Contrato público e o dever de fiscalização como meio de mitigar prejuízos para Administração Pública

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20/09/2018 às 10:31
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A fiscalização dos contratos é, além de imposição legal, um meio de mitigar prejuízos para a administração pública, considerando a finitude dos recursos públicos. Assim sendo, deve seguir um planejamento orçamentário, de modo a demonstrar a moralidade e legalidade na gestão.

1 INTRODUÇÃO

A Administração Pública tem a prerrogativa de contratar com particular a prestação de serviço ou a aquisição de bens, submetendo-se aos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. Previstos na Constituição Federal (BRASIL, 1988), art. 37, somando a eles outros expressos ou implícitos na Carta Magna, sendo todos indispensáveis, tanto na elaboração, quanto na aplicação dos contratos públicos. Ressalta-se também a observância da Lei nº 8.666 (BRASIL, 1993a), que tem por finalidade regulamentar as licitações, as quais resultarão em contratos, tratando ainda da fiscalização a qual os mesmos devem ser submetidos. Da leitura da doutrina e orientações dos órgãos de controle, extrai-se a interpretação conferida pelos dispositivos legais, assim como em lei específica, as quais devem permear as ações da administração pública no que se refere ao ato de contratar. Todavia, anteriormente ao contrato faz-se necessário lembrar que existe o processo de licitação, resultado do planejamento estabelecido pela Gestão. Para Furtado (2015), esta etapa deve ficar entendida como atividade meio, tendo em vista a celebração de futuro contrato. É isso que diferencia a atuação da administração pública da forma de agir da administração privada. Nesta fase, deve ser apontada a necessidade de aquisição por parte do ente público tendo como preceito atender o interesse coletivo. Após a fase licitatória surge o contrato propriamente dito, ou seja, a formalização do acordo firmado entre as partes. É neste momento que deve surgir afigura do fiscal do contrato, que tem a responsabilidade de acompanhar e verificar se o referido acordo entre as partes está sendo cumprido na íntegra, respeitando prazo, valor, finalidade e objeto. Também é seu papel observar a qualidade da coisa entregue ou serviço em execução, objetivando garantir a obediência aos princípios da administração pública, bem como as normas vigentes, evitando a possível responsabilização do ente público, do Gestor ou do próprio fiscal de contrato por omissão. Diante da necessidade de firmar o contrato público é preciso que o Gestor tenha precaução quanto a sua execução, de modo a fazê-lo com a segurança necessária.


2 CONTRATOS PÚBLICOS

2.1 Conceito

Os contratos públicos além de tratarem de ato administrativo que visa atender o interesse público, servem para delimitar a ação de terceiro, podendo ser celebrados com pessoas físicas, jurídicas, públicas ou privadas, na prestação de serviço e formalização de uma relação de obrigação onerosa, haja vista que o contratado será remunerado para que seja executado determinado dever, seja ele de dar ou fazer. Para esse fim, a administração pública se utiliza de recursos orçamentários, os quais devem atingir sua finalidade. De acordo com a doutrina, a Administração pública, de modo similar ao Direito Privado, faz uso do ajuste da vontade das partes, que se materializa com o contrato: Administração Pública utiliza-se de um instrumento bastante comum no Direito Privado, qual seja o ajuste de vontades entre as partes envolvidas, com a assunção recíproca de obrigações visando determinado objeto, mediante a celebração de contratos, os quais apresentam como características já salientadas o caráter bilateral e comutativo, acrescendo-se ainda a onerosidade como regra. (BRUNO, 2008, p. 197) 4 Todavia, vale ressaltar que os referidos contratos são regidos pelo Direito Público e tão somente suplementado pelo Direito Privado, devendo sempre atender ao interesse público satisfazendo as necessidades coletivas. Isso significa dizer que existe a vinculação administrativa, não podendo se admitir, o atendimento particular do contratado, não existindo assim a amplitude contratual, não sendo permitida à Administração Pública a renuncia de direitos e poderes em razão da outra parte. Desta forma, os contratos públicos estão eivados pela presunção de legitimidade. Assim dispõe a lei nº 8.666/93 (BRASIL, 1993a): Art. 54 - Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado. Contrato Público, então, é a relação estabelecida pela Administração Pública com terceiro, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, tendo por finalidade satisfazer seus interesses. Parte da manifestação de vontade exercida entre as partes, no qual fica estipulado vinculo recíproco de obrigações. Os contratos são pluripartes, formais, consensuais, comutativos. Apesar de tratar de manifestação de vontade entre as partes, possui a natureza de contrato de adesão, por ter suas cláusulas impostas unilateralmente pela Administração Pública.

