SUMÁRIO: 1. Considerações preliminares; 2. A disciplina do art. 71 da CLT; 3. Fundamentos para o intervalo intrajornada; 4. Direito indisponível; 5. Exclusão da duração do intervalo do tempo de trabalho; 6. Ônus da prova; 7. Violação do intervalo. Caracterização; 8. Violação do intervalo. Repercussão; 9. Considerações finais.
1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Segundo a disciplina do § 4º do art. 71 da CLT, quando o intervalo para repouso e alimentação não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
A dissidência quanto à correta aplicação do referido dispositivo legal chegou ao Tribunal Superior do Trabalho que, ao decidir a esse respeito, editou a Orientação Jurisprudencial SBDI-1 n. 307, verbis:
307 - INTERVALO INTRAJORNADA (PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO). NÃO CONCESSÃO OU CONCESSÃO PARCIAL. LEI N. 8.923/1994.
Após a edição da Lei n. 8923/1994, a não-concessão total ou parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT). (Inserido em 11-8-2003).
Não obstante o esforço empreendido pela Augusta Corte, não foi ela suficientemente abrangente na análise feita, permitindo, com isso, a persistência de dúvidas quanto ao exato conteúdo do dispositivo legal mencionado.
Eis aí, portanto, o interesse em lançar algumas considerações superficiais sobre o tema, com os olhos voltados ao entendimento jurisprudencial acerca da aplicação da OJ SBDI-1 n. 307.
2. A DISCIPLINA DO ART. 71 DA CLT
Segundo a disciplina do art. 71 da CLT:
a) não será obrigatória a concessão de intervalo para repouso ou alimentação se a duração do trabalho contínuo não exceder de 4h.
b) será obrigatória a concessão de um intervalo de 15min para repouso ou alimentação se a duração do trabalho contínuo exceder de 4h, mas não ultrapassar 6h (CLT, art. 71, § 1º).
c) será obrigatória a concessão de um intervalo mínimo de 1h e máximo de 2h para repouso ou alimentação se a duração do trabalho contínuo exceder de 6h (CLT, art. 71, caput). Nessa hipótese, o intervalo:
¾ máximo poderá ser superior a 2h se assim for ajustado em acordo individual escrito, ou em convenção ou acordo coletivo de trabalho (CLT, art. 71, caput). [1]
¾ mínimo poderá ser reduzido por ato do Ministro do Trabalho quando: a) se verificar que o estabelecimento atende integralmente às exigências concernentes à organização dos refeitórios; e b) os respectivos empregados não estiverem sob regime de trabalho prorrogado a horas suplementares (CLT, art. 71, § 3º).
3. FUNDAMENTOS PARA O INTERVALO INTRAJORNADA
O intervalo intrajornada possui fundamento de ordem biológica [2]. Busca-se, com a inatividade do trabalhador, atingir:
a) metas de saúde física e mental (higidez física e mental), propiciando-lhe que, após certo período, retempere em parte suas forças físicas e psíquicas. Vale dizer, que restabeleça em parte o sistema nervoso e as energias psicossomáticas. [3]
b) metas de segurança, com que se previne em parte a fadiga física e mental e reduzem-se os riscos patológicos e de acidentes de trabalho. A fadiga física e mental se traduz na diminuição do ritmo da atividade e na perda da capacidade de atenção ordinária, com conseqüente perda de produtividade e aumento dos acidentes do trabalho. [4]
4. DIREITO INDISPONÍVEL
Diante dos fundamentos (de ordem pública) do intervalo intrajornada, não poderá o tempo mínimo previsto na lei ser suprimido ou reduzido por ato individual ou coletivo (CC-2002, art. 2.035, parágrafo único), ressalvada a hipótese do § 3º do art. 71 da CLT.
As normas jurídicas concernentes a intervalos intrajornadas são normas de saúde pública. Não podem, por isso, "ser suplantadas pela ação privada dos indivíduos e grupos sociais. É que, afora os princípios gerais trabalhistas da imperatividade das normas desse ramo jurídico especializado e da vedação a transações lesivas, tais regras de saúde pública estão imantadas de especial obrigatoriedade, por determinação expressa oriunda da Carta da República". [5]
Trata-se, portanto, de direito indisponível. [6]
5. EXCLUSÃO DA DURAÇÃO DO INTERVALO DO TEMPO DE TRABALHO
O tempo destinado ao intervalo intrajornada não é computado na duração do trabalho (CLT, art. 72, § 2º).
