer que é a promoção dos meios que proporcionam o básico para o indivíduo ser/estar saudável, bem como as políticas de saneamento básico e vacinação: a prova dessa disposição consta dos referidos artigos 196 a 200 da Constituição de 88.
Alimentação 
 A alimentação foi introduzida como direito fundamental no art. 6º após a Emenda Constitucional nº64, e claramente pertence ao coletivo, sendo também essencial a cada indivíduo. É necessário destacar que a alimentação só passou a ter uma diretriz de atuação após a instituição da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) – Lei n.º 11.346/2006 e regulamentação pelo decreto 7.272/2010.
 No entanto, sua tardia atribuição como direito fundamental não a descaracteriza; pelo contrário, ressalta uma evolução e valorização do ser humano, seja ele indivíduo ou grupo, em situação de fragilidade, ou com grande potencial econômico.
Trabalho
 Das questões relacionadas ao trabalho, o art. 6º é garantia da existência do direito (que tem sua posterior descrição nos termos dos arts. 7 a 11 que se somam à CLT/43 ), proporcionando segurança na esfera trabalhista seja ao empregador seja ao trabalhador.
Moradia
 Após a EC nº26, o direito social à moradia foi incluído na CF/88, tendo como sua principal “arma” de implantação as políticas públicas, a exemplo, do conhecido “Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV”, além de outros com objetivo similar: Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU; Programa Nacional de Habitação Rural – PNHR, visando o cumprir a obrigação do Estado quanto ao bem estar social e o mínimo existencial.
Transporte
 A partir da promulgação da Emenda à CF/88 nº90, o transporte passou a se validar como um direito fundamental, estabelecendo-se uma relação lógica entre o direito de liberdade (ir, vir, permanecer e deslocar-se), mais do que o simples desenvolvimento urbano.
 Este desenvolvimento, já possuía previsão legal no inc. XX do art. 21 e também nos arts. 182 a 183 da CF/88, além de ter suporte na Lei 10.257/2001. Neste caso, a grande diferença está na segurança que o dispositivo legal passou a transmitir, observando-se a função de garante da eficiência do transporte e seu acesso universal em/a e para todas as regiões do país, mesmo que apenas legalmente.
Lazer
 Apesar de não ser bem descrito, o direito ao lazer é claramente fundamental, o mesmo engloba as mais distintas atividades que podem ser consideradas lazer: como atividades prazerosas e que levam ao bem estar do ser humano, de forma física e mental.
 Desta maneira, a existência de praças públicas e demais espaços abertos à população, como museus e parques naturais, são exemplos de mecanismos de validação deste elemento (lazer) contido no art. 6º.
Segurança
 Este direito, um dos mais icônicos, está ligado a diversos outros dispostos no texto constitucional, como a vida (caso dos crimes contra a vida), o patrimônio (dos crimes contra o patrimônio), saúde: dano mental ou físico, como dispostos em vários delitos no CP/40 .
 Há que se lembrar que o Estado é o responsável, por lei, para prover a segurança pública, não podendo ela ser privatizada, salvo se houver mudança na própria Constituição que dispõe sobre a segurança pública no art. 144.
Previdência Social
 Esta garantia fundamental descrita e organizada nos arts. 201 a 2002 do Texto Constitucional representa um garante do indivíduo posterior a sua contribuição econômica. Quando o indivíduo não é mais capaz de gerar sua própria renda o Estado assume a responsabilidade sobre esse indivíduo, de forma que não fique desamparado.
 O direito ainda assegura casos em que a pessoa é incapacitada antes de atingir certa idade, seja uma condição de nascimento seja por alguma condição adquirida ao longo da vida (motivo de doença, por exemplo); em todos esses casos também recai sobre o Poder Público o dever de assistir esse cidadão.
Proteção à Maternidade
Visando o bom desenvolvimento dos infantes, bem como a criação do importante vínculo que estes compartilham com suas mães, a proteção à maternidade complementa o direito à infância e tem seu ápice no âmbito trabalhista – como é o caso do art. 7, inc. XVIII, art. 227, inc. I da CF/88 e Lei 11.770.
Proteção à Infância
 Ao passo em que a maternidade é pouco discutida, embora ainda figure de forma bastante expressiva no meio legal, a juventude como um todo, em suas particularidades, tem posição de destaque na Constituição. A discussão sobre ela ultrapassa o art. 227, § 1º inc. I, bem como os arts. 228 e 229 da Carta Política de 1988, e chega à expressão do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, pois entende-se que é na infância e na adolescência em que se forma o cidadão de forma material, como aquele que realmente atua na sociedade, sendo-lhe participativo de maneira positiva.
Assistência aos Desamparados
 Como prevê a Constituição, a assistência é um direito de todos e tem parte de suas diretrizes traçadas nos arts. 203 e 204 e na Lei Orgânica 8.742, além do art. 6º sobre o qual dispõe este item do texto.
 Porquanto não há um país perfeitamente isento de moléstias, a assistência àqueles que dela mais precisam constitui uma responsabilidade estatal da maior importância, uma vez que ao ter sob sua tutela os indivíduos, o Estado atrai para si o dever de proteger e promover a dignidade humana, sem que exima qualquer pessoa. Logo, é obrigação de fazer do Poder Público prestar-se à assistência social.

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Autores:
VINÍCIO CARRILHO MARTINEZ (Pós-Doutor em Ciência Política)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH

VINÍCIUS ALVES SCHERCH
Mestrando em Ciências Jurídicas - UENP
Universidade Estadual do Norte do Paraná
Jacarezinho - PR 

VANDERLEI DE FREITAS NASCIMENTO JUNIOR
Doutorando no PPGCTS, da UFSCar. Advogado
Especialista em direito processual civil pela Rede Anhanguera/UNIDERP

VICTOR GARCIA FIGUEIRÔA FERREIRA
Bacharel em Direito
Mestrando em Engenharia Urbana da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Engenharia Civil – CCET - DECiv - PPGEU – LIAA

JÉSSICA MARIA FROCEL HOLANDA SALES
Acadêmica do 3° período do Curso de Direito - UNIRON –
Porto Velho RO

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Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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