Notas
01 Derecho Penal argentino, Buenos Aires, TEA, 1978, t. 2, p.244.
02 Tratado de Derecho Penal, Trad. Luis Jimenez de Asúa, 4ª ed., Madrid, Reus, 1999, tomo III, pp.71 e ss.
03 A doutrina mais recente controverte a premissa e o conceito de Liszt, observando que é possível o encadeamento concreto de uma série de "autores por trás de autores", reconhecendo-se no intermeio a autoria da ação típica, ainda quando o sujeito não tenha cooperado nem no princípio e tampouco no final do fato, limitando sua intervenção ao elo intermediário da cadeia, como no caso Eichmann (cfr. Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.274, citando Servatius). Eichmann, criminoso nazista, foi responsabilizado pelo extermínio de incontáveis judeus durante a 2ª Guerra Mundial; oficial intermediário, recebia ordens de instâncias superiores e as fazia cumprir, mas também emanava ordens a seus subordinados, não sendo mero executor. Alegara, em sua defesa, que ainda se houvesse recusado as ordens superiores, seu ato em nada aproveitaria aos judeus, já que o aparato estatal as faria cumprir por intermédio de outrem; "frente à ordem do todo-poderoso coletivo", concluía, "o sacrifício carece de sentido", vez que, ali, o crime não seria obra do indivíduo, mas do próprio Estado (Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal., pp.271-272). Diante da declarada dificuldade em definir, tecnicamente, quem havia auxiliado quem, os juízes do tribunal qualificaram de crimes de massa os delitos em questão, de molde a excluir a aplicação das categorias normais de participação.
04 Idem, p.87.
05 O autor não distingue entre induzimento e instigação. Na mesma linha, em obra mais recente, Julio Fabbrini Mirabete (Manual de Direito Penal, Penal, 6ª ed., São Paulo, Atlas, 1991, v. 1, p.222), analisando que, se variadas as formas de participação (ajuste, determinação, instigação, organização e chegia, auxílio moral, adesão sem prévio acordo etc), a doutrina atém-se a duas espécies básicas, a saber, a instigação e a cumplicidade.
06 Idem, p.92.
07 Contrapõem-se a ela a teoria objetivo-material e a teoria subjetiva, a que faremos referência, en passant, adiante.
08 Damásio E. de Jesus, Direito Penal, 15ª ed., São Paulo, Saraiva, 1991, v. 1, p.355.
09 Idem, p.356.
10 José Frederico Marques, Tratado de Direito Penal, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v. II, p.309. Note-se que o ajuste, como prévio acordo de vontades, é dispensável na co-autoria: basta que haja em cada um dos concorrentes o conhecimento de concorrer à ação de outrem (Francisco de Assis Toledo, Princípios Básicos de Direito Penal, 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 1991, p.305). Assim, e.g., há co-autoria na ação de serviçal que, ciente da presença de um ladrão nas imediações, escancara portas e janelas do imóvel à espera do larápio, na intenção de prejudicar o empregador.
11 E. Magalhães Noronha, Do Crime Culposo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1974, p.105. Essa concepção é refutada por segmento expressivo da doutrina alemã, que nega a possibilidade da co-autoria em delitos culposos, por inocorrente, na espécie, o domínio do fato; cada pedreiro, no exemplo citado, seria autor acessório ou paralelo e não co-autor do delito; cfr., por todos, Hans-Heinrich Jescheck (Tratado de Derecho Penal: Parte General, trad. José Luiz Manzanares Samaniego, 4ª ed., Granada, Comares, 1993, p.617), "in verbis": "No hay, consecuentemente, coautoría alguna en los hechos por imprudencia, puesto que falta entonces la resolución común. Si varias personas cooperan de modo imprudente, cada uno de los que intervienen es autor paralelo y las diversas contribuciones al hecho tienen que ser examinadas por separado en cuanto a su contenido de imprudencia". Isso se deve, na correta ilação de Cezar Roberto Bitencourt (Manual de Direito Penal, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 1, p.391), à adoção da teoria do domínio do fato, que a seguir destrinçaremos.
