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Posso recusar a fazer o teste do bafômetro?

24/04/2019 às 18:45
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Existe uma dúvida quanto a submissão ao teste do etilômetro, conhecido popularmente como bafômetro. Afinal, somos ou não somos obrigados a fazê-lo?

Sempre que converso sobre crimes de trânsito com alguém e me apresento como advogado criminalista, logo surge a pergunta: Mas, e aí, sou ou não sou obrigado a me submeter ao teste do etilômetro (popularmente conhecido como teste do bafômetro)?

Existe um motivo para tanta preocupação. Os condutores que diariamente são carregados de informações falsas e apoiados no “ouvi dizer”, ou, pior, no “vi na internet”, diante de situações reais, pode ser que se compliquem por não conhecerem a legislação ou interpretarem-na de forma equivocada.

Uma das situações que mais penalizam motoristas com base na proibição de dirigir veículo sob influência de álcool, é a confiança do condutor em já ter superado o estado de embriaguez. Isso pois, se sentir apto a dirigir, não necessariamente significa ausência de álcool no organismo a ponto de sair ileso do teste.

Nesta e em qualquer outra hipótese, quando parado em uma blitz, começam a surgir as dúvidas: Sou obrigado a fazer o teste do bafômetro? E se eu não fizer, quais consequências posso sofrer por isso? Se eu fizer e der positivo para presença de álcool, posso ser preso? Se eu optar por não fazer, como agir diante do agente de trânsito? Se…

Não é por acaso que existe essa “avalanche” de dúvidas. O que causa a maior confusão é o fato da Lei 13.281/16 ter acrescentado no Código de Trânsito Brasileiro o artigo 165-A, que traz a seguinte redação:

Recusar-se a ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa, na forma estabelecida pelo art. 277: infração gravíssima; penalidade de multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Medida administrativa: recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo, observado o disposto no § 4º do art. 270. Parágrafo único: aplica-se em dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 meses.

Entretanto, é preciso ter cautela em momentos como este para não sair de qualquer forma prejudicado. Por isso, saber o mínimo da legislação de trânsito neste respeito é sempre importante.


Quais as consequências para quem for flagrado no teste do bafômetro?

O ato de estar na direção de veículo automotor sob efeito de álcool, pode ser que gere consequências tanto no âmbito administrativo, quanto no penal.

Administrativamente, trata-se de infração gravíssima que, conforme artigo 165 do CTB, pode levar a multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 meses, além de outras medidas administrativas como o recolhimento temporário da CNH, registro de pontuação na mesma e retenção do veículo.

Importante lembrar que a multa, neste caso, conforme narrado acima, é de dez vezes o valor da infração gravíssima (R$ 293,47), ou seja, R$ 2.934,70. Além disso, este valor pode dobrar, caso o condutor cometa a mesma infração no período de 12 meses.

Note que a pena aplicada para quem se recusar ao teste é a mesma para quem realizar o teste e for constatado presença de álcool. O que demonstra a vontade clara do legislador em intimidar o condutor a realizar o teste em qualquer circunstância.

Quanto à questão penal, consoante art. 306 do CTB, o condutor pode ser denunciado pela prática do crime de conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, com pena de detenção de 6 meses a 3 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a habilitação.

No caso de ser considerado crime, o condutor é submetido tanto às penalidades criminais quanto às administrativas, ou seja, a aplicação de pena não exime o pagamento de multa e demais sanções administrativas.


Qual a quantidade de álcool permitida para cada situação?

Saber qual a quantidade de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar permitido pode ser bastante útil quando parados em uma blitz da lei seca. 

Conforme já vimos antes, a constatação de presença de álcool no organismo pode ser que gere consequências tanto no âmbito administrativo quanto no penal. 

Mas, qual a quantidade permitida ou proibida para cada situação?

Quanto à questão administrativa (que já explicamos do que se trata), o Código de Trânsito Brasileiro decidiu por determinar que qualquer quantidade de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165 (citado acima). 

Existem estudos que apontam que, para um homem de 70 Kg, até mesmo o consumo de 6 bombons de licor já seria suficiente para acusar presença de álcool a ponto de ser considerado infração administrativa. 

Entretanto, um único bombom não causaria maiores problemas pois, apesar de haver o termo “qualquer concentração de álcool”, o próprio CTB abre margem de tolerância no caso de apuração por meio de aparelhos de medição, levando em consideração a possibilidade de erros.

