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Os danos morais nas relações de emprego:

as modificações promovidas pela reforma trabalhista no âmbito da responsabilidade civil

15/10/2018 às 14:45
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O campo trabalhista é especialmente favorável para a caracterização de danos morais, considerando-se a posição de vulnerabilidade que ocupam os empregados.

Introdução

A Constituição Federal, promulgada em 1988, cuidou de consagrar, ao longo de suas disposições, os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, responsáveis por atribuir ao ordenamento jurídico uma identidade ética e ideológica, capaz de vincular suas diversas partes em torno de valores e fins comuns (BARROSO, Luis Roberto, 2009, págs. 208-209).

A base civilizatória e jurídica, desde então, segue orientada pelo super princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, consoante o art. 1o, III, da Carta Política. Como corolário, portanto, surge a proteção aos direitos e garantias fundamentais, dentre eles, os denominados direitos da personalidade, a saber, o direito à vida, à integridade física e psíquica, além da moral, e assim por diante.

É nesta trilha de ideias que, visando protegê-los, o legislador constituinte assegurou a todos, em pé de igualdade, o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral, ou à imagem, tal como consta do art. 5o, V, da Constituição Cidadã.

Em verdade, esta garantia em muito corrobora o disposto pela própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas - ONU, que assevera, em seu art. 12, nenhum homem estar sujeito à ataque à sua honra e reputação, e acrescenta: “Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.

Esta dada, imprescindível que se esmiúce o real significado do instituto dos danos de ordem moral. O ilustre Carlos Alberto Bittar, com a precisão que lhe é peculiar, qualifica “como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana, ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua” (BITTAR, Carlos Alberto, pág. 41).

Assim, o que se busca aqui, é proteger a pessoa, propriamente dita, em toda sua integridade, compensando-a pelas tormentas que suportara em virtude da violação dos seus atributos, de modo a prezar pela máxima constitucional da dignidade.


Os Danos Morais à luz da Reforma Trabalhista

Prima facie, forçoso convir que o campo trabalhista é especialmente favorável e fértil, por excelência, para a caracterização dos danos morais, considerando-se a posição de vulnerabilidade que ocupam os trabalhadores dentro de suas relações empregatícias, afinal, muitas são as ocorrências aptas a gerar o dever de indenizar, como os atos discriminatórios, de qualquer natureza, por exemplo.

Anteriormente à reforma trabalhista, promovida pelas Leis no 13.467/2017 e no 13.509/2017, além da Medida Provisória no 808/2017, a Consolidação das Leis do Trabalho tratava apenas indiretamente da defesa dos direitos da personalidade, fazendo uso subsidiário das leis comuns para tanto, conforme as antigas determinações de seu art. 8o, parágrafo único.

Entretanto, com a nova roupagem que lhe fora dada, a CLT passou a contar com um título especificamente destinado a tratar da matéria, refiro-me ao Título II-A: “Do Dano Extrapatrimonial”, composto pelos arts. 223-A a 223-G.

Em síntese, estes dispositivos asseguram expressamente o direito de reparação àqueles que suportarem danos de natureza extrapatrimonial, assim compreendidos os que ofendam a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, tutelando-se a autoestima, integridade, imagem, assim por diante.

Feitas estas primeiras considerações, faz-se imprescindível, para a correta fixação da matéria, uma análise clínica do art. 223-G, do diploma legal ora em comento, responsável por delinear os aspectos a serem considerados pelo juiz ao apreciar o pedido indenizatório, a saber: a natureza jurídica do bem tutelado (inciso I), a intensidade do sofrimento ou humilhação (inciso II), a possibilidade de superação física ou psicológica (inciso III), os reflexos pessoais e sociais da ação ou omissão ensejadores do mal (inciso IV), a extensão e duração deste (inciso V), as condições em que se dera (inciso VI), o grau de dolo ou culpa do agente (inciso VII), a ocorrência de retratação espontânea (inciso VIII), o esforço efetivo para minimizá-lo (inciso IX), o perdão (inciso X), a situação social e econômica dos envolvidos (inciso XI) e, por fim, o grau de publicidade que tomara a ofensa (inciso XII).

Incontroversos estes pontos, o quadro vê-se alterado de figura quanto ao art. 223-G, §1o, da Consolidação em comento. Isto porque o legislador, além de classificar os danos conforme sua natureza - leve, média, grave e gravíssima -, propôs-se a estipular os parâmetros mínimos e máximos para fixação do valor da indenização, a ser calculada com base no valor limite dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social. Esta regra, entretanto, não ganha guarida se a ofensa for decorrente de morte.

A doutrina acusa o dispositivo, em vista disso, de flagrante inconstitucionalidade, “porquanto a fixação do dano moral é tipicamente um julgamento por equidade e com equidade, ou seja, o magistrado deve adotar a técnica de ponderação com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade” (LEITE, Carlos Henrique Bezerra, 2018, pág. 66).

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Corrobora o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal de Justiça, quando do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF no 130/DF, que baniu de nosso ordenamento jurídico a possibilidade de vincular-se o agravo a qualquer espécie de tarifação prévia, sob pena de atentar-se contra a ordem constitucional vigente.

Por fim, em observância às disposições do art. 223-G, §§3o e 4o, da CLT, é concedido ao juiz sentenciante o poder de dobrar o montante da indenização, se qualquer das partes for reincidente, ou seja, se qualquer delas houver dado causa a mal idêntico, no prazo de até dois anos, contado do trânsito em julgado da decisão condenatória.


Conclusão

A perpetuação dos direitos trabalhistas é fenômeno jurídico estudado e reconhecido há diversas décadas. No entanto, considerando-se a constante mutabilidade dos cenários político e social, não se cogita de outra hipótese senão a consequente modificação de suas disposições legais.

A reforma dos direitos dos trabalhadores ainda é recente para que vislumbremos suas consequências no tempo, em especial ao considerarmos o tanto de inovações por ela trazidas. Não obstante, a restruturação já é alvo de duras críticas e alegações de inconstitucionalidade.

Certo é, porém, que todas as suas normativas devem ser vistas sob a óptica dos princípios constitucionais, em especial os da razoabilidade e proporcionalidade, no que se refere às indenizações por danos de cunho moral, de modo que se atente muito mais ao grau de violação dos direitos da personalidade e à dignidade da pessoa humana, como medida de verdadeira justiça.


Bibliografia

- BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo – Os Conceitos Fundamentais e a Construção do Novo Modelo. São Paulo. Ed. Saraiva, 2009;

- CALDAS, Edson. Reforma Trabalhista: indenização por dano moral será limitada e baseada no salário da vítima. Época Negócios. 2017. Acesso em 24.03.2018. Disponível em <https://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2017/07/reforma- trabalhista-indenizacao-por-dano-moral-sera-limitada-e-baseada-no-salario-da-vitima.html>;

- BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. Ed. Saraiva,1a ed.;

- LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo. Ed. Saraiva, 9a ed., 2018;

- Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF na 130/DF. STF., Min. Relator: BRITTO, Carlos. Julgado em 30.04.2009. Acessado em: 24.03.2018. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp? docTP=AC&docID=605411>.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDREONI, Helder. Os danos morais nas relações de emprego:: as modificações promovidas pela reforma trabalhista no âmbito da responsabilidade civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5584, 15 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68867. Acesso em: 16 abr. 2024.

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