12 Damásio E. de Jesus, Direito Penal, v. 1, p.360.
13 Derecho penal alemán, 12ª ed., trad. Bustos Ramírez e Yãnez Perez, Santiago, Jurídica de Chile, 1987, pp.161-165.
14 Na doutrina alemã, confira-se Hans-Heinrich Jescheck (Tratado de Derecho Penal, p.419), em alusão "a latere" no discurso sobre discriminantes putativas (erro sobre causas de justificação ou erro indireto de proibição): "La doutrina dominante y la jurisprudencia (...) adotan una posición ecléctica que desemboca en una conclusión similar a la da doctrina de los elementos negativos del tipo, si bien la fundamenten de otro modo (teoría restringida de la culpabilidad). Ciertamente, el error vencible sobre los presupuestos de una causa de justificación no se considera error de tipo, pero se aplica analógicamente el § 16, porque la semejanza estructural con el auténtico error de tipo parece decisiva. Se excluí así el injusto del hecho doloso, de forma que desaparece también la posibilidad de la participación" (g.n.). Noutras palavras, coarctada a ilicitude da conduta principal, não se reconhece participação penalmente relevante na conduta adesiva (teoria da acessoriedade limitada).
15 Programma del corso di diritto criminale: del dellito, della pena, Bologna, il Mulino, 1993, pp.278-283.
16 Hipótese diversa daquela alhures referida, de autoria mediata, em que a ordem emanada não é manifestamente ilegal, não havendo, portanto, abuso (cfr. Damásio E. de Jesus, Direito Penal, 1º v., p.363). Carrara observa que o mandato e sociedade podem ser punidos como delitos autônomos (é o caso, no Brasil, do crime de bando ou quadrilha: artigo 288 do Código Penal), mas é um erro crasso reconhecer na hipótese a forma tentada da infração penal à qual se destinam, porque a tentativa pressupõe, como condição essencial de existência, o início da execução da infração colimada (prática de atos preparatórios ou executórios), o que poderá não ocorrer no mandato ou no ajuste (op.cit., p.280, nota n. 1).
17 José Frederico Marques, Tratado de Direito Penal, v. II, pp.318-319.
18 Nesse sentido, José Frederico Marques (Tratado de Direito Penal, v. II, p.319), ilustrando a figura da participação com "a coação de outrem a execução material do crime é forma de participação" e, a seguir, com a "execução mercenária por paga ou promessa de recompensa".
19 "Nem sempre os tipos penais descrevem com clareza o injusto da ação, dificultando a distinção entre a autoria e participação, especialmente nos crimes de resultado. A teoria objetivo-material procurou suprir os defeitos da formal-objetiva, considerando a maior perigosidade que deve caracterizar a contribuição do autor em comparação com a do partícipe; em outras palavras, considerando a maior importância objetiva da contribuição do autor em relação à contribuição do partícipe" (Cezar Bitencourt, Manual de Direito Penal, p.380 – g.n.). Nos casos de autoria intelectual, a contribuição do mentor, partícipe na construção clássica, é usualmente superior, em importância, à do executor.
20 Johannes Wessels, Direito Penal: Parte Geral, trad. Juarez Tavares, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris, 1976, p.124.
21 A teoria equaciona o problema jurídico dos criminosos nazistas, ante a figura do domínio de vontade por estruturas organizadas de poder; não soluciona a contento, porém, a questão da execução mercenária, ao menos na concepção de seu maior idealizador, Claus Roxin (para quem o mandante é mero partícipe).
22 Cezar Roberto Bitencourt, Manual de Direito Penal, pp.379-381. Cfr. também Claus Roxin (Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, trad. Joaquín Cuello Contreras, José Luís Serrano Gonzáles de Murillo, Madrid, Marcial Pons, 1998, pp.51-77), mais exaustivo, refere a teoria objetivo-formal de Beling, Mayer e Liszt, as teorias objetivo-materiais (teoria da necessidade do aporte causal, de Baumgarten, Liepmann e Kohlrausch; teoria da cooperação anterior e simultânea ao fato, ou teoria da simultaneidade, de Fuchs, reconhecendo a participação na cooperação anterior aos atos de execução e a co-autoria na cooperação simultânea; teorias de causalidade físico-psíquica, arrimadas em Feuerbach e divulgadas por Horn; teoria da supremacia do autor, de Dahm e Schmidt, dinstinguindo entre a co-autoraia e a participação com fulcro, respectivamente, na nota da coordenação ou da subordinação), as teorias subjetivas (teorias do dolo, que distinguem entre a vontade do autor e a vontade do partícipe, como em Wachter; teorias do interesse, de Feuerbach, Henke e Geib, que distinguem entre o interesse autônomo do autor e o interesse acessório do partícipe, que não pode ter interesse independente na causação do resultado) e teorias mistas ou subjetivo-objetivas (Haupt e Tjaben; esse último propôs considerar autores os que executam uma ação típica ¾ teoria objetivo-formal ¾ assim como todos os cooperadores imbuídos de "animus auctoris").
