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A histórica aplicação do princípio da solidariedade como direito humano na Constituição Federal de 1988

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04/05/2019 às 14:10
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4 O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988

Entre os objetivos fundamentais da República contidos na Constituição Federal de 1988, previstos no seu artigo 3º, está o de “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. (BRASIL, 1988, <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.ht>)

Aqui, a solidariedade deixa de ser um pensamento ético e passa a apresentar a qualidade de norma constitucional, ou melhor, princípio fundamental do direito pátrio. (CASABONA, 2007)

É irrefutável que o referido diploma legal expressa um comando para toda a nação, no sentido de concentrar suas ações para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Consoante AFONSO DA SILVA (1998, p. 109-110):

(...) é a primeira vez que uma Constituição assinala, especificamente, objetivos do Estado brasileiro, não todos, que seria despropositado, mas os fundamentais, e, entre eles, uns que valem como base das prestações positivas que venham a concretizar a democracia econômica, social e cultural, a fim de efetivar na prática a dignidade da pessoa humana.

O referido autor assevera ainda que, dentro dos princípios fundamentais da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o princípio da solidariedade está entre um dos princípios que se refere à organização da sociedade. (AFONSO DA SILVA (1998).

[...] exsurge de forma cristalina, pela simples interpretação literal, que a solidariedade compõe um dos objetivos fundamentais de nossa República. [...] todas as ações a serem desenvolvidas pelo Estado, e pelos particulares numa certa medida, se admitirmos a constitucionalização do direito privado como uma realidade entre nós, deverão atender diretamente ou estar relacionadas, de alguma maneira, aos ditos objetivos fundamentais, destacando-se que a fundamentalidade de algo, no caso da norma, outra coisa não é do que a designação de seu caráter essencial. (OLIVEIRA DA SILVA, [200?], p. 27.)

O referido autor vai além ao afirmar que o dispositivo constitucional que aborda a solidariedade atinge indistintamente todos que se encontram submetidos à ordem jurídica estabelecida pela Constituição Federal de 1988. Assim, a norma estabelece um objetivo ideal da sociedade para ser alcançado. (OLIVEIRA DA SILVA, [200?])

Importante argumento sobre tal fundamento do princípio da solidariedade vem de SILVA MACHADO (2006, p. 113), ao inferir que:

(...) tal enunciação, longe de ser taxativa, representa um balizamento condutor da sociedade e dos seus representantes para o presente e para o futuro, pois construir significa dar estrutura, formar, conceber, enfim, aperfeiçoar um eterno fazer com que a liberdade, a justiça e a solidariedade prevaleçam.

Embora alguns doutrinadores defendam que o princípio da solidariedade se concretiza nos direitos sociais constantes dos artigos 6º e 7º da Magna Carta, é bem verdade que aquele se propaga na Constituição Federal de 1988 como um todo. (CASABONA, 2007)

Exemplo disso é a função social da propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88). Igualmente, encontramos a influência do princípio da solidariedade no capítulo que trata da família, criança, adolescente e idoso. (CASABONA, 2007)

Mas não basta estar previsto na Constituição Federal do Brasil a norma sobre o princípio da solidariedade, é necessário que, em virtude da atuação de leis infraconstitucionais, aquele princípio se torne como no direito material, que tal princípio esteja verdadeiramente presente não somente na atuação do Poder Público, e sim na ação do indivíduo comum. (BARROSO, 1992)

Como lembra MACHADO (2006. p. 116):

[...] o princípio fundamental da solidariedade impõe uma política de solidariedade social, a ser exercida por meio de políticas públicas, orientadoras, segundo esse princípio básico e estruturante da solidariedade social, não só de toda a atividade legislativa, administrativa e judiciária, como também das atividades sociais privadas que a essas políticas devem se submeter, permitindo a imposição desse princípio constitucional, em qualquer caso em que se verifique a sua negação evidenciadas em atos comissivos ou omissivos.

Igualmente se manifesta MORAES (2003, p. 116), cerca da efetividade do princípio da solidariedade social:

A solidariedade social, na juridicizada sociedade contemporânea, já não pode ser considerada como resultante de ações eventuais, éticas ou caridosas, pois se tornou um princípio geral do ordenamento jurídico, dotado de força normativa capaz de tutelar o respeito devido a cada um.

Por fim, cabe dizer que o princípio da solidariedade tem aplicação imediata na Constituição Federal de 1988, por ser um dos objetivos principais da República, devendo os indivíduos dotados de direitos e deveres respeitarem o comando da lei, visando a melhora na qualidade de vida da sociedade.