Segundo Diniz (2008, p.30), contrato: É o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial. Ao contrário do que ocorre no Direito Privado, onde a liberdade de contratar é ampla e formal, baseando-se na legislação, no Direito Público a administração pública também está limitada a normas rígidas, porém, dispõe de privilégios. E, são esses privilégios que diferenciam os contratos públicos. Há por outro lado, doutrinadores que sustentam a inexistência de contrato administrativo, porque não é observado o princípio da igualdade entre os contratantes e há mitigação da autonomia da vontade Existe ainda, a corrente que defende que o contrato administrativo é uma espécie de gênero, em razão de possuir características próprias, 5 exorbitantes e derrogatórias do direito privado. Segundo Diniz (2008, p. 297), existe divergências doutrinárias, havendo pelo menos três correntes: 1 - a que nega a existência de contrato administrativo; 2 - a que, em sentido diametralmente oposto, acha que todos os contratos celebrados pela Administração são contratos administrativos; 3 - a que aceita a existência dos contratos administrativos, como espécie do gênero contrato, com regime jurídico de direito público, derrogatório e exorbitante do direito comum.

Para Meirelles, Aleixo e Burle Filho (2015, p. 233) ¨o contrato administrativo é o ajuste que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, firma com particular ou outra entidade administrativa para a consecução de objetivos de interesse público, nas condições estabelecidas pela própria Administração. ¨ Os contratos públicos possuem as seguintes características: são formais, consensuais, onerosos e comutativos, ou seja, são firmados por mais de uma parte, refletindo um acordo de vontade entre ambos, o qual deverá ser remunerado com compensações recíprocas. Também podem ser personalíssimo, porém, em regra intuitu personae. Deve o Gestor orientar-se pelos princípios norteadores da administração pública, em especial, no que se refere ao contrato, existem princípios específicos que vêm referendá-los: da supremacia da ordem pública; da autonomia da vontade; da força obrigatória e a boa fé contratual. No que se refere ao interesse público ou supremacia do interesse público, corresponde à coletividade, ou seja, visa o bem estar social. A autonomia da vontade é a liberdade de contratar, sendo que a vontade contratual somente sofre limitações perante uma norma de ordem pública, onde há imposições econômicas a essa vontade. O princípio da força obrigatória refere-se à força contratual que faz lei entre as partes, o que vem a impedir a alteração do que foi convencionado, devendo ambas cumprir com a obrigação avençada, tornando-o válido e eficaz, vindo a gerar o Pacta sunt servanda.

Por fim, tem-se a boa fé contratual, que diz respeito ao modo de atuação antes, durante e depois do contrato. Todavia, pela inexistência de um conceito propriamente dito, dependerá do caso concreto, o qual será analisado pelo Poder Judiciário. A Constituição Federal (BRASIL, 1988), dispõe no Art. 21, capítulo XXXVII, que o particular não pode ser compelido a contratar com a Administração Pública, devendo existir a manifestação de vontade, a qual surge ao participar anteriormente da licitação. Para tanto, deve ainda, além do princípio da autonomia da vontade, atender a outros dois princípios 6 importantes, quais sejam, “Lex inter partes” e “Pacta Sunt Servanda”. Sobre esses aspectos significa dizer que o contrato estabelece lei entre as partes, contratante e contratado, e, com obrigação recíproca, devendo ser cumprido conforme estabelecido inicialmente.

Nos casos de modificação, alteração ou rescisão deverá ter o consentimento de ambos. Para melhor controle do contrato, é necessário conhecer algumas peculiaridades indispensáveis para a sua constituição, entre elas estão à competência e a vigência, ambas ditadas pela Constituição Federal (BRASIL, 1988). 

2.1.1 Competência Legiferante e o Prazo de Vigência

A competência legiferante, em se tratando de normas gerais no que diz respeito às contratações promovidas pelo Poder Público, compete a União, porém, fica reservada ao Estado e aos Municípios a possibilidade de legislarem supletivamente, conforme dispõe a Constituição Federal do Brasil: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...] XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998). (BRASIL, 1988). Os contratos possuem prazo de vigência de acordo com sua formalização, ou seja, pela assinatura e data, ressalvadas considerações em contrário, quando previsto no próprio documento. Os contratos passam a ter sua eficácia a contar da sua publicação resumida.

Todavia, o prazo de duração, de modo geral, fica atrelado à vigência do crédito orçamentário, a qual coincide com o ano civil postulado pelo art. 34 da Lei nº. 4.320 (BRASIL, 1964), salvo se celebrado o negócio no último quadrimestre, de acordo com o que preceitua a Constituição Federal (BRASIL, 1988) em seu art. 167, § 2º. O referido artigo prevê que os créditos especiais e extraordinários devem ter a vigência compatível com o exercício financeiro para o qual for autorizado. Admitindo exceção para os casos em que o ato de autorização for promulgado nos últimos quatro meses do referido exercício, sendo estes créditos incorporados no orçamento do exercício subsequente.

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O prazo de vigência também é uma forma de extinção do contrato. Isso significa dizer que deve constar no mesmo à previsão de seu término, ficando vedada, pelo art.57 § 3º da Lei nº. 8666 (BRASIL, 1993a), a vigência por prazo indeterminado. Vale ressaltar que o mesmo artigo destaca em seus incisos a possibilidade que venha a ocorrer vigência por prazo superior a do exercício financeiro (BRASIL, 1993a), portanto podendo ser prorrogado. Não havendo essa prorrogação, ocorrerá sua extinção. Além do término do contrato pelo prazo de vigência, isso pode ocorrer também pela rescisão contratual, haja vista a prerrogativa da Administração Pública dispor da possibilidade de alterá-lo ou decidir pelo seu término.

