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Sistema adotivo brasileiro

28/07/2022 às 16:25
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O instituto da adoção passou por diversas transformações. Em determinados momentos, mudanças nas regras em nada agregavam à proteção aos direitos dos adotandos e tampouco traziam justiça aos envolvidos.

Introdução

O presente artigo visa abordar o tema da Adoção. Inicialmente abordar-se-á sobre o cenário atual do sistema de adoção no Brasil. Na sequência discorre-se sobre o instituto da adoção na Constituição Federal de 1988, apresentando os avanços que a Carta Magna trouxe acerca do tema.

Por fim, apresentar-se-á um breve relato histórico do instituto da adoção no Brasil e, ao final, serão exibidos os requisitos indispensáveis à adoção e os passos necessários para adotar um menor.

O Processo de Adoção no Brasil na Época Atual

Segundo informações do Conselho Nacional de Adoção (CNA), atualmente, no Brasil, existem mais de 45 mil pretendentes a adoção cadastrados no Conselho Nacional e cerca de 10 mil crianças e adolescentes a espera de uma família.

O Conselho Nacional de Adoção (CNA) passou a funcionar no ano de 2008 e desde daquele ano mais de 12 mil famílias puderam encontrar seus filhos através da adoção.

Diante dos dados acima apresentados surge a seguinte questão: Por que existem tantas crianças em abrigos a espera de uma família, uma vez que o número de pretendentes é cinco vezes maior do que a quantidade de crianças e adolescentes aguardando a oportunidade de uma adoção?

Muitos irão responder que o Sistema de Adoção no Brasil é moroso e, por este motivo, milhares de crianças e adolescentes passam toda a infância e juventude nos abrigos aguardando a tão sonhada reunião com uma família que nunca chega. Nesta mesma linha, do outro lado, milhares de pessoas aguardam por decisões judiciais que parecem intermináveis, aguardando para ter em seus braços e em seus lares aquele filho(a) tão desejado(a).

Pois bem. Ambas premissas não podem ser totalmente excluídas, mas tampouco são os únicos fatores que levam o processo de adoção a se estender por anos sem a efetividade de uma conclusão que atenda a prestação jurisdicional aguardada.

Perceba-se, a demora constante do processo de adoção não é exclusivamente por causa do sistema e da burocracia. O retardamento nos procedimentos se dá muitas vezes porque os candidatos a adotantes, em sua maioria, demonstram preferências por crianças com até dois anos de idade, sem irmãos, sem deficiência física ou cognitiva, ou, ainda, por crianças de cor branca.

A adoção na Constituição Federal de 1988

Ao longo dos anos, o instituto da adoção sofreu notórias modificações. Nos tempos mais remotos, perdurava o princípio da desigualdade, onde era clara a distinção entre filho legítimo e filho adotivo.

O advento da Constituição de 1988 trouxe maior justiça ao processo de adoção. A Carta Magna de 1988 introduziu no sistema normativo brasileiro a proteção integral às crianças e adolescentes, priorizando, dentre outros os direitos fundamentais como a vida, saúde, alimentação, educação e garantiu aos filhos adotados os mesmos direitos dos filhos tidos anteriormente como legítimos.

O Art. 227 da Constituição Federal de 1988 dispõe que:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Em 1990 foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei Federal nº 8.069/90, trazendo a garantia das regras estabelecidas na CF/88. Vejamos:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. [...]

Atualmente no Brasil pessoas maiores de 18 (dezoito) anos, com diferença de pelo menos dezesseis anos entre adotante e adotado, podem adotar. É o que assegura o ECA no seu artigo 42:

Art. 42: Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil.

(...)

§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.

A Lei nº12.010, de 2009, que dispõe sobre a adoção, estabeleceu a formação e implementação de cadastros estaduais e nacional de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à adoção. 

Dessa forma, com as diretrizes da referida Lei, é possível afirmar que o Estado passou a ser o principal defensor de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, órfãos e abandonados. Desta forma, o Estado é responsável pela intercessão da adoção, bem como por oferecer cuidados, abrigo e educação ao menor até a sua maioridade.

Neste diapasão, o processo de adoção no Brasil se tornou mais favorável para adotantes e adotados, uma vez que essas crianças são cadastradas no Sistema Nacional de Adoção facilitando o elo entre elas e sua futura família.

O Instituto da Adoção no Brasil: breve relato histórico

É relevante destacar que a adoção sempre existiu no Brasil e os fatores que levam os pais biológicos se afastarem de seus filhos são os mais variados, seja pela falta de condições financeiras, maus tratos, problemas psicológicos, dentre outros. Ademais, existem os menores órfãos ou aqueles que vivem simplesmente em situação de abandono, sem qualquer amparo da família biológica.

