LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS
A lei das Contravenções cuida de infrações de menor repercussão social em comparação com as tipificadas no Código Penal, pois produzem uma lesão mínima à sociedade. O objetivo do legislador, com a previsão de certas normas contravencionais, era a de prevenir a criminalidade. Sua punição constituiria uma advertência para o cidadão, evitando-se um mal maior, ou seja, o cometimento de um crime.
CONCEITO DE CONTRAVENÇÃO
Contravenções penais são infrações consideradas de menor potencial ofensivo que muitas pessoas acabam cometendo no dia-a-dia, que chegam até a ser toleradas pela sociedade e até por autoridades, mas que não podem deixar de receber a devida punição. É evidente que por serem delitos de menor gravidade recebem penas proporcionais.
As contravenções penais estão previstas no Decreto-lei nº 3.688/41, o qual está dividido em capítulos que tratam, respectivamente: das contravenções referentes à pessoa; das contravenções referentes ao patrimônio; à incolumidade pública; à paz pública; à fé pública; à organização do trabalho; a polícia de costumes e à administração pública. Algumas contravenções foram revogadas por leis especiais, como, por exemplo, a do porte de arma, que é tratado pela lei n. 10.826/03. Todas as contravenções são punidas com prisão simples, multa ou ambas cumulativamente.
A competência para julgar tais infrações é do Juizado Especial Criminal, já que são consideradas de menor potencial ofensivo. As contravenções mais comuns são : omissão de cautela na guarda ou condução de animais; deixar cair objetos de janelas de prédios; provocação de tumulto ou conduta inconveniente; provocar falso alarma; perturbação do trabalho ou do sossego alheio; recusa de moeda de curso legal; jogo de azar; jogo do bicho; mendicância; importunação ofensiva ao pudor; embriaguez; servir bebidas alcoólicas a menores, pessoas doentes mentais ou já embriagadas; simulação da qualidade de funcionário; crueldade contra animais; perturbação da tranquilidade alheia; omissão de comunicação de crime; anuncio de meio abortivo; internação irregular em estabelecimento psiquiátrico; indevida custodia de doente mental; violação de lugar ou objeto; perigo de desabamento; deixar de colocar em via pública sinal destinado a evitar perigo a transeunte; arremesso ou colocação perigosa; exercício ilegal de profissão; exercício ilegal do comércio de antiguidades; recusa de dados sobre a identidade; exumação ou inumação de Cadáver.
Em outras palavras: é contravenção penal: urinar na rua; provocar tumulto em festa; passar trote para órgãos públicos; retirar placas de sinalização das ruas; queimar lixo no quintal de forma a incomodar o vizinho com a fumaça; dirigir gracejos obscenos a pessoas; colocar música em volume alto para provocar o vizinho; enterrar ou desenterrar cadáver fora das determinações legais; briga de galo com apostas; não querer aceitar troco em moedas; deixar cair da janela de apartamento vaso de plantas; jogar ovos ou água fria nas pessoas que passam embaixo da janela de um prédio; vestir-se com farda, sem ser militar, apenas para impressionar as garotas.
Enfim, todas essas condutas constituem contravenções penais e são punidas na forma da lei.
DIFERENÇAS ENTRE CRIME E CONTRAVENÇÃO
A Lei de Introdução ao Código penal dispõe que a pena privativa de liberdade para os crimes pode ser de reclusão ou detenção. Já a pena privativa de liberdade para a contravenção penal é a prisão simples.
Crime = delito.
É o fato típico e antijurídico que está descrito em lei, em outras palavras, é a conduta que a norma penal descreve.
O conceito legal de crime é aquele que vem estampado na lei. Ocorre que no Brasil há divergências quanto à existência do conceito legal de crime.
Alguns afirmam que o conceito se encontra no art. 1° da Lei de Introdução ao Código Penal (LICP), já outros afirmam que a LICP em seu art. 1° não conceituou o crime e sim expôs as formas de penas que deverão ser aplicadas a conduta delituosa.
A teoria que conceitua o crime materialmente que prevalece nos dias atuais é a do bem jurídico. Segundo esta teoria, crime é a conduta que viola o bem jurídico tutelado pela norma penal.
O bem jurídico tutelado pela norma penal, também chamado de bem jurídico-penal está definido como aqueles bens imprescindíveis para a convivência em sociedade. Exemplos desses bens são a vida, a liberdade, a honra, o patrimônio, etc.