Esclareça-se, porém, que o tempo de intervalo não computado na duração do trabalho é o tempo legalmente previsto. Daí por que:
a) o tempo de intervalo que deve ser excluído da duração do trabalho é aferido (in abstrato) de acordo com a jornada contratual, sendo irrelevante a jornada efetivamente trabalhada. Desse modo, se o empregado foi contratado para trabalhar 6h diárias, o tempo de intervalo não computado na duração do trabalho é de 15min. Se, então, labora das 7h às 14h, com 1h de intervalo, fará jus ao recebimento de 45min extra.
b) o tempo de intervalo que excede os limites legais, bem como os intervalos concedidos sem previsão legal serão computados na duração do trabalho (Súmula n. 118 do TST). [7]
6. ÔNUS DA PROVA
Segundo o comando "dos artigos 818 da CLT e 333, inciso II, do CPC, incumbe à Reclamada o ônus de comprovar a concessão do intervalo intrajornada para repouso e alimentação, por se cuidar de fato extintivo da pretensão de horas extras". [8]
No caso de empregador com mais de dez empregados, a única prova admitida será a prova documental, uma vez que dele é o dever de manter, fiscalizar, conservar e ter sob sua posse e vigilância os controles de horários de seus trabalhadores (CLT, art. 74, § 2º). A inexistência dessa prova (salvo motivo de força maior ou caso fortuito), ou a sua não-exibição injustificada, fará emergir a presunção de veracidade da jornada de trabalho alegada na petição inicial [9], a qual poderá ser elidida por prova em contrário, desde que já existente nos autos (sendo inadmissível a sua produção). [10]
Esse mesmo tratamento jurídico, qual seja, o de presumir verdadeira a jornada de trabalho alegada na petição inicial, regerá a situação da apresentação de controles de jornada que não registram o tempo de intervalo.
Apresentados, entretanto, os controles de jornada será do empregado o ônus de provar a inexistência de intervalos:
a) que neles estiverem registrados.
b) que neles estiverem pré-assinalados. Nesse caso, exibidos pelo empregador os cartões de ponto, "sem que haja notícia de impugnação do empregado e prova de que não retratam com fidelidade a efetiva jornada de labor, não procede pedido de horas extras, com fundamento em inversão do ônus da prova. Não se pode cogitar de inversão do ônus da prova quando a parte a quem a lei atribui o ônus de provar determinado fato desincumbe-se de tal encargo". [11]
Não obstante esteja consolidado na SBDI-1 do TST o entendimento exposto na alínea ‘b’, a pré-assinalação dos intervalos, em meu sentir, não goza de presunção de veracidade, uma vez que nada mais é do que um indicativo dos horários em que o intervalo deve ser gozado, e não o registro fiel desse acontecimento. O ônus de provar a existência do intervalo, portanto, deveria permanecer com o empregador.
Além disso, a Portaria n. 3.082/84 do Ministério do Trabalho, que autoriza a pré-assinalação dos intervalos, não tem caráter geral, não se dirige aos empregadores e tampouco possui força para revogar a determinação legal de assinalação dos horários de intervalo (CLT, art. 74, § 2º).
7. VIOLAÇÃO DO INTERVALO. CARACTERIZAÇÃO
Tem-se por violado o intervalo intrajornada mínimo:
a) pela não-concessão do tempo legal (OJ SBDI-1 n. 307).
b) pela concessão parcial do tempo legal (OJ SBDI-1 n. 307).
c) pela concessão total do tempo legal, mas de forma fracionada. A composição unitária de tempo informa a disciplina do intervalo intrajornada. Este, portanto, tem de ser concedido de forma única. Tal exigência deriva logicamente dos objetivos perseguidos pelo instituto. O intervalo intrajornada, então, não pode ser fracionado ou pulverizado durante o período de trabalho. Essa prática frustra os objetivos teleológicos e políticos da norma legal (CLT, 9º).