Já no âmbito penal, o CTB traz que, para considerar o fato como crime, é necessário constatar concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar.

Da mesma forma administrativa, para apurar a quantidade de álcool através do bafômetro e considerar como infração penal, deve ser respeitada a margem de erro conforme tabela estipulada pelo CONTRAN que, no caso, 0,34 miligrama de álcool por litro de ar alveolar seria suficiente.

Aqui, há uma ressalva quanto às formas de apuração do estado de embriaguez. Mesmo o condutor se recusando ao procedimento do teste do etilômetro, a verificação pode ser feita por outras formas, como, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou, ainda, outros meios de prova em direito admitidos, resguardado o direito à contraprova.

No entanto, a resolução 432 de 2013 do CONTRAN estabelece em seu art. 5º, § 1º que, “para confirmação da alteração da capacidade psicomotora pelo agente da Autoridade de Trânsito, deverá ser considerado não somente um sinal, mas um conjunto de sinais que comprovem a situação do condutor”.

Isso quer dizer que apenas a constatação de olhos avermelhados, por exemplo, não seria suficiente para confirmar o estado de embriaguez do condutor.


Mas, afinal, posso ou não recusar de fazer o teste do bafômetro?

Superada esta parte, respondo à pergunta apresentada no início: Sim, posso recusar de me submeter ao teste do bafômetro e a Constituição me garante este direito.

Mas, e quanto ao artigo de lei citado, não parece clara a imposição de penalidade no caso da recusa? 

A resposta também é positiva, contudo, por mais que se criem leis no ordenamento jurídico, por incrível que pareça, existem várias delas que não respeitam a Constituição Federal, que deve sempre servir de fundamento como uma lei maior para que se crie qualquer outra.

No caso que estamos tratando, a alteração da lei de trânsito que estipulou o artigo citado acima (determinando a obrigatoriedade da realização do teste), fere a Constituição Federal e, por isso, não pode ser imposta a qualquer pessoa.

Estamos falando de um princípio bem conhecido por todos, o princípio da não auto-incriminação, estampado na nossa Constituição Federal em seu artigo 5º, LXIII, determinando que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado”.

Mas, o que isso tem a ver com o fato de não sermos obrigados a produzir provas contra nós mesmos? 

A explicação é muito simples. O artigo da Constituição citado faz menção ao preso (isso já vimos), contudo, enquanto ao preso é garantido o direito de ficar calado, essa garantia é estendida a qualquer outra situação que entenda ser necessária para que não venhamos a prejudicar nós mesmos com produção de provas.

Como o teste do bafômetro tem como único objetivo comprovar que há presença de álcool no organismo, bem como sua quantidade, o que, evidentemente, seria prejudicial para o condutor submetido ao teste, conclui-se que é uma garantia constitucional não ser submetido a este procedimento e, tampouco, ser punido por não tê-lo feito.


O que pode acontecer se eu negar de fazer o teste?

Quem nunca ouviu falar de alguém que responde administrativamente por ter negado de fazer o teste do bafômetro? Como isso acontece se não somos obrigados a realizar o procedimento?

O fato é que a não obrigatoriedade de fazer o teste trata-se de uma interpretação que, apesar de ser perfeitamente plausível, não invalida o artigo 165-A do CTB acima citado (pelo menos, ainda).

Isso quer dizer que a interpretação da não obrigatoriedade de se submeter ao teste não desautoriza o agente de trânsito em lavrar o auto de infração com base no artigo que já mencionamos.

Sendo assim, a princípio, há uma possível consequência administrativa a quem se recusa a realizar o teste do bafômetro, qual seja, a lavratura do auto de infração de trânsito, o que pode ser combatido com recursos posteriores com base nas justificativas que já mencionamos.

Já no âmbito penal, a recusa do teste do bafômetro não traz quaisquer prejuízos. Pelo contrário, pode ser que em determinadas situações, o fato de não se submeter ao teste colabore com a tese defensiva em uma possível ação criminal, que veremos logo adiante.

Sendo constatada a alteração da capacidade psicomotora em razão da influência de álcool através de qualquer uma das formas mencionadas, o condutor pode, inclusive, ser preso em flagrante pela conduta por ora praticada. Neste caso, por se tratar de crime com pena inferior a 4 anos, o próprio delegado de polícia pode estipular a fiança.

Por outro lado, a falta de constatação de elementos que caracterize o estado de embriaguez no condutor, desautorizaria a prisão em flagrante, razão pela qual não parece conveniente se submeter ao teste.