23 Manuel Cobo del Rosal, no Prólogo à obra de Claus Roxin (Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.03).
24 Damásio E. de Jesus (Direito Penal, 1º v., p.166) conceitua os crimes de mão própria, de conduta infungível ou de atuação pessoal como sendo os que só podem ser praticados pelo sujeito ativo em pessoa; são exemplos a contravenção penal de direção perigosa, os crimes de falso testemunho, de prevaricação e de deserção e o delito de incesto, nos países que o admitem. A testemunha notificada a depor não pode pedir a terceiro que deponha falsamente em seu lugar, assim como o funcionário público não pode solicitar a terceiro que deixe de realizar ato de ofício em seu lugar e o condutor não pode fazer com que outrem dirija perigosamente em seu lugar ou divida consigo a condução simultânea do veículo. Os "extranei", nos crimes de mão própria, podem intervir como partícipes, jamais como autores; daí a ilação, na teoria do domínio do fato, de que o sujeito ativo, nos crimes de mão própria, é invariavelmente o "dominus" da ação. Rolf-Dietrich Herzberg (apud Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.712) divisa, entre os delitos de mão própria, delitos referidos ao próprio autor (o tipo penal apresenta, em primeiro plano, uma conduta típica voltada ao próprio corpo do agente, como na contravenção de direção perigosa), delitos em que a possível consumação por terceiros não pode encarnar a lesão ao bem jurídico (prevaricação, gestão fraudulenta) e delitos de própria mão dependentes do direito processual (falso testemunho, perjúrio). Roxin denomina de delitos de mão própria inautênticos aqueles que consubstanciam a desobediência a um dever institucional (delitos de infração de dever), porque o aspecto decisivo para a aferição da autoria não é a constatação de um determinado comportamento, mas a vulneração de um dever especial extrapenal (caso da deserção, do perjúrio, do falso testemunho etc); o conjunto de tais delitos tem sido designado, didaticamente, de direito penal administrativo ou de ordenação.
25 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, pp.675-676.
26 Cfr., sobre culpabilidade e liberdade, Francisco de Assis Toledo, Princípios Básicos de Direito Penal, pp.242-250.
27 O princípio da responsabilidade, haurido por Roxin do ordenamento legal alemão, não reconhece o domínio do fato, em sentido jurídico, àquele que simplesmente exerce sobre o agente próximo (executor) influência mais ou menos intensa, desde que se mantenha a responsabilidade penal do executor; prevalece, aqui, o domínio da ação, como consignado no texto principal. Atribui-se, todavia, a condição de titular do domínio da vontade (e, por extensão, do domínio do fato) àquele que influi na ação de outrem de maneira que o agente próximo "de jure" veja-se exonerado de responsabilidade penal (cfr. Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.170).
28 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.192.
29 "A" pede a "B" que acenda as luzes pressionando o interruptor, no que é inocentemente atendido por "B", que deflagra inadvertidamente explosivo que, noutro local, dá a morte a "C". "A" não agiu com dolo ou culpa e tampouco se lhe exigiria agir de outro modo; remanesce evidente, pois, a autoria mediata de "A", assim como a sua responsabilidade penal exclusiva (Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.193).
30 Erro de proibição próprio ou erro sobre os pressupostos materiais de causas de justificação, com exclusão da culpabilidade (Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, pp.216-231).
31 A hipótese subdivide-se: erro sobre o sentido concreto da ação (e.g., "error in persona"; para Roxin, o sujeito que induz ao erro o executor é autor mediato, exercitando domínio do fato de quarto grau) e erro sobre o risco (e.g., "A" e "B" encontram em sótão granada não detonada, desejando o primeiro desfazer-se imediatamente do artefato para preservar a integridade do último piso; teme, porém, lancá-la ao jardim, já que ali vê "C" trabalhando; delibera, porém, fazê-lo porque "B", desafeto de "C" e expert em explosivos, assevera ser pequeno o risco da detonação com a queda, conquanto o saiba elevado). Também nesse último caso, entende Roxin haver autoria mediata, baseada no engano sobre a probabilidade de produção do resultado lesivo, causal (do ponto de vista psíquico) para a decisão do executor; a criação ou o aproveitamento do erro alheio o tornam autor mediato, não se justificando a qualificação de partícipe (ainda mais porque haveria, nesse caso, participação dolosa em conduta culposa). Cfr. Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, pp.235-249.
