I. INTRODUÇÃO
Com alguma freqüência, em vez de instituir um fundo de pensão fechado para os seus colaboradores, algumas empresas preferem celebrar contratos previdenciários com companhias seguradoras devidamente habilitadas para isso, chamadas também de entidades abertas, visando suplementar as prestações devidas pelo INSS aos seus empregados e dirigentes. Posteriormente, aperfeiçoando-as, suas cláusulas são alteradas, e por vezes diminuindo-se algum direito dos participantes, com a decantação de novas regras.
Esse cenário jurídico suscita dúvidas quanto a aplicação dos critérios de concessão em relação a quem preencheu os requisitos antes e depois da linha-de-corte das aludidas inovações. A proximidade com o Direito do Trabalho e seus princípios afeta a interpretação, máxime quando se tratar de plano de benefícios não contributório (hipótese em que só o empregador é que custeia).
Discute-se, também, qual seria o direito de quem ainda não atendeu as determinações especificadas convencionadas. De modo geral, respeitado o direito adquirido, se os contratos de previdência social complementar podem ser modificados e, por derradeiro, qual seria o prazo legal que os participantes detêm para reclamarem a revisão de cálculo da suplementação.
II. DIREITO ADQUIRIDO
A ausência da pretensão jurídica, a expectativa de direito e o direito adquirido ainda permanecem como questões nebulosas em Direito Previdenciário. Isso se deve à idéia generalizada de que a relação jurídica protetiva privada é um tipo de contrato. Em verdade, se não é uma instituição, posiciona-se como um contrato de adesão, sendo que o gestor do plano de benefícios, pela natureza de sua dinamicidade atuarial, econômica e financeira (quando não jurídica) vê-se obrigado às freqüentes avaliações e às revisões. Algumas delas proclamadas pela legislação regente (LC n. 109/01).
Afirma-se que teve e tem direito quem, até o dia da mudança, atendeu a todas as exigência estabelecidas convencionadas (isto é, os critérios de elegibilidade) contemplados no aludido ato constitutivo. Geralmente: a) tempo mínimo de contribuição; b) período de carência; c) tempo de serviço na empresa; d) idade mínima, etc. e e) até concessão do benefício do INSS.
Claro, todos esses requisitos presentes concomitantemente antes ou quando da solicitação formal das prestações da complementação (LC n. 109/01, art. 17, parágrafo único).
Em relação a cada linha-de-corte (data das mudanças), quem não preencheu os requisitos contratados, é mero espectador do direito adquirido. Terá de observar os comandos estatuídos, vale dizer, os vigentes (até que sobrevenham novas regras).
Mesmo sob uma redação que nem sempre elimina as possibilidades interpretativas, quem completou os requisitos após a dita linha-de-corte ou vier a integrá-los adiante, terá de levar em conta a nova definição da renda mensal inicial.
III. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS
No Direito Previdenciário está assentado o direito de mudanças. Isto é, observado o postulado fundamental insculpido no art. 5º, XXXVI (principalmente, o direito adquirido), da Constituição Federal de 1988, todas as transformações fundadas, necessárias e que visem o aperfeiçoamento do plano de benefícios, são formalmente possíveis. Principalmente, mas não necessariamente, se essa circunstância autorizativa estiver convencionada no Estatuto Social, no Regulamento Básico ou na norma pública.
Destarte, prevalece a veneranda cláusula rebus sic stantibus, de Neratius, em detrimento da igualmente provecta pacta sun servanda. Na previdência complementar, em que as adaptações às premissas dinâmicas do plano (por exemplo, presença do déficit ou do superávit), impõem o princípio constitucional do equilibro atuarial e financeiro — essa mutabilidade é ainda mais verdadeira.
Não se trata de construção cerebrina ou ponto de vista apenas doutrinário, mas aplicação de preceito legal. A respeito, consulte-se o que diz o art. 17 da LC n. 109/01: "As alterações processadas nos regulamentos dos planos aplicam-se a todos os participantes da entidades fechadas, a partir de sua aprovação pelos órgão regulador e fiscalizador, observado o direito acumulado de cada participante".