Digo pois, independentemente do estado em que se encontre o motorista (até mesmo quando não aparenta estar embriagado), se comprovado a quantidade de álcool (0,34 miligrama por litro de ar alveolar) através do teste, por si só já caracterizaria o crime previsto no Código de Trânsito, o que, em tese, autorizaria a prisão.

Neste caso, não havendo estado de embriaguez claro, a recusa em fazer o teste seria uma boa saída e, além disso, o fato de renunciar a fazê-lo, por si só, não pode (jamais) servir como motivo para ser preso em flagrante. Aqui, voltamos (ainda com mais força) ao princípio constitucional da não auto-incriminação.


Como proceder diante da autoridade policial se eu optar por não realizar o teste?

Quando for parado em uma blitz da chamada “lei seca”, se por quaisquer desses motivos optar por não realizar o teste do bafômetro, seja cauteloso em demonstrar ao agente de trânsito sua preferência por não fazê-lo. Afinal de contas, não seria uma boa hora para “perder a razão” e, além disso, a cordialidade, além de ser bem vista em qualquer lugar, em casos como este pode ser bastante útil.

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Neste caso, é sempre bom utilizar mecanismos que gerem provas para uma possível necessidade futura, como a interposição de recursos ou até mesmo uma defesa criminal.

Recomenda-se que, de imediato, comunique ao agente de trânsito que irá gravar com a câmera do celular por motivos de sua própria segurança e, imediatamente, comece a registrar a ação.

Se, ainda assim, o agente optar por lavrar o auto de infração alegando ter infringido o art. 165-A (já aprendemos sobre ele), acompanhe a redação do auto de infração e, caso o agente procure inserir que o condutor foi flagrado dirigindo embriagado, peça que corrija e faça constar que, tão somente, se recusou a realizar o teste. Afinal, o fato de se recusar a fazê-lo, por si só, não quer dizer que está sob efeito de álcool.

Por fim, se o agente insistir no fato de que foi flagrado dirigindo embriagado (isso somente pelo fato da recusa do teste), aconselha-se reunir provas pessoais listando nomes de pessoas que presenciaram a ação, anotando o endereço e contato de cada uma delas.


Concluindo

O Estado tem endurecido bastante a legislação no sentido de tentar coibir a prática de conduzir veículo sob efeito de álcool, com o que não devemos discordar, haja vista a quantidade de acidentes de trânsito em decorrência da capacidade psicomotora alterada em razão destas substâncias.

Contudo, é preciso que saibamos o mínimo das regras estabelecidas pela lei de trânsito para que não venhamos a ser punidos de forma indevida, o que é bastante comum na prática.

Sendo assim, aprendemos que, em que pese existir um artigo no CTB que determine a obrigatoriedade em nos submetermos ao teste do bafômetro, entendemos inconstitucional o fato de sermos forçados a fazê-lo, já que não somos obrigados a produzir provas contra nós mesmos.

Além disso, vimos que em determinadas situações, o melhor a se fazer é recusar de nos submetermos ao teste, considerando que podemos responder, inclusive, criminalmente, caso o teste dê positivo para presença de álcool conforme a quantidade que tratamos.

Isso pois, consoante aprendemos, para que ocorra qualquer penalidade neste sentido, não basta a constatação de apenas uma única prova do estado de embriaguez, mas sim um conjunto delas. Colaborar para a produção de uma, talvez não seja a melhor opção.

Por fim, quando for parado em uma blitz da lei seca, caso prefira não se submeter ao teste, é imprescindível que se tenha bastante cautela, tendo em conta a presunção de veracidade e fé pública quanto aos atos praticados por agentes de trânsito.

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Sobre o autor
Wagner Frutuoso

advogado criminalista especializado, em Uberlândia – MG, atuante exclusivamente nesta área da advocacia. É graduado em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos de Uberlândia-MG, Pós-graduado em Processo Penal pela Faculdade Damásio (especialista) e Pós-graduando em Direito Eleitoral pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Integrante da OAB/MG com número de inscrição 184.784, membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM), membro da comissão de Direito Penal da 13ª subseção da OAB/Uberlândia, membro da comissão de Direito Eleitoral da OAB Uberlândia, palestrante e compromissado com a ética da profissão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRUTUOSO, Wagner. Posso recusar a fazer o teste do bafômetro?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5775, 24 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72534. Acesso em: 29 mar. 2024.

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