32 Esse "modus operandi" tornou-se encontradiço nas capitais brasileiras, sobretudo na última década, como forma de elisão ou atenuação da responsabilidade penal em quadrilhas e, notadamente, no tráfico de entorpecentes, em que os menores são empregados como "vapor". Vicejando, com efeito, a teoria mais ortodoxa (teoria formal-objetiva, de von Liszt), os mentores intelectuais da ação criminosa, se identificados, responderiam como meros partícipes, sendo inimputáveis os executores.
33 A expressão "imputabilidade diminuída", para significar semi-imputabilidade, é acertadamente criticada por Damásio E. de Jesus (Direito Penal, 1º v., p.442), sob o argumento de que "a expressão é incorreta, pois o agente é imputável. Há diminuição de responsabilidade (a pena é diminuída) e não de imputabilidade. Assim, podemos falar em responsabilidade diminuída e não em imputabilidade diminuída". Volvendo a Roxin, se o agente próximo, no instante do fato, é incapaz de compreender o caráter ilícito da conduta ou de se determinar por essa compreensão, o terceiro que o predispõe ¾ agente remoto ¾ detém o domínio do fato, em qualquer sorte de cooperação. Se, por outro lado, o agente próximo não percebe com clareza a ilicitude do ato, mas age com dolo no sentido da teoria da culpabilidade e com domínio do fato de primeiro grau (domínio da ação), pode ser considerado autor, ainda que não se lhe aplique pena (e.g., artigo 98 do Código Penal brasileiro); nada obstante, o agente remoto será, ainda aqui, autor mediato. De outra parte, se o agente remoto, imputável, incorre em erro sobre o injusto material do fato, será reputado partícipe, ainda quando o agente próximo seja inimputável, porque tampouco o primeiro detinha, na hipótese, a compreensão de sentido necessária para o domínio do fato em segundo grau (Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal,p.259).
34 Pela Lei 8.069/90 (Estatudo da Criança e do Adolescente), são crianças as pessoas com até doze anos de idade incompletos; adolescentes são as pessoas cuja idade está entre doze e dezoito anos (artigo 2º). Para Hans Welzel, apenas na ação preordenada de crianças, que executam a vontade alheia sem manifestação paupável de vontade própria, dar-se-ia a autoria mediata; já em relação aos adolescentes, capazes de auto-determinação, a atuação do agente remoto configuraria tão somente a participação. Já para Roxin, nos atos de menores de catorze anos o agente remoto seria, em qualquer circunstância, autor mediato; já nos atos de adolescentes, a autoria mediata verificar-se-ia apenas quando o executor não fosse penalmente responsável, consoante o parágrafo 3º da JGG (Jugendgerichtsgesetz ¾ Lei dos Tribunais para a Juventude ¾ de 11.12.1974). A distinção tem espeque na política criminal tedesca de prevenção e repressão à delinqüência juvenil, que concebe a imputabilidade relativa do menor em determinados contextos; no Brasil, a absoluta inimputabilidade do menor de dezoito anos, prevista no artigo 27 do Código Penal, alcançou "status" constitucional em 1988 (artigo 228 da CRFB), sugerindo-se até mesmo a sua natureza pétrea, em doutrina como em jurisprudência (cfr. STF, ADIn 939-07/DF, in RDA 198/123 e RTJ 151/755, reconhecendo no princípio da anterioridade tribuária uma garantia fundamental do indivíduo e, por conseguinte, admitindo a existência de direitos e garantias individuais, para os fins do artigo 60, §4º, IV, fora do rol do artigo 5º ¾ direitos sociais, direitos de nacionalidade). Conseqüentemente, a solução jurídica para a "vexata quaestio" admite, no âmbito doméstico, notória simplificação em comparação ao caso germânico: sendo inimputável a criança como o adolescente, o agente remoto será sempre, à luz da teoria do domínio do fato, autor mediato.
35 No primeiro caso (autolesão), "cabe aseverar en general: como autor mediato es punible todo aquel que posibilita que otro se autodañe o le determina a hacerlo, siempre que a éste le falte la comprensión del significado moral y social del hecho" (Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.262). Nas lesões praticadas por intermédio de inimputáveis em detrimento de outrem, valem as ilações já consignadas nas notas anteriores.
36 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.679.