Embora não se encontre comando idêntico na Seção III – Dos Planos de Benefícios de Entidade Abertas (arts. 26/30 da LC n. 109/01), a regra é daquelas universais e com capacidade de remissão para todo o segmento da previdência supletiva, incluindo as abertas e fechadas.
IV. PRAZO PARA REVISÃO
Nada obstante cuidar-se até de um plano não contributório (que induz alguns estudiosos a julgar que os benefícios fazem parte do contrato de trabalho), a contratação espontânea com entidade aberta não descaraterizaria a relação jurídica de previdência complementar (nem afetaria a natureza não salarial do custeio da instituidora), arredando-se eventual prazo decadencial da legislação trabalhista.
Se assim é, tem aplicação o disposto no art. 75 da LC n. 109/01, quando assevera: "Sem prejuízo do benefício, prescreve em cinco anos o direito às prestações não pagas nem reclamadas na época própria, resguardados os direitos dos menores dependentes, dos incapazes ou dos ausentes, na forma do Código Civil". Equivocou-se nosso legislador quando falou em "prescreve"; efetivamente o que está presente é o instituto da decadência da faculdade em si e não o perecimento do direito de ação.
Quer dizer, garante-se aí que: 1) a prestação complementar é imprescritível (aliás, uma tradição do Direito Previdenciário); 2) prescrevem as mensalidades não reclamadas, aplicando-se o venerando dormientibus non sucurrit jus; 3) não claramente, que o participante e o fundo de pensão não teriam prazo para qualquer revisão (o que é um exagero a ser corrigido futuramente).
Pela redação adotada é evidente a cópia do art. 102 da Lei n. 8.213/91, o que nos faz recordar a possibilidade de remissão ao RGPS, como sucede com o art. 40, § 12, da Carta Magna, quando remete o regime do servidor público ao do trabalhador da iniciativa privada (INSS). Mas, essa remissão, ainda que doutrinariamente sustentável, legalmente não pode ser efetivada.
No art. 10, a Lei n. 6.435/77, revogada pela LC n. 109/01, em relação às entidades abertas, previa-se uma remissão às entidades de seguro privado, dispositivo que desapareceu com esta LC n. 109/01. Para as entidades fechadas, por seu turno, havia remissão à legislação da previdência social, "no que lhes for aplicável, e, em especial, pelas disposições da presente lei" (art. 36).
Com a decadência, desaparece a pretensão jurídica a certo número de mensalidades, não o direito a prestação, que é imprescritível. Em circunstâncias que têm de ficar bastante aclaradas numa instrução do pedido, importando, em cada caso, destacar-se a DER (instante em que foi requerido o benefício), DCB (momento em que o gestor o concedeu), DIB (data da primeira mensalidade a ser paga), quando deveria iniciar-se, não fora o dissídio instalado ou a inércia do titular e a DIP (ensejo quando do efetivo desembolso, certamente com a quitação de atrasados).
Na vigência da Lei n. 6.435/77, diante do silêncio normativo complementar, observava-se o prazo do Direito Civil, de cinco anos, no mais comum das hipóteses indo-se até o vetusto Decreto n. 20.910/32 (ainda invocado até hoje). Podendo-se buscar os termos do RGPS, então, quase todos de cinco anos.
Ambas normas não compareceram na LC n. 109/01, entendendo-se que deva prevalecer apenas o seu art. 75. Ou seja: os dois pólos da relação jurídica de previdência complementar, a qualquer tempo podem requerer o reexame da instrução da suplementação ou complementação.
V. CONCLUSÕES
A suplementação de quem preencheu todas as condições exigidas até a mudança, era a prevista na cláusula contratual anterior a alteração.
Futuras complementações de aposentadorias regem-se pela regra vigente quando da solicitação (Súmula STF n. 359).
Respeitado o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido, as convenções da previdência complementar podem ser alteradas unilateralmente pelo instituidor.
Os participantes têm prazo de cinco anos para reclamar sobre o cálculo da renda mensal vitalícia.