Portanto, materialmente falando, crime é aquela conduta que viola de forma significativa o bem jurídico-penal.
Contravenção penal = crime/delito anão; delito Liliputiano; crime vagabundo.
De acordo com o art. 1º, da Lei de Introdução ao Código Penal e da Lei das Contravenções Penais, contravenção é “a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. Alternativa ou cumulativamente.”. Assim, conforme acima delineado, não existe uma diferença ontológica entre crime e contravenção penal, ocorrendo a sua diferenciação apenas nas penas cominadas, que no caso da contravenção consiste em prisão simples ou multa; e, quando se tratar de crime, as penas serão de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa.
A pena de prisão simples, nos termos do art. 6º, da Lei de Contravenções Penais, deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semiaberto ou aberto e, de acordo com o § 1º, do mesmo artigo, o condenado à referida pena deve ficar sempre separado dos condenados à pena de reclusão ou de detenção.
Por outro lado, apesar das diferenças existentes entre contravenção de crime, várias normas aplicáveis aos crimes são também aplicáveis às contravenções, como é o caso das regras gerais do Código Penal, nos termos do art. 1º, da LCP. Um exemplo dessa disposição de modo diverso, presente na Lei das Contravenções, é o caso do instituto jurídico da tentativa de crime, presente no Código Penal, portanto aplicável a crimes, mas não admitida nas contravenções, por força da expressa previsão legal de modo diverso, disposta no art. 4º, da LCP.
Outro instituto importantíssimo do Direito Penal, perfeitamente aplicável às contravenções penais, são as “Causas Excludentes de Ilicitude”, previstas no art. 23, CP: estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito.
Apesar de crime e contravenção serem espécies “distintas” do gênero “infração penal”, não existe, a rigor, uma diferença substancial entre os dois. Não há um elemento de ordem ontológica que encerre uma essência natural “em si mesmo”, sendo diferenciados apenas pelas suas penas, nos termos do art. 1º, da Lei de Introdução ao Código Penal e da Lei de Contravenções Penais.
Como leciona Nucci:
o direito penal estabeleceu diferença entre crime (ou delito) e contravenção penal, espécies de infração penal. Entretanto, essa diferença não é ontológica ou essencial, situando-se, tão somente, no campo da pena. (2011, p. 177)
Há muitas diferenças entre crimes e contravenções penais, por exemplo:
· Tipo de pena privativa de liberdade aplicada;
· No crime admite reclusão ou detenção, já a contravenção penal só admite prisão simples (art. 5º e 6º da LCP) e multa (que não é pena privativa de liberdade);
Demonstra o Art. 5º da LCP: “As penas principais são: I – prisão simples; II – multa”. Já o Art. 6º do mesmo dispositivo, dispõe: “A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto”.
· § 1º O condenado a pena de prisão simples fica sempre separado dos condenados à pena de reclusão ou de detenção.
· § 2º O trabalho é facultativo, se a pena aplicada, não excede a quinze dias.
· Registre-se que prisão simples jamais é cumprida no regime fechado [é semi-aberto ou aberto], nem mesmo por intermédio da regressão.
Em se tratando de crime, a tentativa é punível. Em se tratando de contravenção penal, a tentativa não é punível, conforme demonstra o art.4º da LCP: “Não é punível a tentativa de contravenção”.
Isso não quer dizer que não haja tentativa na contravenção penal. Ela existe, mas não é punível.
APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI PENAL
O sistema de proteção aos bens jurídicos a que se propõe o Direito Penal não é ilimitado, eis que sua intervenção somente está legitimada quando os demais ramos ou setores do direito se mostrem incapazes ou ineficientes para a proteção ou controle social.
O caráter fragmentário do Direito Penal, bem como sua natureza subsidiária são, assim, bastante conhecidos e são diversos autores que manifestam ser esse ramo do direito legitimado a intervir somente quando fracassam os outros modos de proteção a bens jurídicos tutelados.
A Constituição Federal Brasileira em seu artigo 1º, inciso III estabelece como fundamento do Estado Democrático de Direito a dignidade da pessoa humana. Além disso, também preleciona serem invioláveis os direitos à liberdade, à vida, à igualdade, à segurança e a propriedade, assim manifestando seu artigo 5º.
Em face desses postulados, é possível refletir que a limitação a esses direitos ou garantias constitucionais somente se justifica quando houver ofensa ou ameaça de tal ordem que a intervenção do Direito Penal e a aplicação da sua consequência jurídica – a pena criminal – sejam estritamente necessárias.