37 Idem, p.270. Caso rumoroso da jurisprudência alemã (BGH 18, 87 (95)) remonta à década de sessenta, em que o agente Staschynskij foi processado pela morte de dois políticos exilados no território tedesco, assassinados mediante veneno, pessoalmente e sem auxílio direto de outrem, por ordem de uma potência estrangeira. Conquanto negados os requisitos do estado de necessidade penal, além de factível e exigível a conduta diversa (o acusado poderia, desde logo, entregar-se às autoridades alemãs, antecipando-se à prática do fato e reclamando proteção e asilo político), foi condenado como mero partícipe, em consideração ao reconhecimento de que seus superiores estrangeiros, desconhecidos, seriam os verdadeiros autores do delito. O desate judicial, insatisfatório, contrapôs as então recentes elucubrações da doutrina sobre o domínio da vontade em virtude de mecanismos organizados de poder (a primeira edição da obra de Roxin data de junho de 1963; o julgado é de outubro de 1962), o que levou à afirmação de que "la penetración de la idea objetiva del dominio del hecho en la jurisprudencia no va a pasar de ser episódica" (Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.125, nota 52). Nada obstante, "la jurisprudencia más reciente ha entreverado con criterios objetivos la anterior teoría puramente subjetiva, acudiendo para ello a una valoración global en la que interesan como ‘puntos de referencia’ el interés y el dominio del hecho o, al menos, la voluntad orientada a dicho dominio. Así se ha logrado un compromiso utilizable en la práctica" (Hans-Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, p.595).
38 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.267.
39 Idem, p.277.
40 Idem, p.271.
41 Idem, p.303.
42 Hans-Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, p.595.
43 Idem, pp.304-310.
44 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, pp.323-324.
45 Tratado de Derecho Penal, pp.585-586; 594-595.
46 Strafgesetzbuch (Código Penal alemão).
47 Modalidades usualmente citadas pela doutrina pátria: a autoria colateral "ocorre quando os agentes, desconhecendo cada um a conduta do outro, realizam atos convergentes à produção do evento a que todos visam, mas que ocorre em face do comportamento de um só deles"; já a autoria incerta dá-se quando, "na autoria colateral, não se apura a quem deva atribuir a produção do evento". Assim, se dois sujeitos postam-se de emboscada, ignorando cada um o comportamento do outro, e deflagram simultaneamente projéteis contra a vítima que vem a cair morta, e em não se apurando qual dos projéteis provocou o evento letal, cabe "puni-los como autores de tentativa de homicídio, abstraindo-se o resultado, cuja autoria não se apurou" (Damásio E. de Jesus, Direito Penal, 1º v., pp.368-378).
48 A menção crítica ao caso Staschynskij é de Jescheck (Tratado, p.586).
49 Tratado., pp. 594-595.
50 Tratado de Derecho Penal, tomo I, p.06: "Como ciencia eminentemente práctica que trabaja continuamente para satisfacer las necesidades de la administración de justicia, creando siempre nuevos frutos, la ciencia del Derecho es y debe ser una ciencia propiamente sistemática; pues solamente la ordenación de los conocimientos, en forma de sistema, garantiza aquel dominio seguro y diligente sobre todas las particularidades, sin el que la aplicación del Derecho, entregada al arbitrio o al azar, no pasaría de ser un eterno diletantismo."
51 Cfr. Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, pp.397-399, "in verbis": "si el sujeto de detrás entrevé el hecho, no es posible imaginar la inducción a un delito no doloso, puesto que en este caso nos encontramos ante un autor que, por falta de dominio final del curso del suceso, precisamente no puede ser autor, según se desprende de la definición; junto a él está un partícipe que es señor del hecho, y por tanto, a partir de los principios de esta teoría en ningún caso puede ser partícipe. Lo inadmisible de una construcción en tal sentido no se deduce, pues, de la ‘naturaleza de las cosas’, sino de la lógica de la formación razonable de conceptos". O argumento é irrebatível; daí compreendermos que, tal como outrora pontificado pelos séquitos da teoria formal-objetiva, não há participação dolosa em delito culposo ou vice-versa, ao contrário do que propugna Günther Jakobs (cfr. Claudia López Díaz, Introducción a la imputación objetiva, Bogotá, Universidad Externado de Colombia, 1996, p.94). Não obstante, a teoria da dominabilidade pode ser manejada de maneira a acolher a figura da co-autoria nas infrações culposas (domínio funcional), reconhecendo-se a "posição-chave" de cada sujeito na ação corrente (domínio factual), com abstração do elemento teleológico; aproximar-se-iam, desse modo, as doutirnas espanhola e germânica sobre concurso de agentes, imprimindo-se à teoria do domínio do fato a desejável universalidade. Confira-se em Günther Jakobs (La imputación objetiva en Derecho penal, trad. Manuel Cancio Meliá, Madrid, Civitas, 1996, p.165): "(...) cuando al poner orden en una habitación uno de los participantes abre la ventana para que otro pueda lanzar fuera una tabla, alcanzando ésta de modo imprevisto a un peáton, ambos intervinientes han organizado la lesión imprudente del peáton en régimen de reparto de trabajo, porque al lanzar fuera la tabla de modo descuidado han llevado a cabo, a través de una organización común, un comportamiento que constituye un riesgo no permitido".