8. VIOLAÇÃO DO INTERVALO. REPERCUSSÃO
Como o tempo destinado ao intervalo intrajornada previsto no art. 71, caput e § 1º, da CLT não é computado na duração do trabalho (CLT, art. 72, § 2º), tinha a jurisprudência, antes do advento da Lei n. 8.923/94, firmado o entendimento de que a violação daquele, sem causar acréscimo na jornada de trabalho, não acarretava qualquer repercussão financeira para o trabalhador. Tratava-se, portanto, de mera infração administrativa (Súmula n. 88 do TST).
A Lei n. 8.923, de 27-7-94, entretanto, rompeu com esse entendimento ao inserir o § 4º ao art. 71 da CLT. Segundo a nova disciplina legal, não sendo concedido pelo empregador o intervalo intrajornada, ficará este obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
Desse modo, a violação do intervalo intrajornada:
a) caracteriza infração administrativa (CLT, art. 75).
b) não causa nenhuma repercussão financeira para o trabalhador anteriormente a 28 de julho de 94, data da publicação da Lei n. Lei n. 8.923/94 (Súmula n. 88 do TST). [12]
c) gera para o empregado, após 28 de julho de 94, o direito de receber a totalidade do tempo correspondente ao intervalo, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (OJ SBDI-1 n. 307). Nessa hipótese, segundo a jurisprudência predominante do TST, o pagamento:
¾ embora equiparado ao das horas extras, tem natureza jurídica indenizatória. [13]
Como Flávio Cooper, porém, penso que a "tese da indenização não prospera". [14] Não foi por acaso que o legislador utilizou-se, no texto do § 4º do art. 71 da CLT, do vocábulo remuneração em vez de indenização.
O lapso temporal para refeição e descanso dentro da jornada de trabalho "revela-se como instrumento relevante de preservação da higidez física e mental do trabalhador, de modo que o seu desrespeito conspira contra os objetivos de saúde e segurança no ambiente de trabalho". [15]
Daí, então, a razão objetiva da norma legal em equiparar o pagamento pela violação do intervalo intrajornada às horas extras, com o que supervaloriza aquele instituto.
¾ tendo natureza indenizatória não haverá reflexos. [16]
A exclusão dos reflexos, embora tecnicamente correta ¾ diante da natureza que se atribui ao pagamento (indenizatória) ¾ , não atende aos fins teleológicos do art. 71, § 4º da CLT.
O escopo objetivo da norma ao determinar a remuneração do período correspondente ao intervalo (com um acréscimo de no mínimo 50% sobre o valor da hora normal) foi o de estabelecer equiparação com as horas extraordinárias (portanto, com seus consectários), sobrevalorizando, desse modo o instituto e ampliando consideravelmente a quantia a ser desembolsada pelo empregador, como forma de frear o seu intento de infringir regra de medicina e segurança do trabalhador.
Nesse sentido, aliás, "parece" orientar-se a SBDI-1 do TST, ex vi do seguinte trecho da ementa dos E-RR-425052/1988: "em se tratando de desrespeito a intervalo para repouso e alimentação, independentemente de haver acréscimo na jornada laboral, a remuneração consistirá no pagamento do período não usufruído, como se fosse hora efetivamente trabalhada e extraordinária, para todos os efeitos legais". [17]
¾ deve ser do tempo integral do intervalo legalmente previsto.
Desse modo, se o intervalo concedido foi de 55min, a indenização não será apenas dos 5min restantes, mas de 1h. A razão disso está em que a concessão de intervalo em tempo inferior ao legalmente previsto frustra os objetivos do instituto e é, por isso, nula (CLT, art. 9º).
Nesse sentido, aliás, foi o voto proferido pela Min. Maria Cristina Peduzzi nos ERR-628779/2000 [18] (acórdão unânime que ensejou a edição da OJ SBDI-1 n. 307): "apenas quando assegurado o período mínimo destinado ao descanso e alimentação do empregado, desincumbe-se o empregador da obrigação legal. No presente caso, o intervalo intrajornada concedido era de apenas 40 (quarenta) minutos, insuficiente, estando correto o acórdão regional ao impor condenação em pagamento do intervalo intrajornada de forma integral, acrescido do adicional extraordinário".