Por isso mesmo o Princípio da Intervenção Mínima - que não está expressamente inscrito na Constituição Federal – é um princípio limitador do poder punitivo estatal, impondo-se como o caminho inevitável para conter possíveis arbítrios do Estado.
Assim por força deste princípio, num sistema normativo-punitivo – como é o Direito Penal - a criminalização de comportamentos só deve ocorrer quando se constituir meio necessário à proteção de bens jurídicos ou à defesa de interesses juridicamente indispensáveis à coexistência harmônica e pacífica da sociedade.
Não pode o Direito Penal servir de instrumento único de controle social, sob pena de banalizar-se a sua atuação que deve ser subsidiária, último remédio, última alternativa, a ‘ultima ratio’.
A observância do Princípio da Intervenção mínima se constitui decorrência imediata do chamado Garantismo Penal, consubstanciado na aplicação constitucional do Direito Pena e, por isso, não se deve tolerar que ele sirva de instrumento único de controle social, sob pena de banalizar-se a sua atuação, que deve ser subsidiária, último remédio, última alternativa, a ‘ultima ratio’.
Em tempos de expansão desmedida e descontrolada do Direito Penal, em que se experimenta um processo de administrativização ou de excessiva intervenção deste setor do Direito, faz bem lembrar do Princípio da Intervenção Mínima, e refletir sobre o seu verdadeiro alcance.
PECULIARIDADES
Dispõe o artigo 2º da LCP que a lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada em território brasileiro, esta é a regra geral, inclusive contemplada no caput do artigo 5º do Código Penal, da territorialidade.
Perpassando por todos os comentários da LCP feita por Nucci, este defende, na maioria das vezes a inaplicabilidade dos dispositivos, por ferir diversos princípios penais e até mesmo constitucionais. Deste modo é o artigo 3º que trata da existência da ação ou omissão voluntária para caracterização da contravenção penal, levando em conta o dolo e a culpa.
No artigo 4º informa que a tentativa não é punível quando se trata de contravenção penal, isso se dá pelo fato de ter no bojo da LCP, condutas tipificadas como infrações leves, com tratamento mais brando; não havendo sentido em punir a tentativa.
As penas principais são prisão simples e multa (artigo 5º). Prisão simples é a pena privativa de liberdade que deve ser cumprida sem o rigor penitenciário (artigo 6º), em estabelecimento especial ou separado dos presídios; sendo que o limite de duração não poderá ser superior a 5 (cinco) anos. No entanto, acaso seja aplicada a pena de prisão simples esta não será cumprida em sua literalidade, uma vez que inexiste no sistema penal brasileiro local adequado para acolhimento dos contraventores; sendo que na maioria das vezes ocorre a conversão em pena de multa.
A multa é a pena pecuniária e sua fixação tem as mesmas regras do Código Penal, variando entre 10 dias-multa até 360 dias-multa.
A reincidência é tratada no artigo 7º da LCP e traz interessante dicção sobre a extraterritorialidade, haja vista que somente é considerado reincidente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, aquele que cometeu contravenção penal no Brasil; não considerando reincidente, aquele que praticou contravenção penal em território estrangeiro. Se porventura tenha cometido crime no estrangeiro, passado em julgado e, venha a ser condenado no Brasil a reincidência recairá sobre o agente.
O erro de direito está previsto no artigo 8º da LCP onde aduz que no caso de ignorância ou errada compreensão da lei, quando escusáveis, a pena pode deixar de ser aplicada. Tal regra, hodiernamente, encontra-se ultrapassada. O dispositivo supra foi inserido numa época em que o erro de proibição (artigo 21 do CP) não era tido como excludente de culpabilidade. Entendemos que o agente poderá utilizar de subterfúgios, alegando o total desconhecimento da lei para provocar um perdão judicial por parte do órgão judiciário. Ademais, após a publicação de uma lei no Diário Oficial, nenhum cidadão poderá descumpri-la sob a alegação de não conhecê-la.
Por redação da Lei nº 9.268 de 1996, onde alterou diversos dispositivos do Código Penal, inclusive o artigo 51 que tratava sobre a conversão da pena de multa em prisão, sendo que após a alteração a multa é considerada dívida de valor, aplicando as normas relativa à dívida ativa da Fazenda Pública; não podendo de forma alguma a multa ser transmutada em prisão, como antes previa o artigo 9º da LCP.