52 Claus Roxin, Autoría y Dominio del Hecho en Derecho Penal, p.145.
53 "El principio de confianza está destinado a hacer posible la división del trabajo; por consiguiente, concluye cuando el reparto de trabajo pierde su sentido, especialmente, cuando puede verse que la otra parte no hace, o no ha hecho, justicia a la confianza de que cumplimentará las exigencias de su rol. En tales casos, ya no resulta posible repartir el trabajo para alcanzar un resultado exitoso" (Günther Jakobs, La imputación objetiva en Derecho penal, p.106).
54 Idem, p.149.
55 "Ainda se correto em teoria, não serve, porém, para a prática".
56 Claudia Lópes Díaz, op.cit., pp.94-95.
57 Günther Jakobs, La imputación objetiva en Derecho penal, p.107.
58 Yesid Reyes Alvarado, Imputación Objetiva, 2ª ed., Santa Fé de Bogotá, Temis, 1996, p.265.
59 Francisco de Assis Toledo, Princípios Básicos de Direito Penal, p.97.
60 Cfr. Damásio E. de Jesus, Imputação Objetiva, São Paulo, Saraiva, 2000, p.150: "A adoção da imputação objetiva não significa abandono da teoria finalista da ação, de modo que continuamos finalistas (...) As duas teorias podem coexistir, tanto que muitas regras, métodos e critérios da imputação objetiva têm fundamento no finalismo, como a inobservância do cuidado objetivo necessário, que corresponde à realização de conduta criadora de risco juridicamente reprovado".
61 No exemplo do taxista, não há qualquer aporte causal relevante ao evento delitual e tampouco lhe cabe qualquer forma de domínio do fato (ação, vontade ou função); não há, pois, elementos factuais indicativos de autoria ou co-autoria. De outra parte, tampouco remanesce a condição de partícipe, eis que o taxista não defraudou, com sua conduta, qualquer expectativa de comportamento (ao taxista cabe, mesmo, conduzir o passageiro de um ponto a outro, a despeito de suas boas ou más intenções), além de não aderir ao propósito criminoso. Por essa via, como pela de Günther Jakobs (proibição de regresso), chega-se à mesma conclusão: irresponsabilidade penal do condutor.
62 Não por outra razão, a doutrina espanhola, que acolhe a teoria do domínio do fato, critica a resistência germânica à admissão da participação em infrações penais culposas (cfr., por todos, Santiago Mir Puig, Derecho Penal: Parte General, Barcelona, PPU, 1985, pp.316-317).
63 Assim, e.g., ainda no caso do taxista que conduz o delinqüente ao local do crime, supra. Presumindo-se que as condutas de autor, co-autor e partícipe sejam sempre objeto de um mesmo processo (conexão ou continência: artigos 76, I, e 77, I do Código de Processo Penal), o juiz cuidará de aferir, primeiramente, a natureza do fato principal, reconhecendo-lhe ou não o caráter delitivo, para somente então analisar o fato acessório (mormente porque, para reconhecer relevância à participação, deverá ter formulado juízos prévios a propósito da tipicidade e da ilicitude do fato principal, em face da teoria da acessoriedade limitada, que reputamos válida ainda quando acolhida a teoria do domínio do fato). Nesse estágio, ao negar a relevância causal, normativa ou subjetiva da conduta acessória, estará automaticamente isentando de imputação o sujeito mediato, por via oblíqua (conquanto possa ser necessário, no contexto, o emprego de rudimentos da teoria da imputação objetiva para excluir, pela via objetiva, a mera participação).
64 Veja-se, e.g., o caso da teoria geral da relatividade, de Albert Einstein, e da física quântica, de Max Plank.