5 CONCLUSÃO

Por intermédio do presente estudo se procurou conhecer a faceta do princípio da solidariedade pelas características de um dos direitos humanos, bem como conhecer a solidariedade nas dimensões dos direitos humanos.

Primeiramente, foi necessário abordar um pequeno ponto sobre o surgimento da solidariedade, suas características como direitos humanos e sua importância como um dos objetivos fundamentais da República do Brasil.

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Posteriormente, se buscou um histórico de constituições que foram muito importantes acerca da positivação da solidariedade, que por sua vez deram subsídio para que a Magna Carta de 1988 possuísse os mesmos preceitos e a essência da solidariedade estudada desde a antiguidade.

Por fim, se pesquisou o princípio da solidariedade na Constituição Federal de 1988, que não está apenas no artigo 3º, ou que somente concretizou os direitos sociais, mas sim de que os ensinamentos e ideias da solidariedade se irradiam para toda a Constituição Federal, a fim de que seja aplicada a solidariedade tanto pelo Estado quanto pela sociedade. Infelizmente, não basta somente a positivação como suficiente para que a solidariedade seja aplicada em larga escala na sociedade.

Diante o exposto, em resposta ao problema de pesquisa: “qual a importância da solidariedade ser enquadrado como um dos direitos humanos na Constituição Federal de 1988 do Brasil? ”, conclui-se que o princípio da solidariedade é uma construção histórica de milênios, mas que ainda não está em sua forma perfeita de implementação, apesar que, de fato, sua importância nas relações contemporâneas é indispensável, tendo em vista que a solidariedade vem tendo papel de protagonismo em constituições federais importantes da história, que trouxeram a síntese de lutas dos direitos humanos, e que influenciaram o diploma de 1988, impondo ao indivíduo e ao coletivo o dever na busca do bem-estar social em sociedade, que é objetivo fundamental do Brasil.


REFERÊNCIAS

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BARROSO, Luiz Roberto. A proteção do meio ambiente na Constituição Brasileira. In Cadernos de direito constitucional e ciência política. Ano 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:  <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 25 abr. 2018.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed., São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2002. p. 525.

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BUCCHIARERI PINHEIRO, Maria Cláudia. A Constituição de Weimar e os direitos fundamentais sociais: a preponderância da Constituição da República Alemã de 1919 na inauguração do constitucionalismo social, à luz da Constituição mexicana de 1917. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/asp?id=9014>. Acesso em: 25 de abr. 2018.

CASABONA, Marcial Barreto. O Princípio Constitucional da Solidariedade no Direito de Família. 2007. 210 f. Tese (Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito – Mestrado e Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

MACHADO, Jeanne da Silva. A solidariedade social na responsabilidade ambiental. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2006.

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 3. ed., Coimbra: Coimbra Editora, tomo IV, 2000. p. 32.

MORAES, Alexandre de. Direitos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 1. ed., São Paulo: Atlas, 2013.

MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 116.

MOTTA DA SILVA, Moacyr. A justiça social como destinação dos direitos sociais. [S.L.: s.n., 200?].

OLIVEIRA DA SILVA, Cleber Demetrio. O princípio da solidariedade. [s.n.] [200-]. p.27.

PIOVESAN, Flavia. Temas de direitos humanos. 1. ed., São Paulo: Max Limonad, 1998.

REIS, Jorge Renato dos. Os direitos fundamentais de tutela da pessoa humana nas rela­ções entre particulares. In: REIS, Jorge Renato dos; LEAL, Rogério Gesta (Orgs.). Direitos sociais e políticas públicas: desafios contemporâneos. Tomo 7. Santa Cruz do Sul: EDU­NISC, 2007.

ROUSSEAU, Jean Jacques. O contrato social. [tradução Antonio de Pádua Danesi]. 3. ed.  São Paulo: Martins Fontes, 1996.

SACCHETTO, Cláudio. O Dever da Solidariedade no Direito Tributário: o Ordenamento Italiano. In GRECO, Marco Aurélio e GODOI, Marciano Seabra de (coord.). Solidariedade social e tributação. São Paulo: Dialética, 2005. p. 13-14.

SILVA MACHADO, Jeanne da Silva. A solidariedade na responsabilidade ambiental. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2006. p. 113.

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Sobre o autor
Ricardo Werner Friedrich

Graduado em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) e advogado atuante na Comarca de Santa Cruz do Sul/RS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRIEDRICH, Ricardo Werner. A histórica aplicação do princípio da solidariedade como direito humano na Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5785, 4 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68109. Acesso em: 24 abr. 2024.

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