2.1.2 Alteração e Rescisão Contratual

Em defesa do interesse público, deve a Administração Pública promover a alteração do contrato, mesmo que não haja a concordância do contratado. Não obstante a existência da necessidade de justa causa tem o particular direito à ampla defesa e ao contraditório, por meio de processo administrativo, que restará eventualmente indenização pelos danos que vier a suportar. Destarte, a rescisão contratual além de ocorrer de modo natural pelo fator vigência, poderá ser também aplicada de modo unilateral, amigável e judicial, todas previstas no art. 79 da lei de licitações (BRASIL, 1993a).

A rescisão unilateral é uma prerrogativa da Administração Pública quando averiguar que houve inadimplência por parte do contratado, ou motivada por interesse público, devendo para ambas as situações apresentar justa motivação, a qual resultará na rescisão contratual. Quando a mesma ocorrer de maneira amigável, mesmo que requerido pelo contratado e aceita pelo contratante, apesar de ficar a princípio demonstrado que ocorreu a coincidência de vontade entre as partes, restará ainda à Administração Pública o dever de justificar qual a conveniência da referida rescisão face ao interesse público. No que se refere à rescisão imposta de maneira judicial, resta o entendimento de que não houve consenso entre as partes, hipótese esta ensejada pela própria administração, assumindo para si a responsabilidade pelo surgimento de tal situação, na qual impele o contratado de propor ação judicial.

2.1.3 Cláusulas Exorbitantes

São cláusulas contempladas nos contratos que asseguram a desigualdade entre as partes, ou seja, são deferidas prerrogativas incomuns, que extrapolam o direito privado, colocando-se em posição de supremacia. Vale salientar que tal situação interposta não constitui ilegalidade somente nos contratos em que num dos pólos da relação contratual figura a Administração Pública. Cláusulas exorbitantes são assim denominadas, por concederem à Administração Pública o poder de alteração e rescisão contratual.  Da mesma forma estão caracterizadas as que impõem manutenção no equilíbrio econômico e financeiro, bem como a aplicação de penalidades, a inoponibilidade da exceção de contrato não cumprido, o controle do contrato e a exigência de garantia, sendo esta última prevista na Lei de Licitações em seu art.56 (BRASIL, 1993a), tendo como modalidade a fiança, o seguro, a calção ou títulos da divida pública. Essas modalidades servem de garantia caso o contrato venha a ser rescindido, ficando como ressarcimento para a Administração Pública, por prejuízos causados ou pagamento de multa. 

Cabe ao contratado o direito de escolha da modalidade de garantia, imposta pela própria lei, no parágrafo 5º do referido artigo, devendo sua aplicabilidade respeitar o limite de 5% do valor do contrato. (BRASIL, 1993a). Apesar de a Administração Pública possuir competência sobre o controle de seus atos, podendo fazer uso das referidas cláusulas, não poderá exorbitar a lei, respeitando o previsto na CFB no artigo 37 (BRASIL, 1988), qual seja, o princípio da legalidade. Sua atuação encontra limitações no art. 65, inciso I, alíneas “a” e “b”, naquilo que se refere à alteração unilateral, devendo ocorrer com a concordância prévia do contratado. Percebe-se que a supremacia da administração encontra limites no equilíbrio econômico - financeiro. Dentre as modalidades supracitadas de cláusulas exorbitantes que contrapõem a limitação da atuação da administração pública, cabe destaque à possibilidade de aplicação da penalidade, a qual está disposta na lei de licitações (BRASIL, 1993a), sem precisar recorrer ao Poder Judiciário para aplicá-la.

2.1.4 Aplicação de Penalidades pela Administração Pública

 A Administração Pública possui a prerrogativa de aplicar penalidades à outra parte, sem para isso necessitar da interseção de terceiros, ressaltando que a referida aplicabilidade se dá somente nos contratos regidos pelo direito público. Desta forma, quando houver o descumprimento de obrigações previamente estabelecidas em contrato, podem ser interpostas sanções de advertência, multa, rescisão unilateral do contrato, suspensão provisórias e declaração de inidoneidade, todas previstas no art. 87 da lei de licitações (BRASIL, 1993a). Todavia é mister pautar-se nos princípios basilares da razoabilidade e proporcionalidade, em razão da falta cometida. Os motivos que permitem aplicação de penalidades são a inexecução ou a execução deficiente do objeto do contrato, ensejando assim que uma ou mais penalidades administrativas possam ser aplicadas: multa, advertência, suspensão temporária ou declaração de inidoneidade, conforme determina a Lei de Licitações (BRASIL, 1993a). A eficiência de um contrato está diretamente relacionada ao acompanhamento de sua execução. O gestor do contrato tem grande responsabilidade pelos seus resultados, devendo observar o cumprimento pela contratada, das regras técnicas, científicas ou artísticas, previstas no instrumento contratual.

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Lia

Especialista em Direito Público

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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