A porta do apartamento integra a fachada do edifício?

04/07/2018 às 09:57

Resumo:


  • Condôminos não podem alterar a fachada do edifício sem consentimento, mas pequenas modificações internas que não afetem a harmonia estética podem ser permitidas.

  • Portas internas das unidades não são consideradas fachada externa; alterações para reforço de segurança mantendo padronização não configuram infração.

  • Julgados indicam que a uniformidade visual não deve impedir personalizações que não comprometam a estética geral do prédio.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Dever do condômino em manter a fachada da edificação, conforme previsto no art. 1.336, inc. III do Código Civil Brasileiro. A porta integra a fachada interna? Pequenas alterações que não firam a harmonia estética do todo são permitidas?

O condômino pode realizar alterações na porta de acesso de sua unidade privativa? A questão gera algumas discussões que vamos elucidar com o presente texto.

Inicialmente, é dever do condômino, segundo consta no art. 1.336 do Código Civil Brasileiro, inciso III, não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas.

Importante, para esta finalidade, conceituarmos fachada, para que delimitemos o campo de ação da norma legal. Nestes termos, fachada é o conjunto harmonioso externo que compõe as faces de uma edificação.

As fachadas, como faces externas da edificação, são a da frente, as laterais e a dos fundos, com ênfase na fachada frontal, que traz a principal identidade visual da edificação. Para alguns juristas, temos ainda as fachadas ditas “secundárias”, que são as fachadas internas, como os corredores, áreas internas e partes comuns.

Uma vez analisado o conceito de fachada, temos de verificar o que pode ser considerado uma alteração de fachada. Assim, configura-se alteração de fachada quando nela se introduz qualquer mudança física capaz de desequilibrar ostensivamente a harmonia estética ou o projeto arquitetônico do edifício, ou ainda, que comprometa a aparência estética geral do prédio.

De fato, a regra geral já enunciada, constante no art. 1.336, inc. III, do Código Civil Brasileiro, é a de que os condôminos não podem realizar modificações nas fachadas, sem que haja o consentimento dos demais condôminos.

No entanto, verifica-se que não é razoável a interpretação literal e limitativa da norma legal, de cunho restritivo, sendo patente que carece de adequada contextualização. Desta forma, é correto afirmar que as modificações introduzidas pelos proprietários, que não afetem a harmonia do edifício, nem causem prejuízos aos coproprietários, são permitidas.

ENTENDIMENTO DOS JURISTAS E DOS TRIBUNAIS SOBRE O TEMA

Comentando o dispositivo legal, o jurista Flávio Tartuce esclarece que “a proibição de alteração de fachada tem por objetivo a manutenção da harmonia estética do edifício”. Prosseguindo, o autor conclui a questão, ao sentenciar que:

“a alteração que em nada implique comprometimento dessa harmonia arquitetônica não é considerada infração(…)" (TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v. 4: Direito das Coisas, 4ª ed. São Paulo: Método, 2012, p. 285).

Nessa linha, os tribunais têm decidido de forma favorável a pequenas alterações, desde que não comprometam de forma estética a fachada, e não exista vedação na convenção e regimento interno. Ainda, dependendo da modificação, é exigida a aprovação da assembleia.

AS PORTAS DAS UNIDADES COMPÕEM A FACHADA INTERNA DO CONDOMÍNIO?

A 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, entendeu em uma recente decisão que a porta de entrada da unidade não é fachada e, portanto, ocorre ausência de prejuízo para a estética do edifício. No mesmo sentido, outra interpretação do TJ-SP foi de que pequenos ajustes não afetam o equilíbrio panorâmico do edifício e não violam a harmonia arquitetônica interna.

TJ-SP - Apelação APL 00105082020088260068 SP 0010508-20.2008.8.26.0068 (TJ-SP)

Data de publicação: 23/08/2013. Ementa:

CONDOMÍNIO EDILÍCIO. SUBSTITUIÇÃO DA PORTA SOCIAL DE ENTRADA DE UM DOS APARTAMENTOS. NORMAS LEGAIS E CONVENCIONAIS QUE VEDAM APENAS MODIFICAÇÃO DA FACHADA. ASPECTOS EXTERNOS DO EDIFÍCIO. PRECEDENTES. APELAÇÃO DO RÉU PROVIDA. 1.

A substituição da porta social de entrada dos apartamentos não implica em mudança de "fachada" (aspectos externos do prédio).

