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Não cabe falar em confisco na exportação

10/10/2018 às 09:40
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O PT definiu que, uma vez no governo, criará um confisco sobre exportações. Diz na página 43 do Plano Lula de Governo: “Será constituído um imposto regulatório sobre a exportação."

O PT definiu que, uma vez no governo, criará um confisco sobre exportações. Diz na página 43 do Plano Lula de Governo: “Será constituído um imposto regulatório sobre a exportação”. E segue: “Esse imposto deve acompanhar a variação dos preços e formar um fundo de estabilização cambial que beneficiará os exportadores no longo prazo”.

Bem lembrou Celso Ming(Confisco de exportações, Estado de São Paulo, em 5 de outubro de 2018), que essa nova disposição do PT vai na contramão de políticas saudáveis de comércio exterior, que, além de isentar de impostos o produto exportado, procura incentivar exportações.

Como “deve acompanhar a variação de preços”, fica subentendido que o governo PT pretende arbitrar o nível de preços do produto exportado acima do qual começa a prevalecer o confisco.

Não é viável taxar a exportação de industrializados na medida em que esse novo custo derrubaria seriamente a competitividade do produto brasileiro. Por isso, o objetivo do novo imposto é taxar tanto as empresas exportadoras de produtos minerais quanto o agronegócio, cerca de 50% do total. Não dá para acompanhar preços de exportação se não for o de commodities minerais, metálicas e agrícolas.

Esse imposto difere das retenciones que prevalecem na Argentina num ponto essencial. Lá, o imposto sobre exportações exerce inequívocas funções fiscais (arrecadatórias). A opção do PT, já se viu, viria para regular o câmbio.

Ora, numa economia de mercado não cabe falar em arbitramento de preços.

A medida proposta pelo PT, naquele documento, é sabidamente inconstitucional.

No imposto de importação, a obrigação tributária decorre do fato gerador, que é a entrada do produto no mercado interno. O crédito tributário decorrerá do respectivo lançamento do tributo. Há o entendimento de que ele, como procedimento tributário, seria o documento expedido pela autoridade competente diante da apresentação da declaração de importação.

Por sua vez, há o imposto de exportação, exação que se faz na forma do artigo 153, II, da Constituição Federal.

O imposto de exportação incide sobre a exportação de produtos nacionais ou nacionalizados, com fato gerador previsto no artigo 23 do Código Tributário Nacional, onde se fala para tal, como fato imponível, a saída destes do território nacional.

Dir-se-á que tal momento se materializa com a expedição da guia de exportação ou documento equivalente, podendo sua exigibilidade acontecer mesmo antes que se opere a saída do produto, a critério da Receita Federal, como já se lia do Decreto-lei 1.578/77, artigo primeiro, parágrafo primeiro.

Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto de exportação no momento em que é efetivado o registro de exportação (RE) no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), ou seja, no momento em que a empresa obtém o RE. O registro no Siscomex é o conjunto de informações de natureza comercial, financeira cambial e fiscal que caracterizam a operação de exportação de uma mercadoria e definem seu enquadramento legal. Note-se que, com a instituição do Siscomex, as guias de exportação e importação foram substituídas pelo registro de exportação (RE) e registro de importação (RI), também foram criados outros blocos de informações das diversas etapas como: registro de venda (RV), registro de operação de crédito (RC). Ao final desses procedimentos é expedido o comprovante de exportação (CE) - que é o documento oficial emitido pelo Siscomex, relacionando todos os registros de exportação objeto de um mesmo despacho aduaneiro. Portanto o registro de exportação (RE) é o único registro indispensável para a efetivação de todas as operações de comércio, em torno dele gravitam as demais etapas. No caso dos autos, o registro de exportação no Siscomex foi posterior à vigência da Res. do Bacen n. 2.136/1995, portanto o imposto deve ser calculado com alíquota de 40%, como estabelecido nessa resolução. Dessa forma, pouco importa considerações sobre a data da obtenção do registro de venda. Isso posto, a Turma, ao prosseguir o julgamento, conheceu em parte o recurso do contribuinte e, nessa parte, negou-lhe provimento. Precedente citado: EDcl no REsp 225.730-PR, DJ 19/2/2001. REsp 964.151-PR, Rel. Min. José Delgado, julgado em 22/4/2008.