¾ por ser equiparado ao das horas extras, deve ser acrescido do adicional mínimo de 50%.
Assim, se o contrato individual ou qualquer outro instrumento normativo fixar percentual para o pagamento de horas extras superior a 50%, esse percentual maior é que deverá ser utilizado.
Como ressalta Maurício Godinho delgado, o "objetivo da lei, ao sobrevalorizar esse tempo desrespeitado, foi garantir efetividade (isto é, eficácia social) às normas jurídicas assecuratórias do essencial intervalo intrajornada para refeição ou descanso, por serem normas de saúde e segurança laborais, enfaticamente encoraçadas pela Constituição". [19]
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como se viu, a Orientação Jurisprudencial SBDI-1 n. 307 deixou sérias lacunas ao dar a interpretação do TST ao conteúdo do § 4º do art. 71 da CLT. Cabe à referida Corte, então, complementá-la.
A título de colaboração sugere-se a seguinte redação:
307 - INTERVALO INTRAJORNADA. ART. 71 DA CLT.
I – Tem-se por violado o intervalo intrajornada mínimo: a) pela não-concessão do tempo legal; b) pela concessão parcial do tempo legal; c) pela concessão total do tempo legal, mas de forma fracionada.
II – A violação ao intervalo intrajornada mínimo, posteriormente a edição da Lei n. 8.923/1994, implica o pagamento da totalidade do tempo legalmente fixado para o seu gozo (CLT, art. 71, caput e § 1º) como hora extraordinária para todos os efeitos legais.
NOTAS
1.Quando "o trabalho diário exceder de seis horas, o intervalo terá de ser, em princípio estipulado com duração de uma a duas horas. Só poderá ser superior a duas horas se o permitir acordo escrito entre o empregador e seus empregados, acordo coletivo celebrado entre a empresa e o sindicato dos seus empregados ou, ainda, convenção coletiva firmada entre os sindicatos representativos das correspondentes categorias" (SÜSSEKIND, Arnaldo. MARANHÃO, Délio. VIANNA, Segadas, TEIXEIRA, Lima. Instituições de Direito do Trabalho. 21 ed. São Paulo: LTr, 2003, v. 2, p. 812).
2."Os repousos do trabalho formam um sistema de equilíbrio com os períodos de trabalho durante os quais o empregado deve a prestação da energia posta à disposição dos fins da empresa, de modo a utiliza-la em três planos de aproveitamento ¾ orgânico, social e econômico. Por isso, as legislações fundamentadas em estudos de Medicina do Trabalho, estabelecem para eles uma escala de duração em inteira correspondência com a escala de duração do trabalho, resultante da execução continuada, que é um dos caracteres do contrato individual" (RODRIGUES PINTO, José Augusto. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Repertório de Conceitos Trabalhistas ¾ v. I ¾ Direito Indivudual. São Paulo: LTr, 2000, p. 452).
3."Os repousos correspondentes ao dia ou dias de trabalho visam alcançar um resultado físico imediato ¾ a recomposição do organismo humano para suportar a continuidade seguinte do esforço" (RODRIGUES PINTO, José Augusto. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Repertório de Conceitos Trabalhistas ¾ v. I ¾ Direito Indivudual. São Paulo: LTr, 2000, p. 452).
4.Segundo a Ministra Maria Cristina Peduzzi, em voto proferido nos ERR-628779/2000 (acórdão unânime que ensejou a edição da OJ SBDI-1 n. 307), tem o intervalo intrajornada "dupla função: se por um lado destina-se à alimentação do empregado, por outro preza pela preservação de sua saúde, física e mental, por meio do descanso. Não por acaso, a duração do trabalho é Capítulo constante do Titulo II, da CLT, ao lado de matérias como salário mínimo e férias anuais".
5.DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2002, p. 897.