A suspensão condicional da pena de prisão simples, bem como a possibilidade de conceder o livramento condicional está previsto no artigo 11 da LCP. No entanto, entendemos que em caso de concessão de sursis e livramento condicional não deve ser aplicado o disposto no artigo 78 do Código Penal às contravenções penais; como bem lecionado por Guilherme de Souza Nucci por ter a LCP dado tratamento especial ao período de um a três anos, enquanto, no Código Penal prevê o lapso temporal de dois a quatro anos como período de prova (NUCCI, 2009, p. 162).
Ainda conforme Guilherme de Souza Nucci, boa parte da doutrina afirma categoricamente que o artigo 12 da LCP foi revogado pela Lei 7.209 de 1984 por ter abolido as penas acessórias do Código Penal; todavia, com base no princípio da especialidade das leis, estas vigoram na Lei de Contravenções Penais.
CONTRAVENÇÕES REFERENTES: À PESSOA, AO PATRIMÔNIO, IINCOLUMIDADE PÚBLICA, PAZ PÚBLICA, FÉ PÚBLICA, AOS COSTUMES, ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DAS CONTRAVENÇÕES REFERENTES À PESSOA FABRICAÇÃO OU COMERCIO E PORTE ILEGAL DE ARMA
Com base no Art. 18: “Fabricar, importar, exportar, ter em depósito ou vender, sem permissão da autoridade, arma ou munição: Pena – prisão simples, de três meses a um ano, ou multa, de um a cinco contos de réis, ou ambas cumulativamente, se o fato não constitui crime contra a ordem política ou social”.
Também inclui o Art. 19: “Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta, sem licença da autoridade: Pena – prisão simples, de quinze dias a seis meses, ou multa, de duzentos mil réis a três contos de réis, ou ambas cumulativamente”. TACITAMENTE REVOGADOS PELA LEI 9437/97 (LEI DAS ARMAS DE FOGO) E LEI 10826/03 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO). DOUTRINA (FERNANDO CAPEZ) E JURISPRUDÊNCIA ENTENDEM (CONTRAVENÇÃO DE PERIGO ABSTRATO) ENQUE O ART. 19 CONTINUA EM VIGOR EM RELAÇÃO À ARMA BRANCA (RESP 549056/SP, MIN LAURITA VAZ, J. 01/03/04).
A Contravenção só se configura se o agente estiver portando arma branca com o objetivo de usá-la para o cometimento de infração penal. Confisco do instrumento da Contravenção Penal – art. 91, II, “a” do CP – Entendimento majoritário é de que cabe (RESP 83857/RJ, Min. Gilson Dipp, j. 14/02/2000).
Porte de Arma Branca e Homicídio ou Lesões Corporais – Se o porte de arma branca ocorreu exclusivamente para a prática do homicídio fica absorvido por este. Ex. – dois indivíduos discutem num bar, um deles vai em sua casa, busca a arma branca, volta e executa o outro. Mas se porta a arma branca e ocasionalmente a utiliza para um homicídio, responde pela contravenção + homicídio. Neste âmbito, pode-se demonstrar também através do Art. 21: “Praticar vias de fato contra alguém: Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de cem mil réis a um conto de réis, se o fato não constitui crime”. O Bem jurídico protegido é a incolumidade pessoal que caracteriza que são todos os atos de violência física que não caracterizem lesões corporais, tentativa de homicídio ou injúria real. Exemplo – tapas nas costas, rasgar a roupa da pessoa, puxar cabelo, empurrões, arremesso de líquido. Obs.: a simples dor e o eritema (vermelhidão na pele) não constituem lesões corporais.Sujeitos ativo e passivo – qualquer pessoa. Se a vítima for maior de 60 anos a pena agrava-se de 1/3. Dispõe o Parágrafo único: “Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos. (Incluído pela Lei nº 10.741, de 2003). Espécie de ação nas Contravenções da vias de fato”. Há duas correntes que discutem estes entendimentos:
1ª corrente: (Damasio, Nucci, Ronaldo Batista Pinto) – Ação Penal condicionada à representação. – se a lesão corporal leve passou a depender de representação, a contravenção de vias de fato também (analogia in bonam partem – art. 88 da Lei 9099/95).
2ª corrente – A contravenção de vias de fato continua sendo de ação pública incondicionada, porque o art. 17 é norma especial, que prevalece sobre o art. 88 da Lei 9099/95. (Ada P. Grinover, “Juizados Especiais”, STF, HC 80617).