Alterações contratuais envolvendo espólio.

Dúvidas comuns no âmbito do Registro Empresarial

11/12/2018 às 10:41
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O presente artigo possui como objetivo demonstrar como o responsável deverá proceder quando precisar fazer alterações em instrumentos societários após o falecimento de um dos sócios.

Há algum tempo, tenho tido vontade de tratar sobre um assunto que percebo ser “pedra no sapato” de muitas pessoas, sejam elas sócias de empresas, contadores ou – e principalmente – advogados. É muito comum encontrar uma grande quantidade de erros em processos administrativos de alterações contratuais quando, no quadro de sócios e administradores da empresa, consta um espólio. Você sabe como proceder?

Vamos começar, efetivamente, do começo pra ficar mais fácil.

Pois bem. Toda empresa é composta por um quadro societário que, a depender do enquadramento em requisitos necessários, pode ser integrado por pessoas físicas ou jurídicas. Atenção! Nem todas as empresas são formadas por pluralidade de sócios, hein? Há as unipessoais, a exemplo do empresário individual e do titular de EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada), entretanto, no que se refere ao espólio detentor de cotas do capital social, estas seguem as mesmas regras que trataremos aqui.

Quando um sócio falece, sua participação no capital social de empresa passa a fazer parte do espólio, que é o conjunto de bens, direitos e obrigações do de cujus. Para que os bens do mesmo sejam transmitidos por herança, é necessária a realização de procedimento de inventário[1], seja ele judicial ou extrajudicial. Ora, se o falecido era detentor de cotas de uma empresa, é indispensável que a Junta Comercial do Estado no qual está localizada a sede da sociedade seja informada acerca do óbito, a fim de promover a pertinente alteração contratual.

Na prática do registro empresarial, isso quer dizer que, enquanto não houver homologação da partilha, o espólio é representado pelo inventariante, devendo sempre ser juntada ao processo a respectiva certidão ou ato de nomeação de inventariante como anexo ao documento a ser arquivado.

Importa salientar, por oportuno, que até que a efetiva partilha seja realizada, o inventariante somente poderá representar o espólio em alterações contratuais (no sentido latu sensu) que não importem em modificação de sua responsabilidade na empresa, exceto se esta acontecer por determinação judicial[2]. Nesse caso, é imprescindível a apresentação do respectivo alvará judicial específico para a prática do ato.

Aqui vale um adendo! Enquanto houver participação do espólio nos instrumentos societários, no preâmbulo da alteração contratual (bem assim da consolidação, em sendo o caso), este deve constar como representado pelo inventariante. Um erro bastante comum que se pode verificar no dia a dia do Registro Empresarial é que os sócios costumam qualificar completamente o espólio[3], mas vamos pensar comigo? Se o espólio é um conjunto de bens, direitos e obrigações, este também é um ente despersonalizado, não possuindo personalidade jurídica própria para atuar em juízo ou fora dele, não é mesmo? Assim, a qualificação feita deve ser tão somente do inventariante, o qual também deverá apor sua assinatura ao final do instrumento como representante processual do espólio.

Importa aduzir, ainda, que, caso o inventário já tenha sido finalizado, deverá ser juntado ao ato que se pretende arquivar cópia da partilha homologada e certidão de trânsito em julgado, no caso de inventário judicial, ou cópia da escritura de partilha e sobrepartilha, se existente, no caso de inventário extrajudicial. Nessa hipótese, o cenário muda. O espólio não mais deverá ser citado no instrumento, salvo para informar que a transmissão das cotas se deu por força do formal de partilha. Dada tal linha de entendimento, os herdeiros serão qualificados e comparecerão na condição de sucessores do sócio falecido podendo, no mesmo instrumento, haver o recebimento das suas quotas e a transferência a terceiros, se assim o desejarem.

Chamo a atenção para outro ponto que costuma gerar dúvidas nos processos de alteração contratual: Não se faz necessário informar que no ato está havendo a saída do sócio falecido, com a consequente cessão de cotas para terceiros. Mais uma vez reforço que, com a morte, os bens deixados são transmitidos diretamente ao espólio e deste aos herdeiros, sendo que o sócio falecido automaticamente, por óbvio, deixa de existir e, portanto, resta impossível sua retirada da sociedade.

O tema comporta várias inseguranças e questionamentos, especialmente em quem não atua na área empresarial, o que é natural. Todavia, se nos ativermos aos conceitos jurídicos básicos no concernente à transmissão de herança, espólio, inventário e partilha, já é possível ultrapassar várias barreiras e conseguir arquivar o ato pretendido na Junta Comercial sem maiores problemas.

Na dúvida, consulte um advogado de confiança.

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Sobre a autora
Danielle Nunes de Brito

Advogada; Graduada pela Universidade Federal da Bahia; Especialista em Direito Imobiliário/Condominial, Empresarial e em Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor; Servidora Pública da Junta Comercial do Estado da Bahia; Professora da plataforma online Brasil Jurídico, com cursos disponíveis de Direito Condominial e Registro de Empresas. Instagram: @daniellenbrito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Como advogada e servidora pública da Junta Comercial do Estado da Bahia, constato diariamente a dificuldade do público em geral, sejam eles advogados, contadores ou sócios, em saber como proceder com os atos constitutivos de suas empresas, no caso de falecimento de sócio. São erros que podem ser sanados com esclarecimentos básicos acerca de definições jurídicas e que evitam o prolongamento desnecessário dos processos administrativos.

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