6.Nesse sentido inclina-se a atual jurisprudência da SBDI-1 do TST: INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO. FLEXIBILIZAÇÃO. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. 1. O intervalo mínimo intrajornada constitui medida de higiene, saúde e segurança do empregado, não apenas garantida por norma legal imperativa (CLT, art. 71), como também tutelada constitucionalmente (art. 7º, inc. XXII da CF/88). Comando de ordem pública, é inderrogável pelas partes e infenso mesmo à negociação coletiva: o limite mínimo de uma hora para repouso e/ou refeição somente pode ser reduzido por ato do Ministro do Trabalho (CLT, art. 71, § 3º). 2. O acordo coletivo de trabalho e a convenção coletiva de trabalho, igualmente garantidos pela Constituição Federal como fontes formais do Direito do Trabalho, não se prestam a validar, a pretexto de flexibilização, a supressão ou a diminuição de direitos trabalhistas indisponíveis. A flexibilização das condições de trabalho apenas pode ter lugar em matéria de salário e de jornada de labor, ainda assim desde que isso importe uma contrapartida em favor da categoria profissional. 3. Inválida cláusula de acordo coletivo de trabalho que autoriza a supressão do intervalo intrajornada para empregado porteiro submetido a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso. 4. Embargos de que se conhece, por divergência jurisprudencial, e a que se nega provimento (TST-ERR-439149/1998, SBDI-1, Red. Min. João Oreste Dalazen, DJU 26-9-2003).
7.Súmula n. 118 do TST: "Os intervalos concedidos pelo empregador, na jornada de trabalho, não previstos em lei, representam tempo à disposição da empresa, remunerados como serviço extraordinário, se acrescidos ao final da jornada".
8.TST-ERR-635725/2000, SBDI-1, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJU
9-5-2003.
HORAS EXTRAS - IMPUGNAÇÃO DO HORÁRIO DECLINADO NA PETIÇÃO INICIAL - AUSÊNCIA
DE DETERMINAÇÃO DE JUNTADA DE CARTÕES DE PONTO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA -
INAPLICABILIDADE DA SÚMULA Nº 338 DO TST. Quando a reclamada aponta, na
defesa, jornada diversa da inicial, atrai para si o ônus da contraprova, na
medida em que sua afirmação tem nítida natureza de fato impeditivo do direito
pleiteado pelo reclamante. A hipótese não é de aplicação do Enunciado nº 338
do TST, uma vez que a juntada dos cartões de ponto se torna imprescindível,
independentemente de determinação judicial. Intactos os arts. 818 e 333 da CLT
e do CPC, respectivamente, assim como o Enunciado nº 338 do TST. Recurso de
embargos não conhecido (TST-ERR-493559/1998, SBDI-1, Red. Min. Milton de Moura
França, DJU 15-8-2003).
9.HORAS EXTRAORDINÁRIAS - ÔNUS DA PROVA - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DA JORNADA DECLINADA NA INICIAL - INEXISTÊNCIA DOS REGISTROS DE CONTROLE DE JORNADA DOS EMPREGADOS - DESNECESSIDADE DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL. Com efeito, a instância revisanda deixou assentado em seu acórdão a premissa fática de que inexistia o registro de horário por parte do Banco, deixando este de observar determinação contida no § 2º do art. 74 da CLT. Por outro lado, o Enunciado n. 338 parte da premissa da omissão injustificada por parte da empresa em relação ao cumprimento da determinação judicial de apresentação de registros de ponto. Ocorre, entretanto, que na hipótese dos autos, conforme já esclarecido, o Banco não possuía os registros de horário do reclamante, o que inviabiliza a aplicação da orientação contida no referido verbete sumular. Este tem na sua substancia o cumprimento pelo empregador da obrigação legal de manter os registros de ponto dos empregados, razão pela qual a inexistência desses documentos, que se consubstanciam em prova pré-constituída administrativa e processualmente, a situação equivale àquela em que o empregador dispõe dos registros e se recusa sem justificativa a apresentá-los em juízo, de molde a ensejar a incidência da presunção de veracidade da jornada declinada na inicial. O aludido verbete não pode ser tomado através da jurisprudência e pelo julgador como excludente da responsabilidade patronal quanto ao pagamento de horas extraordinárias pelo simples fato de não ter havido determinação judicial para apresentá-los em juízo, pois processualmente ninguém pode ser intimado a exibir nos autos o que não existe, bem como não se pode consagrar a exacerbação da forma em prejuízo do conteúdo, qual seja, em detrimento de o empregador possuir ou não os controles de jornada dos empregados, imperativo que decorre de lei, mas, em suma, como indicativo da jurisprudência iterativa no sentido de que impõe-se a observância da regra legal a que alude o § 2º do artigo 74 da Consolidação das Leis do Trabalho. Recurso conhecido e provido (TST-ERR-348915/1997, Rel. Juiz Convocado Vieira de Mello Filho, DJU 23-5-2003).