A história da adoção no Brasil nos mostra que, por muitos anos, o sistema de adoção era informal e em diversas ocasiões o que o adotante buscava não era exatamente um filho, mas sim mão de obra barata. Dessa forma, muitas crianças eram acolhidas para trabalharem em troca de comida e abrigo.

Em face da promulgação do Código Civil de 1916, foi regulamentada a adoção e, sem a intervenção do Estado, era realizado um contrato entre as partes interessadas na adoção. Este quadro não viabilizava, à época, um controle dos direitos dos adotados.

Dessa forma, na prática, os adotados continuavam sendo acolhidos para prestarem serviços. Além do mais, as regras trazidas no Código Civil de 1916 não eram benéficas para os menores. Explica-se. Apesar da garantia da transferência do pátrio poder dos pais biológicos para os pais adotantes, os filhos adotados não possuíam os mesmos direitos que os filhos biológicos.

Além disso, na época, deveria existir uma diferença de 18 anos entre adotante e adotado, os adotantes deveriam ter mais de 50 anos de idade e não poderiam ter filhos biológicos.

O processo de adoção para aqueles casais que queriam um filho, não um serviçal, também era informal. O procedimento era integralmente realizado em cartório e lá registravam-se os adotados como filhos legítimos.

Outros Diplomas Legais, como a Lei nº 3.133, de 1957, e a Lei nº 4.655, de 1965, trouxeram algumas alterações nas regras do processo de adoção, contudo nenhuma evolução no que tange aos direitos dos menores.

Alguns exemplos das regras trazidas nas referidas legislações se referem a idade dos adotantes, a qual passou a ser de 30 ou mais, com a diferença mínima de 18 anos entre adotante e adotado, bem como a irrevogabilidade da adoção (1965). Neste caso, porém, caso o casal tivesse um filho superveniente à adoção, poderiam requerer a retirada do filho adotado da partilha de bens em benefício do filho biológico. E esse benefício era concedido legalmente.

Observe-se o que expõe o Art. 9.º, do Código de 1965: O legitimado adotivo tem os mesmos direitos e deveres do filho legítimo, salvo no caso de sucessão, se concorrer com o filho legítimo superveniente à adoção. (Disposição repetida no Código Civil/1916, § 2.º do art. 1605).

Em 1977, com o advento da Lei nº 6.515 Lei do Divórcio, a adoção passou a ser irrevogável, mas ainda não havia a garantia plena desse direito visto que o casal adotante poderia ou não optar por isso.

Em 1979, entrou em vigência o novo Código de Menores, através da Lei nº 6.697.

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O primeiro Código de Menores foi criado em 1927, por meio do Decreto nº 17.943-A, mas não trouxe nenhuma regra de relevância sobre a adoção. Destaque-se que os menores não eram considerados sujeitos de direito, mas sim mero objeto do processo.

Pois bem. O segundo Código de menores instituído em 1979, trouxe uma divisão do processo de adoção. Existia a adoção simples e a adoção plena.

A adoção simples cuidava de crianças em situação de abandono e vulnerabilidade social, as quais para ser adotadas precisavam da autorização dos pais biológicos e do juiz. Aqui também não era garantido ao adotado os mesmos direitos de um filho considerado então como legítimo.

Na adoção plena, os adotados possuíam os mesmos direitos dos filhos legítimos, mas essa garantia somente era possível para crianças com até 7 anos de idade.

O casal adotante deveria ter pelo menos 5 anos de casamento e um deles deveria ter 30 anos de idade, sendo que ambos precisavam contar com uma diferença mínima de 16 anos de idade em relação ao menor adotado.

Ademais, não era permitido a adoção à pessoas solteiras, tampouco para casais que viviam em união estável sem reconhecimento legal e casais homossexuais. Releva notar que à época o casamento entre pessoas do mesmo sexo não era permitido legalmente.

Em 1988, com a promulgação da Constituição Cidadã, a adoção se tornou um processo mais justo, conforme narrado anteriormente. O texto constitucional trouxe proteção integral às crianças e adolescentes.

Já o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), trazido em 1990 pela Lei nº 8.069, garantiu os direitos descritos na CF/88 com significativa evolução nas regras para adotantes e adotados.

Requisitos indispensáveis à adoção e os passos necessários

  1. A idade mínima para se habilitar à adoção é 18 anos, podendo ser homem ou mulher, independente do estado civil, com a diferença de 16 anos em relação ao adotado.

Atualmente é possível a adoção por uma pessoa solteira e por casais, incluindo os homoafetivos.