2. Inaplicabilidade das limitações previstas no Código Civil, na Lei nº 4.594 /64, e na Convenção do Condomínio. Precedentes. 3. Recurso que deve ser provido, para julgar improcedente o pedido, revogada a tutela de urgência concedida. 4. Apelação do réu provida.

TJ-SP - Apelação Com Revisão CR 2636974300 SP (TJ-SP)

Data de publicação: 06/03/2009

Ementa:

CONDOMÍNIO - MODIFICAÇÃO DE FACHADA - Fechamento por meio de vidros transparentes incolores - Não caracterização da infração ao art. 1.336, III, do Código Civil , antiga previsão do art. 10 , I , da Lei n. 4.591 /64, ou da norma da Convenção Condominial -

Os vidros transparentes não alteram a forma da fachada, não influindo na estética do edifício, não alterando o aspecto externo

- Ausência de especificação de proibição de fechamento de sacadas por envidraçamento e, nele, por vidros transparentes incolores - Possibilidade por opção de realização - Sentença de improcedência - /Apelação desprovida. .

TJ-DF - Apelação Cível APC 20150910093556 (TJ-DF)

Data de publicação: 01/04/2016

Ementa:

CIVIL. PROCESSO CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. ALTERAÇÃO DE FECHADURA E MAÇANETA DA PORTA SOCIAL DE ENTRADA DE UM DOS APARTAMENTOS. NORMAS LEGAIS E CONVENCIONAIS QUE VEDAM APENAS MODIFICAÇÃO DA FACHADA EXTERNA. MANUTENÇÃO DOS ASPECTOS EXTERNOS DO EDIFÍCIO. SENTENÇA MANTIDA. 1.

A substituição de componentes da porta social de entrada dos apartamentos não implica em mudança de "fachada" (aspectos externos do prédio), uma vez que se trata de porta de unidade autônoma voltada para o corredor interno do andar.

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2. Inaplicabilidade das limitações previstas no Código Civil, na Lei nº 4.594/64, e na Convenção do Condomínio. 3. Recurso conhecido e improvido.

Pelos julgados acima, verificamos que as portas internas não integram o conceito de fachada da edificação, pois estes são algo de natureza externa e com conotação eminentemente social, já as portas das unidades possuem uma natureza interna, mais intimista e individual.

Na prática, por motivo de segurança, é comum o condômino requerer a troca das portas externas de sua unidade privativa por outras de material mais resistente, o que tem sido usual, não caracterizando alteração de fachada, desde que mantenha a mesma padronização arquitetônica, cor e tonalidade do projeto original.

Pelo exposto, singelas alterações não têm o condão de comprometer a estética do prédio, a harmonia do projeto, nem a segurança, estabilidade ou a solidez da edificação. A ideia de uniformidade visual estética não pode trazer em seu bojo a exigência rigorosa da mesma aparência para todas unidades condominiais, coibindo todo e qualquer detalhe de personalização, chegando ao absurdo de impor a todos os condôminos os mesmos gostos e preferências.

A porta interna não integra o conceito de fachada da edificação, sendo que diminutas modificações ou personalizações não extrapolam o limite de uniformidade exigido pela convenção coletiva e regimento interno.

Francisco Machado Egito, advogado especialista em Direito Imobiliário, sócio do GRUPO FRANCISCO EGITO, administração de imóveis e condomínios. Mais textos sobre Direito Imobiliário, condomínios e negócios imobiliários em www.franciscoegito.adv.br

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Sobre o autor
Francisco Machado Egito

Advogado com pós-graduação em Direito Imobiliário e pós-graduação em Direito Notarial e Registral. Graduado em Gestão de Negócios Imobiliários. Administrador de condomínios e imóveis. Graduado em administração e contabilidade. Sólida experiência em negócios imobiliários. Professor universitário nas disciplinas de Direito Condominial, tributação em negócios imobiliários e Aspectos contábeis, tributários e previdenciários em condomínios. Coordenador da pós graduação em Direito e Gestão condominial e da pós graduação em Direito Condominial. Mestrando em administração pela UFF. Presidente da comissão de Direito Condominial da ABA-RJ. Coordenador da Comissão de Contabilidade Condominial do CRC-RJ. Membro das comissões de Direito Imobiliário da OAB Niterói e OAB RJ.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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