HORAS EXTRAS. ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. ART. 74, § 2º, DA CLT. EXPRESSÕES ‘EMPRESA’ E ‘ESTABELECIMENTO’. 1. À luz de uma exegese mais alinhada com os princípios gerais e específicos do direito do trabalho, especialmente o da proteção, não há como deixar de conferir caráter processual à regra do art. 74, § 2º, da CLT, que traz previsão da obrigatoriedade de formação de prova que, pré-constituída pelo empregador, destina-se a amparar o empregado na produção de elementos probatórios destinados à comprovação de jornada de trabalho. 2. Tratando-se de norma cujos objetivos são eminentemente processuais, forçoso convir que, embora impropriamente se refira a ‘estabelecimento’, o comando inscrito no artigo 74, § 2º, da CLT dirige-se à ‘empresa’. 3. Se quem comparece em juízo é, naturalmente, a ‘empresa’ e não o ‘estabelecimento’, e se é sobre a primeira que recai o ônus processual referido, não faz sentido entender que ao segundo se enderece o aludido comando legal. 4. Não repugna, por outro lado, à inteligência da Súmula nº 338 do TST o acolhimento de horas extras após a oitava, com base em inversão do ônus da prova e presunção da jornada alegada na petição inicial, se incontroversa a inexistência de controle de ponto, a que está obrigado o empregador, por lei. 5. O descumprimento patronal de manter o registro de ponto do empregado, em observância à lei (CLT, art. 74, § 2º), equivale a dispor do registro de ponto e recusar-se imotivadamente a apresentá-lo ao órgão judicante quando instado a tanto. 6. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento (TST-RR-416131/1998, 1ª T., Red. Min. João Oreste Dalazen, DJU 23-5-2003).
10.NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. HORAS EXTRAS. INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL. 1. É ônus do empregador que conte com mais de dez empregados a prova da jornada de trabalho, na forma do artigo 74, § 2º, da CLT. Trata-se de prova pré-constituída obrigatória. A não-exibição judicial injustificada, ou a exibição de controles de jornada manifestamente inidôneos, gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho. A exibição de documentos formalmente inidôneos equivale à não apresentação. 2. Empregador que, intimado, apresenta em juízo cartões ponto indignos de credibilidade, sujeita-se à confissão tácita da jornada alegada pelo antagonista. 3. A confissão, mesmo tácita, relativa à jornada de labor, autoriza o indeferimento de prova testemunhal referente à inexistência de sobrejornada, com suporte no art. 400, inciso I, do CPC e, no caso de descumprimento de determinação judicial, com esteio no art. 359 do CPC. Embora não seja absoluta a presunção que dimana da ausência dos controles de freqüência, somente é de admitir-se prova testemunhal apenas para infirmar tal presunção com vistas a demonstrar que houve motivo escusável, de força maior, para a inexistência da prova documental essencial. 4. Cerceamento do direito de defesa em afronta ao artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, não se reconhece quando o indeferimento de inquirição de testemunha tem respaldo legal. 5. Recurso de embargos não conhecido. Decisão unânime (TST-ERR-721138/2001, SBDI-1, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJU 03-10-2003).
11.TST-ERR-635725/2000, SBDI-1, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJU 9-5-2003.
12.Nesse sentido a jurisprudência da SBDI-1 do TST: HORAS EXTRAS. INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO. PERÍODO ANTERIOR À LEI N. 8923/94. 1. O direito a horas extras em virtude da não-concessão de intervalo intrajornada surgiu com a publicação da Lei n. 8923/94. Vulnera, assim, o artigo 2º da aludida Lei acórdão que acolhe pleito de horas extras, nos meses de janeiro, fevereiro, março e abril de 1991, em razão da não-concessão de intervalo intrajornada. 2. Viola correlatamente o artigo 896 da CLT decisão de Turma do TST que não conhece de recurso de revista em tal circunstância. 3. Embargos de que se conhece, por violação, e a que se dá provimento para afastar da condenação as horas extras (TST-ERR-391121/1997, SBDI-1, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJU 7-3-2003).