  1. O interessado deve procurar a Vara da Infância e Juventude da cidade onde reside e dar início ao processo de adoção através de advogado ou defensor Público.
  2. Apresentação dos seguintes documentos: CPF e documento de identidade RG, certidão de nascimento ou casamento, comprovante de residência, comprovante de rendimentos, atestado ou declaração médica de sanidade física e mental e certidões cível e criminal.
  3. Obrigatoriedade da participação em curso de preparação psicossocial e jurídica.
  4.  O pretendente a adoção deverá descrever o perfil desejado da criança e isso ocorre durante a entrevista técnica, a qual será previamente agendada. Nesse momento, o adotante poderá escolher o sexo, faixa etária, estado de saúde do menor, se possui preferência por irmão e outros. Ressalta-se que irmãos não poderão ser separados em virtude de vedação legal.
  5. Após os devidos trâmites, será fornecido um laudo pela equipe técnica da Vara da Infância e Juventude, um parecer emitido pelo Ministério Público e, por fim, o juiz dará a sentença. Sendo o pedido acolhido, o nome do pretendente será incluso no Cadastro Nacional de Adoção.
  6. Após a aprovação do pedido, deve-se aguardar na fila de adoção pela criança com o perfil desejado.
  7. O pretendente à adoção será notificado pela Vara da Infância e Juventude quando aparecer a criança com perfil compatível. Dando tudo certo, ambos serão apresentados. A partir daí serão marcados encontros com o menor no abrigo onde ele mora, podendo haver pequenos passeios para que haja interação entre o adotando e a futura família.
  8. Transcorrendo os trâmites de forma satisfatória e com o processo de adoção protocolado, o adotante terá a guarda provisória do menor até a conclusão do processo. A partir desse momento a criança passa a morar com sua nova família, mas continuará a receber visitas periódicas da equipe técnica do tribunal que realizará uma avaliação conclusiva.

Por fim, o juiz irá proferir a sentença de adoção e determinará a lavratura do novo registro de nascimento do menor com o sobrenome da nova família. A partir desse momento, a criança passa a ter todos os direitos de um filho biológico.

Conclusão

No transcorrer do presente artigo, observou-se que o instituto da adoção passou por diversas transformações. Infelizmente, em determinados momentos, mudanças nas regras em nada agregavam à proteção aos direitos dos adotandos e tampouco traziam justiça aos envolvidos.

No entanto, com o advento da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção passou ter maior atenção do legislador e evoluiu fortemente, vez que foram estendidos os mesmos direitos dos filhos legítimos aos filhos adotados.

Por fim, conclui-se que o conceito de adoção vai muito além de um conjunto de regras e de qualquer conceito jurídico, visto não se tratar de uma filiação de segunda classe, tampouco um ato de caridade. A decisão de adotar é um ato de amor, é a gestação que não infla a barriga, mas preenche o coração.

Uma criança adotada cresce no coração do adotante, pois se constitui em uma escolha. O amor que não nasceu de nós, mas nasceu para nós.


Referências Bibliográficas:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12010.htm

https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-4655-2-junho-1965-377680-republicacaoatualizada-45831-pl.html

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l4655.htm

https://www.cnj.jus.br/sna/

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/l6697.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6515.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l4655.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l3133.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l3071.htm

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Sobre a autora
Ivanir Neves Mazzotti

Advogada. Bacharel em Direito/2006. Especialista em Direito e Processo do Trabalho, pela Faculdade de Ciências Sociais de Florianópolis/2008. Especialista em Direito de Família e Sucessões na UCAN/SP. Membro do núcleo de pesquisa e escrita científica da faculdade LEGALE. Pós Graduanda em Direito Civil e Direito Processual Civil na Faculdade LEGALE/SP. Atua na advocacia nos âmbitos extrajudicial e judicial como advogada e consultora jurídica; Possui Curso de Oratória Jurídica e negociação para Advogados – Campo Grande/MS. Atuou como Presidente da Comissão de Precatórios da OAB/MS, Presidente da Comissão de Direitos Sociais - OAB/MS, e Vice-Presidente da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB/MS, até o ano de 2020. Curso de extensão do NCPC – 2016 Cursos de extensão – Inovações no Direito Civil e Previdenciário. Prestou Assistência Jurídica à Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – em Londrina/PR. Mediadora e Conciliadora Judicial e Extrajudicial – Centro de Mediadores - Brasília/DF. 2021/2022. e-mail: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAZZOTTI, Ivanir Neves. Sistema adotivo brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6966, 28 jul. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/99313. Acesso em: 21 nov. 2024.

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