O voto condutor do acórdão buscou na doutrina os critérios para definir o que seriam impostos da mesma espécie nos termos da Lei n. 8.383/1991, além de examinar os impostos confrontados, concluindo, de acordo com os tributaristas, pela observância da unidade operacional do sistema, ou seja, se são instituídos e arrecadados pela mesma pessoa jurídica e com igual destinação. Na prática, os impostos de importação e exportação foram instituídos ambos pela União e por ela são arrecadados. Destinam-se também, um e outro, à formação de uma política extrafiscal, sem conotação arrecadatória, servindo ambos para regular o mercado. Sendo assim, são impostos da mesma espécie pelas semelhanças de origem, de finalidade e de operacionalização, podendo haver compensação entre eles. Com esse entendimento e prosseguindo o julgamento, a Turma, por maioria, negou provimento ao REsp da Fazenda Nacional. REsp 252.241-RJ, Rel. originário Min. Peçanha Martins, Rel. para acórdão Min. Eliana Calmon, julgado em 3/12/2002.

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À luz do artigo 3º do Decreto-lei n. 1.578, de 11 de outubro de 1977, a alíquota do imposto é de trinta  por cento, facultado ao Poder Executivo reduzi--la ou aumentá-la, para atender aos objetivos da política cambial e do ecomércio exterior.

Como “deve acompanhar a variação de preços”, fica subentendido que o governo PT pretende arbitrar o nível de preços do produto exportado acima do qual começa a prevalecer o confisco.

Não é viável taxar a exportação de industrializados na medida em que esse novo custo derrubaria seriamente a competitividade do produto brasileiro. Por isso, o objetivo do novo imposto é taxar tanto as empresas exportadoras de produtos minerais quanto o agronegócio, cerca de 50% do total (veja gráfico). Não dá para acompanhar preços de exportação se não for o de commodities minerais, metálicas e agrícolas.

Reza o artigo 150, IV, da Constituição Federal que “é vedado utilizar o tributo com efeito de confisco”.

A vedação é, sem dúvida, genérica.

A teoria do confisco, em especial o confisco tributário ou, noutro giro, do confisco através do tributo deve ser posta em face do direito da propriedade individual, que é garantido pela Constituição. Se não se admite a expropriação sem justa indenização, também se faz inadmissível a apropriação através de tributação abusiva. Mas deve-se lembrar que o sistema jurídico do Brasil admite a tributação exacerbada, por razões extrafiscais e em decorrência do poder de política; por outro, o direito de propriedade, antes inatacável, com a Constituição de 1988, não é mais, pois a Constituição o garante, mas subordina a garantia, a chamada função social da propriedade.

No direito tributário a questão envolve a chamada tributação razoável.

O que é razoável hoje pode não ser amanhã. Disse Baleeiro (As limitações constitucionais do poder de tributar):

“O problema reside na fixação de limites, expedidos os quais, esses objetivos, prometidos pela Constituição estariam irremediavelmente feridos. Tribunais estrangeiros já se inclinaram por critérios empíricos como o de 33% de renda, adotado pela Corte Suprema da Argentina. Mas esse problema é fundamentalmente econômico. E, à luz da economia, é fácil provar, até com a experiência, que, na tributação progressiva, se poderá atingir até quase 100% - do que há fartos exemplos – sem destruir a propriedade, impedir o trabalho, desencorajar a inciativa ou ultrapassar a capacidade econômica.”

Embora seja declaradamente um imposto apenas regulatório (e não arrecadatório), a receita deve formar o patrimônio de um fundo que deve atuar como estabilizador do câmbio. Significa que o fundo será constituído tanto de dólares quanto de moeda nacional. Se o solavanco cambial a ser estabilizado empurrar excessivamente para cima a cotação do dólar, o objetivo será vender dólares. Se for o contrário, comprará dólares.

No passado, houve essa experiência de confisco: Parte da política de estabilização dos preços internacionais do café e do açúcar, praticados na primeira metade do século 20, foi feita com retenção de receitas com exportação. Mas aí, o objetivo era regular a oferta internacional desses produtos. 

No âmbito administrativo, mais especificamente no exercício do poder de polícia, deve ser levado em consideração o princípio da proporcionalidade, cabendo ao Fisco quando da fixação das sanções, dosá-las de forma que não se apresentem como verdadeiro confisco.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Não cabe falar em confisco na exportação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5579, 10 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69492. Acesso em: 5 nov. 2024.

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