13.INTERVALO INTRAJORNADAS - DESCUMPRIMENTO - DIREITO À INDENIZAÇÃO. Se a Empresa exige o retorno do trabalhador ao serviço antes do intervalo de descanso assegurado pela lei, ocasionando um desgaste maior ao empregado, por ainda não se haver recuperado do esforço despendido, deve indenizá-lo pela exigência suplementar. Convém destacar que o pagamento do intervalo não gozado não se confunde com o de horas extras, quando a jornada continua inalterada no seu cômputo geral. Não se trata de reconhecimento de sobrejornada, mas do direito à indenização prevista em lei, tomando por base o valor da hora normal, acrescendo-o de 50%, (CLT, art. 71, § 4º). Recurso de revista parcialmente conhecido e desprovido (TST-RR-40523-2002-900-04-00, 4ª T., Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DJU 05-9-2003).
14.COOPER, Flavio Allegretti de Campos Cooper. Pausas no Trabalho. In. GIORDANI, Francisco Alberto da Motta Peixoto. MARTINS, Melchíades Rodrigues. VIDOTTI, Tarcio José. Fundamentos do Direito do Trabalho ¾ Estudos em Homenagem ao Ministro Milton de Moura França. São Paulo: LTr, 2000, p. 466.
15.TST-RR-2206-1999-096-15-00, 5ª T., Rel. Min. Rider Nogueira de Brito, DJU 06-6-2003.
16.INTERVALO INTRAJORNADA NÃO USUFRUÍDO. CARÁTER INDENIZATÓRIO.
REFLEXOS. (...) revestindo-se a parcela ora deferida de caráter indenizatório,
não há que cogitar na sua respectiva integração para fins de reflexo em outras
parcelas. Recurso de Revista conhecido e provido (TST-RR-70459-2002-900-02-00,
2ª T., Rel. Min. José Simpliciano Fernandes, DJU 26-9-2003).
INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO. NATUREZA INDENIZATÓRIA. REFLEXOS DO
PAGAMENTO AUFERIDO COM ACRÉSCIMO. O desrespeito ao intervalo para refeição e
descanso, após a vigência da Lei 8923/94, impõe ao empregador a penalidade de
remunerar o período correspondente com um acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o
valor da hora normal de trabalho. Trata-se de situação distinta daquela que
enseja o pagamento de horas extras. Até a vigência da citada Lei 8.923/94 era
classificada como mera infração administrativa, mas sob a conceituação da
norma atual é infração passível de indenização correspondente a 50% do
salário, que deve ser paga ao trabalhador que não usufruiu o intervalo.
Reflexos indevidos. Revista conhecida e não provida (TST-RR-205-1999-094-15-00,
3ª T., Rel. Juíza Convocada Wilma Nogueira de A. Vaz da
Silva, DJU 1º-8-2003).
17.EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. NÃO-CONHECIMENTO. HORAS EXTRAS. INTERVALO INTRAJORNADA. INOBSERVÂNCIA. ARTIGO 71, § 4º, DA CLT. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 896 DA CLT. A não concessão do intervalo intraturnos, a partir do advento da Lei nº 8.923/94, gera direito ao pagamento de remuneração do período correspondente, no valor da hora normal acrescido de cinqüenta por cento. Assim, em se tratando de desrespeito a intervalo para repouso e alimentação, independentemente de haver acréscimo na jornada laboral, a remuneração consistirá no pagamento do período não usufruído, como se fosse hora efetivamente trabalhada e extraordinária, para todos os efeitos legais. Embargos conhecidos e providos (TST-ERR-425052/1988, SBDI-1, Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula, DJU 26-9-2003).
18.Assim, também, em voto proferido pela Ministra junto à 3ª Turma do E. TST: "O intervalo intrajornada concedido a menor gera o direito, para o empregado, à remuneração, como extra, da hora integral. Trata-se de norma de natureza tutelar, objetivando preservar a saúde e a segurança do trabalhador" (TST-RR-813582/2001, 3ª T., Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJU 24-10-2003).
19.DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2002, p. 907.